Discurso durante a 47ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comemoração dos 150 anos de inauguração da primeira ferrovia brasileira - Estrada de Ferro de Petrópolis. Incentivo ao setor ferroviário durante seu período de Governo. Importância dos investimentos em infra-estrutura de transportes para o desenvolvimento do País.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Comemoração dos 150 anos de inauguração da primeira ferrovia brasileira - Estrada de Ferro de Petrópolis. Incentivo ao setor ferroviário durante seu período de Governo. Importância dos investimentos em infra-estrutura de transportes para o desenvolvimento do País.
Publicação
Republicação no DSF de 05/05/2004 - Página 12116
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, INAUGURAÇÃO, FERROVIA, LIGAÇÃO, MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), PETROPOLIS (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • NECESSIDADE, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE, AMPLIAÇÃO, RECUPERAÇÃO, TRANSPORTE FERROVIARIO, BRASIL, OBJETIVO, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS.
  • REGISTRO, INCENTIVO, TRANSPORTE FERROVIARIO, PERIODO, GESTÃO, ORADOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 04/05/04


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DISCURSO PROFERIDO PELO SR. SENADOR JOSÉ SARNEY NA SESSÃO DO DIA 30 DE ABRIL DE 2004, QUE, RETIRADO PARA REVISÃO PELO ORADOR, ORA SE PUBLICA.

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O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB - TO) -Senador José Jorge, V. Exª será atendido na forma regimental.

Concedo a palavra ao próximo orador inscrito, o nobre Presidente desta Casa, Senador José Sarney, que fala por cessão deste Senador Eduardo Siqueira Campos, que seria o próximo inscrito.

Senador Valdir Raupp, V. Exª também está regulamente inscrito, mas a Casa ouvirá as palavras do Presidente José Sarney e, em seguida, daremos continuidade à lista de oradores inscritos.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna para rememorar a data de hoje. Há 150 anos, inaugurou-se a primeira estrada de ferro no Brasil, o que significava e significa um marco muito importante no progresso brasileiro.

Naquele dia, inaugurávamos a estrada que ia até Petrópolis. D. Pedro II, com a imperatriz e todo seu séqüito, comemorava o evento que era, sem dúvida, um fato extraordinário até mesmo no mundo, uma vez que as ferrovias começavam a operar há pouco tempo. Depois da descoberta da máquina a vapor, primeiramente utilizada em navios, com a invenção da locomotiva, as estradas de ferro começaram a ser construídas.

O pioneiro dos meios de transportes no Brasil foi Irineu Evangelista de Sousa, que nos dava não só a primeira estrada de ferro mas o primeiro transporte intermodal no Brasil. Saía-se da Praça do Paço, no Rio de Janeiro, em uma barca, até a praia de Mauá, na Vila da Estrela. Dali, tomava-se o trem até a Raiz da Serra de Petrópolis. Naquele dia mesmo, D. Pedro II resolveu dar a Irineu Evangelista de Sousa o título de Barão de Mauá, justamente porque ali iniciava-se a ferrovia.

Era o momento em que o Brasil começava a descortinar os caminhos do progresso que se abria à frente das descobertas. O transporte ferroviário foi, no mundo, a grande alavanca do comércio e do desenvolvimento. O Brasil teve cerca de 40 mil quilômetros de ferrovias; agora, depois de 150 anos, foram reduzidas a 29 mil quilômetros. As ferrovias foram sucateadas, foram desaparecendo, perdendo para o transporte rodoviário, que, sem dúvida alguma, é o modelo dominante, mas que, na realidade, não corresponde ao que nosso País necessita como infra-estrutura.

Quando Presidente da República, ante o processo de desmonte das ferrovias, inclusive com o estudo feito pelo Geipot no sentido de mandar acabar com os ramais ferroviários - muitos deles foram extintos -, procurei de todo modo incentivar e restaurar a mentalidade ferroviária na infra-estrutura do Brasil.

Para isso, utilizamos mesmo os fundos destinados às rodovias na construção de estradas de ferro. Com isso, conseguimos concluir a Ferrovia do Aço. Projetamos grandes ferrovias nacionais. Se o Brasil tivesse feito a Ferrovia Norte-Sul, se tivesse construído a Ferrovia Leste-Oeste, certamente não estaríamos hoje precisando discutir teorias econômicas, porque o País estaria crescendo e o ativo que se constituem para o Brasil os 70 milhões de hectares já estariam disponíveis para a agricultura, a serviço do progresso brasileiro.

