Discurso durante a 61ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Obstáculos ao desenvolvimento econômico do Brasil: corrupção e incompetência administrativa. Defesa da constituição da CPI de Santo André e da CPI do Waldomiro Diniz.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Obstáculos ao desenvolvimento econômico do Brasil: corrupção e incompetência administrativa. Defesa da constituição da CPI de Santo André e da CPI do Waldomiro Diniz.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/2004 - Página 15704
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, AUMENTO, CORRUPÇÃO, EFEITO, INFERIORIDADE, RENDA PER CAPITA, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, DESEMPREGO, DENUNCIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), OBSTACULO, INVESTIGAÇÃO.
  • ANALISE, CORRUPÇÃO, BRASIL, EFEITO, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA, CRISE, ECONOMIA, SUPERFATURAMENTO, OBRA PUBLICA.
  • SOLICITAÇÃO, INSTAURAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, HOMICIDIO, PREFEITO, MUNICIPIO, SANTO ANDRE (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é claro que a incompetência dos governos provoca insatisfação popular. Mas, a omissão do governo, diante da corrupção, provoca indignação e revolta.

Os escândalos se sucedem, e o que se vê no atual Governo é a tentativa insistente de acobertá-los. O País não suporta mais a corrupção. O Brasil seria mais rico e poderoso se combatesse com maior competência a corrupção que se instala há tanto tempo, corroendo o organismo da Administração Pública brasileira.

Nos últimos dias, estamos indignados com os “vampiros” do Ministério da Saúde. Vampiros, corruptólogos, propinoduto, Waldomiro, gafanhotos, Santo André, uma seleção de escândalos que, se de um lado, provoca a revolta, de outro, revela uma omissão imperdoável do Governo.

Além disso, desde o primeiro momento da atual administração, há uma relação política promíscua do Poder Executivo com o Poder Legislativo, instalando-se um balcão de negócios para assegurar base parlamentar de apoio nas duas Casas do Congresso Nacional. Aliás, esse tema foi explorado ontem, desta tribuna, pelo Senador Antonio Carlos Magalhães.

Sr. Presidente, mais uma vez, destaco que o combate à corrupção no Brasil é prioridade dos homens sérios. Tem que ser prioridade. O Presidente da Transparência Internacional, o alemão Peter Eigen, afirma que o Brasil seria muito mais rico e poderoso se reduzisse os índices de corrupção.

A Transparência Internacional é responsável pelo ranking da corrupção no mundo, que é divulgado anualmente. Esse ranking serve de referência não só para decisões governamentais, mas também para a opção de grandes conglomerados econômicos que investem, sobretudo, no Terceiro Mundo.

Esse alemão afirma que, se o Brasil tivesse o mesmo índice de corrupção da Dinamarca, a nossa renda per capita seria US$2.850 maior do que é hoje. Ou seja, com os mesmos índices de corrupção da Dinamarca, teríamos uma renda per capita 70% superior à de hoje.

É lamentável ver grandes grupos econômicos fugindo do Brasil, deixando de investir no nosso País, porque não querem conviver neste cenário de corrupção. A corrupção expulsa o investimento, expulsando o emprego e roubando oportunidades de trabalho e de vida digna de milhões de brasileiros, que comemoram tristemente mais um recorde de desemprego anunciado ontem desta tribuna. Aliás, pelo quarto mês consecutivo há quatro recordes sucessivos de desemprego no Brasil.

E estamos surpresos e inconformados por vermos o PT protegendo corruptos, abafando escândalos, impedindo a investigação. Partido que acoberta corruptos passa a idéia de que a corrupção é imbatível. Partido que acoberta corruptos associa-se às falcatruas, passa a imagem de que a corrupção vale a pena. Quando há denúncia de corrupção, sem investigação nem punição, há o estímulo para que ela prospere no País. O mais grave é exatamente a idéia de que nada acontece, de que o roubo é livre. É por isso que Ulysses Guimarães afirmava que para um governante não basta não roubar; é preciso não roubar, combater a corrupção e impedir que roubem.

O custo da corrupção é maior do que as cifras divulgadas. O custo da corrupção tem origem na campanha eleitoral, quando há corrupção eleitoral e os candidatos assumem compromissos da retribuição. No exercício da administração, candidatos comprometidos com a corrupção eleitoral, realizam obras desnecessárias e surgem os “elefantes brancos”. As obras são superfaturadas e bilhões de reais são desperdiçados, esvaem-se pelos ralos da corrupção, perpassam por entre os dedos das mãos sujas de corrupção daqueles que desonram o voto popular.

