Pronunciamento de Hélio Costa em 15/06/2004
Discurso durante a 82ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Transcurso dos 40 anos da cassação do mandato de senador do ex-presidente Juscelino Kubitschek. (como Líder)
- Autor
- Hélio Costa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
- Nome completo: Hélio Calixto da Costa
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Transcurso dos 40 anos da cassação do mandato de senador do ex-presidente Juscelino Kubitschek. (como Líder)
- Aparteantes
- Eduardo Azeredo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 16/06/2004 - Página 18252
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- COMENTARIO, ANIVERSARIO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, JUSCELINO KUBITSCHEK, EX SENADOR, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, EPOCA, DITADURA, REGIME MILITAR, ELOGIO, VIDA PUBLICA, ATUAÇÃO, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.
O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os acreanos têm muito o que comemorar nos 42 anos em que passaram de Território para Estado. Vejo isso nas palavras do Senador Sibá Machado, do Senador Geraldo Mesquita e, evidentemente, nas palavras do Senador Tião Viana e do Governador Jorge Viana. Enquanto isso, nós mineiros, lamentavelmente, lembramos o 40º aniversário, na segunda semana de junho, da cassação do ex-Presidente Juscelino Kubitschek. É uma data que lamentamos historicamente, mas temos de relembrá-la. O ex-Presidente Juscelino Kubitschek, na época Senador pelo Estado de Goiás, representava as esperanças de milhões de brasileiros e, certamente, dos mineiros, que acreditavam no seu programa de governo. Juscelino pretendia candidatar-se à Presidência da República em 1965 para continuar sua meta de progresso e de desenvolvimento, como fez nos cinco anos em que governou o País.
Na verdade, Sr. Presidente, Juscelino não foi apenas um político extraordinário, de rara habilidade e de raro descortino. Foi, sobretudo, o estadista que, ao modernizar o País, ao remover as estruturas arcaicas de nossa organização social, soube desbravar novos caminhos e contagiar o povo com o seu otimismo, com sua persistência e com seu entusiasmo. Ao lado dessas qualidades, tinha a capacidade de conviver fraternalmente com correligionários e com adversários políticos, sem descuidar-se de suas mais arraigadas convicções. Assim, é natural que sua cassação e, alguns anos mais tarde, sua morte fossem lamentadas por brasileiros de todos os quadrantes, por homens públicos de todos os matizes ideológicos, por toda a sociedade, por todos aqueles que se lembram do Presidente Juscelino Kubitschek, por todos aqueles que viram o progresso chegar aos mais longínquos pontos do território nacional por meio da mão desse mineiro que cumpriu uma trajetória extraordinária, brilhante, na política brasileira.
Juscelino foi Deputado federal, chefe de gabinete do Governador, Prefeito da capital mineira, Governador de Minas, Presidente da República e Senador pelo Estado de Goiás.
Com Juscelino, o País ganhou 18 mil quilômetros de novas rodovias, além de usinas hidrelétricas como Furnas e Três Marias. O economista Francisco Luiz Lopreato, ouvido pelo jornal Correio Braziliense na comemoração do centenário de nascimento de Juscelino, foi enfático ao dizer:
O investimento no setor de infra-estrutura foi fundamental, pois o Brasil, naquela época, carecia muito de obras no setor energético para se tornar um país industrializado.
Por sua vez, a pesquisadora Alzira Abreu, da Fundação Getúlio Vargas, ouvida pelo mesmo periódico, Correio Braziliense, salientou que “apesar de tomar dinheiro emprestado no exterior, Juscelino não era entreguista. Ele sempre manteve a soberania do País nas maiores empresas, embora tenha aberto as portas também para as indústrias estrangeiras.
A Juscelino e também a Celso Furtado, devemos ainda a criação do Conselho de Desenvolvimento do Nordeste, o embrião da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - Sudene. Como se vê, o Governo de Juscelino, além de integrar os brasileiros, procurou corrigir as graves distorções do desenvolvimento.
