Discurso durante a 69ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Avaliação da participação do Ministro da Saúde, Humberto Costa, no Programa Roda Viva.

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Avaliação da participação do Ministro da Saúde, Humberto Costa, no Programa Roda Viva.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Antonio Carlos Valadares, José Jorge, Magno Malta, Mozarildo Cavalcanti, Ramez Tebet, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/2004 - Página 17099
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, TELEVISÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), SUSPEIÇÃO, ORADOR, PARTICIPAÇÃO, MINISTRO, QUADRILHA, CORRUPÇÃO, DESVIO, VERBA, PROCESSO, LICITAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, IRREGULARIDADE, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, HUMBERTO COSTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), LEITURA, TRECHO, DENUNCIA, EDITORIAL, JORNAL, ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • CRITICA, GOVERNO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DESPREPARO, INCOMPETENCIA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, FALTA, IDONEIDADE.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores:

Não basta sentir a chegada dos dias lindos, é necessário proclamar que os dias ficaram lindos.

Carlos Drummond de Andrade.

No primeiro escândalo, a reação do Governo do Excelentíssimo Senhor Presidente a República, Luiz Inácio Lula da Silva, foi tensa, atabalhoada e esgarçante. Nos dias que se seguiram àquela sexta-feira 13, o semblante oficial começou sangüíneo. Teve ares compungidos de fazer dó. Dois meses depois, voltou a ter o nariz em pé, com a arrogância dos primeiros tempos. Desta vez, no calor da Operação Vampiro, o comportamento mudou: uniforme e horizontal, o Governo do PT, mais bem talhado no gerenciamento de crises político-patrimoniais, encarregou o Ministro da Saúde, Humberto Costa, de ser frio e reagir com cinismo aos desgastes provocados pela descoberta da fraude generalizada no sistema de compras do Ministério, cujas fontes de contaminação chegam muito próximas da mesa do primeiro funcionário da Pasta.

Quem teve a oportunidade de assistir ao Programa Roda Viva da TV Cultura da última segunda-feira, pôde, em pelo menos três oportunidades, testemunhar o quanto Humberto Costa estava letrado na embromação. No centro da arena, com os mais importantes jornalistas do Brasil, o Ministro da Saúde, primeiro, tentou passar por inspetor-geral e lembrou que a transparência deve ser total e insinuou que a ardilosa operação era parcela da herança maldita. Como não colou, ato contínuo, conseguiu ser meio mudo, quando perguntado pelo repórter da revista Época Gustavo Krieger, autor do furo de reportagem sobre as investigações da Polícia Federal, por que manteve na Presidência da Comissão de Licitação da Pasta o Sr. Mário Machado da Silva, um datilógrafo que ostenta injustificáveis sinais de riqueza como mansão no Lago Norte, em Brasília, e lancha de R$700 mil e que há dez anos vinha “esfaqueando a viúva”.

Se as evidências de viscerais ligações entre o Ministro da Saúde e o ex-Coordenador de Assuntos Logísticos Luís Cláudio Gomes da Silva não fossem sabidas e propaladas, seria plausível acreditar que Costa estava mesmo surpreso e decepcionado com o comportamento ladravaz do ex-assessor, quando perguntado por que não desconfiou das suas atividades clandestinas já que eram tão próximos. São robustas as evidências de que o Sr. Luiz Cláudio é um malandro conhecido no seu Estado; e foi simplesmente Diretor Administrativo Financeiro da Secretaria de Saúde do Recife quando o Ministro da Saúde administrava a Pasta, e vem contabilizando atividades duvidosas desde o Governo Miguel Arraes.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senador Demóstenes Torres, peço-lhe um aparte, por favor.

