Discurso durante a 72ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação sobre o futuro da Fundação Nacional do Índio - Funai, que está sendo questionada em sua atuação.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Preocupação sobre o futuro da Fundação Nacional do Índio - Funai, que está sendo questionada em sua atuação.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2004 - Página 17567
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DENUNCIA, ATUAÇÃO, QUADRILHA, CONTROLE, POLITICO, EMPRESARIO, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, GARIMPAGEM, MANIPULAÇÃO, INDIO, LOBBY, PRESERVAÇÃO, AREA, REGISTRO, DEPOIMENTO, EX PRESIDENTE, IMPOSSIBILIDADE, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, CORRUPÇÃO.
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, DETALHAMENTO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho hoje a esta tribuna para manifestar minha preocupação sobre o futuro da Fundação Nacional do Índio - Funai, que está sendo questionada em sua atuação.

Em setembro de 2003, o ex-Presidente da Funai, Sr. Eduardo Almeida, em depoimento público na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados, denunciou a existência de máfias atuando em vários níveis da instituição.

A denúncia é grave, porque, segundo o autor, as quadrilhas existentes no interior do órgão são controladas por políticos e empresários ligados ao setor de exploração de madeira e ao garimpo, e contam com a ajuda de alguns índios.

Segundo o denunciante, a cadeia de irregularidades começa com os índios que agem junto à Funai para garantir a preservação das áreas desejadas pelos políticos e pelos empresários. Ele afirma que as pressões são fortes por parte dos indígenas sobre a Funai.

Comentando sobre os índios, diz que são totalmente manipulados pelas conveniências econômicas em jogo. São induzidos ao consumo do álcool, de drogas e de alguns trocados para garantir as áreas desejadas pelos criminosos. O objetivo principal é assegurar a manutenção das reservas minerais para futura exploração por parte de grupos econômicos poderosos e políticos influentes na região.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, denúncias sobre a existência de máfia na Funai datam de muito tempo.

Em março de 1996, por exemplo, em entrevista à imprensa, o ex-Deputado Federal Márcio Santilli, que ocupava na época a Presidência da entidade, divulgou que um dos motivos de sua saída da Funai referia-se exatamente à falta de apoio que havia encontrado para combater a máfia existente no interior do órgão. Segundo ele, pessoas influentes dominavam a área administrativa do órgão, desvirtuavam seus objetivos e mantinham relações de cobrança e poder de pressão sobre um conjunto importante de indigenistas.

Em meados de 1999, na Comissão Parlamentar de Inquérito da Funai, na Câmara dos Deputados, foram levantadas inúmeras denúncias de corrupção, malversação de recursos, tráfico de influência e envolvimento nebuloso da entidade com fazendeiros e garimpeiros. Os maiores problemas encontrados pela CPI referiam-se exatamente a invasões de terras indígenas e tentativas irregulares de exploração econômica dessas terras por fazendeiros, posseiros, madeireiros e garimpeiros.

Diante de tantos problemas encontrados e de tantas irregularidades apresentadas aos parlamentares, o relator da CPI, o então Deputado Federal Antonio Feijão (PSDB-AP), recomendou, em seu relatório, que o ideal seria colocar a Funai sob a tutela de um conselho pluriétnico, formado com representantes das etnias mais representativas da comunidade indígena e por um conselho pluriministerial, formado pelos Ministérios da Justiça, da Educação, da Saúde, do Planejamento e da Fazenda.

Nos últimos meses do ano 2000, a Funai estava, outra vez, sendo alvo de graves denúncias veiculadas por importantes canais da mídia nacional. Naquele ano, a título de exemplo, o jornal O Estado de S. Paulo, denunciou que havia forte suspeita do envolvimento de funcionários do órgão com madeireiros e índios em derrubada e contrabando de madeiras nobres. De acordo com a matéria, a Polícia Federal iria abrir inquérito para apurar o envolvimento de madeireiros e funcionários da Funai em um incidente ocorrido em São Félix do Araguaia, quando 39 funcionários do Governo foram retidos na Aldeia Puicararanga pelos índios caiapós. Segundo as autoridades policiais, esse grupo de funcionários estava em missão que visava impedir a retirada ilegal de madeira daquela área indígena.