Em 1961, já com Jânio Quadros no poder, Juscelino se elegeria pelo Estado de Goiás. Com o advento do golpe militar de 1964, Juscelino apóia a pretensão de Castelo Branco a concorrer às eleições presidenciais, acreditando, como a maioria dos civis e quiçá dos militares, que o regime militar teria curta duração. No dia 09 de abril, como se sabe, os comandantes militares promulgariam o Ato Institucional nº 1 (AI 1), que estabelecia a eleição do novo Presidente da República pelo Congresso Nacional e que dava ao Chefe do Executivo o poder de cassar mandatos parlamentares e suspender direitos políticos.
A certeza de que seria cassado motivou um pronunciamento do grande estadista na tribuna desta egrégia Casa, no dia 3 de junho de 1964. Dias depois, com a confirmação daquele ato de truculência e arbitrariedade, que suspendia os direitos políticos do ex-Presidente por dez anos, o PSD decidiu retirar-se do bloco de apoio ao Presidente Castelo Branco.
A cassação de Juscelino é uma demonstração inequívoca de que o Brasil nem sempre reverencia os benfeitores, os grandes homens públicos, os grandes ídolos. Oficialmente, não se alegou qualquer motivo para cassar o mandato do grande estadista Juscelino Kubitschek, mas analistas e historiadores têm por certo que a liderança e a popularidade de Juscelino representavam um risco para a perpetuação de seus adversários no poder.
Se esse ato brutal nos privou de uma liderança política inconteste, ao menos nos propiciaria como contraponto conhecer outros aspectos da personalidade de Juscelino Kubitschek, como a sua serenidade, a sua humildade, a sua identificação com os anseios populares. Ele ainda superaria divergências pessoais para formar, com Carlos Lacerda e João Goulart, a Frente Ampla, de oposição ao regime militar. O movimento seria proscrito pelo Governo militar e Juscelino, preso logo após a decretação do AI-5, passaria pela humilhação de ser mantido incomunicável por vários diais.
O povo, entretanto, deu-lhe a absolvição que lhe foi negada pelos governantes militares. Quando de sua morte, em trágico acidente na Via Dutra, em 22 de agosto de 1976, quando ia de São Paulo para o Rio de Janeiro, o Brasil viveu uma intensa comoção. As homenagens póstumas que então lhe foram prestadas no Rio e em Brasília, em seu sepultamento, foram demonstrações incontestáveis do carinho e do reconhecimento que a população tinha por ele.
No transcurso dos 40 anos de cassação do mandato do Senador e ex-Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, nós queremos mais uma vez reverenciar a memória desse grande estadista mineiro, verdadeiro guardião das causas populares e, ao mesmo tempo, tirar lições preciosas, Sr. Presidente, da necessidade de lutarmos pela manutenção da ordem democrática, capaz de preservar os valores mais altos da nacionalidade.
Sr. Presidente, não li inteiramente o discurso preparado para relembrar esta data, mas gostaria que fosse publicado na íntegra.
Concedo o aparte ao ilustre Senador Eduardo Azeredo.
O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Hélio Costa, cumprimento V. Exª pela oportunidade do discurso em que relembra o grande mineiro Juscelino Kubitschek, que foi, sem dúvida alguma, o maior Presidente da República que o Brasil já teve. Como V. Exª lembrou, S. Exª tinha a humildade como uma de suas principais qualidades. Convivi com o Presidente Juscelino, pois meu pai trabalhou com S. Exª, quando era Governador, de quem era grande amigo. O Presidente Juscelino, no PSD e, depois, na Frente Ampla, buscava sempre a volta da democracia no Brasil. No ano passado, neste plenário, quando comemorávamos o aniversário de Brasília, relembrei todos os fatos importantes da vida dele. Sem dúvida alguma, esta é uma data que nós não comemoramos, mas lembramos, com muita tristeza, a data em que Juscelino foi injustamente cassado e banido da política brasileira naquele momento.