O Sr. DEMÓSTENES TORES (PFL - GO) - Ouço o nobre Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Sr. Senador, quero me congratular com V. Exª pelo teor do seu pronunciamento. Nós pernambucanos estamos envergonhados com o fato de o Ministro Humberto Costa ter trazido três assessores - e agora aparecem outros - para dirigir os principais órgãos no Ministério. Esses já eram acusados quando estavam no Recife. Nessa acusação publicada em toda a mídia - e também nesse programa Roda Viva que V. Exª citou -, o Sr. Ministro Humberto Costa e o Dr. Luiz Cláudio, Chefe da Direção Administrativa da Secretaria de Saúde do Município, assinaram cerca de 35 contratos sem licitação com empresas de limpeza e vigilância que totalizaram valores acima de R$30 milhões. Essas empresas foram as mesmas que fizeram doações para a sua campanha política. Ora, Senador Demóstenes Torres, ele disse que isso é legal. Bom, legal é se fazer uma dispensa de licitação em determinadas situações limites; legal também é receber doação de empresa e colocar na sua prestação de contas. O ilegal é ligar essas duas coisas. É, ao mesmo tempo, se liberar uma licitação, assinar contrato sem licitação e receber depois 25% do valor da sua campanha em prestação de conta que foi de R$800 mil, sendo que R$190 mil vieram de uma empresa cujo contrato foi feito sem licitação. Na verdade, é uma vergonha. Aparentemente, este Governo Lula criou uma regra nova que é a seguinte: primeiro, ministro não é responsável pelos seus auxiliares e pode nomear quem quiser: corrupto, ladrão... a culpa não é dele se o cidadão for pego com a mão na botija. Em segundo lugar, não tem nada demais em liberar-se uma licitação e depois receber daquela empresa dinheiro que, no fundo, é público. Parabéns a V. Exª. Tenho certeza de que está no caminho certo o seu discurso, e sei onde vai terminar. Muito obrigado.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Muito obrigado, Senador José Jorge. V. Exª abordou inclusive temas que irei tratar e que entendo são escandalosos. Na realidade, uma quadrilha tomou conta do Ministério da Saúde e não só do Ministério da Saúde.

Mas o Dr. Humberto Costa deu o mesmo show de interpretação quando indagado pelo subeditor do Jornal O Estado de S.Paulo, Gabriel Manzano Filho, se ele considerava moral ter como financiadores da sua campanha eleitoral de 2002 para o Governo do Estado de Pernambuco, empresas que prestaram serviços com dispensa de licitação à Prefeitura de Recife, quando ele era Secretário Municipal de Saúde.

Escorado em dados irrefutáveis, Manzano disse que o Estadão publicaria no dia seguinte reportagem informando que a empresa Líder Conservação e Serviços Ltda. obteve pelo menos dois contratos com a Secretara de Saúde de Recife, com dispensa de licitação, no valor de pouco mais de R$2 milhões. Maior financiadora de Humberto Costa, doou R$191.700,00 à campanha. Já a empresa Essencial Serviços de Vigilância doou oficialmente R$11 mil e contratou com a Prefeitura de Recife valor superior a R$1 milhão nas mesmas circunstâncias.

Acuado pelas evidências apresentadas pelo jornalista do Estadão, o Ministro da Saúde não se fez de rogado, afirmou que “a dispensa de licitação é uma forma de licitação” e argumentou que as suas contas foram aprovadas pelo Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco. Salvo pelo fim do programa, acabou cofiando o cavanhaque e fez “cara de nada”, como se houvesse acabado de cumprir a missão proposta pelo poeta Carlos Drummond de Andrade de propagar a chegada dos dias lindos.

Conforme cobrou hoje, com muita propriedade, o editorial do Estadão, “é eticamente correto uma empresa ser beneficiada, por um administrador público, com dispensa de licitação em contratos (de fornecimento ou prestação de serviços) e logo depois tornar-se a maior doadora de recursos na campanha eleitoral desse mesmo administrador? Outra indagação correlata: qual o motivo de uma dispensa de licitação pública? Por que motivo teriam sido dispensadas as licitações para a contratação de “auxiliares de serviços gerais”, de motoristas e de telefonistas? Certamente não são funções que demandem (por parte de empresas que empreitam mão-de-obra) “notória especialização”, como as referidas na Lei de Licitações (Lei 8.666/93).

