Discurso durante a 61ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Participação no décimo sexto Fórum promovido pelo Instituto Nacional de Estudos Superiores. Inclusão digital no Brasil. Defesa da introdução de linguagens multimídias nas escolas.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Participação no décimo sexto Fórum promovido pelo Instituto Nacional de Estudos Superiores. Inclusão digital no Brasil. Defesa da introdução de linguagens multimídias nas escolas.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/2004 - Página 15722
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ENCONTRO, AMBITO NACIONAL, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, CIDADANIA, INCLUSÃO, TECNOLOGIA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.
  • CRITICA, PROGRAMA DE GOVERNO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, FALTA, INCENTIVO, CRIATIVIDADE, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, DEFESA, AUMENTO, ESCOLARIDADE, POPULAÇÃO.

            A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, gostaria de cumprimentar os Senadores Tião Viana e Heráclito Fortes pela abordagem sensata que fazem desse episódio no Ministério da Saúde.

Acredito que todos nós, que temos vida pública, sabemos o quanto um episódio como esse choca o povo brasileiro. Por isso, ele deve servir para que a transparência se faça sentir nos ministérios, de forma geral, para que possamos, nesta Casa, exercer o nosso legítimo direito de fiscalizar.

            Portanto, associo-me às palavras dos Senadores Tião Viana e Heráclito Fortes.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna comunicar a esta Casa que me ausentei ontem dos trabalhos para participar, no Rio de Janeiro, dos debates do décimo sexto Fórum Nacional promovido pelo Instituto Nacional de Altos Estudos.

Sr. Presidente, solicito à Mesa do Senado que encaminhe cumprimentos pela iniciativa, por meio de requerimento que já encaminhei, ao Presidente do Conselho Diretor do INAE, Dr. Márcio Fortes, e também ao Dr. João Paulo dos Reis Velloso. Eles merecem nosso aplauso pelo papel público que desempenham no País ao propor e colocar em debate uma Agenda Nacional de Desenvolvimento.

Nestes tempos de incertezas, em que se confirma a cada dia a inoperância do Governo na área social, diante das graves questões nacionais, é estimulante constatar a disposição de tantas personalidades para contribuir com seu potencial intelectual e pensar um Brasil mais justo.

Da mesa redonda da qual participei para discutir a economia do conhecimento, o desenvolvimento sustentável e a inclusão social, participaram os mais ilustres cientistas da área bem como o Sr. Ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias.

Sr. Presidente, foi uma rara oportunidade para troca de opiniões bem fundamentadas sobre uma nova agenda para o desenvolvimento brasileiro, no momento em que ainda estamos sob o impacto das pesquisas do IBGE acerca da redução do consumo e queda na renda do povo brasileiro.

Sem receio de ser injusta, posso afirmar que o assistencialismo ainda marca os programas sociais neste País. É preciso analisar em profundidade até que ponto a tutela do Estado tem impedido a ousadia no desenho dos programas sociais, já que esses programas não avançam no sentido de utilizar novas tecnologias e estratégias de enfrentamento da pobreza.

No século XXI ainda persistem programas socais que são graduais no trato da pobreza. O discurso oficial determina que os pobres, em primeiro lugar, devem receber três refeições. Depois, escola para crianças, obter emprego, para, só então, gradualmente, ter acesso, também de forma gradual, à aproximação com o conhecimento e a tecnologia.

No entanto, é o conhecimento, e não mais a propriedade privada, que condiciona o desenvolvimento e a inclusão social. Em sentido mais radical, é o conhecimento a porta para a cidadania.

A sociedade do conhecimento e, mais particularmente, a economia do conhecimento já se impuseram no contexto brasileiro, mesmo junto às camadas mais populares, principalmente aquelas castigadas pela pobreza. Essa consciência altera o modo de pensar não apenas o desenvolvimento e o crescimento sustentável, mas, sobretudo, a redução das desigualdades.

Mas, como enfatizei, de alguma forma, perdura nas elites e profissionais de política pública, idéias gradualistas e tutelares em relação a programas sociais.

Por exemplo, o sucesso do voto eletrônico, num País de muitos analfabetos, ou do cartão eletrônico em programas de transferência de renda para famílias em situação de pobreza atestam a adesão e uso da tecnologia, próprios da sociedade do conhecimento e, mais do que isso, do uso da ousadia na ação pública. Sem mencionar a popularização dos telefones celulares, da Internet e de outros elementos das tecnologias nas diversas camadas sociais.

Cabe analisar por que falta arrojo nas estratégias de ação de enfrentamento à pobreza brasileira, uma vez que todo esse instrumental já está disponível para as diversas camadas da população.