Meus cumprimentos pela oportunidade de seu discurso.
O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG) - Muito obrigado, Senador Eduardo Azeredo. Incorporo suas palavras ao meu pronunciamento, lembrando que nós, mineiros, que damos tantos nomes extraordinários à política nacional, nestes 40 anos da cassação do mandato de Juscelino Kubitschek, quando o sonho de retornar ao poder terminou com uma penada durante o regime militar, lamentamos o ocorrido. Ficamos imaginando o que não teria sido o Brasil se tivéssemos tido a oportunidade de mais cinco anos de progresso, de mais cinco anos de Juscelino à frente dos destinos desta grande Nação. Certamente, Senador Tião Viana, teríamos tido a oportunidade de navegar um pouco mais no progresso, um pouco mais na criatividade, na capacidade extraordinária de sensibilizar as pessoas que Juscelino tinha, com seu carisma excepcional.
Tive a oportunidade de conviver com o ex-Presidente durante o seu exílio voluntário em Nova York, para onde foi e onde viveu durante vários anos, fugindo à perseguição incessante que sofria quando estava no Brasil. Por muitas vezes, emocionei-me de ver, em lugares públicos, em uma cidade como Nova York, o ex-Presidente da República ser reconhecido pela população, quando as pessoas se referiam a ele como o grande Presidente Juscelino, que estava naquele momento vivendo nos Estados Unidos porque não podia retornar ao seu País, pois este se encontrava sob regime militar insano.
Portanto, Sr. Presidente, conforme solicitei a V. Exª, passo às suas mãos, na íntegra, o discurso que profiro, lembrando a cassação do mandato de Senador do grande mineiro que foi o ex-Presidente Juscelino Kubitschek.
Muito obrigado.
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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR HÉLIO COSTA
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O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há 40 anos, com um rude golpe na democracia e nas esperanças de milhões de brasileiros, o regime militar cassava o mandato do ex-Presidente da República Juscelino Kubitschek, então Senador pelo Estado de Goiás. Não se cassava, ali, apenas mais um mandato político, entre tantos que foram cassados pelo poder discricionário. Cassava-se, para infortúnio do povo brasileiro, uma das maiores vocações da política nacional, um dos maiores talentos na arte de governar e uma das maiores esperanças de se recolocar o Brasil, num curto prazo, no caminho do progresso e do desenvolvimento econômico e social.
Juscelino não foi apenas um político extraordinário, de rara habilidade e de raro descortino. Foi, sobretudo, o Estadista que, ao modernizar o País, ao remover as estruturas arcaicas da nossa organização social, soube desbravar novos caminhos e contagiar o povo com seu otimismo, sua persistência e seu entusiasmo. Ao lado dessas qualidades, tinha a capacidade de conviver fraternalmente com correligionários e adversários políticos, sem descurar de suas próprias e mais arraigadas convicções.
Assim, é natural que sua cassação e, alguns anos mais tarde, sua morte fossem lamentadas por brasileiros de todos os quadrantes, por homens públicos de todos os matizes ideológicos. Não é de admirar que o saudoso Teotônio Vilela, que por tantos anos honrou com sua presença esta Casa Legislativa, assim se tenha referido a Juscelino, dias após a morte do estadista:
“Nada me dói pelas discordâncias antigas com o então Presidente da República; e nada me impede, hoje, de orgulhar-me do seu porte histórico de estadista e de cidadão brasileiro exemplar da nossa raça. Não exemplar por ser um puro, um santo, um mito ou um gênio; não, a sua exemplaridade vem exatamente da condição de ser um homem comum que se fez grande aproveitando em largo estilo as qualidades dominantes do povo, sem perder, no governo, as características e as aspirações do homem brasileiro”.
A importância de Juscelino Kubitschek de Oliveira para o País, Sr. Presidente, é sobejamente conhecida. Entretanto, para os mais jovens, a perfeita compreensão de sua relevância na vida nacional requer um pequeno retrospecto de sua vida e sua obra, o que fazemos resumidamente.
