Discurso durante a 52ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Condenação do gesto do Sr. Larry Rhoter, articulista do jornal The New York Times, que ironicamente atribuiu ao Presidente Luis Inácio Lula da Silva o consumo excessivo de bebida alcoólica. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Condenação do gesto do Sr. Larry Rhoter, articulista do jornal The New York Times, que ironicamente atribuiu ao Presidente Luis Inácio Lula da Silva o consumo excessivo de bebida alcoólica. (como Líder)
Aparteantes
Cristovam Buarque, Edison Lobão, Geraldo Mesquita Júnior, Pedro Simon, Roberto Saturnino, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2004 - Página 13338
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REPUDIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, THE NEW YORK TIMES, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), OFENSA, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA, ELOGIO, HISTORIA, DEFESA, DIGNIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • SUGESTÃO, GOVERNO FEDERAL, EXIGENCIA, RETRATAÇÃO, JORNAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • CRITICA, IMPERIALISMO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o jornalista Larry Rhoter*, do jornal The New York Times, resvalou, sem dúvida alguma, para a grosseria em relação ao Presidente da República do Brasil.

Há pouco, dizia ao Senador Pedro Simon que, quando a coisa passa pelo meu crivo ético, ela desce pela minha goela; quando ela não passa pelo meu crivo ético, ela não desce pela minha goela. É assim que sou. Ou seja, não daria para compactuar com isso, não daria para tirar proveito político disso. Ao contrário. Disponho-me a fazer, aqui, uma análise breve, porém objetiva, da questão.

Conheço o Presidente Lula há muitos anos, e nunca vi em Sua Excelência nada que cheirasse a descontrole nesse campo do comportamento. Em sua passagem pela vida sindical, o Presidente Lula acertou e errou muito. É figura marcante da vida política brasileira. Entretanto, não se pode dizer que nenhuma das suas derrotas tenha sido causada por qualquer coisa ligada a excesso etílico.

O seu Governo padece de enormes males. A meu ver, o seu Governo não está atuando de maneira efetiva. O seu Governo não é operacional. O seu Governo é equivocado no microeconômico. O seu Governo não sabe atrair investidores, ele os afugenta. O seu Governo pratica uma política externa que nem sempre pisa o terreno duro da realidade. Tudo isso é fato. Mas o Presidente Lula tem que ser olhado nesse conjunto e não na sua individualidade.

Imaginar que os males brasileiros sejam culpa do Presidente Lula e não também dos seus Ministros seria desonesto intelectualmente. Imaginar que os seus Ministros, nos seus erros, não sejam culpa do Presidente Lula seria também cometer um gesto de desonestidade intelectual. Ou seja, o Presidente Lula erra porque não demite Ministros, que não são competentes; Sua Excelência erra, porque não aciona a máquina; Sua Excelência erra, porque não faz o melhor para maximizar esses quatro anos que Sua Excelência passará governando este País.

Mas, o Sr. Larry Rhoter, correspondente do The New York Times, foi para o campo da grosseria. Ele fez um artigo, que - a meu ver - é ofensivo à dignidade do País. É ofensivo ao Presidente da República. É ofensivo ao Brasil. Não foi construtivo, e, por isso, merece, aqui, a minha repulsa.

O Governo Lula, às vezes, é desastrado. A reação do Palácio do Planalto foi completamente fora de esquadro. Saiu para um bate-boca com o Sr. Larry Rhoter: “Bebe; não bebe”. Não é por aí. O Governo brasileiro deveria ter, pura e simplesmente, acionado o Embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdenur, para que S. Exª tomasse as duas providências cabíveis: pedir ao jornal que se retratasse, por intermédio da coluna do Sr. Larry Rhoter. Não atendido, o Governo brasileiro tomaria a segunda atitude: processar o jornal e o comentarista. E mais nada. É preciso o Presidente Lula aprender a preservar a majestade do cargo. É preciso aprender a preservar a dignidade formal do cargo, aquilo que o Presidente José Sarney chama de liturgia do cargo. Investido como está na primeira Magistratura da Nação, o Presidente tem que ser cuidadoso com qualquer palavra, qualquer gesto, tem que lutar muito para recuperar toda essa credibilidade arranhada.

