Discurso durante a 72ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Exaltação ao acordo para a adequação do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico do Estado de Rondônia.

Autor
Paulo Elifas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Elifas Paulo da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Exaltação ao acordo para a adequação do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico do Estado de Rondônia.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2004 - Página 17531
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • REGISTRO, ACORDO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ESTADUAL, REFERENCIA, ZONEAMENTO ECOLOGICO-ECONOMICO, COMPATIBILIDADE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CODIGO FLORESTAL.
  • REGISTRO, DETERMINAÇÃO, LEI ESTADUAL, PERCENTAGEM, TERRAS, PROPRIEDADE RURAL, DISPONIBILIDADE, RESERVA FLORESTAL, VARIAÇÃO, QUALIFICAÇÃO, TERRENO, COMPARAÇÃO, LEI FEDERAL, PROVOCAÇÃO, CONFLITO.
  • COMENTARIO, IMPOSSIBILIDADE, PRODUTOR RURAL, REFLORESTAMENTO, PROVOCAÇÃO, EXODO RURAL, SUBSTITUIÇÃO, PEQUENA PROPRIEDADE, AUMENTO, LATIFUNDIO.
  • DISCUSSÃO, SOBERANIA NACIONAL, OCUPAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, BRASILEIROS, NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRODUÇÃO, ALIMENTOS, EMPREGO.
  • DEFESA, ATUAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, FINANCIAMENTO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, RESERVA ECOLOGICA, INCENTIVO, PRODUTOR RURAL, CAMPANHA, EDUCAÇÃO, SOCIEDADE, GOVERNO ESTADUAL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, ADAPTAÇÃO, LEGISLAÇÃO.

O SR. PAULO ELIFAS (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma das principais palavras-chaves na construção da harmonia na convivência entre povos e nações é a cooperação. Cooperar significa contribuir com trabalho e esforço no sentido de se alcançar um objetivo comum.

Pois bem, Srªs e Srs. Senadores, a palavra “cooperação” - e todo o sentimento que a envolve - deu suporte ao acordo assinado, no último dia 2 de junho, entre o Ministério do Meio Ambiente e o Governo do Estado de Rondônia. Por esse acordo, estabelecido entre a Srª Ministra e o Sr. Governador, buscar-se-á, em um trabalho conjunto e cooperativo entre a União e o Estado, fixar as condições necessárias para a compatibilização da legislação estadual referente ao Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico às normas vigentes, em especial à Lei nº 4.771, de 1965, também chamada de Código Florestal, modificada pela Medida Provisória nº 2.166, e ao Decreto nº 4.297, de 10 de julho de 2002.

A falta de sintonia existente, até aqui, entre a legislação estadual relativa ao zoneamento de Rondônia e as leis federais, em especial o Código Florestal, têm a ver, principalmente, com os percentuais de área destinada à manutenção da reserva legal nas propriedades rurais, isto é, o quanto os agricultores têm, por lei, que manter como reserva legal, na limpeza do solo para o plantio.

Pelo Zoneamento Socioeconômico-Ecológico elaborado pelo Governo do Estado, que se transformou na Lei Estadual nº 233, de junho de 2000, Rondônia foi dividida em três zonas e nove subzonas, por meio de critérios técnicos relativos à aptidão de uso do solo e às características ambientais, além de outras informações obtidas por intermédio de amplas discussões com instituições governamentais e privadas e com organismos representativos da sociedade civil rondoniense.

Cada uma dessas zonas e subzonas foi minuciosamente diagnosticada e, para cada uma delas, foram estipulados usos do solo que maximizam os potenciais locais em termos de produção e produtividade. Assim, dependendo da melhor utilização da terra (seja por meio da agropecuária, seja pelo manejo sustentável das florestas estaduais e das chamadas reservas extrativistas ou, ainda, pelo manejo das áreas de uso restrito e controlado pela União, pelo Estado e pelos Municípios, previstas em lei, como as áreas indígenas), a Lei Estadual nº 233 determina percentuais diferenciados de cobertura florestal nas propriedades rurais. Por exemplo, nas áreas de maior potencial para a produção agropecuária, a Lei de Zoneamento estipula que a cobertura florestal de cada propriedade rural, mantida ou recuperada, pode variar entre 20% e 40%.

Ocorre que o Código Florestal, ou a Lei nº 4.771, de 1965, já estipulava, à época da mesma Lei Estadual nº 233, no seu art. 44, que “na região Norte e na parte norte da Região Centro-Oeste, enquanto não for estabelecido o decreto de que trata o artigo 15, a exploração a corte raso só é permissível desde que permaneça, com cobertura arbórea, pelo menos 50% da área de cada propriedade”. Não há, nessa mesma lei federal, qualquer diferenciação espacial no tratamento da Amazônia, como se a região fosse totalmente homogênea, sem qualquer diferença na tipologia florestal, desconsiderando-se, por exemplo, as áreas típicas de cerrado. Portanto, com essa falta de diferenciação sub-regional do Código Florestal, o Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico do Estado de Rondônia já entrava em choque com a lei federal, por exigir, em algumas subáreas, menos que os 50% de permanência da cobertura florestal, apesar de que, em outras subáreas, esse percentual seja maior que o estipulado no Código Florestal.