Nascido em Diamantina, Minas Gerais, em 12 de setembro de 1902, filho de um caixeiro-viajante e de uma professora primária, Juscelino ficou órfão do pai com apenas três anos de idade. Formando-se pela Faculdade de Medicina de Minas Gerais, vai para a França, onde se especializa em urologia. De volta ao Brasil, em 1931, ingressa na Polícia Militar, onde alcança o posto de Coronel-Médico e faz amizade com Benedito Valadares, futuro Governador do Estado. Podemos dizer que começa, aqui, sua vida política. No mesmo ano, casa-se com D. Sarah Luiza Gomes de Lemos.
Nos anos seguintes, alguns fatos mudariam definitivamente sua trajetória de vida. Com a súbita morte de Olegário Maciel, em 1933, Benedito Valadares, de quem se tornara amigo, seria nomeado por Getúlio Vargas interventor federal em Minas. Convidado por Valadares, Juscelino tornou-se Chefe do Gabinete Civil, dando início à sua vida pública. Ainda por influência de Valadares, Juscelino se filiaria ao Partido Progressista e disputaria as eleições, em 1934, para exercer seu primeiro mandato parlamentar, como o Deputado Federal mais votado no Estado. Perdendo seu mandato com a instituição do Estado Novo, em 1937, retornou ao exercício da Medicina.
Em 1940, nomeado Prefeito de Belo Horizonte, pôde reunir suas qualidades inatas de político hábil e de administrador competente. É interessante observar, Sr. Presidente, que, convidado para assumir a Prefeitura por Benedito Valadares, Juscelino recusou o cargo, pois não pretendia afastar-se da atividade profissional. Entretanto, nomeado dois meses depois sem nova consulta, considerou o fato consumado e tomou posse.
Na Prefeitura, executou numerosas obras de infra-estrutura, expandindo as redes de esgoto e de abastecimento de água, além de remodelar a cidade, com a abertura de ruas e avenidas e a criação de bairros como Sion e Cidade Jardim. O conjunto arquitetônico da Pampulha, projetado então por um jovem arquiteto - ninguém menos que Oscar Niemeyer, hoje mundialmente consagrado -, seria um marco de sua administração.
Com a deposição de Getúlio Vargas e o fim do Estado Novo, em 1945, Juscelino deixa a Prefeitura. No mesmo ano, elege-se Deputado Constituinte e abandona a atividade médica, que ainda exercia, para dedicar-se integralmente à vida política. O Hospital Militar e a Santa Casa de Misericórdia, de Belo Horizonte, perderam um profissional competente e dedicado; Minas e o Brasil ganharam um estadista que iria modernizar a administração pública e imprimir novo ritmo à política econômica. Datam dessa época, de suas viagens ao exterior e de seus contatos com representantes de outros povos, suas observações quanto à necessidade de se adotarem novos modelos de administração pública.
Indicado pelo Partido Social Democrático, o PSD, elegeu-se, em 1950, Governador do Estado de Minas Gerais, onde alcançaria uma projeção nacional capaz de alçá-lo à Presidência da República, na eleição seguinte.
Em Minas, adotou um programa de governo baseado no binômio “Energia e Transporte”. Com a abertura de três mil quilômetros de estradas, construção de usinas hidrelétricas, implantação de usina siderúrgica, entre outras obras marcantes, Juscelino tirou Minas de uma condição agropastoril para lançá-la à industrialização.
Seu Governo, em Minas, representou um trampolim para a Presidência da República. Ainda candidato, assume o compromisso de transferir a Capital da República para o interior do País, sonho de muitos brasileiros desde a época do Império. Ao mesmo tempo, anuncia o Programa de Metas, com o qual pretendia fazer o Brasil avançar “50 anos em 5” e do qual a construção de Brasília era a chamada meta-síntese.