O editorial ressalta que, conforme matéria publicada no “Jornal do Commercio, de Pernambuco, na edição do último domingo, esses contratos sem licitação feitos com as duas financiadoras da campanha de Humberto Costa não foram em número de quatro, mas de 16, no valor total, aproximado, de R$30 milhões, entre 2001 e janeiro deste ano, enquanto que para o vereador Heráclito Cavalcanti (PFL) com base em levantamento no Diário Oficial, fixou em R$18 milhões o total das contratações sem licitação feitas pelo Secretário Municipal da Saúde, na gestão Humberto Costa”.

Ciente de que “a primeira conseqüência da combinação de azul e leveza do ar é o sossego que baixa sobre o nosso estoque de problemas”, Humberto Costa mostrou-se cordato e justo ao afirmar que não iria politizar as investigações de um escândalo que há uma década vem sangrando o dinheiro público, cuja soma supera R$2 bilhões desviados em um sistema organizado de corrupção. Mas, como bem pontuou o editorial do Estadão, considerando-se que o Ministro age com a máxima prudência de modo a não permitir a politização do escândalo e ainda quer aprofundar as investigações da Operação Vampiro em suas conexões regionais, seria providencial examinar também as conexões eleitorais, já que as “contratações sem licitação e as doações para campanhas eleitorais andam, e andaram, juntas”, resume o documento jornalístico.

Sr. Presidente, essa hemorragia de recursos destinados a medicamentos poderia ter sido estancada, caso o “debate qualificado de idéias” entre o Ministro da Saúde, o Diretor do Fundo Nacional da Saúde, Reginaldo Muniz Barreto, e o Sr. Luiz Cláudio Gomes da Silva não tivesse girado em torno da reflexão de que “em vez de alienação, o prazer dos dias lindos é terapia e nos integra, neste momento, num conjunto harmonioso, em que somos ao mesmo tempo ar, luz, suavidade e gente”.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Senador, V. Exª me permite um aparte?

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador, V. Exª me permite um aparte?

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Concedo a palavra ao nobre Senador Magno Malta. Em seguida, ouvirei o Líder da Minoria, Senador Líder Sérgio Guerra, e, depois, o Senador Ramez Tebet.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Senador Demóstenes Torres, quero congratular-me com V. Exª pelo pronunciamento oportuno, estudado, inteligente. V. Exª traz à luz os fatos, sem conotações irresponsáveis, fruto de quem vem acompanhando o problema e que se aprofundou na matéria para poder, nesta tribuna do Senado, nossa trincheira, mostrar à opinião pública o que esta Casa pensa sobre esses episódios. V. Exª e eu somos militantes na área da segurança pública e temos uma voz única quando falamos do estado de exceção em que vive a sociedade brasileira. A violência toma corpo porque a sociedade não tem motivos para acreditar nas instituições. É verdade que o esquema existia há alguns anos, mas isso não justifica que outras pessoas, posteriormente, a ele se tenham juntado.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - E até o aprofundaram.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Trouxeram requintes de qualidade à maneira como se sangra o País. Tenho uma opinião e, de maneira muito particular, divido-a com um amigo. No Brasil, como voz que clama no deserto, afirmo que se nós já tivéssemos mexido na Constituição brasileira e instituído prisão perpétua para o crime organizado e o narcotráfico, com arresto imediato de bens, não teríamos visto a imagem desses vampiros algemados entrando na carceragem da Polícia Federal. Iriam direto para um presídio de segurança máxima para cumprir prisão perpétua e os bens deles seriam arrestados imediatamente, conforme determinaria a Constituição Federal, se ela tivesse sido alterada.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - O pior é que entram em um dia e saem no dia seguinte.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Saem no dia seguinte porque são réus primários. São muito indoutos, muito despreparados. Eles não podem ser comparados com um criminoso que mata um tatu, ou um passarinho, para comer e é preso por cinco anos sem direito a fiança. Essas contradições que a sociedade não aceita são a causa da violência. Por isso, precisamos insistir. Antes que Deus me ceife a vida, antes que me leve daqui, gostaria de ver uma mudança na Constituição Federal. Vou lutar, sempre, para que a prisão perpétua seja instituída para o narcotráfico e para o crime organizado, com o arresto imediato dos bens dos criminosos. Se a Constituição tivesse sido alterada, esses canalhas vampiros já estariam cumprindo suas penas, com correntes nós pés, e os bens deles, que seriam arrestados, ressarciriam a sociedade, de onde saíram.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PMDB - GO) - Agradeço a intervenção de V. Exª.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PT -ES) - O pronunciamento de V. Exª é dos mais significativos para o País e para nós.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PMDB - GO) - Muito obrigado, Senador.

