Discurso durante a 48ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações à decisão do Tribunal Superior Eleitoral - TSE que cassou o mandato do Senador João Capiberibe e da Deputada Janete Capiberibe.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Considerações à decisão do Tribunal Superior Eleitoral - TSE que cassou o mandato do Senador João Capiberibe e da Deputada Janete Capiberibe.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2004 - Página 11903
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • REPUDIO, RESOLUÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), CASSAÇÃO, MANDATO, JOÃO CAPIBERIBE, SENADOR, JANETE CAPIBERIBE, DEPUTADO FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ASSUNTO, PROCESSO, CASSAÇÃO, JOAQUIM RORIZ, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), COMPARAÇÃO, JOÃO CAPIBERIBE, SENADOR, JANETE CAPIBERIBE, DEPUTADO FEDERAL.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE. Pela Liderança do PSB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta sessão de hoje à tarde, ocupo a tribuna para, em primeiro lugar, muito embora respeite a decisão do Judiciário, lamentar que pena tão rigorosa tenha recaído sobre o Senador João Capiberibe e a Deputada Janete Capiberibe. Pensávamos justamente o contrário, pelo passado de honestidade, de conduta ética incensurável do eminente casal e também pela forma como se conduziu ao longo de mandatos eletivos consecutivos. João Capiberibe foi Prefeito e, em seguida, Governador duas vezes; e Janete Capiberibe foi Deputada Estadual e, em seguida, Deputada Federal, elegendo-se como a mais votada da história do Amapá.

Lamento que decisão tão drástica tenha sido tomada por um tribunal superior da Justiça do nosso País, justamente contra um casal que pontificou sua vida lutando pela democracia e pelas liberdades constituídas, em favor do cidadão e da cidadã. Posso aqui registrar o sacrifício pessoal a que ambos se submeteram e conseqüentemente o impuseram à sua família, para que conseguíssemos um ambiente de plena democracia, de liberdade e de correção de todas as injustiças que pudessem ser cometidas ou perpetradas contra qualquer brasileiro ou brasileira.

Volto a lamentar que castigo tão cruel tenha sido infligido a pessoas tão valorosas, que receberam as homenagens de todos os Partidos, de Senadores das mais diferentes correntes. O Senado Federal e Câmara dos Deputados, pela manifestação dos mais diferentes segmentos partidários, reafirmaram sua solidariedade a João Capiberibe e Janete Capiberibe, em uma prova evidente de que há uma confiabilidade imposta não pela amizade, pela aproximação, mas pela conduta irrepreensível que tiveram em sua carreira política, nos diversos mandatos eletivos que exerceram.

Ao mesmo tempo, Sr. Presidente, na condição de representante do PSB nesta Casa e usando a palavra por concessão da Liderança, eu gostaria de agradecer aos Parlamentares dos mais diferentes Partidos ou siglas partidárias que se manifestaram sobre o acontecimento, que expressaram a sua solidariedade, a sua confiança no Senador e na Deputada, conseqüentemente, no PSB, Partido que tem como norma respeitar a legislação, conduzir-se dentro dos limites éticos e da decência, seja na Administração, seja no pleito eleitoral. Portanto, meu agradecimento, do fundo do coração, em nome do PSB, a todos aqueles que, sem qualquer interesse, por meio de suas palavras, deram o carinho da sua solidariedade, do seu apreço e do seu respeito ao Senador João Capiberibe e à sua esposa, Deputada Janete.

Aliás, Sr. Presidente, gostaria de registrar também que o Senado Federal já teve mandatos cassados, sob as mais diferentes formas, mas nunca se manifestou de forma tão clara, tão evidente, publicamente, sem qualquer resquício de acanhamento. O Senado Federal, ao se posicionar na solidariedade, confiou e confia no Senador João Capiberibe, como também jamais deixará de confiar, qualquer que seja o resultado, na justiça brasileira, que existiu e existe para corrigir distorções, para chegar a um denominador comum onde prevaleça, acima de tudo, o legítimo direito do cidadão em exercer o mandato eletivo que o povo lhe outorgou nas urnas.