Peter Eigen, Presidente da Transparência Internacional, afirma não ser muito entusiasta das estatísticas. Para ele, elas nem sempre são confiáveis, mas afirma que gente séria publica estatísticas no Brasil de que um terço da dívida pública brasileira, que é gigantesca, deve-se a políticos e servidores públicos corruptos.

Somos um país com riquezas naturais fantásticas. Somos um país de privilegiados nesse aspecto, porque em muitos casos somos até mais ricos e poderosos do que a grande nação norte-americana. As nossas riquezas naturais são invejáveis, mas nos comparamos com a Nigéria, que tem o petróleo, uma riqueza invejável, especialmente nesse mundo moderno, porém vive na miséria.

No Brasil, apesar das nossas riquezas naturais extraordinárias, vivemos um momento de terrível aflição, com o agravamento da crise econômica e social provocada, de um lado, pela incompetência administrativa e, de outro lado, pela corrupção. A corrupção, Senador Paulo Paim, leva as pessoas pobres ao sofrimento. A corrupção é, portanto, mortal e monstruosa.

Pergunto, Senador Mão Santa, o que estaríamos nós a fazer no Congresso Nacional se não combatêssemos a corrupção. É claro que a corrupção não é uma novidade. Ela é tão velha quanto o mundo, vem dos tempos de Adão e Eva. A Bíblia, o Corão - livro sagrado dos muçulmanos - e outros escritos religiosos importantes trazem relatos de episódios de corrupção que provocaram indignação. Portanto, a corrupção nasceu com o mundo.

Já que o Presidente Lula está viajando hoje à China, lembro o filósofo chinês Confúcio, que viveu no século V a.C. Ele já reclamava dos funcionários corruptos.

Não há, lamentavelmente, fórmulas mágicas de combate à corrupção. O combate à corrupção é uma atividade lenta e permanente, que exige pertinácia. É com persistência que devemos combatê-la, sob pena de permitirmos que ela arrombe o País ainda mais. Não é uma batalha, é uma guerra. E devemos ser incansáveis nesse combate. A corrupção afeta dramaticamente o crescimento econômico do País. A corrupção transforma estruturas públicas em estruturas ineficientes, interfere na qualidade dos investimentos e, como diz a Transparência Internacional, afugenta os investimentos externos sobretudo.

Os agentes corruptores e corruptos, portanto, constituem-se numa carga pesada, numa sobrecarga de improdutividade, que é paga pela sociedade.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, resta-nos o que nesta Casa do Senado Federal? Qual o instrumento que temos à nossa disposição para o combate à corrupção? Como se combate o mal? Qual é a estratégia para combater o mal? Colocando-o à luz, retirando-o do submundo, retirando-o dos escombros do poder desacreditado para que possa ser combatido com visibilidade.

É esse o papel da Comissão Parlamentar de Inquérito. Não é outro. A investigação política tem esta finalidade: conferir transparência às investigações. Quando se combate a CPI, quando se quer definir CPI como palanque, na verdade, se quer fugir da responsabilidade, se quer evitar a punição, impedir a responsabilização civil e criminal de corruptos, de corruptores, de criminosos, enfim.

Só nos resta instalar a CPI de Santo André. Não é apenas a denúncia do roubo, é a denúncia de assassinatos que se sucederam após a revelação do escândalo. Essa insensibilidade em relação ao crime nos assusta. Os insensíveis, os desalmados não deviam governar. Não há como manter esse mistério, não há como proteger os responsáveis por crimes hediondos praticados em nome da corrupção.

Não estamos aqui para julgar o PT, para julgar aqueles que eventualmente estão sob suspeição no caso Santo André. Estamos aqui para pedir ao PT que nos permita a instalação dessa CPI para satisfazer a aspiração da sociedade de revelar a verdade sobre os crimes de Santo André.

Imagino, Senador Mão Santa, como deve ser difícil para um homem sério, de conduta irretocável como o Senador Paulo Paim, assistir a essa complacência do seu Partido, contra a sua vontade, em relação à corrupção e a ilícitos praticados por agentes do Poder Público.