Em 2001, cinco funcionários da Funai e um do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Renováveis - Ibama, de Rondônia foram acusados de comandar uma eficiente máfia de extração de diamantes, na chamada reserva Roosevelt, pertencente aos índios cintas-largas. Essa ocorrência consta dos documentos reservados da Polícia Federal e foi divulgada pelo jornal O Globo, em 29 de novembro de 2001.

Segundo a mesma matéria, os acusados estavam, inclusive, sendo responsabilizados por pelo menos dez casos de tortura e quatro assassinatos. A Polícia Federal declarou que os meliantes cobravam entre R$10 mil e R$18 mil para permitir a entrada de máquinas de extração de diamantes na reserva. Feito o primeiro pagamento, logo que vencesse o prazo de 30 dias estipulado para a exploração, os que quisessem permanecer na área teriam de pagar nova taxa. A mesma fonte assinalou que cerca de 30% dos lucros obtidos na área eram destinados ao suborno dos caciques.

Em janeiro de 2002, agentes da Polícia Federal conseguiram prender em Cuiabá, o fiscal da Funai Sérgio Toledo Santana, sob a acusação de chefiar a máfia responsável pela extração ilegal de diamantes na reserva Roosevelt. Outros dois funcionários do mesmo órgão, Darcylio Ramos Moura e Claudionor Duarte, também foram presos, mas foram logo liberados pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília.

Segundo a Polícia Federal, a máfia de Roosevelt conta com o apoio de maus funcionários da Funai, de empresários delinqüentes, de políticos devassos, de caciques corruptos e de uma empresa multinacional de origem canadense. Cerca de dois mil garimpeiros atuavam na reserva, dilapidando o patrimônio nacional e sofrendo toda sorte de ameaças por parte dos marginais que controlam todas as saídas e entradas na reserva.

No início de 2003, a imprensa divulgou a instauração do inquérito n° 04423, da PF, para apurar supostas fraudes financeiras existentes na Funai. No referido inquérito, estão envolvidos como réus os Senhores Sant’Clair Pitangui Versiani e o programador de computadores da administração central da Funai, Paulo Marcos Vasconcelos. Os dois são acusados de improbidade administrativa, por serem apontados como causadores de um prejuízo da ordem de R$340 mil aos cofres da Funai.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lamentavelmente é essa a história que temos para contar sobre a atuação da Funai nesses últimos sete anos. Criada há 39 anos para amparar e desenvolver políticas direcionadas às 215 etnias do País, infelizmente, a Funai foi desviada dos seus princípios nobres e virou um foco de corrupção, de incompetência e de ineficiência.

A mostra de sua instabilidade é patente, quando verificamos que o órgão já teve mais de 27 presidentes. Vale ressaltar que quase todas as suas administrações pecaram pela ineficácia, tanto na gestão externa quanto na gestão administrativa.

Há três anos, por exemplo, o órgão tinha cerca de 5 mil funcionários e centenas de cargos comissionados. Ao que nos parece, era muito mais um cabide de empregos do que uma entidade voltada para a defesa dos 325 mil índios existentes no País, que falam 175 línguas diferentes e que ocupam 561 áreas, o equivalente a 11% do território nacional.

Logo se observa que os fatos recentes, envolvendo garimpeiros e indígenas, que resultaram no massacre da Reserva Roosevelt foram delineados ao longo dos últimos anos.

Eminentes Srªs e Srs. Senadores, no final deste pronunciamento, eu gostaria de lançar um desafio ao Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dizendo que é preciso salvar a Funai, saneá-la, livrá-la da ação dos predadores e dos administradores incompetentes, expulsar os marginais e destinar as verbas necessárias para que ela possa realmente cumprir a sua verdadeira missão.

Finalizo meu discurso reproduzindo palavras do ambientalista e jornalista Washington Novaes, que encerra uma de suas entrevistas dizendo o seguinte: “Resta torcer para que os velhos sábios xinguanos - como Malakuyawá, Paru, Prepuri e tantos outros -, lá na aldeia dos ancestrais, onde se encontram, conversem com seus amigos, os irmãos Villas Boas e, juntos, consigam abrir os nossos olhos e influenciar os nossos rumos.”

            Era o que eu tinha a dizer!

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2004 - Página 17567