Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Elogios à decisão do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Sr. Peçanha Martins, de acolher habeas corpus apresentado por S.Exa. em favor do jornalista norte-americano Larry Rohter. (como Líder)

Autor
Sérgio Cabral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RJ)
Nome completo: Sérgio de Oliveira Cabral Santos Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DEMOCRATICO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Elogios à decisão do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Sr. Peçanha Martins, de acolher habeas corpus apresentado por S.Exa. em favor do jornalista norte-americano Larry Rohter. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 14/05/2004 - Página 14152
Assunto
Outros > ESTADO DEMOCRATICO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, DECISÃO JUDICIAL, MINISTRO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), SAUDAÇÃO, VALORIZAÇÃO, ESTADO DE DIREITO, INDEPENDENCIA, PODERES CONSTITUCIONAIS, LIBERDADE DE IMPRENSA, CONCESSÃO, HABEAS CORPUS, FAVORECIMENTO, JORNALISTA, AUTOR, ACUSAÇÃO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OFENSA, HONRA, SUSPENSÃO, ATO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), CANCELAMENTO, VISTO PERMANENTE, ESTRANGEIRO, ATENDIMENTO, REQUERIMENTO, ORADOR.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, PETIÇÃO, ORADOR, DECISÃO, MINISTRO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ).

O SR. SÉRGIO CABRAL (PMDB - RJ. Pela Liderança do PMDB. Sem revisão do orador.) - Senador Eduardo Siqueira Campos, companheiro de geração, Presidente em exercício desta sessão, Srªs e Srs. Senadores, expresso meu agradecimento ao Senador Antonio Carlos Magalhães e ao Senador Eduardo Azeredo, que permitiram a troca de posição, para que eu pudesse falar neste momento. Agradeço também ao Senador Luiz Otávio, meu Vice-Líder, que me deu a possibilidade de usar o tempo pelo PMDB.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que estamos diante de um dia histórico, um dia em que se reafirma o Estado democrático de direito neste País, um dia em que se reafirma a Constituição brasileira, um dia em que se reafirma a independência dos Poderes.Tudo isso está contido na decisão que trago a V. Exªs, da lavra do Ministro Francisco Peçanha Martins, do Superior Tribunal de Justiça. Eis a decisão:

Trata-se de habeas corpus requerido pelo Senador Sérgio Cabral em favor de Willian Larry Rohter Junior contra ato do Ministro interino da Justiça, que cancelou o visto do paciente, repórter do jornal The New York Times, por haver publicado matéria jornalística, noticiando que o Presidente da República faria uso de bebida alcoólica.

Reproduzo o texto da nota do Ministro, publicada pelo jornal O Globo, de hoje, dia 12.5.2004, transcrita às fls. 3 dos autos.

Neste ponto, está a transcrição daquela decisão lamentável do Ministério da Justiça suspendendo o visto do jornalista.

Prossigo a leitura:

Funda-se o Requerente no art. 5º, incisos IV, IX e LII, da Constituição brasileira, pedindo seja concedida ordem liminar de habeas corpus para suspender os efeitos do ato violador da liberdade de locomoção no Brasil, a fim de fazer cessar o constrangimento ilegal praticado pela autoridade coatora, requerendo, afinal, a concessão da ordem em definitivo, após o trâmite legal.

É o relatório.

Senador Jefferson Péres, creio que o Ministro consagra uma peça histórica em defesa da democracia brasileira.

O Brasil é um Estado Democrático de Direito, e o Presidente da República contribuiu com intensa participação política para a instauração da democracia plena no País e se conduz com honra e dignidade.

A imprensa é um dos pilares fundamentais da democracia e “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”, nos precisos termos do art. 5º, inciso IX, da Constituição.

“A imprensa”, disse Rui Barbosa, “é a vista da nação”, e “o jornalista, as mais das vezes, é isto: um refletor da luz que vem do público, dos sentimentos populares do meio que o cerca” (“in” Laudelino Freire, Ruy, pág. 38, Ed. Casa de R.B, 1958, e Obras Completas, vol. XXIX, tomo V, pág. 186, respectivamente).

O fato é que o paciente, jornalista estrangeiro, teve cancelado o visto de permanência no País, por ter assinado reportagem dita leviana, mentirosa e ofensiva à honra do Presidente da República Federativa do Brasil, publicada no The New York Times.

Poderia o Ministro da Justiça fazê-lo?

O ato de concessão ou revogação de visto de permanência no país de estrangeiro, em tese, está subordinado aos interesses nacionais (art. 3º da Lei nº 6.815/80). O visto é ato de soberania. Pergunto-me, porém, se uma vez concedido poderá ser revogado pelo fato de o estrangeiro ter exercido um direito assegurado pela Constituição, qual o de externar a sua opinião no exercício de atividade jornalística, livre de quaisquer peias? Estaria tal ato administrativo a salvo do exame pelo Judiciário?