Como falei, não vi nenhuma manifestação sobre outros mandatos cassados, seja na justiça, seja no Senado ou na Câmara dos Deputados. Mas vi com meus olhos e ouvi com meus ouvidos a manifestação espontânea de Senadores, favorável a um resultado positivo de um julgamento que estava prestes a acontecer no Tribunal Superior Eleitoral.

A esse respeito, Sr. Presidente, a imprensa se posicionou, divulgou o acontecimento, em matérias que foram publicadas em revistas, no final de semana, e em jornais. E posso aqui resumir, por exemplo, o que publicou a revista Veja: “O Tostão e o Milhão”, é o título da matéria. “Capiberibe perde o mandato e Roriz é absolvido, porque o TSE não aceitou o indício como prova.”

A matéria da Veja:

Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral produziram decisões contrastantes na semana passada. Na terça-feira, eles se reuniram para julgar o caso do Senador João Capiberibe e sua mulher, a Deputada Janete Capiberibe. Filiados ao PSB do Amapá, os dois foram acusados de comprar votos na eleição passada. Nos autos do processo, duas testemunhas afirmam que receberam dinheiro para votar no casal com a seguinte forma de pagamento: 6 reais de entrada, e, depois da eleição mais 20 reais em duas notas de 10 reais. Aceitando a prova testemunhal de que o casal desembolsou 26 reais por voto, os ministros decidiram-se pela condenação. Por 4 votos a 2, o senador e a deputada perderam mandato e ficarão dois anos inelegíveis. Na quinta-feira - disse a Veja -, o TSE voltou a julgar um caso de abuso de poder econômico. O governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, do PMDB, era acusado de desviar cerca de 40 milhões de reais de dinheiro público para sua campanha. O TSE resolveu absolvê-lo. Foram 5 votos a 1.

O ministro Carlos Velloso foi o relator dos dois casos. No processo do casal Capiberibe, ele convenceu os colegas de que havia prova suficiente para a condenação. Na campanha eleitoral, a política do Amapá fez uma batida na casa de militante do PSB e, entre outras coisas, encontrou uma lista com nomes e telefones de eleitores e uma sacola com 15.000 reais, escondida no canil. A presença da lista eleitores com dinheiro gerou a suspeita de que votos estavam sendo comercializados. Fortaleceu-se mais tarde quando apareceram as duas testemunhas, cujos nomes, aliás, constavam na relação de eleitores apreendida. A maioria dos ministros entendeu que tal ciclo de coincidências consistia prova...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Antonio Carlos Valadares, lamento interrompê-lo. Eu e o País todo gostaríamos de ouvi-lo por tempo indeterminado, mas o Regimento manda que... V. Exª já dobrou o tempo.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Encerro daqui a pouco, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - E estamos aguardando...

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

Concedo cinco minutos do meu tempo, pois serei a próxima oradora, para que o Senador Antonio Carlos Valadares possa concluir seu pronunciamento.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Entendo a bondade, a generosidade, e gostaria de ceder todos os horários para o Senador Antonio Carlos Valadares, que, sem dúvida, representa a maior competência e é quem mais brada em defesa de uma boa justiça, mas o Regimento não permite.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Sr. Presidente, sei que V. Exª está de acordo com o Regimento. Mas, como se trata de um caso extraordinário, da cassação de um Colega nosso, eu gostaria que V. Exª, assim como em outras oportunidades a Presidência da Mesa já agiu, concedesse o tempo necessário para que a opinião pública do Brasil, que acompanha o Senado Federal, possa fazer o seu juízo, possa dar a sua opinião, conversar entre si e saber o que está acontecendo aqui em Brasília. Eu gostaria que V. Exª compreendesse que se trata de uma matéria da mais ampla repercussão, já que é a primeira vez na história do Brasil que o Tribunal Superior Eleitoral, com base numa legislação nova, cassa o mandato de um Senador e de uma Deputada.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Sr. Presidente, pela ordem.

