Discurso durante a 81ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Debate sobre o salário mínimo. Paralisia do governo Lula no que tange à execução orçamentária. Adoção de critério eminentemente político para a liberação de recursos às emendas de parlamentares ao Orçamento.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. ORÇAMENTO.:
  • Debate sobre o salário mínimo. Paralisia do governo Lula no que tange à execução orçamentária. Adoção de critério eminentemente político para a liberação de recursos às emendas de parlamentares ao Orçamento.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2004 - Página 18081
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. ORÇAMENTO.
Indexação
  • CONCLAMAÇÃO, DEBATE, VOTAÇÃO, SALARIO MINIMO, CRITICA, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, REPUDIO, TENTATIVA, MANIPULAÇÃO, VOTO, CRIAÇÃO, CARTA, DOCUMENTO, PROMESSA, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL.
  • PROTESTO, INFERIORIDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, PARALISIA, GOVERNO FEDERAL, REGISTRO, DADOS, FALTA, INVESTIMENTO PUBLICO, DETALHAMENTO, INVESTIMENTO, MINISTERIO.
  • DENUNCIA, LIBERAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, EMENDA, CONGRESSISTA, CRITERIOS, POLITICA PARTIDARIA, MANIPULAÇÃO, VOTAÇÃO, SALARIO MINIMO, CAMARA DOS DEPUTADOS, DESRESPEITO, LEGISLATIVO.
  • DEFESA, EXTINÇÃO, EMENDA, ORÇAMENTO, AUTORIA, ORADOR, REPASSE, VALOR, RECURSOS, DEPUTADO FEDERAL, MELHORIA, ATENDIMENTO, PREFEITURA, ENTIDADE, ASSISTENCIA SOCIAL, JUSTIÇA, CRITERIOS.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, teremos tempo nesta semana para o debate da proposta do Governo que oferece aos trabalhadores do País um salário mínimo deplorável. Esse não será o tema do pronunciamento de hoje, mas quero destacar que já se prevê o exercício da criatividade no terreno da esperteza governamental, a utilização daquela arquitetura da esperteza, com a oferta do pretexto que pode aplacar algumas consciências, mudando o voto a favor do Governo. Fala-se na idealização da CIP -- Carta de Intenção Paralela. De paralelismos, já cansamos. O que é paralelo me parece não ser sincero. Verificamos isso na reforma da Previdência, quando aqui se apresentou a chamada PEC paralela, que até hoje continua na Câmara dos Deputados à espera de definição.

O debate do salário mínimo exige, no mínimo, sinceridade. Quem quiser votar com o Governo que vote e assuma as conseqüências. Não venham outra vez com a estratégia da dissimulação, não compareçam a esta Casa, mais uma vez, elegendo a hipocrisia como caminho a percorrer. É preciso que todos assumamos nossa responsabilidade diante de tema de transcendental importância, principalmente para os trabalhadores.

Vamos deixar de lado essa história de carta de intenção paralela. Isso não aplaca consciência de ninguém. Vamos votar o que é real. Há duas propostas: a do Governo e a outra que estabelece o salário de R$275,00, assinada pelos partidos oposicionistas. Há também evidentemente propostas outras como a do Senador Paulo Paim e as de tantos outros nesta Casa. Vamos, portanto, deliberar em função daquilo que é real. Carta de intenção, lamentavelmente, não pode de forma alguma conduzir, sem sombra de dúvida, o nosso voto nesta Casa.

Concedo, com prazer, um aparte ao Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Alvaro Dias, cumprimento V. Exª. Quero dizer que foi feito um acordo informal: vamos debater o salário mínimo na segunda e na terça e votá-lo na quarta-feira. V. Exª está sendo muito feliz. Eu, particularmente, não quero acreditar que esse ou aquele Senador vá viajar para a Suíça, para a Espanha, para Portugal ou para onde quer que seja para não votar. Não acredito nisso. Também, como me disse alguém, não sou uma criança que ainda chupa bico, ou coisa parecida, para acreditar em uma carta segundo a qual, no futuro, será investido mais no campo social. Claro que não. Por isso quero cumprimentar V. Exª, que está cumprindo o acordo e trazendo o assunto para o debate. Quem for a favor dos R$260,00 deve vir aqui e fazer o bom debate e quem quiser algo a mais, inclusive para os aposentados e pensionistas, que se posicione. Faço este aparte porque me lembro de que V. Exª, no passado, quando fazia parte da base do Governo Fernando Henrique Cardoso, votou contra o salário mínimo estipulado à época e, graças a votos como esse, construímos naquele momento uma alternativa. Por isso cumprimento V. Exª.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Paulo Paim.