Para traduzir a vontade que o País teve em investir nas ferrovias, basta dizer que, quatro anos depois da construção da primeira ferrovia no Brasil, da qual estamos comemorando os 150 anos, já também se inauguravam a de Recife a São Francisco e a União-Indústria, obra de Cristiano Ottoni. O Brasil acompanhava o ritmo dos grandes países. Os ingleses pegaram a Índia e cortaram o país com ferrovias para cima e para baixo. O mesmo fizeram os Estados Unidos, que em 1869 inauguraram sua primeira ferrovia transcontinental.

Hoje nós ouvimos um discurso anacrônico de que as ferrovias foram o instrumento de transporte do passado, não são do presente e não serão mais do futuro. Isso não é verdade, Sr. Presidente. Realmente, as ferrovias foram o transporte do passado, sofreram um período de decadência, mas hoje, com as novas tecnologias e os trens de alta velocidade, elas passaram a ser as esteiras rolantes de escoamento da produção. Se nós não tivermos ferrovias, não teremos transporte competitivo. Se nós não tivermos ferrovias, jamais poderemos pensar no crescimento do Brasil porque a cada 1% de crescimento anual nós teríamos que crescer 1,6% na infra-estrutura de transporte. E dentro dessa infra-estrutura nós, certamente, teríamos o transporte ferroviário.

Sonhei, como Presidente, até mesmo trazer novas tecnologias; planejamos e colocamos em edital de concorrência o trem-bala do Rio de Janeiro para São Paulo àquela época. Enfim, tínhamos a mentalidade ferroviária.

Devo também ressaltar que o processo de privatização compulsório das ferrovias brasileiras foi obviamente um processo errado que não deu certo. Hoje, estamos constatando que não atingiu os seus objetivos.

Portanto, nesta data, eu quero relembrar ao País a necessidade de restaurarmos a consciência de que as ferrovias são importantes para o progresso brasileiro e, ao mesmo tempo, louvar e homenagear aqueles ferroviários que, ao longo do tempo, participaram desse processo e constituíram uma classe importante do desenvolvimento da infra-estrutura brasileira; ferroviários que, até hoje, estão aí esquecidos, mas cuja grande contribuição ao Brasil temos que reconhecer.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Darei o aparte a V. Exª.

Quero ressaltar também, nesse aspecto, alguns líderes do presente que sempre lutam pelos ferroviários como o Deputado Carlos Santana, que, em toda sua vida política, tem sido um defensor da classe ferroviária e da necessidade de renovarmos a consciência ferroviária no Brasil.

Como Presidente de Honra dos Ferroviários -- deram-me esse título que até hoje guardo com muita gratidão --, estou aqui relembrando esses 150 anos e dizendo que considero esta data marca importante para o Brasil porque é uma marca do progresso brasileiro.

Ouço a Senadora Ideli Salvatti e, em seguida, o Senador Álvaro Dias.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Sr. Presidente, quero me congratular com a manifestação de V. Exª, até porque ontem tive a oportunidade de fazer da tribuna um registro da representação que o Senador Marco Maciel e eu fizemos em encontro da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, numa solenidade onde estava sendo debatida toda essa questão, não só a comemoração dos 150 anos, mas também a necessidade fundamental de retomarmos esse modal de transporte, fundamental a todo e qualquer país, principalmente a países com dimensões continentais como é o caso do Brasil. Tive a oportunidade de traçar comparativos entre os parcos 24% de transporte do Brasil feitos por ferrovias com outros países como o Canadá, com 46%; Estados Unidos, 43% e Rússia, 81%, sendo inadmissível que não tenhamos a capacidade política de dar a importância que a ferrovia tem para o nosso desenvolvimento, para a infra-estrutura de escoamento de produção, de cargas e de pessoas neste País continental. Registrei também todas as tratativas feitas pelo Governador Zeca do PT, em Mato Grosso, e toda a articulação na parceria público-privada com a ferrovia Novo Oeste que, infelizmente, como V. Exª registrou, nesse processo de privatização acelerado teve muitas seqüelas. Mas é esse o sistema que temos, é com ele que temos que dar a volta por cima e fazer com que a ferrovia tenha realmente esse papel importante no desenvolvimento. Parabenizo V. Exª por trazer mais uma vez ao plenário este que é um dos temas fundamentais para que o desenvolvimento brasileiro tenha sustentabilidade.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado pelo aparte de V. Exª. Sei que muitos pronunciamentos foram feitos nesta Casa e também na Câmara dos Deputados, quando tivemos uma sessão solene a que compareci.

