Discurso durante a 83ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para o complexo problema dos tóxicos ilícitos e do uso abusivo de substâncias lícitas, tal como o álcool.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • Alerta para o complexo problema dos tóxicos ilícitos e do uso abusivo de substâncias lícitas, tal como o álcool.
Publicação
Publicação no DSF de 17/06/2004 - Página 18643
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • ADVERTENCIA, COMPLEXIDADE, PROBLEMA, TOXICO, ABUSO, UTILIZAÇÃO, SUBSTANCIA, FALTA, TOXICIDADE, ESPECIFICAÇÃO, ALCOOL, FUMO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, POLITICA, REPRESSÃO, TRAFICO, DROGA, SIMULTANEIDADE, COMBATE, INCENTIVO, CONSUMO, ALCOOL, FUMO.
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, CONSUMO, BEBIDA ALCOOLICA, CRIANÇA, ADOLESCENTE, AMPLIAÇÃO, RISCOS, COMPORTAMENTO.
  • IMPORTANCIA, PRETENSÃO, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, AMPLIAÇÃO, NUMERO, ENTIDADE, ATENDIMENTO, USUARIO, DROGA.
  • ELOGIO, INICIATIVA, MINISTERIO PUBLICO, DISTRITO FEDERAL (DF), PROIBIÇÃO, VENDA, BEBIDA ALCOOLICA, FESTA JUNINA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, RECOMENDAÇÃO, DIRETOR, ESCOLA PUBLICA, ESCOLA PARTICULAR, IMPEDIMENTO, COMERCIO, PRODUTO.

           O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a escalada da violência urbana, notadamente na cidade do Rio de Janeiro - quando quadrilhas de traficantes de drogas protagonizam cenas próprias de teatros de guerras convencionais -, deve reavivar o alerta para o complexo problema dos tóxicos ilícitos e do uso abusivo de substâncias lícitas, tal como o álcool.

           Muitos são os estudos que demonstram ser a bebida a primeira substância com que o jovem trava contato e o seu estímulo é, em muitos casos, estimulado pela sociedade. Durante muitos anos o consumo da maconha foi considerado como o primeiro estágio da dependência química. Ou seja, depois do jovem fumar cigarros preparados com a erva, a pessoa passaria a usar drogas cada vez mais “pesadas” e também em maiores quantidades. Essa realidade está mudando rapidamente.

           Estudos mais recentes, divulgados pela imprensa, revelaram que o problema das drogas ilegais começa de outra forma, qual seja, freqüentemente no consumo de bebidas alcoólicas.

           Acredito que além de uma política absolutamente necessária e urgente de repressão ao narcotráfico, o nosso País necessita, também com igual urgência, da adoção de políticas públicas incisivas de desestímulo radical ao consumo de drogas ilegais e legais, como álcool e tabaco notadamente.

           Não nos iludamos na hora de elaborarmos leis e normas jurídicas: o álcool é uma substância que causa dependência, o alcoolismo, razão pela qual é incluído em todas as relações de drogas. No mundo, essa doença preocupa enormemente os sistemas de saúde, segurança, previdência e o setor produtivo. Estima-se o número de dependentes alcoólatras entre 10% e 15% da população mundial.

           No Estado de São Paulo, o mais populoso de nosso País, pelo menos um milhão de pessoas sofrem desse mal. O alcoolismo, ao contrário do que tantos pensam, não se resume àqueles pobres coitados que vivem nas ruas, bebericando de bar em bar, cultivando uma cirrose que os levará cedo à morte. Também existem os alcoólatras bem apessoados, que dizem beber socialmente, que se tornam dependentes da bebida forte. Igualmente provocam muitos problemas aos sistemas de saúde e segurança públicas, com enormes gastos financeiros para o Estado.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos pacificar o grande conflito que existe dentro do Governo quanto ao tema. É o psiquiatra brasileiro Ronaldo Laranjeira, uma das maiores autoridades mundiais em drogas lícitas e ilícitas, quem lança o alerta na última edição da “Revista Sras & Srs”:

           “O Ministério da Economia (sic) não quer perder arrecadação. A Agricultura não quer diminuir as plantações de cana-de-açúcar.... E esse é um erro conceitual do Governo. Eles consideram o álcool como um produto qualquer, em relação à arrecadação. O problema é que o álcool tem um custo social”.

           Diz mais o especialista que, em cada R$10,00 que o Governo arrecada com imposto da cachaça, gasta R$20,00 em saúde, além do que é também despendido com acidentes de carro, violência doméstica, dias não trabalhados pelos empregados etc.

           Os especialistas preconizam modificações imediatas e profundas na legislação brasileira, com o intuito de melhorar a segurança e a saúde da população. Se não é viável em pleno século XXI uma lei seca, que pelo menos se estabeleçam critérios restritivos para a venda e propaganda de bebidas alcoólicas.

           Pesquisa em um bairro de São Paulo - no Jardim Ângela - mostrou que lá existe um bar para cada dez moradias. Não é à toa que aquela região é a mais violenta do Brasil - informa o referido psiquiatra.

           Já na cidade de Diadema, também em São Paulo, onde os bares foram fechados às 23 horas, houve uma queda de mortes violentas em mais de 80%. O número relativo à violência doméstica também caiu drasticamente.

           Outro dado assustador levantado pelos especialistas mostra que 95% das pessoas começam a ficar dependentes antes dos 18 anos de idade. No Brasil, estima-se que aproximadamente 30% das bebidas alcoólicas são consumidas por crianças e adolescentes.

           Em nosso País um pobre compra uma garrafa de cachaça por menos de R$2,00; uma cerveja custa menos do que um refrigerante ou um litro de leite, além de poder ser veiculada a sua publicidade em horários nos quais as nossas crianças e adolescentes assistem tevê.

