Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Convênio firmado entre a Universidade de Brasília (UnB) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) destinado a conferir formação superior e qualificação profissional a membros das etnias indígenas do Brasil.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Convênio firmado entre a Universidade de Brasília (UnB) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) destinado a conferir formação superior e qualificação profissional a membros das etnias indígenas do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 21/05/2004 - Página 15551
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, IGUALDADE, ACESSO, DIREITOS, CIDADANIA, PRESERVAÇÃO, DIVERSIDADE, CULTURA, SOCIEDADE.
  • ELOGIO, INICIATIVA, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), CONVENIO, DESTINAÇÃO, VAGA, ENSINO SUPERIOR, ACESSO, INDIO, CONCESSÃO, BOLSA DE ESTUDO, MANUTENÇÃO, ALUNO, SEMELHANÇA, PROGRAMA, UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO (UFMT), UNIVERSIDADE ESTADUAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS).
  • ELOGIO, UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR), CRIAÇÃO, CURSO SUPERIOR, MAGISTERIO, PESQUISA, CULTURA, COMUNIDADE INDIGENA, VALORIZAÇÃO, TRADIÇÃO, PRODUÇÃO, MATERIAL ESCOLAR, MELHORIA, ATENDIMENTO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a sociedade democrática é, ou deveria ser, uma sociedade inclusiva, capaz de conceder a todos os seus membros, o gozo do conjunto de direitos que constituem o núcleo mesmo da cidadania; uma sociedade capaz de conferir a qualquer um de seus componentes a oportunidade de exercer perfeitamente sua condição de cidadão e, ao mesmo tempo, de afirmar sua diferença em relação a todas as demais pessoas que compõem aquela sociedade.

É garantindo o exercício da diferença e a preservação das múltiplas culturas que a compõem que uma sociedade se mantém plural e, por conseguinte, viva e vibrante, pois uma sociedade perfeitamente uniforme é uma sociedade moribunda, se não morta.

Como bem sabemos todos, a sociedade brasileira ainda não conseguiu garantir, de modo pleno, a todos os seus componentes o usufruto daqueles direitos básicos de cidadania, que são a base do exercício da diferença a que acima me referi.

Se é certo que logramos produzir uma pátria una - sem as profundas clivagens étnicas e religiosas que efetivamente dilaceram outros Estados -, tampouco podemos negar que não pudemos gerar uma sociedade em que diversos grupos sociais se pudessem possam libertar da marginalidade que lhes foi secularmente imposta e em que os membros das minorias pudessem romper suas amarras e atingir plenamente seu potencial como seres humanos.

Em razão disso, quero louvar, Sr. Presidente, a iniciativa conjunta da Universidade de Brasília e da Fundação Nacional do Índio (Funai), que, no dia 12 de março do corrente ano, firmaram convênio destinado a conferir formação superior e qualificação profissional a membros das etnias indígenas de nosso País.

Por meio desse convênio, a Universidade absorverá, inicialmente, um conjunto de quinze estudantes universitários, oriundos de tribos das Regiões Norte, Centro-Oeste e Sul, os quais já se encontram matriculados em instituições universitárias de caráter privado situadas na região de Brasília. A partir do próximo ano, a Universidade oferecerá aproximadamente dez vagas anuais destinadas à recepção de estudantes indígenas.

À Funai caberá efetuar a divulgação desse programa nas reservas de todo o Brasil, bem como participar, juntamente com a UnB e representantes dos índios, do processo que selecionará os candidatos e os cursos mais adequados às necessidades das comunidades indígenas. Ainda, a Funai se encarregará do transporte dos estudantes, bem como do pagamento de uma bolsa de estudos àqueles alunos que não residam em Brasília, cujo valor será definido em três categorias de R$150,00, R$260,00 e R$900,00 que se prestarão, conforme a necessidade do bolsista, respectivamente, ao custeio de moradia, alimentação, transporte e apoio escolar.

Esta iniciativa, Srªs e Srs. Senadores, constitui uma ação inestimável - ainda que tímida - para se atenuar a histórica incapacidade de nosso País para garantir a extensão do ensino superior a suas populações indígenas.