É muito bom que esse assunto tenha despertado também na área política a tão necessária consciência a respeito do transporte ferroviário no Brasil, que foi sucateado e abandonado. Mas estou falando hoje porque justamente há 150 anos, 30 de abril de 1854, tivemos esse fato que não poderia passar em branco no Senado da República. O aparte de V. Exª engrandece esta pequena comunicação. E tenho certeza de que todos estamos contribuindo para que as ferrovias possam renascer no Brasil.

Ouço o Senador Alvaro Dias.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Presidente Sarney, apenas para um depoimento e um agradecimento. V. Exª fez referência aos esforços do seu Governo para estimular o sistema ferroviário nacional e impedir o seu sucateamento. Sou testemunha disso porque foi autorizado pelo seu Governo, estimulado pelo seu Governo, com a participação do qual iniciamos no Paraná a construção da ferrovia Paraná-Oeste, que se tornou realidade e hoje presta um extraordinário serviço no escoamento da produção - especialmente soja - do oeste do Paraná, que é um celeiro na produção de soja no nosso Estado e no nosso País. A ferrovia reduz o custo do transporte, por conseqüência reduz o custo da produção, oferecendo uma margem de lucro maior ao produtor e certamente economia superior ao País. Notadamente, quando se vê o porto Paranaguá com filas de 120 quilômetros de caminhões à beira da rodovia esperando vez, a importância da ferrovia se destaca. E é para agradecer a V. Exª, que possibilitou aquela realização, que nós o aparteamos neste momento. V. Exª tem autoridade para falar em ferrovia no nosso País.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias, pela referência que faz às providências que, naquele tempo, tomamos conjuntamente; trabalhamos conjuntamente nas ferrovias do Paraná. Recordo-me que foi naquele tempo que fizemos a parceria privada que possibilitou aquela estrada de Mato Grosso até São Paulo, que hoje está sendo tão importante para o escoamento da produção, interligada com o sistema paulista, feita naquele tempo, por concorrência, pelo Olacyr de Moraes com o apoio do Estado.

Nós políticos - repito - devemos ter a consciência de que é preciso que as ferrovias estejam no primeiro plano do pensamento da criação da infra-estrutura nacional.

Muito obrigado a V. Exª.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Ouço, com muita honra, o Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Presidente José Sarney, V. Exª, em primeiro lugar, trouxe algo que é muito bom que se traga aqui que é ressuscitar fatos históricos. O Senado deveria ser, na verdade, uma grande sala de história para nós e para o Brasil. Mas o que me fez pedir o aparte foi a oportunidade do tema. Na verdade, algo que ocorreu há 150 anos é mais moderno, do ponto de vista dos desejos de um país melhor, do que o que fazemos hoje. O que está aí é uma lógica diferente. O transporte ferroviário é um transporte comprometido com o público; o transporte que surgiu da indústria automobilística é comprometido com os indivíduos. Daí há uma diferença, inclusive, entre os sindicatos ferroviários e a indústria automobilística. Assim é uma preocupação que tenho com a Esquerda, da qual me sinto parte. A nossa Esquerda nasceu moderna na indústria automobilística. Nossa Esquerda é filha das fábricas de automóveis e se tornou privatista. Nesse caso, a oportunidade, por exemplo, do tema que apareceu de ontem para cá. Estamos tratando do salário pelo lado privado, tendo em vista a renda ao trabalhador, que é fundamental, mas estamos esquecendo o lado público do salário do trabalhador, que é a sua escola, o seu transporte, como dizia há pouco o Senador Valdir Raupp, e preocupados com aqueles que nem salário mínimo têm. Então, por trás dos cento e cinqüenta anos das ferrovias no Brasil, V. Exª está propondo um debate que este País precisa levar a sério: quebrar a lógica do desenvolvimento com base no aumento na demanda privada de cada um e passar a um desenvolvimento que atenda às necessidades da totalidade do povo brasileiro. Isso está por trás desse debate sobre ferrovias ou rodovias e por trás do que V. Exª trouxe hoje como simples lembrança de um fato histórico, muito oportuno, Presidente Sarney, para os dias de hoje.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - V. Exª recorda no seu aparte um fato extremamente importante, que passa despercebido e de que não íamos nem tratar. Realmente, o transporte ferroviário feito para os pobres, porque, nos séculos XVIII e XIX, o transporte de pessoas era feito usando animais. Os ricos usavam as carruagens, que eram das pessoas abastadas, e os pobres tinham de andar a pé. Quando implantamos o transporte ferroviário, ele se tornou o transporte dos pobres. Recordo que li, por exemplo, que nessa ferrovia, que completa cento e cinqüenta anos, foi estabelecido que os pobres pagavam só quinhentos réis pela passagem. Diziam “os descalços”, porque os pobres naquele tempo andavam descalços, não tinham sapatos.