           De pouco adiantará colocarmos as nossas crianças nas escolas, dar-lhes boa educação, se elas, em casa, verão muitos de seus ídolos fazendo propaganda de bebidas alcoólicas. Sei que a legislação já baliza limites neste tema, mas precisamos avançar mais um pouco se quisermos uma juventude saudável e longe das garras do narcotráfico.

           Proponho estas questões, Sr. Presidente, não para apresentar uma solução pronta para tão complexo problema. O meu intuito é o de oferecer aos meus ilustres pares um ponto de reflexão, para que, a partir daí, nós legisladores possamos nos debruçar sobre o tema em busca de uma saída para esta verdadeira encruzilhada na qual está colocada a sociedade brasileira.

           A violência tem múltiplas raízes, e, com certeza, o consumo e a comercialização das drogas são variáveis que necessitam ser equacionadas pelo Poder Público.

           Nunca é demais ressaltar que a as bebidas alcoólicas iludem os jovens, parecendo ajudá-los (mas na verdade iludindo-os) a contornar dificuldades de convívio social e inibição. No entanto, aumentam, significativamente, a chance de o jovem optar por algum comportamento de risco. Os dados são do próprio Ministério da Saúde: entre especialmente os adolescentes, a bebida diminui sensivelmente a possibilidade de se praticar o sexo seguro, o que pode levar à gravidez não planejada, além da eventual contaminação pelo vírus HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis.

           Segundo dados obtidos no site do Ministério da Saúde, o Governo Federal gasta R$180 milhões anuais, por meio do Sistema Único de Saúde, só para tratar de dependentes de álcool. Aí não estão computados os gastos decorrentes com a segurança pública e perdas laboriais.

           Pode ser lugar comum, mas vale repetir: o alcoolismo é um problema grave. Reflexo disso é que a administração federal pretende ampliar a rede de atendimento aos dependentes químicos. A idéia é fazer a assistência se estender aos familiares dos dependentes.

           Em todo país, há dezenas de Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), que atendem dependentes sem cobrar nada. A meta é ampliá-los para 120 até dezembro. A meta de médio prazo é que todos os municípios com mais de 100 mil habitantes tenham uma CAPs.

           Tais centros funcionam com tratamento médico e psicológico. O atendimento é feito em domicílio. Cada centro recebe, atualmente, cerca de 120 pessoas. Segundo cálculos de 2003, do Ministério da Saúde, somente a ampliação desse serviço deverá consumir mais de R$16 milhões.

           Pelo menos 20% de todas as internações psiquiátricas feitas pelo SUS decorrem de transtornos mentais provocados pela bebida alcoólica. Quinze por cento da população têm problemas com a ingestão de álcool, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Não é por acaso que existe tanta gente mergulhada no submundo da bebida.

           Há dez anos, nós do Poder Legislativo tentamos disciplinar as propagandas de bebidas alcoólicas na tevê. Há dezenas de projetos de lei tramitando no Congresso Nacional sobre o tema. Infelizmente, nenhum deles foi até o fim, ou seja, à aprovação e sanção presidencial

           Talvez fosse a hora de propormos um grupo de trabalho, quiçá uma comissão especial, para analisar todos esses projetos e unificá-los. Há muitos deles incoerentes e contraditórios.

           Também foi justamente por conta da incoerência que muitas leis municipais e distritais - bem intencionadas, registre-se -, destinadas a restringir a venda de bebida alcoólica, não “pegaram”. Em Brasília, por exemplo, os postos de gasolina só podem vender álcool até as 22 horas. No entanto, os supermercados 24 horas vendem durante toda a madrugada qualquer tipo de bebida.

           Gostaria de louvar a iniciativa do Ministério Público, que, em Brasília, há poucos dias, diligenciou, para coibir a venda de bebidas nas festas juninas escolares. Assim, na Capital da República, muito corretamente, na temporada de festas juninas nas escolas, as barraquinhas de quentão, cerveja ou quaisquer bebidas alcoólicas não serão permitidas. Ressalte-se, não são permitidas em nenhuma época do ano.

           Segundo noticiou o Jornal de Brasília (edição de 01/06/2004), a Promotoria de Educação do Ministério Público do DF emitiu uma recomendação aos Diretores de escolas públicas e particulares, que respeitem efetivamente a lei que proíbe a venda de bebida alcoólica nas dependências escolares. Em um raio de cem metros dos estabelecimentos de ensinos Fundamental e Médio - ou perímetro escolar - nenhum bar, cantina ou lanchonete deve comercializar produtos alcoólicos, sob pena de perderem o alvará, dentre outras conseqüências. "A recomendação serve para qualquer época do ano", lembra o promotor Marcos Donizeti. Ele menciona, na matéria jornalística acima citada, que no ano passado, nessa mesma época, a bebida excedente de uma festa foi vendida em dias de aula normal. Um absurdo intolerável.

           Muitos são os estudantes que lembram que os seus primeiros porres foram exatamente em festa juninas, nas escolas onde estudavam. Como é sabido, é crime quando a bebida é vendida para menores de idade. Nesses casos, os comerciantes podem, portanto, ser enquadrados em processos criminais.

           A preocupação do Ministério Público do Distrito Federal está amparada em dados estatísticos, segundo o noticiário: pelo menos 65% dos estudantes dos ensinos Fundamental e Médio de Brasília consomem ou já consumiram bebidas alcoólicas, revela pesquisa realizada recentemente pela Comissão da Aliança Cidadão pelo Controle do Álcool. Esta situação não deve ser diferente nos demais estados brasileiros.

           Espero, Sr. Presidente, que estas minhas considerações contribuam para levantar o debate deste tema tão relevante para a nossa sociedade.

           Era o que tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/06/2004 - Página 18643