Pronunciamento de Heloísa Helena em 28/04/2004
Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Denúncia de tortura e tráfico de influência no Presídio Professor Aníbal Bruno, em Recife/PE.
- Autor
- Heloísa Helena (S/PARTIDO - Sem Partido/AL)
- Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SEGURANÇA PUBLICA.:
- Denúncia de tortura e tráfico de influência no Presídio Professor Aníbal Bruno, em Recife/PE.
- Publicação
- Publicação no DSF de 29/04/2004 - Página 11356
- Assunto
- Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
- Indexação
-
- GRAVIDADE, DESRESPEITO, DIGNIDADE, DIREITOS HUMANOS, PRESO, BAIXA RENDA, BRASIL, CONTRADIÇÃO, IMPUNIDADE, CRIME DO COLARINHO BRANCO, LAVAGEM DE DINHEIRO, TRAFICO, DROGA.
- REGISTRO, RECEBIMENTO, ENTIDADE, IGREJA, ATENDIMENTO, PRISÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, PRESIDIO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), EXPLORAÇÃO, FAMILIA, PRESO, COBRANÇA, TAXAS, ILEGALIDADE, TRANSFERENCIA, DETENTO, TORTURA, AMEAÇA, REPRESALIA.
- ANUNCIO, ENCAMINHAMENTO, DOCUMENTO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA.
A SRª HELOÍSA HELENA (Sem Partido - AL. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, anteontem estive no Recife, onde participei de um amplo debate na assembléia dos professores municipais. Encontrei, literalmente no meio da rua, Senador Jefferson Péres, várias mães e esposas de presos no serviço ecumênico de militância das prisões.
Sei que os presos são acompanhados pela Pastoral Carcerária e pelo serviço ecumênico de militância nas prisões. Sei também que os problemas relatados pelas mães ocorrem não só em Pernambuco, mas em Alagoas, São Paulo e várias localidades deste País.
A situação por que passam os presídios brasileiros é gravíssima. Falarei dos ladrões pobres, e não dos ricos, que chafurdam solene e impunemente na lama da corrupção sem que nada lhes aconteça. Registro esse assunto nos Anais do Senado, porque também solicitarei providências ao Ministério da Justiça.
Como tive oportunidade de dizer várias vezes, preocupo-me com o respeito à dignidade dessas pessoas. Repito que me refiro aos ladrões pobres. Sei que, com o aumento da violência no nosso País, as pessoas costumam não se preocupar com os presos. Algumas até comemoram os presos estarem sendo assassinados, tendo suas cabeças cortadas nos presídios, sendo estuprados e violentados. A angústia da sociedade com a violência é tão grande que as pessoas querem se livrar daqueles que, de alguma forma, perturbam a ordem.
Muitas pessoas comemoram as sardinhas abarrotando os presídios do País. Os ladrões pobres, que são utilizados na estrutura do narcotráfico, garantem a impunidade. Vejam o caso Waldomiro e tantos outros em que ficam impunes no Brasil figuras vinculadas diretamente aos mecanismos de lavagem do dinheiro sujo do narcotráfico.
Sr. Presidente, o Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões nos encaminhou documento - e eu tive oportunidade de falar com os familiares de presos, com mães e esposas angustiadas - apresentando uma denúncia contra o Presídio Professor Aníbal Bruno, que tem permitido a transferência de detentos dos seus pavilhões de origem sem nenhuma sustentação legal.
E elas nos informam que, além dos seus familiares sofrerem maus-tratos, as famílias, extremamente pobres, cumprem com a árdua missão de assumir as despesas com a custódia do detento - e isso sem nenhuma sustentação legal. Elas compram a cela, que está em torno de R$150,00, com direito a “estadia” nas empanadas construídas com lençóis que são conhecidas como barracos ou come-quietos. E há celas do tipo “casas de vila” que chegam ao preço de R$2 mil. Elas compram medicamentos, alimentação, material de higiene, vestuário; pagam a taxa de manutenção do pavilhão, que varia de R$2,00 a R$10,00 por semana, e taxas extras. Os proprietários de cantinas têm de pagar taxas de autorização para funcionamento e pagam até taxas de energia.