A CPI de Santo André é uma exigência nacional. A CPI Waldomiro Diniz é nova exigência nacional, sobretudo depois da publicação do relatório conclusivo da investigação administrativa anunciada agora pelo Governo. Waldomiro Diniz é utilizado como bode expiatório, como se fosse ele apenas a ponta desse enorme iceberg, como se não existissem os outros. Na verdade, Waldomiro Diniz é um subordinado, um operador comandado. Os que comandam a operação e os operadores de plantão estão protegidos pela impunidade diante da desfaçatez do Governo em relação às exigências da sociedade brasileira, que quer o combate à corrupção de forma implacável.

É claro que há corruptólogos, que há propinoduto, que há vampiros, o nome que se queira. Existem os corruptos cercando o Presidente da República e eles, lamentavelmente, estão impunes.

Portanto, há ainda uma forma de resgatar a credibilidade: interromper esse processo de impunidade, iniciar uma nova fase na administração federal, com transparência, com responsabilização e punição. E tudo isso começa com a CPI. Simultaneamente às investigações judiciais, à ação da Polícia Federal, do Ministério Público, a investigação política acrescenta, contribui, e é, sem dúvida alguma, indispensável para que se restabeleça a credibilidade da função pública em nosso País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero aproveitar a viagem do Presidente Lula para relembrar algumas citações chinesas. Lao Tsé-Kung, o pai do Taoísmo e grande discípulo de Confúcio, retrata, de forma lapidar, como é próprio do confucionismo, a questão da confiança. Estamos falando na derrota da confiança devido à omissão governamental em relação à corrupção.

Lao Tsé-Kung perguntou sobre o governo e Confúcio respondeu:

“O povo deve ter o suficiente para comer; é preciso um exército suficiente; é necessário que o povo confie no governante.”

“E se fores forçado a sacrificar um desses objetivos, qual deles sacrificarias primeiro?” prosseguiu Lao Tsé-Kung.

“Eu primeiro abandonaria o exército”, respondeu Confúcio.

“E se fores forçado a abrir mão de um dos outros fatores restantes, com qual ficarias?” perguntou de novo Lao Tsé-Kung.

“Eu ficaria sem alimento suficiente para o povo”, disse Confúcio.

“Houve sempre mortes em cada geração desde que o homem vive, mas uma Nação não pode existir sem confiança no seu governante.”

Essa lição o Presidente Lula deve aprender ao chegar à China hoje: o que não se pode perder definitivamente. Um governante não pode se dar ao luxo de perder a confiança da população, e estamos vivendo uma crise de confiança no atual Governo, Senador Mão Santa. Se esse Governo mantiver-se omisso, conivente, complacente, partícipe da corrupção, não haverá como recuperar a confiança perdida.