Qual é o principal problema do Presidente, Senador Mão Santa? A meu ver, é o descompasso entre o muito que prometeu e o pouco que está conseguindo realizar. Esse é o fato objetivo. E é por aí que trabalho a minha discordância em relação a Sua Excelência; é por aí que trabalho a minha crítica e a do meu Partido em relação à Sua Excelência. Não! O Presidente sabe que não haverá de nossa parte, jamais, o menor recurso à baixaria. Não haverá de nossa parte, jamais, o menor resvalo para o ataque pessoal. Não haverá de nossa parte, jamais, o menor achincalhe à autoridade do Presidente. Ao contrário. Condeno o Presidente por haver deixado, em várias ocasiões, sua autoridade ser arranhada. Isso eu condeno. Não contribuirei para, eu próprio, ajudar a arranhar a autoridade do Presidente da República. Portanto, que as vozes deste Congresso se levantem de maneira unânime para condenar a atitude do The New York Times e, sobretudo, a atitude infeliz do seu jornalista Larry Rhoter.

Senadora Ideli Salvatti, se eu fosse resvalar para a grosseria - eu não faria isso -, poderia, apressadamente - e eu não seria apressado -, dizer que a política externa americana dá a impressão de estar bêbada, pois a política externa americana consegue, em 40 anos, fazer dois vietnãs: um no pântano, e um outro no deserto. Eu não faria isso. Ao contrário. Muitas vezes, condeno o Presidente pela forma apressada com que dialoga com os Estados Unidos. Condeno o Presidente pela forma - a meu ver - inadequada com que trata a questão da Alca, que é necessária ao País. O Brasil precisa entrar na Alca pela porta da frente. Eu não poderia, portanto, aqui, incitar qualquer reação que fosse de cunho mais psicológico, mais pessoal em relação aos Estados Unidos. Não! Não cultivo o anti-americanismo. Não sou anti-americano. Sempre digo que minha fase de quebrar vidro de embaixada e de consulado americano já passou. Já fiz muito isso, mas passou. Trata-se de um país como os outros, com a agravante de ser um país extremamente importante, a maior potência econômica do mundo, uma potência militar incontrastável no mundo, se se trata de guerra aberta. Portanto, é preciso sofisticação ao lidar com os Estados Unidos. Esse é o fato. As críticas que fazemos ao Presidente não perderão, um só minuto, a cor, nem o viço, nem o peso. No entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero dizer que, por um lado, é preciso haver, no Brasil, alguns objetivos nacionais que sejam definidos por todos nós. Por exemplo, a questão da paz: um objetivo de todos nós. Nessa hora, não há Oposição nem Governo. Todos temos de nos perfilar e lutar pela paz, mantendo o Brasil na posição de potência intermediária que é, contudo pacifista o tempo inteiro. Quando o Presidente é atacado desse jeito, teríamos duas atitudes a tomar. Uma mesquinha, pequena, menor, de aprofundarmos o desgaste do Presidente, endossando uma peça leviana do Sr. Larry Rhoter. Não seria esse o papel da Oposição brasileira, o de nos perfilarmos em uma crítica menor e darmos ênfase a uma crítica pequena. Portanto, receba o Presidente Lula, neste episódio em que foi agredido, a solidariedade do PSDB.

