Discurso durante a 68ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, sobre a saúde bucal do brasileiro, destacando a necessidade urgente do tratamento da saúde do nosso povo.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Comentários à pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, sobre a saúde bucal do brasileiro, destacando a necessidade urgente do tratamento da saúde do nosso povo.
Publicação
Publicação no DSF de 02/06/2004 - Página 16973
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, PESQUISA, FUNDAÇÃO INSTITUTO OSWALDO CRUZ (FIOCRUZ), ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), SITUAÇÃO, GRAVIDADE, PRECARIEDADE, SAUDE, DENTES, POPULAÇÃO, BRASIL, REGISTRO, EXCESSO, INCIDENCIA, DOENÇA MENTAL, AUMENTO, DESPESA, CIDADÃO, TRATAMENTO MEDICO.
  • NECESSIDADE, URGENCIA, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL, SAUDE PUBLICA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos mais significativos indicadores da qualidade de vida de uma população é sua saúde bucal. Por ela podemos avaliar, sem medo de erro, até que ponto a população tem instrução e meios de vida adequados aos bons padrões de uma sociedade moderna, justa e desenvolvida socialmente.

Infelizmente, o Brasil está muito longe desses qualificativos, seja pela falta de instrução ou informação, seja pelas desigualdades e injustiças, seja pelo atraso em muitos setores de sua sociedade.

Exemplo disso, Sr. Presidente, é a situação do pernambucano Kiko, conforme relatou o jornal O Globo, em sua edição de 19 de maio passado. Aos 24 anos de idade, Kiko foi apenas cinco vezes ao dentista do posto público em toda sua vida. E diz não ter gostado, pois teve que sair de casa às quatro horas da manhã para guardar lugar na fila e poder ser atendido. Há três anos Kiko não vai ao dentista, pois diz não ter tempo a perder e precisa trabalhar para sustentar os quatro filhos. E quando foi ao posto, já com sete dentes perdidos, não ganhou dentadura para substituí-los. A que usa foi-lhe ofertada por um vereador, ante a sua impossibilidade de pagar os mais de R$80,00 que lhe custaria uma nova. Afirma Kiko: “isso dá para eu alimentar minha família por duas semanas. Para comprar a dentadura teria que passar duas semanas sem comprar comida. Ou a comida ou a dentadura.”

Eis, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um exemplo típico do que aflige parcela majoritária da população brasileira. E o caso do Kiko ainda não é o extremo. Pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, financiada pela Organização Mundial de Saúde, indica que quase 38% da população brasileira de mais de 50 anos é completamente desdentada. Do total dos brasileiros, de todas as idades, 24,5 milhões não possuem um dente sequer, representando mais de 14% de nossa sociedade.

Sr. Presidente, estamos, sem dúvida, diante de um caso grave de saúde pública deficiente. E deficiente por todos os prismas possíveis. Renda familiar, educação, prevenção, tratamento, sistema público de saúde, enfim, há uma falha grave na nossa estrutura social que não permite a um contingente enorme de brasileiros e brasileiras manter um mínimo de saúde bucal ao longo de sua vida.

Eis um campo em que a prevenção do Sistema Único de Saúde pode atuar de modo eficaz e abrangente. As campanhas de cuidados com a dentição na primeira infância, associadas à fluoretação da água de consumo doméstico, podem ser instrumentos muito eficazes de combate à deterioração dentária da população de baixa renda no Brasil.

Contudo, Sr. Presidente, além da deficiência na saúde bucal dos brasileiros, a pesquisa coordenada pela Fiocruz identificou, também, que mais de um quarto dos brasileiros consideram que seu principal problema é o estado de ânimo - depressão, tristeza, ansiedade e preocupação. Seguem-se mais 18% que indicam mal-estar físico ou dores no corpo e dificuldade de sono como males constantes.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não acho que seja muito difícil identificar a causa de tais estados depressivos de ânimo em boa parte de nossos concidadãos. A trajetória do Brasil nas últimas décadas não tem ajudado muito o cidadão comum, principalmente os mais pobres, a se sentirem esperançosos e animados com as perspectivas de futuro.

Exclusão social recorrente, aumento de desigualdades, desemprego crescente, renda declinante, saúde precária, benefícios sociais retrocedendo, ao invés de avançarem. Tudo conspira para o desânimo da parte da população que não pode elevar-se sem o auxílio da solidariedade nacional. Solidariedade essa que sempre foi precária e que, ainda hoje, pouco se manifesta, pelo menos, de parte das autoridades constituídas. Restam apenas ações das entidades privadas ou das ONGs que tentam minimizar o vazio em que vive a sociedade brasileira, pelo menos parte expressiva dela.

Sr. Presidente, num país onde os direitos sociais sequer chegaram a ser consolidados e já começam a ser retirados, fica muito difícil convencer os humildes de que há razão para esperar algo melhor no futuro. E, infelizmente, este Governo, que ascendeu ao poder impulsionado por uma enorme esperança, não tem colaborado para melhorar o quadro.

Não fosse a controlada taxa de inflação, que ainda permite que se possa pensar no dia de amanhã, pelo menos, nas mesmas bases do dia de hoje, certamente já estaríamos vivendo um clima de tensão social à beira do colapso. Basta ver os sintomas que pipocam no Rio de Janeiro, São Paulo ou Belo Horizonte, ou nos campos do Pará, do Pontal do Paranapanema ou de Pernambuco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos, urgentemente, tratar da saúde do povo brasileiro. A saúde física, com programas sustentados e objetivos de prevenção de males endêmicos, como a perda de dentição. Mas, também, a saúde psíquica, dando à Nação brasileira razões objetivas para ter esperança no futuro e superar o desânimo social que nos atinge.

A pesquisa da Fiocruz aponta também para o altíssimo impacto dos gastos em saúde no orçamento dos brasileiros. São 19% de gastos em saúde, sendo que, desse total, quase um terço é despendido em medicação e outro quarto com plano de saúde. É muito para um país pobre e quase sem cobertura social que valha a pena. E o que é pior, quanto mais baixa a renda, maior o peso da despesa com medicamentos nos gastos da população.

Sr. Presidente, diante de números e conclusões tão contundentes, não podemos tergiversar e tentar postergar ações firmes de combate às carências básicas do povo brasileiro. Os chamados gastos sociais não são, na verdade, gastos, mas investimentos de retorno garantido a médio e longo prazos. Mas precisam ser feitos para que o Brasil possa crescer e fortalecer-se.

Creio que o Sistema Único de Saúde tem que ser fortalecido, já que atende a praticamente três quartos da população nacional. O SUS tem que ser consolidado, eliminando-se a evasão de recursos, racionalizando atendimentos e melhorando a infra-estrutura física dos postos de atendimento.

Sr. Presidente, achar que a solução dos problemas do sistema de saúde nacional está em empurrar os cidadãos para os planos privados de saúde é querer subtrair do Estado uma responsabilidade social que lhe é inalienável. Todo país civilizado busca atender sua população com eficientes sistema de proteção social preventiva e curativa. Assim deve o Brasil proceder. A começar pelas campanhas de elevação da saúde bucal.

Se não podemos, ainda, resolver todos os problemas que nos afligem, devemos, como dirigentes nacionais, apontar e trilhar caminhos que dêem esperança aos nossos concidadãos a esperança de que estaremos, paulatinamente, melhorando nossa qualidade de vida. E que isso irá acontecer num horizonte que ainda os permita desfrutar de algo melhor do que podem hoje ter.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/06/2004 - Página 16973