Nós, que chegamos ao Senado da República, não temos o direito de acreditar em Papai Noel, e quem não acredita em Papai Noel não acredita também nessa Carta de Intenção Paralela. Se não podemos acreditar nem mesmo no Orçamento, como vamos acreditar nessa CIP? Aqui está a execução orçamentária, tema que vou abordar hoje, Sr. Presidente e Srs. Senadores.

O Governo é uma espécie de mastodonte empacado, caminha, às vezes, com muita lentidão e está, lamentavelmente, acometido de uma grave doença: paralisia. É uma maldade para com os destinos do País quando a doença da paralisia acomete o Governo. Em cinco meses de execução orçamentária, o Governo alcança apenas 2,90% do total autorizado para investimentos no País. O total previsto no Orçamento é de R$12.481.537.588,00. Desse total, apenas R$362.468.756,00 foram aplicados pelo Governo em 5 meses. Se tivermos mais de doze bilhões para o ano, teríamos mais de um bilhão por mês e, conseqüentemente, mais de cinco bilhões em cinco meses. No entanto, o Governo aplicou apenas R$362.468.756,00. Portanto, está muito aquém da execução orçamentária necessária para atender os compromissos que assumiu. Se o Governo não cumpre sequer o que se comprometeu a executar, como podemos acreditar que o Governo cumpriria a tal Carta de Intenção Paralela?

Desses doze bilhões, o Ministério da Educação, por exemplo, investiu apenas 0,08%. Antes dos números, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de indagar: como pode o País se desenvolver quando o Governo, que é inegavelmente o artífice principal do desenvolvimento, está sem criatividade, imaginação, sem ação, sem capacidade de gerenciamento, sem competência para aplicar os recursos orçamentários? Como pode o País se desenvolver quando o Governo está empacado, não deslancha, não promove as ações administrativas necessárias para motivar o crescimento econômico do País, se é ele quem tem os principais instrumentos para alavancar o desenvolvimento, não apenas poderosas empresas estatais, agentes financeiros como o BNDES, que tem um orçamento maior que o BID, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, mas também um gigantesco orçamento? Evidentemente, nenhuma empresa tem um orçamento que possa se comparar ao Orçamento do Poder Executivo Federal. Se quem tem esses instrumentos não os aciona com competência, como podemos esperar desenvolvimento econômico no patamar exigido pela sociedade brasileira?

O Ministério da Educação - repito - investiu apenas 0,08%. Não seria a educação importante para o desenvolvimento de um país? Como pode se admitir que o Governo aplique apenas 0,08% do que está destinado para a educação? O Ministério das Cidades investiu apenas 0,84% do montante autorizado para o ano. Esse Ministério não é importante? Ele não trata, por exemplo, da política habitacional? Há política habitacional no País? Lamentavelmente, com esse nível de investimento, nada se pode esperar.

O Ministério dos Transportes investiu apenas 0,27% do orçamento autorizado. Seria de se imaginar que as nossas estradas são maravilhosas, que estão trafegáveis de ponta a ponta. Mas, ao contrário, as nossas estradas são lamentavelmente não diria um caso de polícia, mas um escândalo. As nossas estradas se constituem um verdadeiro escândalo. Nem mesmo os recursos da Cide, imposto criado para a recuperação das estradas, têm sido aplicados com esse objetivo. Ao contrário, são desviados para pagamento de pessoal e para acumular o chamado superávit primário, exigência do Fundo Monetário Internacional.

O Ministério das Minas e Energia, que cuida de setor fundamental para o futuro do País, investiu apenas 0,4% do autorizado. O Ministério da Ciência e Tecnologia investiu apenas 1,69% do montante autorizado e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, apenas 0,1%.