Ouço o nobre Senador Pedro Simon.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Felicito V. Exª pelo pronunciamento que faz da tribuna, pela sua manifestação. Creio ser um gesto da maior elegância e também de grande patriotismo. Afinal, nós todos, Governo e Oposição, torcemos para que o Brasil vá bem e todos temos respeito pelas autoridades brasileiras. Lula é uma pessoa que, na minha opinião, tem milhares de qualidades e alguns equívocos, mas esse não é um deles. Até hoje, como líder sindical, nas reuniões e nas festas de trabalhadores, como Deputado, como Presidente de Partido e como Presidente da República, não se viu um fato, uma ação, uma atitude de Sua Excelência referente ao excesso de bebida. Os Estados Unidos, por sua vez, estão acostumados com fatos dessa natureza. Lá, um cidadão deixou de ser candidato a Presidente da República por ser alcoólatra; há outros que chegaram à Presidência da República e deixaram de ser alcoólatras. Mas, por causa disso, eles talvez não dêem a importância que essa questão merece. Somos diferentes, damos importância. Temos o maior carinho e o maior respeito por nosso Presidente e entendemos que essa matéria do The New York Times, em que o americano pensa que é o dono da verdade, atingiu todos nós. Atingiu o Presidente da República, a nossa sociedade e o País como um todo. Na verdade, eles soltaram penas no ar. Daqui por diante, em uma reunião aqui, em uma festa ali, em que o Presidente aparecer com um copo na mão ou tomar uma segunda dose, vão comentar “olha, bem que disseram”, e provar-se o contrário será algo quase impossível. Por isso, acho que V. Exª age muito bem e, em nosso contexto, deveríamos ir além, numa manifestação, não do Governo em si, que é o próprio Presidente, mas da sociedade brasileira e de todos nós, numa demonstração de que podemos ser Situação ou Oposição, mas temos a maior credibilidade e o maior respeito à figura do Presidente da República, porque Sua Excelência merece. Felicito V. Exª pelo gesto que realmente o credencia. V. Exª é um crítico respeitável, que sabe diferenciar o que é de se criticar e o que é de se lamentar, como está acontecendo agora. Cumprimento V. Exª.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Pedro Simon. Estou de acordo com a idéia de V. Exª de fazermos uma manifestação do Congresso, até para travarmos nossas disputas internas aqui, sabendo exatamente que cada um tem legitimidade para tomar seu partido sabendo que todos temos interesse em preservar o Brasil e que nenhum de nós tem compromisso com a leviandade. Foi exatamente um gesto de leviandade esse que se abateu sobre o Presidente Lula.

Senador Tião Viana.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Caro Senador Arthur Virgílio, cumprimento V. Exª, que é um Parlamentar que honra efetivamente cada voto que recebeu, por ser completamente coerente. V. Exª foi eleito para agir com a concepção do Governo anterior, fazendo as críticas que está fazendo ao atual Governo, não escondendo isso em momento algum de sua campanha, honrando exatamente essa função parlamentar. A manifestação que V. Exª faz da tribuna é de respeito à autoridade do parlamentar brasileiro e do valor da honestidade intelectual. E, seguramente em nome do Presidente Lula, de toda a história de sonhos e de respeito às relações humanas que Sua Excelência cultiva em sua vida, pensando em olhar para o outro, com respeito, à mesma altura, com dignidade sobretudo, temos que valorizar muito o pronunciamento de V. Exª, de solidariedade, de honestidade, de não-subserviência a uma relação com o poder instituído e, sobretudo, de um País que pode falar da mesma altura com qualquer outro país do mundo e ainda mais com um veículo de comunicação que tem tanta responsabilidade. Nessa hora, valorizo a imprensa brasileira, os grandes meios de comunicação, jornalistas se manifestando com a sociedade brasileira, à altura do respeito, entendendo que não se pode desonrar alguém, fazendo juízo de valor apenas preso a uma fonte. Foi exatamente o que o jornal The New York Times fez. Como cidadão brasileiro, estou fazendo a minha parte. Estou, além de um protesto por meio da tribuna, mandando e-mail, fax, ao editor do jornal The New York Times, mostrando a minha indignação com uma postura que julgo covarde, com a honra, com a dignidade e com a biografia, não apenas de Luiz Inácio da Lula da Silva, mas do Presidente da República, que é um símbolo da Pátria. A Pátria brasileira foi injuriada com esse tipo de atitude.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Senador Tião Viana, V. Exª, que é um amigo fraterno, sabe que, se eu agisse de forma diferente, eu perderia talvez a credencial para fazer as críticas duras que tenho que fazer ao que me parecem os descaminhos, os desvãos do Governo. Ai do Governo, ai da democracia que não tenham a tomar conta dele, Governo, e dela, democracia, a voz altiva e firme da Oposição. Por outro lado, a Oposição que, neste momento, se limitasse a aprovar um gesto que me parece de má-fé, de baixo nível, um gesto torpe, que não sei se esconde algo por trás, mas um gesto simplesmente de má-fé e mal-intencionado, esta Oposição estaria ela própria diminuindo seu papel. Seu papel é o de fazer crescer a figura da democracia brasileira, e não o de tentar ela própria crescer, descredenciando a democracia brasileira e difamando figuras.