Concedo a V. Exª, Senador Mão Santa, o aparte que solicita.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Mão Santa, vou permitir o aparte. Naturalmente, o orador assim também entendeu, mas, para esclarecimento do debate, informo que V. Exª é o próximo inscrito.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, atentamente estamos ouvindo o seu pronunciamento, e todo o País. Sem dúvida nenhuma, acho que a TV Senado, hoje, atinge um dos maiores índices de audiência, porque V. Exª está na tribuna. V. Exª mostra ao País a profundidade dos seus conhecimentos, citando o próprio Confúcio. Desejamos pelo menos que essa caravana se aproxime daqueles conhecimentos que V. Exª adquiriu, citando o Tao, o livro dos chineses, que é o caminho do Nirvana, o lugar onde haveria uma sociedade justa, digna, igualitária e fraterna. Eu queria lembrar Churchill, um militar e um político vitorioso que fez ressurgir a democracia, que disse que a política é como a guerra, com a diferença de que, na guerra, só se morre uma vez e, na política, várias vezes. Quero dizer a essa comitiva que aí vai que damos graças a Deus, porque há uma esperança: o Vice-Presidente da República. É aquela propaganda: “Experimente!” Vamos experimentar, porque os problemas não estão na China. O comércio está aberto desde a bússola, no Renascimento, da navegação e da comunicação. Não estamos exportando, Sr. Presidente Paulo Paim, porque os grandes problemas estão aqui, desestimulando os trabalhadores. Este é o País que tem as mais altas taxas de juros da História do mundo, a mais alta carga de impostos. Hoje, de doze meses de trabalho do brasileiro, cinco são para o Governo. Isso se prova. Então, é isso, é essa burocratização. Aqui, para se abrir uma firma levam-se seis meses. Para fechar, para sair com o nome limpo, honrado, neste desonrado momento que vivemos, o comerciante passa uma vida em processo. No Ibama, a ignorância é audaciosa. Colocaram um time de ignorância total no Ibama, que não sabe aquilo que Sófocles dizia: que muitas são as maravilhas da natureza, mas a mais maravilhosa é o ser humano. Então, estou, no meu Piauí, revoltado. Surgiu uma perspectiva de riqueza: carcinicultura - cultivo de camarão -, mas o Ibama atrapalha muito. Basta dizer, Senador Paulo Paim, que o empresário que vai investir, criar, trabalhar e lutar deve buscar uma licença em Brasília, com esses burocratas burros, do núcleo duro, que foram nomeados. Devemos combater a corrupção e o desperdício. Essa viagem não é um desperdício? Esse avião não é outro desperdício? Chegou-me às mãos um jornal, que vou ler, sobre a farra que vive o Alvorada. Quero lhe dizer, Senador Alvaro Dias, que fui ao Chile. De verdade em verdade lhes digo que o Presidente de lá mora em sua casinha, num sobrado, onde passei, por curiosidade, com um taxista. E ele me disse: “Quando chega uma autoridade, a mulher dele bota a mesa e ele vai servir.” E o que está aqui, para que V. Exª tenha noção: houve uma licitação só para latas de cervejas - foram 2 mil. Então, tem-se que combater o desperdício e a incompetência, que são as causas. Elas não estão na China, mas no Brasil, e a esperança é o Vice-Presidente, que não se deve inibir. Temos o exemplo de Aureliano Chaves, o extraordinário Vice-Presidente que tinha coragem. É hora de o Presidente Alencar, que trabalhou, que fez riquezas, ver o sofrimento do empresário e de quem trabalha no Brasil.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Mão Santa, V. Exª sempre nos honra com a sua presença e com os seus apartes, e fala agora na farra do Alvorada, lembrando-me que o Chefe da Casa Civil precisa responder um pedido de informações a respeito da aquisição de 700 copos para bebidas alcoólicas como vinho, uísque e licor. Isso foi divulgado e queremos informações. O Governo deve responder, porque V. Exª tem razão. É preciso que o Governo dê exemplo de sacrifício, evitando o desperdício, a mordomia, o esbanjamento e a festa, porque o País vive uma crise de profundidade ímpar, que se agrava a cada passo, sobretudo agora, com a crise externa que causa impacto aqui, fortemente, alterando os nossos indicadores econômicos e sociais.

Vou concluir, Sr. Presidente Paulo Paim. Abordei a questão da perda de confiança no Governo e, sem dúvida, o Presidente Lula é o principal responsável pela desesperança que campeia, hoje, em relação a seu Governo. Não há mais confiança no Presidente. Sua Excelência não demonstrou autoridade e liderança, competência e comando. O que prevalece é a imagem do despreparo, num Governo que se associou às teses fisiológicas para ter apoio no Congresso Nacional e estabeleceu, repito, uma relação promíscua entre Executivo e Legislativo. Consagrou, de forma definitiva, o fisiologismo e puxou para baixo a qualidade administrativa do Governo.

Não há qualificação técnica. Não há instrumentalização competente dos diversos órgãos encarregados de executar programas. Não há planos de médio e longo prazos. Não há projetos que possam ser, tendo em vista a incompetência de gerenciamento, executados com sucesso.

Quando se anuncia um programa de reforma agrária, não é possível acreditar que esse programa será plenamente executado quando não há recursos do Incra, quando, por exemplo, em Pernambuco, a Funai não tem recursos sequer para a aquisição de água para os seus servidores e não paga aluguel há oito meses. Com discurso, não se cumprem metas, não se realizam projetos, e programa algum tem credibilidade popular.

Sr. Presidente, restabelecer a confiança é mudar a postura, é impedir que se acoberte a corrupção em primeiro lugar, porque nada provoca mais indignação do que a corrupção na Administração Pública.

Por isso, mais uma vez, o nosso apelo às Srªs Senadoras e aos Srs. Senadores para que subscrevam os requerimentos apresentados pela Oposição com o objetivo de instalar a CPI do Waldomiro Diniz e a CPI de Santo André, especialmente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/2004 - Página 15704