Para piorar esse choque entre as legislações estadual e federal, a Medida Provisória nº 2.166, de 24 de agosto de 2001, alterou artigos do Código Florestal, especialmente no que diz respeito às exigências de manutenção de cobertura florestal. O art. 16 estipula que “as florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são susceptíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo: I - oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta na Amazônia Legal”.

Nesse caso da medida provisória, abre-se exceção para as áreas de cerrado, na mesma Amazônia Legal, com, no mínimo, 35% de manutenção da reserva. Nesse sentido, o novo texto legal da Medida Provisória nº 2.166 agudiza o desacordo entre as leis estadual e federal.

Ocorre, também, que é exatamente na chamada Subzona 1.1, do Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico de Rondônia, que se adensa a população do interior do Estado. Essa subárea corresponde a 25,75% da extensão geográfica total de Rondônia, com aptidão agrícola das mais consideráveis, com solos de baixa vulnerabilidade, portanto, pouco propensos à erosão, onde se concentra a pequena produção rural, fruto do processo histórico de ocupação de Rondônia.

Como sabem as Srªs e os Srs. Senadores, Rondônia foi objeto de grande atração de pequenos produtores rurais, principalmente na década de 70, por meio dos projetos de assentamento dirigido e dos projetos integrados de colonização, estes em áreas de 100 hectares, que se estenderam ao longo da BR-364, exatamente onde se configura a Subzona 1.1. Os pequenos agricultores de todo o País que se deslocaram para o Estado - talvez como última fronteira para se resolverem os focos da tensão social que pipocavam nas mais diferentes regiões brasileiras - tinham permissão para desmatar metade de suas glebas para o plantio, principalmente de arroz, feijão, milho e, posteriormente, café e cacau. Nessa subzona, segundo o último censo agropecuário, dois terços das propriedades rurais estão nos estratos de área abaixo dos 100 hectares.

Nesse sentido, a legislação federal, além de contrastar com a legislação estadual, embutida no Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico, vai de encontro ao próprio processo histórico de ocupação de Rondônia, cujo resultado, em termos da ocupação produtiva da terra, é amplamente reconhecido. Os projetos de colonização de Rondônia são o exemplo mais que evidente do sucesso de uma reforma agrária que, ao contrário de gerar conflitos, resolveu tensões pela posse da terra de outras regiões do País, além de criar empregos, que, já naquela época, minguavam nas outras regiões brasileiras.

Mas essa realidade, tão bem captada no diagnóstico que deu suporte ao Zoneamento de Rondônia, não impediu o embargo, por ação judicial, da lei estadual, por estar em contradição com o Código Florestal e com a Medida Provisória nº 2.166, que o reformulou. A tribuna do Congresso Nacional, durante todo esse período, foi palco de manifestações dos Parlamentares, principalmente os do Estado de Rondônia. O reclamo da população rondoniense ocupou todas as discussões no nosso Estado durante todos esses anos. Os agricultores, por não terem o documento de averbação da sua reserva legal, não podiam obter créditos de bancos oficiais porque não cumpriam o que determina a lei e passaram a viver numa espécie de ilegalidade, porque não dispunham de documentos hábeis para se beneficiarem dos programas federais de incentivo à produção e à produtividade agrícola.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não se quer, evidentemente, descartar a importância da floresta. Não há, e nem é esse o desejo, qualquer confronto com as teses ambientalistas, seja do Ministério do Meio Ambiente, seja das organizações não-governamentais, em defesa do meio ambiente. Até porque, se fossem consideradas todas as áreas de zoneamento de Rondônia, 68,7% do total manter-se-iam intactas ainda sob o título de vegetação preservada. O Estado de Rondônia, portanto, apesar de tamanha migração e do conseqüente crescimento explosivo da sua população, manteria, após a realização total do projeto, mais de dois terços de sua vegetação intacta. Poder-se-ia dizer que o choque maior entre as legislações federal e a estadual está no fato de que, enquanto a primeira diz respeito às áreas das propriedades rurais, a segunda trata de zonas definidas por critérios de homogeneidade, numa visão de planejamento de curto, médio e longo prazos. A lei federal tem uma incidência micro de propriedade rural, enquanto a lei estadual tem uma concepção mais macro de áreas geográficas homogêneas.

O propósito maior é o de sanar um problema que surgiu alheio à vontade dos produtores rurais, principalmente os de pequeno porte. É que eles não possuem condições concretas de recuperar, por conta própria, o que foi desmatado, muitas vezes sem o devido conhecimento legal. O reflorestamento de parte da propriedade fere de morte os pequenos agricultores, inviabilizando a produção e, conseqüentemente, a renda. Esses agricultores ocupam exatamente a zona 1, ao longo da BR-364. Essa resolução, fatalmente, fará com que tenhamos em Rondônia o êxodo rural, em que as pequenas propriedades serão substituídas por grandes latifúndios, como já está ocorrendo.