Ao fazer essa ferrovia, fez-se o transporte intermodal, que naquele tempo foi uma solução genial. Mauá procurou fazer a estrada, interligando o transporte marítimo, das barcas, com o ferroviário - era uma mentalidade extraordinária para aquele tempo -, preocupado com o transporte dos pobres que até hoje é feito pelos trens suburbanos e metrôs. Então, como V. Exª disse, esse foi o transporte dos pobres e que hoje, nas grandes cidades, continua sendo daquelas pessoas que não têm acesso aos transportes de alta velocidade ou aos transportes particulares e privados, que são segregacionistas das classes mais privilegiadas.

Também recordo, já que estamos recordando, que corresponde a meu Governo o estabelecimento do vale-transporte, que foi dado a todos operários e empregados do Brasil e até hoje é um instrumento importante para o trabalhador. Verificamos que as pessoas não podiam guardar parte do salário que recebiam para pagar transporte porque havia a premência da compra da comida. Em vários dias da semana, o trabalhador não podia sair de casa porque não tinha dinheiro para o transporte. Daí o estabelecimento do vale-transporte quando eu era Presidente da República.

Ouço o Senador Heráclito Fortes.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Nobre Presidente José Sarney, a presença de V. Exª na tribuna é sempre uma aula para todos nós. Lamento que o aparte me tenha sido dado após V. Exª ter feito referência ao vale-transporte. Pensei que tinha havido um esquecimento por parte de V. Exª dessa grande conquista, talvez uma das maiores conquistas que o trabalhador brasileiro teve nos últimos tempos, exatamente no Governo de V. Exª. Eu queria pedir permissão para acrescentar à homenagem feita por V. Exª a um ferroviário da Câmara o nome de um ferroviário do Senado. Refiro-me ao Senador Alberto Silva, de origem ferroviária, que foi Governador do Piauí e hoje é um entusiasta das ferrovias brasileiras.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - E fez metrô em Teresina.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Fez metrô em Teresina, exatamente. Eu queria dar um testemunho: fiz turismo em ferrovia na terra do Senador Mão Santa, nossa querida Parnaíba. Quantas e quantas vezes saí de Parnaíba para Luiz Corrêa no trem da Central, exatamente para tomar o chamado trem dos banhistas. Saía de manhã de Parnaíba, ia para Luiz Corrêa e voltava à tarde, sempre de trem. Era uma maneira de fomentar o turismo.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Em Piripiri, também.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Exatamente. Saía-se de Teresina, era uma viagem vagarosa, e chegava-se a Parnaíba. Lamentavelmente isso faz parte do passado, V. Exª bem disse. Vamos torcer para que o Brasil retome as ferrovias como prioridade e que não fiquemos apenas na questão ferroviária, imortalizada pelo seu conterrâneo João do Vale. Quantas e quantas vezes o trem do João do Vale me despertou em Teresina para que eu pudesse ir à escola. Esse trem do João do Vale, a famosa Maria Fumaça, transportava riqueza do Piauí para o Maranhão. Espero que possamos voltar um dia, Presidente Sarney, a contar não só com essa estrada de integração como também com várias outras que, infelizmente, foram paralisadas no Brasil. Parabéns a V.Exª pela oportunidade do pronunciamento.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado. V. Exª preenche uma lacuna no meu discurso, evitando o esquecimento do Senador Alberto Silva. Certamente, a Casa há de me desculpar, porque na minha idade começamos a esquecer.

O Senador Alberto Silva, realmente, é um homem que tem ligado a sua vida ao transporte ferroviário. Lembro-me da luta de S. Exª pelo metrô de Teresina.