Concedo o aparte ao Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Ouvi, de forma ininterrupta, as suas palavras no dia de hoje. Para não ser recorrente, mas tentando fazer uma avaliação correta da dimensão da sua palavra, quero dizer que normalmente, se não todas as vezes em que V. Exª comparece ao plenário, quando usa da palavra o faz com propriedade e com notório equilíbrio. Tenho pessoal simpatia por políticos que atuam dessa forma. Esse episódio do Ministério da Saúde é extremamente grave e não deve ser separado de outros. Algumas denúncias de corrupção no atual Governo não foram politicamente tratados de maneira a que pudessem ser resolvidos. A ação do Governo do Partido dos Trabalhadores e das lideranças que atuam pelo Presidente Lula no Senado foi na direção de evitar sempre a participação do Congresso e do Senado, em especial, nessas investigações. Elas vão se acumulando. No primeiro caso, que discutimos tantas vezes, do Waldomiro Diniz, ficou claro que o Governo não desejava, de forma alguma, a interferência do Congresso no processo. A alegação é a de sempre: ela era perturbadora, representava a politização de um processo que estava em andamento, com a devida prudência e com toda a responsabilidade, no contexto do Executivo ou da Polícia Federal. Rigorosamente, os sinais não apontam nessa direção. Nenhum deles. Agora se acumulam denúncias no Ministério da Saúde. A idéia de remetê-las para o passado é bastante simplória, mas não há por que não considerá-la. Não há razão alguma para não a encarar dessa forma já que existem, senão provas, indícios de que essas irregularidades são antigas. O que não faz sentido é impedir, de forma absolutamente insincera, a participação do Congresso, na forma de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, para investigação dessa questão que interessa ao povo brasileiro. O Presidente Lula enfrentou, nos últimos quatro meses, um declínio substancial de popularidade. É claro que esse declínio tem a ver com a falta de produção do seu Governo, mas também tem muito a ver com esses fatos, com a imensa contradição do Governo e do PT em torno dessa questão. Penso que a expressão “politização não cabe”. Não se trata de politização, mas de democratização. É dar transparência a fatos que não podem ser tratados de forma semi-aberta. Essas negociações têm que ser abertas, explícitas.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Semi-aberta é um termo muito apropriado, Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Sem dúvida. Elas têm que ser tratadas de maneira segura, explícita, responsável. Nem V. Exª, Senador Demóstenes Torres, nem Senador da Minoria ou da Oposição tratariam esse assunto com leviandade, como antes se fez tantas vezes. Não podemos aceitar e devemos denunciar a absoluta falta de coragem política do Governo atual de enfrentar a questão da forma como deveria estar enfrentando, para recuperar a confiança que neles está esvaindo-se. Discuti-la aqui, de forma conseqüente, em um acordo concreto e responsável de lideranças que não querem outra coisa senão a verdade desses fatos. O seu pronunciamento vai na rota das boas manifestações do Congresso Nacional e do Senado.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Muito obrigado, Senador Sérgio Guerra. V. Exª engrandeceu o meu pronunciamento.

