Pronunciamento de Lúcia Vânia em 04/06/2004
Discurso durante a 71ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Transcrição do artigo intitulado "Condutor conduzido", de autoria da jornalista Miriam Leitão, publicado no jornal O Globo.
- Autor
- Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
- Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- Transcrição do artigo intitulado "Condutor conduzido", de autoria da jornalista Miriam Leitão, publicado no jornal O Globo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/06/2004 - Página 17488
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
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- SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), NEGLIGENCIA, AUTORIDADE, GOVERNO FEDERAL, INVASÃO, SEM-TERRA, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO.
A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ocupo hoje esta tribuna para um breve comentário baseado no artigo intitulado “Condutor conduzido”, de autoria da jornalista Miriam Leitão, publicado no jornal O GLOBO, de 10 de abril do corrente.
O referido artigo mostra como o governo Lula “... está se deixando conduzir pelo MST, sendo leniente com o desrespeito à lei, premiando quem afronta sua própria autoridade”. Infelizmente, o atual governo tem se movimentado assim, na base do grito.
Sr. Presidente, para que conste dos Anais do Senado Federal, requeiro que o artigo acima citado seja considerado como parte integrante deste pronunciamento.
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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA LÚCIA VÂNIA EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
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Matéria referida:
“Artigo de O Globo: Condutor conduzido”.
CONDUTOR CONDUZIDO
O GLOBO, 10/04/2004
Panorama Econômico (Miriam Leitão)
Na democracia, o governo tem de ouvir os movimentos sociais. O diálogo entre a sociedade organizada e as autoridades públicas tem de ser constante. Mas o poder constituído não deve permitir o desrespeito à lei, nem se deixar dirigir pelos movimentos sociais. O que está acontecendo pertence à segunda categoria. A tibieza do ministro da Reforma Agrária, a inação do Executivo diante das provocações do MST mostram que o governo está se deixando governar.
O roteiro é sempre o mesmo. Diante de uma provocação do MST, o governo diz que não permitirá desrespeito à Lei. Mas nada se segue a essa frase. É oca, frase feita por algum estrategista de comunicação, não é sincera. O MST aumenta ou diminui os ataques à propriedade privada respeitando apenas o calendário dos líderes, mas não porque o governo demonstre qualquer firmeza.
O que a Constituição estabelece é que não haverá reforma agrária em terras produtivas. O que a medida provisória ainda em vigor acrescenta é que não será desapropriada a terra que for invadida. Com isso, o que a legislação está determinando é que a reforma agrária será feita respeitando a propriedade privada, mas exigindo que quem a possui respeite o princípio, também constitucional, da função social. A MP está estabelecendo que quem manda no ritmo, na forma e no local da ação governamental é apenas o governo.
Com esses dois parâmetros, a reforma agrária será feita de forma pacífica e preservando o princípio da autoridade governamental. Fora dela, é um risco à ordem pública. Nos últimos dias, o MST está escalando a provocação invadindo terra produtiva e destruindo investimento de empresas produtivas e empregadoras. A Veracel teve suas terras invadidas, 21 hectares de plantação derrubados, teve de esperar o movimento aceitar cumprir a ordem judicial e ainda fornecer os ônibus para tirar os manifestantes. Além disso, não está a salvo de novas invasões, até porque o novo lema do movimento é: “o que é produtivo para eles pode não ser para nós”, como disse Jaime Amorim, o coordenador do movimento em Pernambuco. Valmir Assunção, que liderou a ocupação, avisou que a Veracel continua vulnerável a novas invasões, sempre que o movimento achar que o governo não está cumprindo o que prometeu.
O ministro Miguel Rossetto trata tudo isso com candura. Segundo ele, o governo entende que invasão de terra produtiva “é um erro”, porque “a Constituição é clara no sentido de evitar desapropriação de terras produtivas”. Se a Constituição é clara, desrespeitá-la não é apenas um erro, é inconstitucional e ilegal. O ministro Miguel Rossetto fala como se fosse um militante que discorda da orientação do líder. O ministro tem de falar como autoridade pública que cumpre o dever de zelar pelo cumprimento da lei.
Num desafio aberto à autoridade do presidente, o coordenador do movimento na Bahia disse que será feita, sim, “no grito” a reforma agrária. E, pelo visto, tem toda razão porque o governo anunciou que vai desapropriar 24 fazendas para assentar os que invadiram a Veracel e acalmar o MST. Se gritar, o governo cede.
Com atos e palavras assim, o governo está se deixando conduzir pelo movimento, sendo leniente com o desrespeito à lei, premiando quem afronta sua própria autoridade. Neste contexto, o ambiente de investimento fica comprometido. Se o MST decidiu que não vale o que está escrito na Constituição ou que eles mesmos podem fazer a jurisprudência definindo o que é ou não é produtivo, nenhum investimento está protegido, principalmente aqueles que não são feitos para produzir alimentos, como a Veracel, mas que são fundamentais na garantia da balança comercial, no equilíbrio das contas externas e na saúde da economia.
O governo erra no trato desta questão, como tem errado em outras tantas questões em que nega ao país seu papel de árbitro, condutor e líder do processo histórico. O país quer enfrentar as velhas questões que foram deixadas intocadas, como a nossa intolerável desigualdade social, mas quer fazer isso preservando o que foi duramente conquistado: a democracia.