V.Exª falou do ramal que ligava Teresina a Piripiri, que foi desativado naquele tempo, de acordo com o relatório do Geipot. Muitos queriam também desativar o de São Luís-Teresina. O ramal que ligava São Luís a Teresina estava incluído para ser extinto. Eu, naquela época, era Governador do Estado do Maranhão e não quis discutir a desativação, mas mandei fazer um estudo sobre a viabilidade da ferrovia, porque sabia que o relatório estava errado, quando pedia a extinção daquele ramal. Muitos outros ramais foram extintos. Por exemplo, a chamada estrada Bragantina - de Belém a Bragança - foi extinta. Naquela área da Amazônia era a única estrada que existia. Então, na realidade, é um setor que ficou esquecido. Criou-se a mentalidade de que ferrovia era uma coisa do passado, que ferrovia era uma coisa antiquada, quando, na realidade, não havia nada disso. Quer dizer, tinha que se incorporar as novas tecnologias às ferrovias brasileiras.

Ouço o Senador José Jorge, que me havia pedido um aparte.

O Sr. José Jorge (PFL-PE) - Senador José Sarney, agradeço a oportunidade de apartear V.Exª Na realidade, eu quero me congratular com V.Exª pela atualidade do tema que discute no Congresso. O moderno, hoje, é exatamente o transporte modular, quer dizer, a integração de todos os tipos de transportes: rodoviário, ferroviário, fluvial, aéreo, tudo integrado, no sentido de que a mercadoria vá ponto a ponto com custo mínimo. Certamente, que em diversos tipos de transporte no Brasil não temos um sistema avançado tecnicamente. O setor ferroviário é que está mais atrasado, mesmo, porque, esteve, praticamente, desativado. Então, no momento em que V.Exª traz esse assunto à nossa pauta, acho que também podemos ter esperança de que esse sistema de transporte avance de forma integrada, reduzindo o custo/Brasil e permitindo que nossos produtos cheguem ao exterior de forma competitiva e cheguem mais baratos a todos os brasileiros. Parabéns a V. Exª.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Obrigado, Senador José Jorge, V.Exª sempre com muita precisão e experiência de homem público, aborda um ponto novo. No caso dos transportes, hoje, realmente, o que é moderno, é o transporte intermodal, quer dizer, a conjugação de todos os tipos de transporte.

Queria dizer que Mauá já tinha essa visão. Para possibilitar a ferrovia, ele fez uma interligação do transporte ferroviário com o transporte marítimo. É com tristeza que vemos desaparecer no Brasil essa mentalidade de integração, de transporte intermodal. De certo modo, ela desapareceu e foi relegada a segundo plano. Como bem disse V.Exª, todos os nossos meios de transporte estão atrasados, sob esse aspecto. Não precisamos inventar coisas novas. Recordo, não por saudosismo para fazer referência pessoal, mas por necessidade, porque já antes de chegarmos à Presidência muitos haviam pensado nisso. Fizemos um plano de integração do transporte intermodal, incluindo hidrovias, ferrovias, transporte aéreo, o centro de distribuição; tudo isso parte de um estudo profundo feito naquele tempo. Iniciamos pensando nas hidrovias e no transporte de cabotagem. E é com tristeza, posso dizer, já que estamos invadindo a data histórica com a discussão desse problema de infra-estrutura de transportes, que vemos que, no Brasil, com essa costa imensa, abandonaram-se os portos, a navegação de cabotagem e, para tristeza nossa, desapareceram as bandeiras brasileiras de transporte internacional. Não temos hoje uma bandeira brasileira de transporte internacional! O que significa? Que, na balança de serviços, o nosso déficit se encontra na altura em que está. Se hoje resolvermos crescer 3%, 4%, 5% ao mês, esse crescimento vai esbarrar numa infra-estrutura incapaz de dar-lhe suporte. E mais: na balança de serviços, o que vamos pagar de fretes internacionais aumentará muito mais, porque perdemos as bandeiras brasileiras de transporte internacional. É uma coisa triste para nós não termos mais uma bandeira de transporte marítimo internacional.