Sempre digo que uma das aspirações que tenho é, ao fim deste mandato, o Presidente acreditar que eu termine o mandato amigo dele. Digo que não sei se ele vai ter paciência de continuar a ser meu amigo depois de tantos anos seguidos de críticas. Mas, neste momento, falo aqui muito menos como amigo dele, alguém que tem estima por ele, mas muito mais como alguém que imagina que tem deveres para com o Brasil. E o Brasil não pode, a esta altura, achar que é normal esse tipo de combate que, aliás, não é nem claro, proposto pelo Sr. Larry Rhoter, que, no fundo, escreveu para uma opinião pública de certa forma provinciana, escreveu ele próprio como provinciano, falando de maneira leve sobre um problema que ele não domina. Ou seja, há muito o que se dizer contra este País, e não vou ceder a vaga de Líder da Oposição deste País para o Sr. Larry Rhoter. Fique tranqüilo, vou continuar, eu próprio, fazendo críticas ao Presidente Lula toda vez que eu achar que ele erra e toda vez que eu achar que ele merece a crítica. Mas estarei ao lado dele e do País toda vez que eu achar que há o interesse nacional em jogo.

Concedo um aparte ao Senador Geraldo Mesquita e, após, ao Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (Bloco/PSB - AC) - Senador Arthur Virgílio, é fato que V. Exª traz um assunto que não só preocupa todos os brasileiros, a Nação brasileira, mas incomoda, inquieta e causa revolta em todos nós. V. Exª, com a autoridade de líder nomeado e líder natural que é, da altura de sua liderança, consegue discernir o combate político leal que imprime aqui nesta Casa, na defesa intransigente, como bem lembrou o nobre Senador Tião Viana, inclusive dos símbolos da nossa Pátria. A Presidência da República é um símbolo da nossa Pátria, é algo que todos devemos defender com unhas e dentes, ainda mais em se tratando de uma pessoa da grandeza do Presidente Lula, um trabalhador brasileiro. Os trabalhadores brasileiros foram ofendidos mortalmente com o artigo desse jornalista americano. Creio até que foi uma tentativa de desviar a atenção da opinião pública provinciana dos Estados Unidos do que está acontecendo naquele país e fora dele. Esse jornalista, na verdade, deveria estar ocupado em comentar os atos bárbaros, levianos, perpetrados por militares cheiradores de cocaína, que violentam, seviciam presos iraquianos. Isso só pode ser a mente deturpada de quem cheira cocaína, Senador Arthur Virgílio. Creio que a tentativa de despistar a opinião pública em relação ao assunto levou-o a enveredar-se por um campo que desconhece, como bem lembrou V. Exª, proferindo ofensas ao Presidente da República do nosso País. Ora, assunto não lhe falta para que comente as próprias mazelas, impostas por ocupantes invasores de países outros. Então, essa situação nos causa muita preocupação. Como o Senador Tião Viana, devemos todos nós, com firmeza, rebater essa ofensa, essa injúria ao nosso Presidente da República. E devemos nos perfilar a Sua Excelência para não permitir, de maneira alguma, que uma ofensa como essa se banalize em nosso País. Essa calúnia é muito grave, e receio que se torne um comentário tido como normal. Não se trata de um comentário normal, mas leviano. Esse jornalista não tem conhecimento do que se passa em nosso País. Não conhece nem a postura, nem a atividade do nosso amigo, querido e fraterno companheiro Presidente Lula. Então, parabenizo V. Exª por tocar nesse assunto que nos comove, que nos causa muita tristeza. Não quero generalizar, fazer um julgamento sobre a imprensa americana. Não se trata da imprensa americana, mas de um jornalista em especial, que cometeu, talvez, a maior sandice de sua vida, ao ofender o dignitário de uma nação amiga, como o Brasil, em face dos Estados Unidos. Muito obrigado.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Senador Geraldo Mesquita, V. Exª lembrou a foto da menina-soldado Lynndie, praticando sevícias nos soldados. De fato, isso envergonha os democratas americanos, que constituem a grande maioria naquele País, assim como a opinião pública mundial e nos mostra que há coisas muito mais sérias para serem tratadas pela imprensa daquele país. É claro que não estou aqui para pautar a imprensa americana.

Juntamente com V. Exª, que é um dos mais altivos Senadores, pontuo que também a Oposição afirma que a questão não é de Governo ou Oposição. Precisamos cuidar de nossas questões internamente. Aqui vamos propor as nossas CPIs, desqualificar alguns temas e qualificar outros. No entanto, vamos resolver os nossos problemas de acordo com o que seja o consenso ou o dissenso brasileiros. Não precisamos, de jeito algum, de opiniões apressadas de fora para dentro, mas não se trata de xenofobia. Trata-se de respeitarmos a dignidade nacional.

