Discurso durante a 66ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da correção da tabela do Imposto de Renda.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • Defesa da correção da tabela do Imposto de Renda.
Aparteantes
Alvaro Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2004 - Página 16673
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • REITERAÇÃO, NECESSIDADE, CORREÇÃO, TABELA, IMPOSTO DE RENDA, COMENTARIO, DADOS, AUMENTO, ARRECADAÇÃO, COMPARAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), FALTA, JUSTIÇA SOCIAL, TRIBUTAÇÃO, CLASSE MEDIA, POPULAÇÃO CARENTE, DENUNCIA, OCORRENCIA, CONFISCO, RENDA, TRABALHADOR.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Presidente, Paulo Paim, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta tribuna para tratar, por mais uma vez, da malsinada falta de correção da tabela do Imposto de Renda.

O Brasil é um país complexo, colonizado por um processo senhorial de ótica extrativista e não civilizatória. O povo sempre foi visto pelas elites econômicas e sociais e boa parte da intelectualidade como um mal para que as tarefas ditas menos nobres pudessem ser desempenhadas sem que ficasse ameaçada a perpetuidade do domínio dos poderosos.

Com o crescimento populacional, o desenvolvimento tecnológico, a simplificação do acesso a bens e serviços, com a necessidade do Estado de arrecadar mais para prover-se de recursos para seus gastos, maximizou-se a necessidade de aumento da arrecadação do Tesouro Nacional. E assim o Estado brasileiro foi, gradativa e inexoravelmente, aumentando sua carga tributária em cima dos cidadãos, pessoas físicas ou jurídicas, que estavam a seu alcance fácil para taxação.

Isso, todavia, nunca se refletiu, infelizmente, numa verdadeira política de valorização da cidadania e de inclusão na sociedade. A demonstração cabal dessa realidade é que a tributação nacional subiu de 24% para quase 35% do PIB, em cerca de uma década, nos anos 90 recém-terminados.

Os governos que se têm sucedido não têm tido complacência alguma com a população, principalmente as classes média e pobre, tirando-lhes tudo que é possível via impostos e taxas. Uma das maiores fontes de arrecadação é o Imposto de Renda, cuja tabela não tem sido reajustada como deveria nos últimos anos. Para culminar, prorrogou a alíquota de 27,5% de desconto de Imposto de Renda para o ano de 2004.

Ao invés de aumentar a renda nacional e, em conseqüência, a base de arrecadação de tributos e contribuições, os governos preferem extrair mais e mais dos mesmos bolsos dos quais sempre tiraram. Para se ter uma idéia, o teto mensal de isenção de desconto na fonte passou de R$900,00, em 1º de janeiro de 1996, para R$1.058,00, válidos ainda este ano, ou seja, um reajuste de 17,6% em oito anos, enquanto a moeda se desvalorizou no mesmo período em mais de 60%.

Sr. Presidente Paulo Paim, Sr. Senador Paulo Elifas, tal diferença traduz um real confisco de renda dos trabalhadores pelo Governo Federal ao provocar o aumento do desconto do Imposto de Renda, seja pela inclusão de novos contribuintes cuja renda ultrapassou o teto de isenção seja pelo aumento de descontos dos que já contribuíam. Assim, rendas que foram corrigidas apenas por índice de inflação com o fito de recompor o poder aquisitivo são diminuídas nesse mesmo poder aquisitivo pelo aumento do imposto que lhes é descontado. Tal prática configura, de modo inequívoco, um espúrio confisco de renda.

Sr. Presidente, Sr. Senador Alvaro Dias, corrigir a tabela de faixas de rendimentos para efeito de Imposto de Renda é um dever do Estado. Não fazê-lo constitui um esbulho contra a cidadania, sobretudo porque essa sobretaxação incide justamente sobre rendimentos mais baixos, provocando, como efeito colateral extremamente pernicioso, o aumento da vergonhosa concentração de renda, fenômeno já extremamente acirrado em nosso País e que tem crescido sobremodo nos últimos anos.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Concedo o aparte ao Senador Alvaro Dias com prazer.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Augusto Botelho, V. Exª aborda uma situação fundamental e até emblemática, resultante de várias promessas descumpridas. A correção da tabela do Imposto de Renda é um compromisso descumprido pelo Governo e isso, queremos destacar aqui, também promove queda de renda. Essa queda de renda que vem se verificando sucessivamente, ao longo dos meses, aumenta o desemprego. Como o orçamento familiar se torna insuficiente, aqueles que até então não buscavam emprego porque estavam estudando, tinham condições de dispensar o salário para dedicar-se naquela fase da vida ao aprendizado, entraram agora nas estatísticas dos que buscam emprego. A não-correção da tabela do Imposto de Renda significa mais impostos e, portanto, limitação do orçamento familiar, já esgotado na sua capacidade de realizar as necessidades básicas da família. Com isso, promove o desemprego no País, que vem batendo recordes sucessivos. Cumprimento V. Exª porque esta Casa do Congresso Nacional tem o dever de cobrar do Governo o cumprimento de seus compromissos.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Agradeço o aparte de V. Exª.