Ouço o Senador Leomar Quintanilha.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - Presidente José Sarney, quero associar-me àqueles que homenageiam V. Exª, pela lembrança de tão importante tema, que, apesar de começar rememorando os 150 anos da primeira ferrovia brasileira é um tema atualíssimo, é um tema candente nas necessidades nacionais. V. Exª, com a autoridade de quem já governou este País, que naquele momento tinha a compreensão da importância da multimodalidade e sobretudo da implantação da modal ferroviária neste País como forma de redução dos custos nos transportes dos bens deste País, não só internamente, mas alcançando os portos para que pudesse alcançar outros mercados, V. Exª se empenhou muito, mas foi mal compreendido com a implantação da Ferrovia Norte-Sul, pela qual hoje o Brasil todo clama; e nós, particularmente, do seu Estado irmão, seu Estado vizinho, que divide com o Maranhão, com quem tenho a honra, de com o nosso Senador Eduardo Siqueira Campos - que preside esta sessão -, com o Senador João Ribeiro temos nos empenhado e tratado como prioridade absoluta e número um da implantação da Ferrovia Norte-Sul, que V. Exª iniciou no seu mandato como Presidente da República. Ela, naturalmente, vai contribuir para a mudança de matriz dos transportes nacionais e vai eliminar a vantagem comparativa que tem os grandes centros em relação aos estados mediterrâneos, as imensas regiões mediterrâneas que este País tem e que, isoladas pelas distâncias, se sentem prejudicadas em relação ao seu custo de produção. Não só no recebimento dos seus insumos, mas também no escoamento da sua produção. Portanto, o tema que V. Exª traz, neste momento em que o Brasil se propõe a ser uma nação globalizada e participar, de forma competitiva, nessa disputa de mercados com os demais países, naturalmente a modal ferroviária se insere como uma prioridade absoluta, como uma prioridade imensa e que encontra ressonância nesta Casa. Cumprimento, portanto, V. Exª. E estaremos juntos nessa luta para que, não só essa modal, mas as demais modais, como a hidrovia, a navegação de cabotagem, que V. Exª também lembrou, possam contribuir para que o País acelere o seu processo de desenvolvimento, alcance a prosperidade que a nossa população tanto almeja.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Obrigado, Senador Leomar Quintanilha, pelo seu aparte. V. Exª é um representante tão presente do Estado do Tocantins, esse Estado que, sem dúvida alguma, é um exemplo do que se pode fazer no País e que muito deve ao Siqueira Campos, que foi o seu grande defensor. A gente que visita hoje o Tocantins vê aquela força do progresso invadindo, a transformação que ali ocorreu, e o apoio que sempre foi dado pelas lideranças e pelo povo daquela região sobre a construção da Ferrovia Norte-Sul.

Quero dizer que não tenho nenhum ressentimento quanto ao que ocorreu sobre a Norte-Sul; ao contrário, tenho a certeza de que uma boa idéia não pode ser morta. Ninguém pode matar uma boa idéia porque ela ressurge, renasce, ressuscita.

Outro dia, tive uma grande satisfação, quando estive com o Presidente da República, o Presidente Lula, que então me disse: “Fui contra a Norte-Sul, mas nem eu mesmo me explico por que fui contra a Norte-Sul. E quero dizer ao senhor que vou fazer tudo para concluir a Norte-Sul”. E a Norte-Sul, hoje, é uma unanimidade nacional. Por quê? Porque é uma boa idéia, uma grande idéia que se tornou evidente.

Muitas vezes as lutas políticas - isso é natural, é compreensível - nos levam a cometer equívocos, e as paixões muitas vezes cegam as pessoas em determinados instantes. Mas, quando a idéia é boa, ela vem, ressuscita e finalmente é concluída. Como a nossa história não se esgota nem na nossa geração, vai em frente, sonho com o momento em que verei este Brasil cortado de Norte a Sul pela grande ferrovia; vejo também a ferrovia de Oeste para Leste. Nesse tempo, já não precisaremos estar falando aqui sobre teorias economias, FMI, porque a própria força do desenvolvimento e do progresso nacional vão sepultar as teorias para vivermos, na praticidade, a existência do grande Brasil, que é o presente e que será, sem dúvida, no futuro.