V. Exª fez um aparte que incorporo, com muito prazer, ao meu discurso.

Concedo um aparte aos Senadores Roberto Saturnino e Cristovam Buarque.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Arthur Virgílio, como os nobres colegas, cumprimento V. Exª pela categoria do discurso que pronuncia hoje, pela altivez com que traz as questões. Vou emitir um juízo, uma opinião. Não acredito em leviandade do The New York Times, em incompetência do jornalista, em desconhecimento. The New York Times é um jornal muito competente e rigoroso na escolha de seus profissionais e alcançou prestígio mundial exatamente pela qualidade de seu profissionalismo. Não acredito que essa notícia não tenha tido um propósito, o de atingir a imagem do Presidente do Brasil, que vai ganhando certo destaque nos fóruns internacionais, passando a incomodar o grande capital norte-americano, o patrão do The New York Times, digamos assim. Trata-se de um jornal muito bem-feito, para cometer uma leviandade dessa dimensão. Penso que uma matéria dessa substância, dessa densidade nunca sairia sem passar pelo crivo da redação, da diretoria. Isso me preocupa. Respeito a opinião de V. Exª e, se não estou equivocado, entendi que considerava mais adequado, antes de processar, tentar a via do protesto; essa seria a via convencional. Confesso que não tenho o conhecimento de V. Exª nessa área de política internacional, de diplomacia; não vou discutir, porque talvez V. Exª tenha razão. Compreendo a atitude do Presidente, do Palácio, de entrar com um processo direto, exatamente para contrapor-se a uma atitude que foi, além de insólita, propositada -- creio eu. Custa-me crer que tenha sido algo impensado, a que se seguiriam o protesto e o desmentido -- algo natural na relação entre Governo e jornalistas. Tendo a acreditar que houve um propósito e que a ação correta é entrar logo com um processo, e não ficar no diálogo. Cumprimento V. Exª pela atitude, pela iniciativa de abordar esse assunto; respeito a opinião de V. Exª, muito mais competente do que eu para discuti-lo. Apenas estou emitindo minha opinião.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Roberto Saturnino. Agradeço a V. Exª o fraterno aparte. De fato, a minha idéia seria a de que o Governo brasileiro, por meio do Embaixador Roberto Abdenur*, interpelasse o jornal e o jornalista, podendo disso derivar-se um processo. Ficar sem resposta não me parece o mais justo. É claro que, daqui para frente, a todos nós impõe um cuidado muito maior. Gostaria de encerrar, concedendo um aparte ao Senador Cristovam Buarque, mas vejo que o Presidente Lula terá que tomar um enorme cuidado daqui para frente, até para preservar os seus ganhos no contato com a política internacional. Cada palavra tem que ser medida, cada passo tem que ser estudado, cada atitude tem que ser do Brasil, quando se tratar de política externa. Só abro espaço para a possibilidade de ser uma leviandade, porque os Estados Unidos são um império, e nos assustamos, quando sabemos que aquele país, de 280 milhões de habitantes, conta com apenas 10 milhões de cidadãos norte-americanos com passaporte, Presidente Eduardo Siqueira Campos. Desses 10 milhões, metade viaja apenas a prazer - geralmente pessoas de mais idade -, e a outra, a negócio e a lazer. A metade que viaja a negócio vai para qualquer lugar, e a que viaja a prazer esgota primeiro todo o circuito americano; vai ao Alaska, ao Havaí, a todos os Estados americanos no norte, sul, leste e oeste, a Rock Montains. Então, começa a viajar para outros lugares. A preferência é o México, ali do lado - os cidadãos dos países do Nafta não precisam de passaporte. Vai a Londres, que é a matriz, e a Paris, que em algum momento da vida todos têm curiosidade em conhecer. Prefere as Bahamas, aquelas ilhas do Caribe. Para o Brasil tem vindo muito turista sexual, que gasta de US$80.00 a US$100.00 por dia, apenas, trazendo para nós todo um opróbrio. Temos de ter muito cuidado com isso; temos de melhorar o perfil do turista que nos procura.