Concedo o aparte ao Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Demóstenes Torres, os Senadores que me antecederam já fizeram justiça ao seu substancioso pronunciamento. V. Exª nos surpreende a cada dia não pela sua capacidade jurídica, pois essa é conhecida, mas pela sua coragem e pela forma como aborda os assuntos. Este assunto é de uma gravidade extrema, porque se trata da saúde do povo brasileiro, saúde essa combalida. Estamos vendo por que os remédios custam caro, por que eles estão faltando. Estamos vendo por que a saúde não é melhor. Isso ocorre porque existe corrupção no sistema de saúde do Brasil. Imaginem oito, nove ou dez anos de sangria, o que isso representa contra os aposentados, contra aqueles que necessitam do Sistema Único de Saúde. Positivamente, alguma providência há de ser tomada. Em qualquer país sério, esse pessoal já teria de estar respondendo na cadeia mesmo. Não pode mais continuar assim. É preciso colocar um freio imediatamente nisso. Isso é uma ignomínia, uma falta de sensibilidade a toda prova, Senador; é roubar a saúde do povo. Onde nós estamos? E ainda querem que o Congresso não aborde um problema dessa natureza. Isso é só problema policial? Isso é só problema do Judiciário, do Ministério Público, cujos quadros V. Exª tanto honrou e dignificou? Não! Isso aí é problema do povo brasileiro. Há uma revolta generalizada. Tem V. Exª a minha solidariedade por abordar o assunto como está fazendo.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Sr. Presidente, deixo de conceder os apartes aos Senadores Mozarildo Cavalcanti e Antonio Carlos Valadares, em virtude de ter-se esgotado o tempo - a não ser que V. Exª abra uma exceção.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) -

Então, concedo o aparte ao nobre Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Serei breve, Senador Demóstenes Torres, mas não poderia, como médico, ficar apenas ouvindo o pronunciamento importante que V. Exª faz, principalmente quando vemos o dinheiro da saúde sendo saqueado. Dinheiro esse que deveria ser aplicado exatamente na atenção ao paciente, ao doente, mas que estava enchendo os bolsos de pessoas inescrupulosas. Isso, não apenas no caso dos chamados “vampiros”, mas também das ONGs que tratam da saúde dos índios. Funcionários do Ministério da Saúde montam ONGs picaretas para tirar dinheiro da saúde que deveria dar assistência aos índios. Portanto, sugiro que façamos aqui uma CPI da saúde, para investigar amplamente a questão da aplicação dos recursos dessa área.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Ouço o Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Eminente Senador Demóstenes Torres, V. Exª faz um pronunciamento que, efetivamente, deixa-nos todos preocupados e apreensivos, cada vez mais, porque os recursos da saúde retirados da arrecadação nacional estão sendo desviados, promovendo enriquecimento ilícito de pessoas inescrupulosas que se aproveitam do mal andamento da máquina administrativa para fraudar recursos tão vultosos de mais de R$ 2 bilhões nestes últimos anos, envolvendo o atual Governo e também o Governo de Fernando Henrique Cardoso. Manifesto a V. Exª a minha admiração pelo seu discurso. Espero que todos sejam punidos exemplarmente, que esses fatos não voltem a acontecer, principalmente porque nós vimos a luta do Senado Federal - e não é de agora - e da Câmara dos Deputados para aprovação da Emenda nº 29, que disponibilizava e disponibiliza recursos federais, estaduais e municipais, num verdadeiro mutirão, para salvar a vida do povo. E agora nós estamos vendo isso. Existem várias formas de matar os mais pobres, de matar pessoas desvalidas. Uma delas é nas guerras, como agora está ocorrendo no Iraque, onde pessoas inocentes são trucidadas com bombas, com o terrorismo. Outra forma de matar as pessoas, Senador Demóstenes Torres, é roubando, tirando dinheiro da saúde e deixando de distribuir remédio para a população mais carente. Deixando de atender, de forma eficiente, ao sistema de saúde do Brasil. Agradeço a V. Exª.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Agradeço a V. Exª, Senador Antonio Carlos Valadares. Concedo a palavra ao Senador Antonio Carlos Magalhães, com muita honra.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Como sempre, V. Exª é muito apropriado nas suas colocações. Eu apenas gostaria de dizer que esses auxiliares que já trabalharam em Pernambuco, em Recife, com o Ministro da Saúde, não poderiam ser desconhecidos de S. Exª, de modo nenhum. Conseqüentemente, o Presidente da República só tem uma solução, e creio que sabe qual é. Se não souber, é incompreensível que ainda esteja à frente do Governo, permitindo essas coisas.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Concordo com V. Exª.