Ouço o Senador Crivella e depois concederei também um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Marcelo Crivella (PL - RJ) - Presidente Sarney, suas palavras são empolgantes. Gostaria de cumprimentá-lo em nome do meu Estado do Rio de Janeiro, onde se construiu a primeira ferrovia deste País. Esses dias, conversando com o presidente da Vale do Rio Doce, ele dizia que a China encomendou ao Brasil 50 milhões de toneladas de minério de ferro, mas que ele só ia conseguir entregar 20 milhões. Isso ocorre não por falta de minério de ferro, mas porque não temos ferrovias, porque não temos portos, porque não temos alguém com a visão de V. Exª, que possa dotar este País de uma infra-estrutura capaz de atrair capital estrangeiro e não de depender dele. Temos tudo para sermos soberanos, com todos esses recursos naturais, uma bênção extraordinária que Deus colocou em nosso País. Assim, quero cumprimentar V. Exª que, na política, é uma locomotiva. Ninguém melhor para fazer esse discurso do que a nossa locomotiva política, que tem rebocado a nós todos aqui como vagões da sua liderança e que, tenho certeza, Presidente Sarney, ainda será, com a visão que V. Exª tem, uma direção certa, como essa da Ferrovia Norte-Sul, para levar o progresso do nosso País ao lugar que ele merece e já deveria estar há muito tempo. Muito obrigado pela honra do aparte, Presidente.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado, Senador Crivella. V. Exª continua sendo um homem preocupado com as coisas do nosso País e continua orando também pelo Brasil.

Ouço com muita honra -- como antigamente se dizia “para finalizar essa coroa de sonetos”, que são os apartes que estou recebendo --, o Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Presidente Sarney, o nosso representante Heráclito já falou tão bem. Eu queria aqui reviver um pensamento de Alberto Silva. Quando Alberto Silva governou o Piauí, uma vez ele disse: “Era bom era ter vinte anos de Sarney”. Deus escreve certo por linhas tortas, estamos com vinte anos, 85, da presença. Agora, eu queria dizer o meu testemunho. Tenho maior privilégio que os outros Senadores. Primeiro, quero mostrar que a valia da personalidade de V. Exª tem muito a ver com o Piauí, o seu avô piauiense. E sou filho de maranhense, então é muito fácil. Mas o mundo me fez entender as coisas e, diante do Professor Cristovam Buarque, quero citar um homem como ele, Aristóteles, como o Professor Cristovam Buarque, que disse que o homem é um animal político. Não conheço nem um nessa definição que seja tão grandioso quanto o Presidente Sarney. Vou dar um testemunho. A vida foi uma luta e não foi fácil. O Presidente Sarney enfrentou altas oligarquias e o maior sistema de comunicação do tempo de Chateaubriand, quando negociações fizeram renunciar dois Senadores para que S. Exª fosse Senador. S. Exª foi contra. Isso é uma história longa. Mas eu queria dizer do Presidente Sarney, eu queria dizer, brasileiros e brasileiras, que eu vi, Deus me permitiu trabalhar com o Presidente Sarney,com o Presidente Collor, com o Presidente Itamar e com o Presidente Fernando Henrique. E aqui, com minha formação cristã, “em verdade, em verdade, vos digo” que o mais generoso, o mais competente de todos eles é o Presidente Sarney. Queria dar o meu testemunho. Olha, estar de cima, ser Presidente deve ser bom como o quê! Só fui de rótulo e foi bom! O Presidente Fernando Henrique diz que tem saudades da piscina e do helicóptero. Mas eu tive um privilégio. Consolidada a democracia neste País, vencidas pela paciência dez mil greves, eu, Prefeito, recebi em minha cidade, Parnaíba, o ex-Governador, o homem que consolidou a democracia neste País: o ex-Presidente e Presidente Sarney. Poucos dias depois eu vi um homem com a satisfação do cumprimento de uma missão, Heráclito. Recebi o Presidente Sarney, que ia à vizinha cidade de Araioses*, porque o rio Parnaíba da minha cidade é o Maranhão. Recebi o ex-Presidente grandioso, o que fez ressuscitar a democracia consolidando-a, dando-lhe a vida - e por isso estamos aqui. O Presidente ia inaugurar um grupo escolar e um calçamento, a convite do Prefeito dias depois. E quero dar o retrato do homem: era o retrato da satisfação do cumprimento da missão. Mas a cada dia aprendemos com V. Exª, o que é outro privilégio. Queria dizer que V. Exª falou em Mauá. Eu, governando o Piauí, fui fazer um convênio com a Fundação Getúlio Vargas, com a UESP. E estava lá Alberto Costa e Silva, seu companheiro da Academia de Letras, filho de Da Costa e Silva, o maior poeta do Piauí. Na conversa Alberto Costa e Silva dizia que os maiores homens, Senador Cristovam Buarque, os dois maiores do século XIX foram o político Pedro II e o empresário Mauá. Mas eu queria trazer para esta festa, esta festa da ferrovia e do trabalho que tinha que nascer: “um bem nunca vem só”, como diz Padre Vieira. E o Presidente Sarney os traz. No dia da inauguração da pedra fundamental, Mauá fez um carrinho de pedreiro, um carrinho de mão, de jacarandá, uma madeira especial. Atentai bem para o que Cristovam Buarque disse aqui: não libertamos o operário, que ainda está como escravo. Naquele tempo só quem trabalhava era o escravo e ele, o brasileiro Mauá, teve um gesto: convidou Pedro II para carregar as primeiras pedras. E isso foi tido, vamos dizer, como uma ofensa, porque era assim como entendíamos o trabalho: o trabalho era considerado uma vergonha. Hoje devemos inspirar-nos em Rui Barbosa, que disse: “Deve-se dar primazia ao trabalho e ao trabalhador”, que amanhã comemora o seu dia e que hoje homenageamos.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Sr. Presidente, devo terminar o meu discurso. Todos nós sabemos que não comandamos os nossos pronunciamentos nesta Casa. Às vezes, eles tomam um rumo que não desejamos ou, pelo menos, não traçamos. Não vou pedir para esquecer o que disse nem o sentido do meu discurso, mas vou pedir para esquecermos as homenagens que transformaram esta comunicação, que desviou-se um pouco para a minha pessoa.