De fato, verificamos que, dos cerca de 410 mil indígenas existentes no País, apenas uma parcela mínima atinge formação de nível superior. O censo escolar realizado em 2003 pelo MEC indica que para os 149 mil 311 estudantes indígenas ora cursando o nível básico de ensino, há apenas cerca de mil e oitocentos no ensino superior, um percentual de somente 1,2%, número muito inferior ao do restante da sociedade brasileira e claramente insuficiente para as necessidades daquele contingente populacional.

Sr. Presidente, os alunos indígenas que logram concluir o ensino superior, uma vez formados e tendo retornado a suas tribos de origem, tornar-se-ão verdadeiros dínamos do progresso social junto aos seus, pois juntarão ao aprendizado técnico obtido na Universidade o conhecimento da mentalidade e visão de mundo de seu povo, achando-se em condições de maximizar a difusão dos saberes exigidos pela vida moderna e - a um só tempo - de favorecer a preservação consciente de suas tradições.

Há tempos, Srªs e Srs. Senadores, o Estado percebeu que, por meio da educação, os índios brasileiros poderiam lograr uma integração justa ao restante de nossa sociedade, não mais como vítimas, mas como sujeitos conscientes, capazes de exercerem sua cidadania de forma integral.

Desta forma, reitero meu apoio à iniciativa ora em exame, que se junta àquelas da Universidade do Estado do Mato Grosso e da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul de oferecer aos povos nativos uma valiosa ferramenta para sua conservação e florescimento.

Gostaria de ressaltar sobretudo, Srªs e Srs. Senadores, o pioneirismo da Universidade Federal de meu estado, Roraima, na criação de curso universitário especificamente destinado à formação de professores e pesquisadores indígenas, capacitados a produzir conhecimento e não unicamente a transmiti-lo.

Esse curso, denominado curso de licenciatura intercultural, foi criado por intermédio do convênio de cooperação nº 001/03, firmado pela UFRR e pela Funai, e se norteia pelos princípios de elaboração e consolidação de um projeto pedagógico adaptado às necessidades das populações indígenas, valorizando seus conhecimentos tradicionais e o trabalho dos professores indígenas.

Desde julho de 2003, o Núcleo Insikiran de Formação Superior Indígena da UFRR instalou o curso, oferecendo 60 vagas e almejando a formação, nos próximos dez anos, de quatrocentos professores, razão pela qual receberá novas e maiores instalações, que ora estão sendo reformadas pela reitoria da Universidade.

Por se destinar primariamente à formação de pessoas que já exerçam funções docentes em suas aldeias, esse curso possui características especiais, de maneira a não afastar essas pessoas de seus afazeres por mais tempo que o necessário. Assim, por exemplo, os alunos somente se deslocarão ao campus da UFRR nos meses de janeiro, fevereiro e julho, sendo, nos demais meses, acompanhados, pelos professores da Universidade, os quais se deslocarão até suas aldeias.

O ponto absolutamente inovador desse curso é que ele se destina, Senhor Presidente, à formação de professores pesquisadores, ou seja, profissionais capazes de coletar e sistematizar o conhecimento tradicional de sua comunidade, bem como de produzir o material didático necessário à sua transmissão - em português e na língua materna de seus alunos.

Os professores pesquisadores formados por esse curso pioneiro não serão, desta forma, meros repetidores dos ensinamentos produzidos por outros, serão realmente educadores, no sentido mais rico da palavra: capazes de coletar do mundo da vida os elementos destinados à transmissão e perpetuação de suas culturas e de efetivamente produzirem o conhecimento que transmitem. Encontrar-se-ão aptos a servirem como forças motrizes da integração bem-sucedida de sua gente à sociedade brasileira.

Deste modo, Sr. Presidente, quero reiterar meu apoio à iniciativa da Funai e das universidades públicas, notadamente a UnB e a Universidade Federal de Roraima, e destacar sua importância não apenas para os povos indígenas, mas também para todo o Brasil.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/05/2004 - Página 15551