Certamente aparecerão as Lideranças do Governo para afirmar que o Governo Lula colheu uma safra recorde. Há poucos dias, sugeri aos agricultores brasileiros, diante dessa afirmativa do Líder do Governo, que tirassem férias, porque não dependeríamos mais do seu trabalho. Os agricultores poderiam ficar em casa. Já que o Governo Lula plantava e colhia, eles não necessitariam trabalhar. Agora, vejo que o Ministério da Agricultura aplicou apenas 0,21%.

É preciso ser franco e honesto. A agricultura brasileira vai bem por obra e graça dos competentes produtores rurais do nosso País, que evoluíram, agregaram valores tecnológicos e podem competir em igualdade de condições com grandes nações do mundo, embora em terrível desvantagem no que diz respeito à proteção governamental. Enquanto países da Europa e os Estados Unidos aplicam US$1 bilhão por dia de subsídio à agricultura, no Brasil nada aplicamos e ainda estamos em desvantagem no momento da comercialização, em função da política de protecionismo adotada pelas grandes nações. E o Ministério da Agricultura aplica esta fábula de 0,21% do orçamento!

O Ministério da Cultura aplica 0,83%. É por isso que o Ministro Gilberto Gil, que nós admiramos como artista, precisa continuar artista, porque Ministro não pode ser. É evidente que se o Presidente da República o escolheu, não foi para que gerenciasse a cultura no País. Provavelmente o Presidente sabia da inaptidão para esse tipo de tarefa. O Ministro Gilberto Gil deveria ter uma assessoria tecnicamente competente para gerenciar a aplicação dos recursos e desenvolver programas culturais que significassem avanço, num governo que veio para promover o avanço. Resta ao Ministro Gilberto Gil continuar dando canja aqui, ali, acolá, em nome do Ministério da Cultura, porque certamente não teremos um programa de cultura à altura do renome artístico do atual Ministro.

O Ministério dos Esportes aplicou 0,01%, ou seja, muito próximo de zero; o Ministério do Turismo, 0,38%, pouco mais do que aplicou o Ministério dos Esportes; o Ministério da Integração Regional, 0,33%, apesar das enchentes que sacudiram o Norte e o Nordeste do País; o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, 0,77%; o Ministério da Justiça, 2,09%; e o Fundo Nacional de Segurança Pública investiu zero. É porque o nosso País vive no “paraíso” em matéria de segurança pública. Não há violência. A população está tranqüila nos seus lares, pois não é atormentada pelo crime organizado, pelo narcotráfico, pela violência que campeia solta nos campos e nas cidades do nosso País. Por isso, o Fundo Nacional de Segurança Pública investiu 0% do orçamento em cinco meses.

O Ministério das Relações Exteriores, sim, investiu 10,32%, talvez em face das viagens do Presidente da República. Se este Ministério continuar investindo desta forma, o orçamento será insuficiente, porque de 5% que deveria ter investido em cinco meses, investiu 10,32%, o dobro, portanto, do que deveria ter investido, para atender provavelmente aos compromissos do Presidente da República no exterior.

O Ministério da Previdência Social investiu 0,24% e o INSS, 0%. Entretanto, as filas aumentam a cada dia às portas do INSS, são famílias pobres atormentadas pelas doenças, desamparadas, desassistidas completamente, e o INSS investiu 0% até o último 04 de junho.

Sr. Presidente, no dia da votação do salário mínimo na Câmara dos Deputados, no entanto, o Governo foi generoso, competente, conseguiu mudar o seu desempenho: liberou R$100 milhões para atender emendas individuais de Parlamentares da Base aliada, para garantir aprovação da proposta do Governo de R$260,00 para o salário mínimo. Desse total, R$59,4 milhões foram para os aliados e 39,7 milhões atenderam emendas da Oposição.

Aliás, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo Lula favorece de forma ostensiva os aliados na liberação de emendas parlamentares. Creio que esta Casa deveria adotar uma posição rigorosa em relação a esse assunto. Não se trata de uma ofensa ao Parlamentar, que gera uma expectativa ao inserir no orçamento recurso para determinada obra e, depois, tem a frustração em ver os recursos não serem liberados.

Essas emendas parlamentares se constituem, quase sempre, em moeda de troca do Governo. Ele as utiliza em um momento de obter apoio para suas propostas que encontram dificuldades de aprovação no Congresso Nacional. O Governo não as libera como rotina; não adota qualquer critério para a liberação desses recursos.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, segundo a Comissão de Orçamento, até o final de maio, os Partidos da base do Governo tiveram, em média, 28% do valor de suas emendas empenhadas pelo Poder Executivo. Enquanto isso, os Partidos de Oposição receberam menos de 2% do previsto.