A situação torna-se ainda mais gritantemente injusta quando se constata que a mesma estagnação de valores do desconto na fonte se reproduz na declaração anual de ajuste, agravada pelo fato de que gastos anteriormente contemplados como abatimentos possíveis na renda bruta do declarante ou não mais são considerados ou tiveram os seus valores fortemente reduzidos. A conseqüência direta é que mesmo uma pessoa que não tenha tido sua renda aumentada de um centavo sequer de um ano para o seguinte terá maior imposto a pagar no próximo ano. Mas uma vez, o Estado está se apropriando de modo indevido do rendimento do trabalho honesto dos cidadãos.

Com a falta de correção da tabela e das deduções, cerca de seis milhões de trabalhadores, que deveriam estar na faixa de isenção pelas regras válidas em 1996 e que foram mantidas até hoje, transformaram-se em contribuintes, de acordo com a Unafisco - Associação dos Ficais da Receita Federal. Outros seis milhões de trabalhadores tiveram sua carga aumentada, alguns até em 200%. Será preciso alinhavar mais aumentos e dados para demonstrar e convencer que o Estado brasileiro se transformou num explorador do contribuinte?

Se for preciso, posso também dizer que a Unafisco Sindical, entidade representativa dos auditores fiscais da Receita Federal, estima que o Governo arrecadou R$14,5 bilhões a mais, no período de 1997 a 2001, por causa dessa não-correção da tabela. Entende-se agora por que interessa tanto aos governos manterem a tabela inalterada.

Tal estado de coisas colide com diversos princípios constitucionais, sobretudo os tributários da igualdade (art. 150, II), da capacidade contributiva (art. 145, § 1º), da vedação do confisco (art. 150, IV) e da estrita legalidade (art. 150, I).

Ainda segundo nota da Secretaria Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade de São Paulo, a falta de correção integral dos valores das faixas de contribuição implicou redução da massa salarial líquida do País de R$4,5 bilhões somente este ano. O aparte do Senador Alvaro Dias toca justamente neste assunto: a diminuição da capacidade de aquisição da família, a redução do poder de compra do salário. Isso significa cerca de 1% a menos de recursos disponíveis para 6,69 milhões de trabalhadores que atualmente contribuem para esse tipo de imposto.

Sr. Presidente Paulo Paim, tenho plena convicção de que chegou ao fim o tempo em que o Estado podia decidir unilateralmente o que fazer para arrecadar dinheiro para se financiar. Chegou o momento me que a sociedade brasileira e nós, parlamentares seus representantes, devemos reivindicar participação ativa nas escolhas sobre a carga tributária, melhor dizendo, sobre o modelo tributário que devemos adotar no País.

Precisamos transformar o Estado brasileiro no real articulador do desenvolvimento econômico, mas sobretudo do desenvolvimento social. Precisamos dotar a sociedade organizada de mecanismos eficazes para protegê-la dos gananciosos predadores do bem comum.

Corrigir a tabela do Imposto de Renda não é uma concessão a ser obtida do Governo. É uma obrigação a ser cumprida pelos que hoje estão no comando da Nação. Agir de outro modo é continuar a esbulhar o povo e aprofundar a concentração de renda e a injustiça social que sufoca este País.

Espero que os governantes da nossa Pátria finalmente se voltem para o povo e corrijam a tabela de faixas de rendimentos e deduções para o Imposto de Renda. É um dever de justiça ao qual o Governo não pode se furtar.

Gostaria também de registrar que fiquei muito feliz com o crescimento de 2,7%. Espero que mantenhamos essa curva de subida, porque se o País arrecadar mais poderemos fazer as correções sociais necessárias.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2004 - Página 16673