Evidentemente, quando há transferência de pavilhão ou de unidade prisional, essas pessoas não têm como recuperar aquele investimento que acabou fazendo. E essas famílias miseráveis, essas famílias extremamente pobres, essas mulheres e mães que lá estavam desesperadas nos diziam:
Temos que aceitar tudo em silêncio, pois estamos ameaçadas. Se a situação for denunciada, nossos familiares sofrem transferências até para o interior do Estado e são perseguidos em outras prisões. Mas tudo tem um limite humano suportável e o nosso se esgotou. Por isso, estamos recorrendo ao SEMPRI - Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões, às autoridades e à imprensa, mesmo sem divulgar nossos nomes por medo de represália do Sistema Prisional.
E, aí, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, elas detalham todo o tipo de tortura que essas pessoas estão sofrendo. Como eu, Sr. Presidente, além de trotskista militante e socialista por convicção, sou cristã, é sempre bom lembrar - e há muitos cristãos que fazem o moralismo farisaico tão duramente condenado pelo camarada Jesus Cristo - que, na História da humanidade, os ladrões pobres foram tratados de forma diferente, para melhor, do que os ladrões ricos. Não foi à toa que o próprio Salomão, em um texto bíblico conhecido, dizia: “O ladrão que furta para comer não vai nem leva ao inferno: os que não só vão, mas levam, de que eu trato, são os ladrões de maior calibre e de mais alta esfera, os quais debaixo do mesmo nome e do mesmo predicamento distingue muito bem S. Basílio Magno”.
Estamos falando aqui dos ladrões miseráveis, a quem a pobreza condenou a esse gênero de vida.
São Basílio Magno dizia: “Os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o Governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos: os outros furtam debaixo do seu risco” - porque já se sabe até o que lhes pode acontecer, porque eles já viram os seus amigos, os seus irmãos sendo assassinados ou pelas batidas policiais nas favelas ou dentro dos presídios ou dentro das próprias estruturas e disputas do crime organizado - , “estes sem temor, nem perigo: os outros, se furtam”, vão abarrotar o presídio; o ladrão rico, se furta, rouba, é recebido solenemente nos salões da high society e ainda se vê no direito de matar ou aprisionar o ladrão pobre que roubou.
Não foi à toa - e sabe V. Exª muito bem - que até Jesus Cristo, que deixou como principal mandamento “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” tratou de forma diferente o ladrão pobre e o ladrão rico. Também não foi à toa que Zaqueu, que roubava muito e muito tinha a restituir, para conseguir o perdão, andou muito e teve que devolver quatro vezes mais tudo do que tinha roubado para ser perdoado por Jesus Cristo; e o Dimas foi o primeiro que ele levou com ele para o Reino dos Céus, porque era pobre, não tinha roupa e nada tinha a restituir.
Fiz questão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de fazer esse registro e estou encaminhando a documentação que nos foi encaminhada pelas mães, pelas esposas dos presos do Presídio Professor Aníbal Bruno, em Recife, Pernambuco, mas sei que essa é a realidade de todos os presos, de todos os pobres deste País nos presídios brasileiros.
Deixo aqui, Sr. Presidente, mais uma vez a minha preocupação com o respeito à dignidade humana, pois os ladrões pobres estão sofrendo todo tipo de atentado à dignidade humana nos presídios brasileiros; enquanto que os ladrões ricos chafurdam na lama da corrupção, solenemente, impunemente e nada lhes acontece.
Portanto, estou fazendo um encaminhamento ao Ministério da Justiça para que haja fiscalização e providências sejam tomadas.
**********************************************************************************************
DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª. SENADORA HELOÍSA HELENA EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
**********************************************************************************************
Matéria referida: Ofício nº 19/2004, de 26 de abril de 2004, do Sempri - Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões