Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Saudação à decisão do Superior Tribunal de Justiça na questão da expulsão do jornalista norte-americano Larry Rohter.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DEMOCRATICO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Saudação à decisão do Superior Tribunal de Justiça na questão da expulsão do jornalista norte-americano Larry Rohter.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 14/05/2004 - Página 14359
Assunto
Outros > ESTADO DEMOCRATICO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ABOLIÇÃO, ESCRAVATURA, NECESSIDADE, LUTA, ELIMINAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • SAUDAÇÃO, DECISÃO JUDICIAL, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), HABEAS CORPUS, JORNALISTA, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, CASSAÇÃO, VISTO PERMANENTE, MOTIVO, ACUSAÇÃO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), ILEGALIDADE, CASSAÇÃO, DESRESPEITO, LIBERDADE DE IMPRENSA, HOMENAGEM, JUDICIARIO, SERGIO CABRAL, SENADOR, INICIATIVA, HABEAS CORPUS, BENEFICIO, DEMOCRACIA.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, se coube a mim a tarefa de encerrar os nossos trabalhos desta quinta-feira, quero dizer, neste 13 de maio, data consagrada à Abolição da Escravatura no Brasil, que a luta dos nossos antepassados continua hoje, mas com outro sentido. Não se trata de defender apenas a liberdade das instituições; mais do que isso, temos de lutar bravamente por essa causa. Esta Casa tem a responsabilidade de procurar eliminar, cada vez mais, as desigualdades entre os brasileiros.

Ouvi alguns Senadores, inclusive a Senadora Ana Júlia Carepa, falarem dos programas habitacionais. Entretanto, temos presenciado o aumento de favelas e de casebres de lona à beira das estradas. Pessoas buscam assentamentos, e as que estão assentadas pedem cestas básicas. Há pessoas buscando até mesmo energia elétrica na área rural e outras lutando, com dificuldade, para pagar a tarifa da energia elétrica que está cada vez mais alta. A classe média está cada vez mais sacrificada.

Senador Mão Santa, assim como eu, V. Exª permanece neste plenário até o fim dos nossos trabalhos. Sr. Presidente Senador Efraim Morais, talvez tenha de fazer este discurso amanhã, porque hoje estou falando por deferência a V. Exª, meu grande amigo, que, neste momento, preside a sessão do Senado da República. Tive a felicidade de granjear a amizade de V. Exª. Prefiro deixar o meu discurso para amanhã, e, hoje, fazer uma saudação à Justiça da minha Pátria, à Justiça brasileira, nesse imbróglio todo que se criou quando o Presidente da República teria sido atingido por um dos maiores órgãos da imprensa mundial, se não o maior. Atingiu a pessoa física do Presidente da República, que mereceu e está a merecer a solidariedade nesse particular de todo o povo brasileiro, mas Sua Excelência confundiu sua própria pessoa com a instituição Presidência da República. Aí, então, o cidadão Luiz Inácio Lula da Silva, aquele que tem razão de ficar indignado, porque filho de operários, nascido no Nordeste sofrido do nosso País, viu a sua própria família ser atingida por um jornalista americano. Mas Sua Excelência não tinha, Sr. Presidente e Srs. Senadores - e falo à Nação brasileira -, o direito de confundir, de misturar. Sua Excelência tinha que compreender que não era mais aquele homem sofrido do Nordeste e precisava ter os seus olhos voltados para a sua origem, sim. Respeito a dignidade com que procurou defender a sua família, mas o Presidente confundiu a sua pessoa com o exercício da Presidência da República.

Então, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Senador Mão Santa e Nação brasileira, nós vimos todo este imbróglio: a prática de um ato positivamente ilegal. Ilegal porque o Ministério da Justiça não podia deportar já que o jornalista era casado com uma brasileira; não podia expulsar porque o processo de expulsão requer um processo administrativo com amplo direito de defesa. Se não vivêssemos em uma democracia, estaríamos vivendo, hoje, talvez, um dos nossos maiores dramas. Mas, felizmente, vivemos em uma democracia. E, para sorte nossa, o Poder Judiciário se manifestou e salvou o País.

O Poder Judiciário integra e governa o Brasil, sim. Há de se entender o Governo do País pelos três Poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, cada um cumprindo a sua missão.

Deixo, então, a minha homenagem ao Poder Judiciário, que foi motivado por um Companheiro nosso, a merecer o nosso abraço e a nossa saudação, o Senador Sérgio Cabral. A iniciativa do nosso companheiro pelo Rio de Janeiro, de levar o assunto para que o Poder Judiciário se manifestasse, encontrou no Ministro Peçanha alguém que, imediatamente, pôs fim à querela, pelo menos em uma liminar, estando o assunto praticamente encerrado aos olhos do mundo, que poderá dizer que o Brasil respeita a imprensa livre; que a imprensa é o olho desta Nação. Um país é visto através da sua imprensa - isso é verdade. Uma imprensa livre e democracia andam juntas, já dizia Ruy Barbosa.

Não existe democracia em um país sem a imprensa livre, nobre Senador Cristovam Buarque, que acaba de chegar ao nosso plenário. S. Exª foi o primeiro orador a se pronunciar, chamando a atenção e pedindo que o Senado se manifestasse a respeito dos problemas que afligem ainda o nosso País.

Presto, assim, a minha homenagem a Sérgio Cabral e ao Poder Judiciário, dizendo que devíamos dar este assunto inteiramente por encerrado, porque se cumpriram os destinos de uma democracia que quer ser forte, como é a brasileira.

Lamentavelmente, o Ministério da Justiça, volto a afirmar, praticou juridicamente um ato que não podia praticar. Não podia deportar, porque o jornalista americano é casado com uma brasileira, não podia expulsar porque não havia processo administrativo. Assim, não restou outra alternativa ao Poder Judiciário senão restabelecer a verdade dos fatos e demonstrar que, neste País, a imprensa é livre.

No mais, o que desejo lamentar deste episódio, Senador Cristovam Buarque, é que a imprensa brasileira já vinha comentando o fato e nenhuma providência foi tomada. Por quê? Porque a imprensa é livre e tem o direito de comentar e cada qual tem o direito de se defender. Essa que é a verdade mais cristalina e mais verdadeira.

Assim, Sr. Presidente, encerro as minhas palavras de congratulações, não sem antes conceder um aparte ao Senador Mão Santa que o solicitou e, a seguir, ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Ramez Tebet, estamos ouvindo atentamente seu pronunciamento, como todo o País. V. Exª simboliza também a Justiça. Os melhores anos de sua mocidade foram dedicados ao saber jurídico e, agora, V. Exª enriquece esta Casa. Mas gostaria de dar um ensinamento àquele que nós elegemos, ao Lula humilde. Aprendi, na literatura, que um rei, antes de assumir, pediu conselhos aos sábios que o rodeavam: se era mais importante ter coragem, ser um homem corajoso, valente, ou ser um homem justo. Os conselheiros meditaram, refletiram e voltaram ao rei: procure ser justo, porque, para se fazer justiça, tem que se ter coragem. E esse é o conselho que dou. Essa imagem foi muito oportuna, numa homenagem que a Pátria tem que fazer ao Ministro Peçanha. S. Exª tomou essa atitude, que satisfez o sábio jurista Montaigne, que disse: “A Justiça é o pão de que mais a humanidade necessita”.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Muito bem, Senador Mão Santa, recebo com alegria o aparte de V. Exª e concedo um aparte, agora, ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senador Ramez Tebet, creio que seria até mais interessante se ficássemos discutindo o dia de hoje, como V. Exª começou, mas gostaria de me pronunciar sobre este fato da expulsão do jornalista americano. Reafirmo, obviamente, que sou parte do Governo, sou do Partido que está no Governo, mas, nesse caso, disse aqui, inclusive, logo que o assunto surgiu, que cometemos erros. A opinião pública americana, o povo em geral, deve ter lido aquela matéria sem dar a menor importância. E aqueles que fazem o poder nos Estados Unidos não se informam pelo jornal The New York Times, eles sabem quantos mililitros de qualquer bebida qualquer um de nós Senadores bebemos ou o Presidente. Não importa o The New York Times - essa é a verdade. Transformamos num grande fato o que era sem importância. Disse isso aqui no primeiro dia do debate. A expulsão do jornalista foi um equívoco e creio que não é amigo do Presidente quem o ficar aplaudindo por ter feito aquilo. Acredito que o verdadeiro amigo não é o que bajula, mas é aquele que alerta.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Padre Vieira já dizia isso.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Foi um equívoco. Fico satisfeito com o fato de que a Justiça brasileira tenha permitido corrigir o erro. Foi uma derrota para o nosso Governo, mas foi uma vitória para a democracia. E, no final, é melhor que seja uma vitória da democracia do que ser uma vitória do nosso Governo. Porque, se fosse uma vitória do nosso Governo contra a democracia, não há dúvida que, daqui a dois ou três meses, outros fatos viriam, outros e outros, e um dia descobriríamos que a democracia estava de fato totalmente maculada. V. Exª tem sido um dos grandes defensores da ordem democrática, da boa relação entre os três Poderes. Creio e espero que o Presidente, simplesmente, assuma aquilo que deve ser feito, o que a Justiça mandou e deixe claro à opinião pública brasileira que Sua Excelência entendeu daquela maneira, mas a Justiça acha que é de outra e a democracia e nós todos ficamos com a Justiça. Nesse sentido parabenizo V. Exª pelo pronunciamento e admito que, hoje, foi uma derrota do nosso Governo, mas uma vitória da democracia. E isso faz os governos se engrandecerem engrandecerem, se souberem entender o recado que a opinião pública brasileira, a Justiça e o Senado deram.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - O aparte de V. Exª fecha com chave de ouro meu pronunciamento. É isso mesmo: ganhou a democracia. O Brasil deu esse exemplo hoje, por intermédio do Poder Judiciário, e concordo com V. Exª: não é amigo do Presidente quem não lhe falar a verdade, o seu verdadeiro sentimento. Acredito, por exemplo, que Sua Excelência confundiu seu papel como ser humano com o que deve desempenhar na Presidência e colocou no assunto toda a sua emoção de filho que viu o pai e a família serem atingidos, de cidadão mesmo, quando deveria compreender que é o Presidente da República do Brasil. Como V. Exª disse, o fato era corriqueiro. Não tivesse havido essa “expulsão”, esse cancelamento do visto do jornalista, o assunto não teria, positivamente, a mínima importância, como V. Exª ressaltou.

Eu devo esclarecer a V. Exª que o aparte que lhe fiz foi no sentido de aplaudi-lo e de concordar ipsis litteris com o que disse. Não pretendi demonstrar que o Senado não tinha capacidade para trabalhar, mas que há um enfraquecimento do Poder Legislativo diante do Poder Judiciário. Devemos travar, aqui, o bom combate e valem, sim, as nossas críticas, os nossos pronunciamentos e o exercício das nossas atribuições para que o Brasil possa ser um País mais justo, mais humano, com melhor qualidade de vida. Afinal de contas, se nós, que representamos os nossos Estados, não acreditamos nisso, o que estamos fazendo aqui?

Apenas quero dizer que acredito na nossa luta, apesar da inferioridade que, constitucionalmente, mesmo com o princípio da independência, harmonia e igualdade entre os Poderes, o Poder Legislativo sofre hoje, diante do gigantismo do Presidencialismo, com medidas provisórias e outras coisas mais que têm dado ao Poder Executivo uma força maior do que a nossa. No entanto, sem o Poder Legislativo não existe democracia. Sem a nossa luta, não vamos construir o Brasil que queremos.

Portanto, quero dizer que V. Exª abriu com chave de ouro essa discussão. Pena que o último orador não faça jus às suas palavras.

Sr. Presidente, pretendo, amanhã, retornar a esta tribuna para dizer o que estou sentindo a respeito do nosso querido Brasil: continuar a luta, continuar travando o bom combate dentro daquilo que penso ser melhor para o País.

Muito obrigado a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/05/2004 - Página 14359