Mas o fato é que aquele país, que não deixa de ser um império, age como o Império Romano. Quando Roma queria um quadro, mandava buscar; quando os Estados Unidos querem um cantor brasileiro, mandam contratar, para se apresentar no baiarro doVillage, em Nova York. Quando querem um atleta, mandam buscar; quando Roma queria um campeão para entrar em choque com leões ou outros campeões na arena do Coliseu, mandava buscar, e ele vinha quase como um escravo.

Ou seja, os impérios se bastam a si próprios. E, com isso, tendem a fechar-se no próprio modelo que os encerra e a achar que, bastando a si próprios, podem dar as costas para a realidade do mundo à volta deles. Então, acontecem disparates como esse, que, a meu ver, conseguiu, mais do que a sessão de hoje, que o Brasil terminasse unindo-se em torno do respeito à dignidade da figura do Presidente da República.

Portanto, o Brasil hoje sai mais forte ou menos fraco; mais fortalecido ou menos enfraquecido. Isso depende do otimista ou do pessimista que esteja vendo o quadro, do que estava na sexta-feira passada.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque, Sr. Presidente, e agradeço a V. Exª pela tolerância. Na verdade, somente o tema justificava tanta paciência e até tanta transgressão. Reconheço que estamos aqui, em conjunto, todos transgredindo o Regimento Interno, em função do tema que, a meu ver, pelo insólito, pelo rude e pelo injusto, a todos nos mobiliza para trocarmos o antagonismo Governo-Oposição, no dia de hoje, pela repulsa, Senador Roberto Saturnino, a um gesto infeliz de um jornalista e pelo abrigo que, de maneira não menos infeliz, deu a esse artigo o jornal The New York Times.

Concedo o aparte ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senador Arthur Virgílio, não vou dizer que há males que vêm para bem, porque o mal é o mal e esse episódio, de fato, é maléfico para o Brasil, para a nossa imagem, sobretudo para a figura do Presidente Lula que, hoje, todos sabem, é um dos mais importantes líderes em escala planetária. Entretanto, nesse fato há alguns aspectos sobre os quais vale a pena refletirmos, uma vez que trazem luz. O primeiro é o reconhecimento da maturidade da democracia brasileira, em que vem aqui o Líder da Oposição fazer um discurso em defesa da figura do Presidente da República. Isso mostra uma maturidade da democracia brasileira, que põe o Presidente não apenas como Chefe de Governo a ser criticado, mas também como Chefe de Estado, nosso representante a ser preservado. E uma maturidade da Oposição, que tem que ser crítica, sim, porque Oposição que não for crítica não é oposição, é agregada. E a Oposição hoje no Senado, percebe-se, não é agregada do Governo, é oposição. Triste do governo que não tenha oposição. Felizmente, o meu Governo tem uma Oposição dura, mas que é capaz de gestos leais como o de V. Exª neste momento em defesa da figura do Presidente. O segundo é lembrar que talvez estejamos tendo um tipo de comportamento que também aconteceu no governo passado e na história do Brasil: supervalorizamos tudo que lá fora se fala do que fazemos aqui dentro. Mais uma vez, uma matéria que, como se diz por aí, “deu no The New York Times” vira fato nacional dessa envergadura. É verdade que se trata de fato importante, mas, se estivéssemos mais voltados para dentro, menos preocupados inclusive com formas de relações públicas externas, teríamos abalos muito menores com notícias de jornal. Certamente, sempre ficam resquícios, mas seriam menores as repercussões se estivéssemos fazendo um trabalho forte de mudar o Brasil. Não podemos continuar prisioneiros do exterior. Temos que começar a fazer gestos concretos para que o Brasil encontre seu caminho e seja capaz de enfrentar notícias como essa, dando não o desprezo mas o devido tamanho, que é o tamanho de uma matéria de jornal.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sem dúvida, Senador.

Encerro, Sr. Presidente, dizendo que, de fato, se o Governo vai bem, a notícia é melhor assimilada potencialmente por todos nós. Se o Governo enfrenta as dificuldades que a realidade registra, evidentemente qualquer coisa hiperboliza o suposto infortúnio. De outra parte, Senador Cristovam Buarque, quando V. Exª se refere ao fato de que é preciso uma Oposição forte e é bom se ter uma Oposição madura, digo que a forma mais dura e mais mesquinha de se fazer oposição a um Governo é silenciando. Todo Governo que encontra como resposta da Oposição o silêncio, termina abrigando prevaricadores no seu interior, ele termina incorporando vícios quanto à ética, ele termina cometendo equívocos enormes. O Governo que, ao contrário, conte como uma oposição vigilante passa a ter a preocupação de não deixar errar, passa a ter uma preocupação de acertar. Portanto, o nosso dever é de não fazer a pior oposição, que seria a do silêncio; a melhor oposição é precisamente a da crítica contundente toda a vez que se ofereça um motivo para fazê-la.