Nesse caso penso que não. É que no Estado Democrático de Direito não se pode submeter a liberdade às razões de conveniência ou oportunidade da Administração. E aos estrangeiros, como aos brasileiros, a Constituição assegura direitos e garantias fundamentais descritos no art. 5º e seus incisos, dentre eles avultando a liberdade de expressão. E dúvidas não podem haver quanto ao direito de livre manifestação do pensamento (inciso IV) e da liberdade de expressão da atividade de comunicação, “independentemente de censura ou licença” (inciso IX).

Mas dos autos só constam alegações e notícias publicadas em jornais. Não acompanha a inicial a reprodução do ato administrativo, e entendo necessário conhecer as razões que o determinaram.

Urge, porém, assegurar ao paciente, cujo pleito vejo revestido da fumaça de bom direito, a plena eficácia das garantias constitucionais, pelo que lhe defiro salvo-conduto até a decisão do feito, nos termos do art. 201, IV, do RISTJ.

Oficie-se ao Exmº Sr. Ministro de Estado da Justiça, comunicando a decisão e requisitando informações no prazo de 72 (setenta e duas) horas.

Publique-se e intime-se.

Brasília (DF), 13 de maio de 2004.

Ministro Francisco Peçanha Martins

Relator

Foi proferida em treze de maio, data tão significativa para o Brasil, a decisão do Ministro Francisco Peçanha Martins, baiano, como lembra o grande baiano Senador Antonio Carlos Magalhães. Em seu relatório, o Ministro cita outro baiano, Rui Barbosa, que, não por acaso, é o Decano desta Casa, o homem que mais tempo permaneceu no Senado Federal - foram quase quarenta anos.

Sr. Presidente, peço a V. Exª que seja transcrita nos Anais não só a minha modesta petição, como também a decisão do Ministro Francisco Peçanha Martins.

Agradeço aos Srs. Senadores o apoio. Agradeço também ao Ministro Francisco Peçanha Martins.

Estamos conquistando um gol para a democracia, mostrando ao mundo que a democracia no Brasil é para valer, que os Poderes no Brasil são independentes, que a Constituição brasileira é para ser respeitada. Apesar de alguns Parlamentares, na ocasião, terem se negado a assiná-la, a Constituição é para ser respeitada por todos, e a liberdade de expressão é um bem fundamental. Hoje, assistimos no mundo a um verdadeiro açougue por conta da falta de liberdade de expressão. Estamos assistindo a um morticínio, a uma violência, onde falta liberdade de expressão.

O Brasil - hoje é 13 de maio, vale lembrar - conquistou a sua liberdade, a sua emancipação republicana em 1889, permitiu que a mulher votasse apenas em 1946 para Presidente da República. Foi a primeira vez que a mulher votou.

Em 1964, houve o golpe militar e só voltamos a votar para Presidente em 1989. O Brasil carece de democracia. O dia 13 de maio de 2004 é um dia histórico para todos nós.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Parabéns!

O SR. SÉRGIO CABRAL (PMDB - RJ) - Obrigado, Senador. Eu agi não como Senador de situação ou de Oposição, nessa pequenez do jogo conjuntural dos partidos políticos que apóiam ou fazem oposição ao Governo. Eu agi como cidadão, como jornalista, como Senador que acredita que a democracia é um bem que temos que assegurar permanentemente no Brasil.

Agradeço aos Senadores Antonio Carlos Magalhães e Eduardo Azeredo por possibilitarem que eu antecipasse a minha fala. Agradeço ao STJ, que restabeleceu o Estado de direito democrático no Brasil. O Presidente da República, se ofendido pela matéria, tem o caminho da Justiça para processar o jornalista e o jornal, porque é assim no jogo democrático. Expulsar o jornalista seria um ato vergonhoso para o Brasil, que nos deixaria em uma situação muito ruim perante a opinião pública internacional e geraria constrangimento nos outros jornalistas estrangeiros que aqui no Brasil trabalham e nos nossos jornalistas também.

Por isso, quero comemorar, neste plenário, essa vitória da democracia e agradecer, mais uma vez, ao Superior Tribunal de Justiça por ter recuperado a nossa Constituição brasileira e os direitos individuais.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB - TO) - Nobre Líder Sérgio Cabral, a solicitação de V. Exª será atendida, na forma do Regimento Interno.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR SÉRGIO CABRAL EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I, § 2º, do Regimento Interno.)

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            Matéria referida: “Decisão do STJ.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/05/2004 - Página 14152