Conseguimos, em décadas passadas, atingir a condição de oitava economia mundial e desenvolvemos um parque de negócios invejável, com trabalhadores brasileiros com uma média inferior a três anos de estudos. O que desejo salientar aqui é que a ausência da escolaridade formal não impediu o desenvolvimento de nosso parque produtivo. É que os trabalhadores brasileiros desenvolveram uma escola não formal, de autoria própria, e adquiriram a instrução necessária para enfrentar os desafios daquela época.

Parece que não estamos apostando, no presente, nessa capacidade de apreensão do conhecimento e de tenacidade da população pobre do Brasil. Seja porque os encastelamos na condição de miseráveis - a mídia, o Governo e a própria sociedade só apresentam esse retrato do pobre -, seja porque os nossos técnicos e burocratas perderam a capacidade de olhar esse potencial criativo do nosso povo. Vêem apenas problemas e carências que os embalam na tutela e gradualismo na ação.

Esse, hoje, a meu ver, é o maior risco Brasil.

            Dados já desatualizados, pois de novembro do ano passado, divulgados no Relatório da Anatel, trazem algumas informações importantes sobre a inclusão digital no País:

-     são 14,7 milhões de internautas em domicílios residenciais;

-     entre empresas, escolas, hospitais e demais serviços, atingem cerca de 26 milhões de usuários;

-     o maior problema para a expansão não é nem mesmo a infra-estrutura, e sim o preço do microcomputador, 20% acima dos preços internacionais;

-     o acesso à Internet é ainda quase exclusivo das classes A e B (90,7%); porém, não é raro que as classes C e D já atinjam dez por cento dos acessos. 

Muitos Municípios, hoje, possuem telecentros espalhados em seus bairros, e projetos como o dos Centros Democráticos de Informática, coordenados por Rodrigo Baggio, que povoam as favelas das grandes cidades, têm sido uma experiência de altíssimo sucesso.

            É preciso, no entanto, ousar mais. E aqui me refiro aos avanços necessários:

-     para além da universalização do acesso à educação básica, meta indispensável para a economia do conhecimento, é preciso maior agilidade e empenho para que as linguagens multimídias adentrem as escolas. Isto é, para que as tecnologias genéricas - informática-eletrônica, Internet,... - cheguem de forma maciça à escola e à casa do professor. Temos vários exemplos de sucesso entre professores que tiveram os seus microcomputadores financiados pelos governos locais, e que apresentaram grande rendimento no sentido de ajudar a equipar suas escolas e a despertar seus alunos para a importância da linguagem digital.

-     outra questão fundamental é o incentivo à criação de programas de ensino da leitura e da escrita por computador, para o ensino de jovens e adultos e mesmo no ensino regular. É preciso acordar para o índice expressivo dessa faixa etária nas grandes cidades: cerca de 48% dos jovens não completaram o ensino fundamental. Estão mal alfabetizados, mas não voltarão às classes de alfabetização regular. Parte de um falso pressuposto a prioridade que se alardeia de alfabetização de jovens e adultos neste País: o que a população jovem e adulta deseja é um supletivo com certificado de Ensino Fundamental que parta de seu potencial de alfabetização. A tecnologia até aqui desenvolvida precisa estar ao seu alcance, e, aqui, não é possível limitar a construção desse projeto apenas às universidades. O desafio é estender esse trabalho para as ONGs e outros centros, cujas experiências demonstram eficácia em sua divulgação.

Não precisamos de primeiro emprego para os jovens, outro falso pressuposto. No contexto de baixo crescimento, recessão e desemprego, a oferta de trabalho deve ser estimulada para o adulto. Aos jovens é preciso dar a oportunidade de programas de incentivo à inovação, à criação tecnológica e à experimentação.

Aos que pensam ser utopia, lembro recente matéria do Jornal Nacional que mostrou alunos do Ensino Fundamental montando painéis solares para a população da periferia.

Portanto, não é mais o caso de ofertar cursos de adestramento profissional, mas uma política incentivadora de criação tecnológica. O País carece desse potencial de ousadia e precisa apostar em sua população mais pobre, não vista como carente, mas com capacidade de criar e de colaborar com o desenvolvimento de nosso País. Para que essa postura permaneça é preciso que tenhamos ousadia e um olhar menos tutelar, como temos tido com as políticas sociais.

Apresento duas últimas questões para a nossa reflexão.

O aumento da escolaridade como projeto de toda uma sociedade caminha igualmente na esteira da inserção nas redes digitais.

As necessidades cada vez maiores do uso das tecnologias de informação tornaram, igualmente, necessário disponibilizar processos de capacitação dos cidadãos para o acesso às estradas digitais.

Finalmente, para concluir, quero dizer que não há falta de recursos para tal empreendimento, mesmo porque, na mesma ocasião, o Banco Mundial apontava o Brasil como um dos países que mais gastam na área social. Portanto, o dinheiro existe. O que falta é ousadia e reconhecimento do potencial da população brasileira em situação de pobreza para inovar e galgar maior acesso à sociedade e à economia do conhecimento.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/2004 - Página 15722