Hoje, aqui, me parece que temos uma razão muito forte para cuidarmos de preservar certos interesses permanentes e gerais do Brasil, no caso preservar a figura não a do Presidente Lula mas a figura da Presidência da República brasileira, que não pode e não deve ser atingida da maneira como o foi.

Se o Presidente me permitir, concederei o aparte ao Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - É do temperamento de V. Exª, da sua personalidade e do seu caráter, gestos de grandeza desta natureza.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Creio que todos devemos repudiar este papel feio de um dos maiores jornais do mundo, um jornal respeitado por toda humanidade. Mas, quando ele atinge ou pensa atingir a figura do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, de fato ele está atingindo a Nação brasileira, e não podemos aceitar isso. A figura da Presidência há de ser preservada - já se disse aqui - como símbolo; a presidência é um ícone da Nação brasileira. Trago a minha palavra de oposicionista também em solidariedade ao Presidente da República. Sempre que atitudes feias como essa de um jornal do exterior ocorrerem, V. Exª estará aqui, na tribuna, como está hoje, e eu estarei solidário com V. Exª. Muito obrigado.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente, desta vez, encerro mesmo. Agradeço ao Senador Lobão. V. Exª me lembra um encontro que tivemos com o Presidente Lula, na casa do Presidente Sarney, no início da legislatura, ou seja, no começo do ano passado. Conversando comigo - e conversou comigo bastante demoradamente -, o Presidente me disse, referindo-se à transição de Governo para Governo, bonita, pacífica e construtiva que houve, e S. Exª me disse “Arthur, você pode pegar no meu pé, mas ao longo do tempo, eu vou ter a oportunidade de fazer gestos na direção de vocês. Eu sou homem de gestos. Eu sei que você vai fazer gestos na minha direção”.

Ou seja, o Presidente não estava errado. Agiu e falou com sabedoria naquele momento, porque não poderia mesmo desconfiar que daqui não saíssem gestos em sua direção. Não o gesto da adesão, da disputa interesseira, da bajulação, da sofreguidão palaciana, mas o gesto da Oposição que não se furtará a servir ao País. Portanto, eu queria que Sua Excelência entendesse que, voltando alguns meses no tempo, estou exatamente na casa do Presidente Sarney, conversando com o Presidente Lula, dizendo: Presidente Lula, eu não teria como não fazer o gesto hoje; eu teria de fazer o gesto, sim, hoje. Sei que Vossa Excelência tem que fazer muitos gestos pelo País. O que de melhor eu espero que Vossa Excelência faça é governar o Brasil de maneira adequada, competente e para resolver problemas e criar soluções para os dramas brasileiros.

De nossa parte, Vossa Excelência saberá que, no dia a dia, trocaremos todas as balas. Da cintura para cima, sempre, com muita lealdade, de frente, e com muita altivez. Por outro lado, nos momentos em que o Brasil exigir da Oposição que se manifeste a favor do País, ela não hesitará, nas votações, no discurso e, como Sua Excelência me disse naquele dia - gosto muito da palavra gesto, por isso repito a palavra de Sua Excelência -, também no gesto. Espero que a atitude seja entendida como um gesto da Oposição não em favor de fulano ou de beltrano, sequer em favor do Presidente da República como pessoa física, mas a favor da figura jurídica do Presidente da República, a favor do Brasil, que não pode ser achincalhado por quem quer que seja.

Para um País que tem interesses que se espraiarão pelo tempo, a alternância de poder é um fato para a sociedade brasileira amadurecida pela democracia e para a democracia, consolidada pelo amadurecimento da sociedade brasileira. Daqui para a frente, cada vez mais, teremos absoluta convicção de que não podemos contar com elites políticas às quais faltem os gestos, que devem ser esboçados toda vez que a Nação brasileira seja atingida.

Muito obrigado.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2004 - Página 13338