Discurso durante a 70ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações a respeito de estudo publicado na revista Saude Pública 37/2003, da Universidade Federal de São Paulo, com o título: "Doenças Isquêmicas do Coração: Mortalidade em Nativos e Migrantes, São Paulo, 1979-1998".

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações a respeito de estudo publicado na revista Saude Pública 37/2003, da Universidade Federal de São Paulo, com o título: "Doenças Isquêmicas do Coração: Mortalidade em Nativos e Migrantes, São Paulo, 1979-1998".
Publicação
Publicação no DSF de 04/06/2004 - Página 17297
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, SAUDE PUBLICA, UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO 1960 (UFSP), PESQUISA, INCIDENCIA, DOENÇA, CARDIOLOGIA, MIGRANTE, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), REGIÃO NORDESTE, PROVOCAÇÃO, MORTE, VITIMA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • DEFESA, EMPENHO, GOVERNO, ESPECIFICAÇÃO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), INICIO, CAMPANHA, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, MIGRANTE, NECESSIDADE, EDUCAÇÃO ALIMENTAR, DIETA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, ENGAJAMENTO, COMBATE, INCIDENCIA, DOENÇA, CARDIOLOGIA, REDUÇÃO, MORTE, POPULAÇÃO CARENTE.

PAPALÉO PAES (PMDB - AP) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores,

Venho hoje à tribuna desta Casa para tecer alguns comentários sobre um recente trabalho de pesquisa que trata dos males do coração entre migrantes no Estado de São Paulo. Como veremos mais adiante, o que chama a atenção nas conclusões da pesquisa realizada é que os migrantes nordestinos e mineiros aparecem como os mais atingidos pelas doenças isquêmicas e pelas ocorrências de infarto do miocárdio. Entre todos os grupos pesquisados, os nordestinos e os mineiros apresentam os maiores índices de mortalidade.

Certamente, ao chegar ao conhecimento público, a revelação dessa realidade deve ter sido recebida com grande preocupação pelos cardiologistas, pelas autoridades governamentais que cuidam da saúde pública em nosso País, e por amplos setores sociais que demonstram interesse pelo assunto. Por esse motivo, considerei importante trazer a questão a este Plenário, por se tratar da doença que mais temor causa aos brasileiros com mais de trinta anos de idade.

Aliás, com muita freqüência, os meios de comunicação têm dedicado espaços importantes ao assunto e têm procurado alertar a sociedade com longas matérias sobre a gravidade das doenças cardíacas. Em quase todas as publicações, de forma bastante didática, são apresentados os principais fatores de risco que provocam as doenças isquêmicas; o que fazer para evitar uma obstrução coronariana e um infarto do miocárdio; os medicamentos existentes; a dieta que deve ser seguida para evitar a elevação, acima dos níveis médicos indicados, do chamado colesterol ruim e da glicose; a importância do controle periódico da pressão arterial; o controle do estresse; a prática de exercícios físicos diários; os efeitos altamente destruidores provocados pelo fumo; enfim, uma série de outras recomendações que já fazem parte de nossa vida cotidiana e que, infelizmente, não são seguidas à risca pela maioria da população adulta do nosso País.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, em estudo publicado na Revista Saúde Pública, n° 37/2003, da Universidade Federal de São Paulo, com o título: “Doenças Isquêmicas do Coração: Mortalidade em Nativos e Migrantes, São Paulo, 1979-1998”, o Doutor Luiz Francisco Marcopito, epidemiologista, membro do Departamento de Medicina Preventiva daquela instituição, concluiu que os migrantes nordestinos e mineiros são os que mais morrem de doenças isquêmicas do coração no Estado de São Paulo.

Segundo o professor Marcopito, foram registrados 3,2 milhões de óbitos de pessoas com mais de 20 anos de idade, ocorridos entre 1979 e 1998 no Estado de São Paulo. Do universo dos que morreram vitimados por doenças cardíacas, foram selecionados, como amostra para a pesquisa, 426.033 casos. Destes, 38,7% referiam-se a migrantes, dos quais, pelo cálculo da mediana, cerca de 12,41% haviam nascido na Região Nordeste e 10,6% em Minas Gerais, enquanto 4,3% eram naturais dos demais Estados.

Por outro lado, considerando no universo do estudo apenas o ano de 1998, que foi o último período levantado, o percentual por naturalidade no total de óbitos por doenças isquêmicas apresentou os seguintes resultados: os nordestinos ficaram em primeiro lugar com 17,2%; os mineiros ocuparam a segunda posição com 10,7%; e os migrantes das outras regiões do País ficaram em último lugar com apenas 4,3%. É importante destacar que desprezamos a apresentação dos resultados referentes aos migrantes estrangeiros, que foram, inclusive, inferiores aos índices que acabamos de mostrar. Como podemos observar, nas duas abordagens apresentadas, nordestinos e mineiros morreram mais de doenças isquêmicas do que os representantes de todos os outros Estados.