De fato, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a construção de Brasília é a obra indissoluvelmente associada ao Governo de Juscelino Kubitschek, muito embora ele tenha executado um vasto leque de obras e realizado numerosas transformações na economia nacional. Em que pese a campanha “Marcha para o Oeste”, empreendida por Getúlio, o Brasil, até a posse de Juscelino, era voltado para o mar. Ignorava o sertão, o hinterland. Nesse aspecto, como o Marquês de Pombal, como o Barão de Mauá, como o Marechal Rondon e tantos outros, Juscelino exerceu um papel importante, misto de desbravador e de colonizador do nosso território.
A mudança da Capital para o interior se impunha. Era um compromisso histórico que perdurava havia já vários governos e várias gerações. Para cumprir sua promessa, Juscelino precisou pôr à prova toda sua determinação e toda sua coragem, construindo Brasília em apenas três anos e dez meses. Imagine-se, agora, se a Capital da República fosse ainda o Rio de Janeiro - uma cidade belíssima que abriga um povo alegre e hospitaleiro, mas espremida entre as serras e o mar, onde a locomoção das pessoas e o transporte de bens requer túneis e elevados em número sempre crescente.
Imagine-se, também, o que seria do Planalto Central, da Região Amazônica e de todo o interior brasileiro se Brasília não tivesse sido construída. A nova Capital, Sr. Presidente, incorporou efetivamente ao Brasil vastas porções do seu território que haviam sido abandonadas; integrou brasileiros que eram estranhos à população brasileira; expandiu a fronteira agrícola e deu maior proteção às fronteiras; viabilizou a exploração agrícola do cerrado, que se revelaria um verdadeiro celeiro.
Antes de citar algumas realizações de Juscelino no seu mandato presidencial, impõem-se algumas ponderações. Juscelino enfrentou dificuldades antes mesmo de tomar posse. Seus adversários políticos, inconformados com a vontade das urnas, tentaram impedir a proclamação do resultado, sob a alegação de que ele não obtivera maioria absoluta dos votos. Tendo o inconformismo gerado a pregação aberta da necessidade de um golpe militar, o então Ministro da Guerra, General Henrique Teixeira Lott, pôs os tanques nas ruas e deflagrou o chamado “golpe da legalidade”, de forma a garantir a normalidade e o respeito à Constituição.
Empossado em 31 de janeiro de 1956, Juscelino imediatamente solicitou ao Congresso a abolição do Estado de Sítio. A seguir, ele aboliu também a censura à imprensa, numa clara demonstração de que seu mandato seria exercido na mais absoluta normalidade democrática. Essa atitude, Sr. Presidente, é por si bastante eloqüente do caráter de Juscelino Kubitschek. Contudo sua grandeza não pára aí. Logo no início de seu Governo, oficiais da Aeronáutica se rebelaram e tomaram a base aérea de Jacareacanga, no Pará. Numa demonstração do seu espírito não apenas democrático, mas também tolerante e conciliador, Juscelino, sufocada a sublevação, propõe anistia para todos os que tivessem participado de movimentos civis ou militares no período de 10 de novembro do ano anterior a 19 de março daquele ano.
Tendo embora iniciado sua carreira política pelas mãos de Benedito Valadares, um dos homens mais próximos de Getúlio e um dos próceres do Estado Novo, Juscelino jamais traiu sua índole democrática e seu respeito pelas opiniões divergentes.
No plano administrativo, imprimiu um cunho modernizador e desenvolvimentista. O Plano Nacional de Desenvolvimento, conhecido como “Programa de Metas” ou “Plano de Metas”, criou as bases para o crescimento e para a diversificação da economia. Das 31 metas propostas em sua campanha, cumpriu a maioria antes mesmo de findar seu mandato. Encontrou um País agrário e acanhado e, ao final de sua administração, deixou ao sucessor um Brasil industrializado, com grandes realizações na área de siderurgia, de geração de eletricidade, de produção de automóveis. Estimulou as indústrias estrangeiras a se instalarem em nosso território, mas adotou medidas de proteção para o empresariado nacional.