Como Líder do Bloco de Apoio, solicito que os cinco minutos do Bloco sejam concedidos ao Senador Antonio Carlos Valadares, para que ele possa fazer a conclusão.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Senador, V. Exª usará da palavra pela Liderança do Bloco.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.

Como dizia a respeito da reportagem da Veja,

A maioria dos ministros entendeu que tal ciclo de coincidências constituía a prova da compra de votos e ignorou uma gravação apresentada pela defesa na qual as duas testemunhas desmentiam a denúncia e alegavam ter recebido dinheiro para depor contra os Capiberibe. O rigor do julgamento do casal do Amapá sugeria que o governador Joaquim Roriz também perderia o pescoço na guilhotina jurídica. Eis que não.

No caso de Roriz, o ministro Carlos Velloso entendeu que existia uma montanha de indícios, mas nenhuma prova.*

A revista ISTOÉ traz outra matéria, na página 30, intitulada “Justiça Eleitoral: a luta continua.”

Cassados, o Senador Capiberibe e sua mulher, a Deputada Janete, tentam reverter a decisão do TSE.

No Brasil, a cassação de um político costuma ter reflexos dos mais favoráveis. Antes de tudo, é símbolo de depuração e transparência na política. A máxima cultivada na história nacional contemporânea foi quebrada na semana passada quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou, por quatro votos a dois, os mandatos do senador João Alberto Capiberibe (PSB-AP) e de sua mulher, a deputada Janete Capiberibe(PSB-AP). Com base no testemunho de duas eleitoras do Amapá, que denunciaram ter recebido R$ 26 cada para marcar o nome dos parlamentares nas urnas, o casal foi condenado por compra de votos nas eleições de 2002. Se a decisão não for revertida, ele será o primeiro senador cassado do País.

Capiberibe conta que, ao ouvir a decisão, voltou mais de três décadas no tempo. “Tive a mesma sensação de estar imobilizado por uma camisa-de-força que senti quando fomos presos em 1970”, afirma. Na época, o casal integrava a organização clandestina Aliança Libertadora Nacional (ALN), do líder guerrilheiro Carlos Marighella. Como Janete estava grávida de oito meses, deixava a cidade de Belém (PA), junto com o marido, para escapar da perseguição do governo militar. Na primeira barreira montada pela polícia, os planos do casal foram interrompidos. A carreira política, no entanto, continuou, mesmo depois de dez anos de exílio. Quando governador do Amapá (1994-2002), Capiberibe se destacou por investir no desenvolvimento sustentável da região. Janete, que já exerceu três mandatos como deputada estadual, é forte candidata à Prefeitura de Macapá nas próximas eleições.

Originalmente, a denúncia contra o casal foi feita ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), no Amapá, pelo ex-senador Gilvan Borges, do PMDB, que perdeu as eleições para Capiberibe, e por Jurandil Juarez, também do PMDB, candidato derrotado à Câmara dos Deputados. Como o TRE julgou a denúncia improcedente, Borges e Juarez recorreram à instância superior.

E continua a revista ISTOÉ:

Em sua defesa no TSE, os Capiberibe apresentaram uma gravação na qual as duas eleitoras assumem que receberam “uma mixaria” para acusar o casal e pedem R$ 20 mil para mudar o depoimento. Não surtiu efeito. Para tentar manter os seus mandatos, eles agora vão apelar ao Supremo Tribunal Federal.

Sr. Presidente, antes de encerrar as minhas palavras, eu gostaria de requerer a transcrição, nos Anais desta Casa, da totalidade das reportagens das revistas Veja e ISTOÉ, publicadas no final desta semana, bem como do artigo publicado pelo jornalista Márcio Moreira Alves, no jornal O Globo, intitulado “Desilusão e esperança”.