A assinatura do acordo, mesmo que indiretamente, pode fortalecer teses no sentido da defesa da soberania nacional. Os interesses enraizados na discussão da preservação da Amazônia são sabidamente muito antigos e ambíguos. Por isso, estou ciente de que se trata de uma questão polêmica. Há quem afirme - e o Congresso Nacional já instituiu até mesmo uma Comissão Parlamentar de Inquérito para estudar o assunto - que há em Rondônia e na Amazônia interesses nem sempre confessáveis que ferem a nossa soberania na defesa de organizações não-governamentais do meio ambiente amazônico. Tudo isso porque a floresta esconde riquezas incalculáveis, principalmente para a medicina do futuro e para a tecnologia de ponta que ainda necessitará, por muito tempo, dos recursos minerais abundantes no solo amazônico.

Há pouco tempo, a título de exemplo, circulou pelas mãos de Parlamentares deste Congresso cópia de uma ata de reunião, realizada em Berna, na Suíça, de um tal “Conselho Mundial das Igrejas Cristãs” que, dentre outras orientações aos seus “missionários” enviados para a Amazônia, preconizava que “o meio ambiente dessa região (a Amazônia), que, pretensamente, pertence ao Brasil, deve ser mantido no seu estágio atual, e os índios que lá habitam devem permanecer em estágio de letargia, para que eles preservem a Amazônia para os povos europeus do futuro”.

Ora, Srªs e Srs. Senadores, a soberania nacional somente será respeitada se a Amazônia for ocupada pelos brasileiros, que lá habitam e trabalham. É neste contexto que emergiu um novo conceito-chave nas discussões das melhores teses para a ocupação da Amazônia, sem ferir o meio ambiente: o desenvolvimento sustentável. Por ele é possível preservar a soberania nacional da Amazônia, produzindo os alimentos e os empregos que o País tanto necessita, sem destruir o meio ambiente. E é exatamente este o objetivo do Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico de Rondônia, incluído no texto da Lei nº 233, art. 2º: “O Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico de Rondônia, doravante chamado ZSEE, constitui-se no principal instrumento de planejamento da ocupação e controle de utilização dos recursos naturais do Estado”. Mais ainda, no art. 3º: “O ZSEE tem por objetivo orientar a implementação de medidas e elevação do padrão socioeconômico das populações, por meio de ações que levem em conta as potencialidades, as restrições de uso e a proteção dos recursos naturais, permitindo que se realize o pleno desenvolvimento das funções sociais e do bem-estar de todos, de forma sustentável”. Com esse objetivo, não há como se imaginar, como parece óbvio, que haveria outro intuito da lei, a não ser o de produzir, utilizando-se dos recursos naturais do Estado, mas sem ferir de morte o meio ambiente. O desenvolvimento planejado e sustentável, portanto.

O acordo, assinado na última semana, visa, exatamente, a compatibilizar as leis estadual e federal, estipulando obrigações de ambas as partes. Caberá à União, entre outras ações, o apoio técnico e financeiro ao Estado, para equipar-se institucionalmente e para implantar programas de Recuperação de Reserva Legal e de Preservação Permanente, além de incentivos aos produtores e de campanhas educativas junto às organizações da sociedade civil.

Ao Governo do Estado de Rondônia, além de estruturar órgãos ambientais e fortalecer o Conselho Estadual de Política Ambiental - Consepa, bem como outros procedimentos que visem a defesa do meio ambiente, cabe, também, adequar a sua legislação aos ditames das leis federais, por meio, principalmente, da exclusão de parágrafos que permitem percentuais de reserva legal inferiores a 80%. Deverá ser incluído, também na lei estadual, um parágrafo no sentido de que “para fins de recomposição florestal da reserva legal, deve-se averbar, observando o mínimo de 50% da propriedade, excluídas, em qualquer caso, as áreas de preservação permanente, os ecótonos, os sítios ecossistemas especialmente protegidos, os locais de expressiva biodiversidade e os corredores ecológicos”, o que é permitido na Medida Provisória 2.166, § 5º, inciso I, que tem esse mesmo teor. Os agricultores rondonienses terão um prazo de até 30 anos para recompor tal reserva legal, com plantio de um décimo a cada três anos da área total necessária à complementação devida.

Portanto, Srªs e Srs. Senadores, para o mundo rural rondoniense, para o povo e os agricultores de Rondônia o acordo significa um avanço e uma trégua importantes. Eu diria, neste momento, principalmente ao povo do meu Estado, que o acordo não pode ficar aí, como definitivo, e sim como uma pequena vitória, pois restaura a posse da terra em 30%, mas precisamos de mais. Por conseguinte, continuaremos a luta para que o Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico seja aceito na sua plenitude, para que se faça justiça ao povo de Rondônia. Queremos que a Ministra do Governo nos mande plantar “batatas” e não florestas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2004 - Página 17531