Com Juscelino, o País ganhou 18 mil quilômetros de novas rodovias, além de usinas hidrelétricas como Furnas e Três Marias. O economista Francisco Luiz Lopreato, ouvido pelo jornal Correio Braziliense na comemoração do centenário de nascimento de Juscelino, foi enfático: “O investimento no setor de infra-estrutura foi fundamental, pois o Brasil naquela época carecia muito de obras no setor energético para se tornar um país industrializado”.
Por sua vez, a pesquisadora Alzira Abreu, da Fundação Getúlio Vargas, ouvida pelo mesmo periódico, salientou que “apesar de tomar dinheiro emprestado no exterior, Juscelino não era entreguista. Ele sempre manteve a soberania do País nas maiores empresas, embora tenha aberto as portas também para as indústrias estrangeiras”.
A Juscelino, e também a Celso Furtado, devemos ainda a criação do Conselho de Desenvolvimento do Nordeste, o embrião da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - Sudene. Como se vê, o Governo de Juscelino, além de integrar os brasileiros, procurou corrigir as graves distorções de desenvolvimento.
Em 1961, já com Jânio Quadros no poder, Juscelino se elegeria Senador pelo Estado de Goiás. Com o advento do golpe militar de 1964, Juscelino apóia a pretensão de Castelo Branco a concorrer às eleições presidenciais, acreditando, como a maioria dos civis e quiçá dos militares, que o regime militar teria curta duração. No dia 9 de abril, como se sabe, os comandantes militares promulgariam o Ato Institucional nº 1 (AI 1), que estabelecia a eleição do novo Presidente da República pelo Congresso Nacional e que dava ao Chefe do Executivo o poder de cassar mandatos parlamentares e suspender direitos políticos.
A certeza de que seria cassado motivou um pronunciamento do grande estadista na tribuna desta egrégia Casa, no dia 3 de junho de 1964. Dias depois, com a confirmação daquele ato de truculência e arbitrariedade, que suspendia os direitos políticos do ex-Presidente por dez anos, o PSD decidiu retirar-se do bloco de apoio ao Presidente Castelo Branco.
A cassação de Juscelino é uma demonstração inequívoca de que o Brasil nem sempre reverencia os benfeitores, os grandes homens públicos, os grandes ídolos. Oficialmente, não se alegou qualquer motivo para cassar o mandato do grande estadista, mas analistas e historiadores têm por certo que a liderança e a popularidade de Juscelino representavam um risco para a perpetuação de seus adversários no poder.
Se esse ato brutal nos privou de uma liderança política inconteste, pelo menos nos propiciaria, como contraponto, conhecer outros aspectos da personalidade de Juscelino, como sua serenidade, sua humildade e sua identificação com os anseios populares. Ele ainda superaria divergências pessoais para formar, com Carlos Lacerda e João Goulart, a Frente Ampla, de oposição ao regime militar. O movimento seria proscrito pelo Governo militar, e Juscelino, preso após a decretação do AI 5, passaria pela humilhação de ser mantido incomunicável por alguns dias.
O povo, entretanto, deu-lhe a absolvição que lhe foi negada pelos comandantes militares. Quando de sua morte, em trágico acidente ocorrido na Via Dutra, em 22 de agosto de 1976, quando ia de São Paulo para o Rio de Janeiro, o Brasil viveu uma intensa comoção. As homenagens póstumas que então lhe foram prestadas no Rio e em Brasília, no seu sepultamento, foram demonstrações incontestáveis do carinho e do reconhecimento que a população tinha por ele.
No transcurso dos 40 anos de cassação de Juscelino Kubitschek de Oliveira, queremos mais uma vez reverenciar a memória desse grande estadista, verdadeiro guardião das causas populares, e, ao mesmo tempo, tirar lições preciosas sobre a necessidade de lutarmos pela manutenção da ordem democrática, capaz de preservar os valores mais altos da nacionalidade.
Muito obrigado!