Por isso, Sr. Presidente, confiamos que o próprio Tribunal Superior Eleitoral ainda pode, atendendo ao que foi requerido pelo advogado do Senador João Capiberibe, corrigir esse equívoco que foi, sem dúvida alguma, a decisão em condená-lo e a sua própria esposa, a Deputada Janete Capiberibe. Caso isso não seja possível, Sr. Presidente, ainda temos a saída do Supremo Tribunal Federal, por meio de um recurso extraordinário, com pedido liminar, para que seja reconhecida a inconstitucionalidade da medida severa e equivocada, salvo melhor juízo, do Tribunal Superior Eleitoral.

Sempre respeitei as decisões da Justiça e continuo a respeitar, Sr. Presidente. Contudo, penso que mesmo um tribunal, por mais sábio que seja; mesmo um juiz, por mais justo que seja, pode cometer um equívoco, pode consagrar uma decisão, na melhor das intenções, que venha a atingir pessoas que não merecem uma condenação.

Pelo que conheço de João Capiberibe e da Deputada Janete, posso afirmar que eles jamais seriam capazes de um ato dessa natureza. Mesmo porque nem recursos financeiros eles têm para a sustentação de uma campanha de nível econômico amplo, como aconteceu, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em muitos Estados brasileiros, inclusive aqui em Brasília, onde, às vésperas das eleições, no mínimo R$48 milhões foram gastos em benefício de uma candidatura. E não foi dinheiro particular, de empreiteira, de empresa privada, mas sim dinheiro público, e nada foi explicado até hoje.

Às vésperas de um pleito eleitoral, R$48 milhões são gastos para beneficiar um candidato a governador e nada acontece! Isso é o que me dói, porque sabemos que, ao comparar, chegamos à realidade. Comparemos a eleição do Amapá à eleição de Brasília e veremos a diferença. Que diferença! É da água para o vinho!

O Senador João Capiberibe e a Deputada Janete Capiberibe conseguiram os seus mandatos com lisura e com o devotamento ao trabalho que realizaram. Eles jamais precisariam, pelo prestígio de que dispõem no seu Estado, usar R$52,00 para comprar dois eleitores fajutos que não tiveram sequer a coragem de reafirmar, perante o Tribunal, o que haviam, mediante um processo de extorsão, proposto ao advogado das vítimas. Posso considerar o Senador João Capiberibe e a Deputada Janete Capiberibe vítimas da armação de alguém que arquitetou, com muita malícia, maldade e competência, a destruição dos mandatos populares conseguidos à custa de muito trabalho, devoção e compromisso com a democracia, a liberdade e o desenvolvimento sustentável do Estado do Amapá.

Esta é a minha palavra, Sr. Presidente, de reafirmação da crença de que no Brasil existem democracia e justiça. E se houver justiça, como sei que existe, os mandatos do Senador João Capiberibe e da Deputada Janete Capiberibe serão respeitados e S. Exªs serão reintegrados aos mandatos que conquistaram nas eleições democráticas a que se submeteram.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ANTONIO CARLOS VALADARES EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

- “Desilusão e Esperança” - Márcio Moreira Alves (O Globo);

- “A Luta continua” - ISTOÉ;

- “O Tostão e o Milhão” - Veja.

 

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Antonio Carlos Valadares, estou emocionado com a brilhante defesa que fez V. Exª do Senador João Capiberibe. V. Exª, profundo conhecedor do Direito e da vida do Senado, sabe que já houve fatos aqui que suscitaram a criação de leis de anistia. Então, sugiro-lhe que dê andamento a isso com seu cabedal jurídico.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Se V. Exª me permite, Sr. Presidente, informo-o de que, sem dúvida alguma, no decorrer desta semana, tramitará projeto de resolução de autoria do Deputado Sigmaringa Seixas, do PT, propondo anistia para corrigir distorções semelhantes a esta, cometida contra os dois Parlamentares.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2004 - Página 11903