Isso se deve à generosidade, ao coração grandioso dos nossos Senadores que aqui estão, sempre generosos no julgamento dos seus Colegas. Portanto, quero agradecer ao Senador Mão Santa pela generosidade com que se juntou às outras generosidades nas referências à minha pessoa, interligando-me ao problema das ferrovias no Brasil. Ele, que é da cidade de Parnaíba, cidade essa que tem uma importância grande na minha vida, porque comecei como candidato a Deputado Federal, na década de 50, indo a Parnaíba, atravessando o rio Parnaíba em canoas de remo, rompendo aquelas madrugadas. Verifiquei um fato: os rios também têm sentimentos, os rios também têm vontades. Eles são como as pessoas. E descobri que o rio Parnaíba, que divide o Maranhão com o Piauí, gosta mais do Piauí, porque, no momento em que ele se aproxima do mar, enrosca-se nas terras piauienses. Vai lá. Dá um abraço. E depois volta para desembocar naquele delta extraordinário que é o delta do rio Parnaíba. Eu aprendi isso naquelas viagens longas, de noites inteiras, deitado nas canoas, em bagaço de cana, para que as costas da gente não ficassem só na madeira, em busca do início da carreira política que me trouxe até hoje aqui. Portanto, a cidade da Parnaíba está sempre na minha lembrança, no meu coração e V. Exª sabe bem disso, porque tantas vezes esteve comigo na cidade de Parnaíba.

Bem, Sr. Senadores, eu vim aqui para homenagear e não para ser homenageado. Eu vim aqui para dizer que o passado é importante, que a lembrança do passado é sempre muito importante, porque quem não olha para o passado não tem olhos para ver o futuro.

Eu já disse algumas vezes e devo repetir, então, no final do meu discurso. Devemos nos lembrar de Mauá, de Pedro II, naquele momento, porque o Brasil vai continuar e nós temos que recordar esse caminho. E quero repetir que uma Nação não se faz senão com três coisas: com os historiadores, com os políticos e com os poetas; os historiadores para pensarem no passado; os políticos para tratarem do presente; e os poetas, sem dúvida, para sonharem com o futuro.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB - TO) - Sr. Presidente José Sarney, esta Presidência desejaria apenas complementar tudo que disseram aqueles que o apartearam. O pronunciamento de V. Exª é sempre importante para esta Casa e para o País. Este é um problema de V. Exª: um discurso em que V. Exª iria fazer uma homenagem acaba se transformando numa grande homenagem a V. Exª. Eu destacaria que, dentre todo o legado que deixou V. Exª na Presidência da República, dentre eles houve a convocação da Assembléia Nacional Constituinte que ensejou ao País, dentre tantas conquistas, o nascimento do nosso querido Tocantins.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/2004 - Página 12116