O mesmo estudo mostra que, no Município de São Paulo, em duas pesquisas realizadas - a primeira, entre 1990 e 1992, e a segunda, em 1999 -, em relação às taxas de mortalidade causadas por problemas graves do aparelho circulatório e pelas doenças isquêmicas do coração (DIC), obtidas em quatro regiões do Município, os piores índices foram registrados nas áreas com as mais precárias condições sociais. Como bem sabemos e o estudo confirma, nessas áreas vive a maioria dos migrantes que chegam de outros Estados.

Como acabamos de verificar, a pesquisa realizada pelo professor foi baseada em dados bastante objetivos, ou seja, nas declarações de óbitos de pessoas residentes no Estado de São Paulo, falecidas entre 1979 e 1998, com causa definida de morte, idade e naturalidade devidamente registradas, inclusive, em base de dados do próprio Ministério da Saúde.

O autor da pesquisa teve igual preocupação em apoiar sua análise em estudo aprofundado do comportamento dos seguintes aspectos: mortalidade proporcional por naturalidade, dentro do total de óbitos por DIC; mortalidade proporcional por DIC, dentro do total de óbitos por todas as causas, em cada naturalidade; variação percentual, em relação a 1979, no número absoluto de óbitos por DIC e pelas demais causas, de acordo com a naturalidade; variação percentual, em relação ao ano imediatamente precedente, no número absoluto de óbitos por DIC e pelas demais causas, de acordo com a naturalidade; e, por fim, definição criteriosa da mediana e da idade em que ocorreram os óbitos por DIC.

De maneira geral, o estudo concluiu que, para residentes do Estado de São Paulo, cerca de 40% dos óbitos por DIC ocorreram em migrantes. No que se refere à contribuição percentual sobre o total de DIC, a pesquisa mostra que ela permaneceu praticamente a mesma entre os nascidos nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e outras regiões do País. Todavia, em relação ao Nordeste, a situação é apresentada de maneira diferente. Aparece nítido aumento da contribuição nordestina nos óbitos motivados pela DIC.

Em síntese, nos vinte anos observados pelo estudo, os relatórios conclusivos mostram que os nordestinos foram os que morreram mais jovens de DIC entre todos os grupos comparados, incluindo estrangeiros.

Assim, levando em consideração a mediana geral da idade do óbito por DIC, que foi de 69 anos em 1998, temos os seguintes resultados por naturalidade : Japão, 82 anos; Leste Europeu e ex-União Soviética, 80 anos; Europa Ocidental, 78 anos; outras regiões do mundo, 77 anos; São Paulo, 69 anos; Minas Gerais, 67 anos; outras regiões do Brasil, 65 anos; e, em último lugar, a Região Nordeste, com 64 anos.

É importante ressaltar que, em todos os anos estudados, os nordestinos apresentaram a maior percentagem de óbito por DIC em hospital. Além disso, convém destacar igualmente que esse percentual, em termos globais, foi o campeão entre todos os grupos de brasileiros e de estrangeiros abrangidos pelo estudo.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, como disse no início deste pronunciamento, os dados que acabo de reproduzir neste Plenário, tirados de competente pesquisa realizada por notável cientista do Departamento de Medicina Preventiva da Universidade Federal de São Paulo, merecem uma séria reflexão desta Casa, dos nobres colegas Senadores nordestinos e, sobretudo, do Governo Federal e do Ministério da Saúde. 

Em particular, ao Ministério da Saúde, que tem, indiscutivelmente, a maior responsabilidade sobre o assunto, caberia a tarefa de iniciar uma grande campanha educativa de alerta, principalmente, junto às comunidades que são as maiores vítimas das doenças do coração, no caso, os migrantes nordestinos e mineiros. Entre outras providências, tal campanha deveria insistir nas mudanças dos hábitos de vida e no maior controle das dietas alimentares.

Em suas conclusões, o professor Luiz Francisco Marcopito diz que, de maneira geral, os grupos mais atingidos pelas doenças do coração no Estado de São Paulo são justamente aqueles que têm baixo poder aquisitivo, baixo nível de escolaridade, baixa qualificação profissional, baixo nível de informação e baixo nível de preocupação com a saúde.

Segundo ele, o somatório de todos esses fatores explosivos para o coração será, indiscutivelmente, mais dia, menos dia, o atestado de óbito prematuro, que poderia muito bem ser evitado. Por isso, em meu entendimento, cabe principalmente ao Governo Federal assumir, daqui para frente, um maior engajamento na luta contra a incidência de doenças cardíacas e de mortalidade causadas por esses males entre grupos sociais carentes.

Nobres Senadoras e Senadores, não podemos nos esquecer de que 34% dos óbitos anuais no Brasil são decorrentes de doenças cardiovasculares. Entre elas, as mais graves são: o infarto agudo do miocárdio e a angina.

Só com um programa abrangente e eficaz de saúde pública em nível nacional, acompanhado de uma competente campanha de educação, de esclarecimento e de prevenção, a exemplo do que é feito contra a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), seremos capazes de reduzir a mortalidade por doenças do coração a níveis aceitáveis, tanto nas camadas baixas da população quanto nas camadas altas.

Era o que tinha a dizer!

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/2004 - Página 17297