O pior, Sr. Presidente, conforme denuncia o jornal O Estado de S. Paulo na edição de hoje, já se sabe da participação na Máfia do Sangue do terceiro homem na hierarquia do Ministério, o Subsecretário para Assuntos Administrativos, Ivan Batista Coelho, responsável pelo setor de compras da Pasta. De acordo com a matéria, Coelho teria deixado vazar informações privilegiadas sobre a aquisição de medicamentos pelo Governo para atender as vítimas das enchentes no Nordeste.

Observem, Srs. Senadores, que esse pessoal age com falta total de escrúpulo e tem um senso de rapinagem que faz corar de vergonha bandidos da qualidade de um Fernando Beira-Mar. Quando era Oposição, o PT, ao fulminar de críticas implacáveis o Governo FHC, passava a idéia de que sabia administrar e de que faria tudo diferente. Está mais do que provado que o Partido dos Trabalhadores não é do ramo da Administração Pública. Outro sofisma que caiu em relação à “petezada” é que eles eram probos até a alma. Além da vocação não ter sido confirmada, o País está espantado com a saliência do pessoal, com o negrume dos sugadores.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de Tancredo Neves a Fernando Henrique Cardoso, o PT foi perseverante e conseguiu convencer a sociedade brasileira de que a mudança era encerrar o ciclo dos doutores e entregar o comando do País a um amador. Definitivamente, não estou me valendo de nenhuma consideração diminutiva da natureza iletrada do Presidente Lula, por quem nutro respeito pela espontaneidade idealista. Muito embora ainda continue acreditando que esse choro desmotivado do Presidente Lula, como ocorreu na solenidade de partida da missão do Exército brasileiro ao Haiti, tenha muita relação com o conteúdo do diário íntimo de Lima Barreto.

Eu particularmente sou convencido, em consideração aos baixos indicadores educacionais do País e à força dos costumes, que o provisionado pode se converter em um grande político, empresário, prestador de serviços ou administrador público. Não é preciso ir lá fora buscar exemplos de bons gestores com a hegemonia cognitiva proporcionada pelo segundo grau incompleto. No Brasil, nada menos do que 7 dos 27 governadores não possuem curso superior, sendo que alguns podem perfeitamente, caso sejam avaliados de acordo com os critérios da Organização das Nações Unidas, ser considerados analfabetos funcionais. Ou seja, têm o domínio de menos de 500 palavras do vocabulário, conseguem até ler, mas não possuem capacidade para entender a mensagem completa de um bilhete de cinco linhas. Mas só há democracia quando tal direito de oportunidade é amplamente assegurado, como ocorre no Brasil. O talento dispensa o diploma, mas, como a sua manifestação é rara, em qualquer nação responsável do mundo, a escola nunca vai deixar de ser a melhor conselheira.

É preciso fazer uma conta de matemática básica para entender que a formação, a especialização, a capacitação e o elemento vocacional para administrar devem ser preponderantes. Já o avesso, apenas uma excepcional exceção. O Governo Lula não consegue executar o Orçamento, socorrer uma emergência, manter os programas tradicionais ou confirmar nenhum tipo de esperança, porque está nas mãos do charlatanismo. Eu tinha a percepção de que o PT arrebanharia parcelas da inteligência brasileira dos centros universitários de pesquisa, para compor um Ministério capaz de substanciar as decisões do Presidente. Natural raciocínio, considerando-se que a simpatia era recíproca. Mas estava enganado. O PT montou um Ministério ad hoc e fez regra a desqualificação dos quadros, como se fosse belo, fagueiro e sustentável mirar o exemplo da figura presidencial.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/2004 - Página 17099