Isso é uma violência ao Poder Legislativo. O Governo não tem o direito de estabelecer duas categorias de Parlamentares: Parlamentares de primeira classe e Parlamentares de segunda classe. O Governo libera as emendas parlamentares para os integrantes da base aliada e nega a liberação para os da Oposição, fazendo configurar, dessa forma, duas categorias de Parlamentares no País.

Sr. Presidente, não estou fazendo reivindicação de cunho pessoal, mas cito o meu caso como exemplo. No ano de 2004, apenas cinco emendas de minha autoria foram liberadas, sendo que três delas pela metade; e, das emendas de Bancada, apenas uma. No ano passado, eu tive algumas emendas liberadas. Ao redor de 15% das emendas de minha autoria foram liberadas no ano passado. São emendas importantes, porque particularmente não faço política com emendas orçamentárias. Subscrevi uma emenda em prol do Pequeno Cotolengo do Paraná e outra a favor da Escola de Educação Especial Vivian Marçal, ambos centros de atendimento à pessoa portadora de deficiência física, mas não foram liberadas. Tive a oportunidade de visitar o Hospital Regional João de Freitas, na cidade de Arapongas, e verifiquei o drama vivido por pessoas humildes, jogadas em filas, que perdem a vida por falta de oportunidades de atendimento. Não são liberados recursos nem para as emendas destinadas às santas casas, que correm o risco de fechar - algumas até já o fizeram.

Não há justificativa para a não liberação de emendas dessa natureza. Por essa razão, tenho defendido o fim das emendas parlamentares, pelo menos no que diz respeito ao Senado. Devemos repassar o valor dos recursos destinados às emendas orçamentárias de Senadores aos Deputados Federais, para que eles possam, exercendo o seu mandato, oferecê-las em atendimento às prefeituras municipais e às entidades de assistência social, pois geramos expectativas com recursos escassos - são apenas R$2 milhões por ano -, depois verificamos que o dinheiro não é liberado. Não há critério de planejamento nem de projeto; e não há critérios da relação custo-benefício do investimento. O que se verifica é que o Governo as usa realmente como moeda de troca.

O PT foi contemplado com R$48,6 milhões neste início de ano. A segunda legenda do ranking, o PTB, teve 36,2% de suas emendas atendidas. O PT desponta com o maior valor de empenho - R$ 48,6 milhões. A segunda legenda, que teve 34,24%, é a do PCdoB, o pequeno Partido do Ministro Aldo Rebelo. A explicação do Ministro da Articulação Política é estranha. Diz S. Exª: “Os Ministros são orientados a atender às emendas de Oposição, mas têm autonomia para escolher a quais propostas atender, de acordo com suas prioridades”. A prioridade é do Ministro? Que critério há para se estabelecer a prioridade? O critério é político? O critério é o voto a favor do Governo no Congresso Nacional? A tentativa de fazer o raciocínio de que as propostas dos aliados abrigam sintonia fina com as diretrizes dos Ministérios e, por isso, estão sendo acolhidas em maior escala, é inaceitável.

Creio que seria oportuno que a Presidência desta Casa do Congresso Nacional fosse ao Presidente da República lavrar o protesto da instituição, porque esse tipo de relação caminha para a promiscuidade política, já que o critério para liberação de recursos é de quem “apóia” e não de quem escolhe o melhor projeto, não de quem escolhe a melhor causa para o investimento público.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apenas para concluir, quero dizer que o atendimento de emendas pertencentes ao PCdoB foi de 96%; PTB, de 89%; PT, de 95%. Portanto, isso é uma vergonha, isso é um acinte, isso não é democrático, isso não é sequer civilizado. Entre os Partidos de Oposição, o quadro é o seguinte: PFL, 2,26%; PSDB, 1,88%; e PDT, 1,08%. Portanto, enquanto o PC do B tem 96%, o PSDB tem 1,88%. Enquanto o PT tem 95%, o PDT tem 1,08%. Sr. Presidente, isso compromete a imagem de lisura de qualquer Governo. Portanto, em matéria de lisura o Governo Lula está absolutamente comprometido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2004 - Página 18081