Discurso durante a 84ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Urgência ao retorno da discussão da reforma trabalhista.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Urgência ao retorno da discussão da reforma trabalhista.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/2004 - Página 18672
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, URGENCIA, DEBATE, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, OBJETIVO, VALORIZAÇÃO, RECUPERAÇÃO, PODER AQUISITIVO, SALARIO MINIMO, MELHORIA, RELACIONAMENTO, TRABALHADOR, EMPREGADOR.
  • COMENTARIO, DADOS, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), ORGANIZAÇÃO, COOPERAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, AMBITO INTERNACIONAL, RISCOS, FLEXIBILIDADE, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, NECESSIDADE, PROTEÇÃO, DIREITOS, TRABALHADOR.
  • COMENTARIO, DADOS, ESTATISTICA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), COMPROVAÇÃO, AUMENTO, DESEMPREGO, POSTERIORIDADE, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PERIODO, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste momento de grande importância para o Brasil em que se discute o novo valor do salário mínimo, sobre o qual irei me manifestar no momento oportuno durante a votação da matéria, lamento a ausência de um tema importantíssimo para o Brasil: a reforma trabalhista, um dos pilares para a geração de emprego e conseqüentemente renda de nossa população. O debate sobre como conseguir que o salário mínimo adquira poder aquisitivo e seja valorizado passa também pela discussão sobre as novas relações de trabalho. Desde logo digo que não busco, aqui, tratar da reforma trabalhista que retira direitos dos trabalhadores, mas ao contrário, busco àquela reforma que, diante do monopólio do pensamento liberal, precisa urgentemente proteger a dignidade do trabalho.

Sr. Presidente, reconheço que há grandes projetos que necessitam ser deliberados pelo Parlamento, tais como:

A PEC nº 77 da Previdência Social, ou PEC paralela, em que ali consta minha sugestão acerca da tributação sobre os funcionários públicos inativos dos Estados e Municípios, em que somente possam ser taxados se (e somente se) existir legislação específica em nível local das Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais.

Infelizmente, Sr. Presidente, a PEC paralela continua dormindo nas gavetas da Câmara dos Deputados sem uma decisão que possa comprovar o esforço de abnegação que foi feito aqui no Senado Federal por tantos Senadores, inclusive pelo Senador Paulo Paim que, ao meu lado, e ao lado de tantos outros que acreditaram na palavra do Governo; que acreditaram na palavra empenhada pelas Lideranças, que disseram, na época, que, se votássemos o projeto inicial, a PEC nº 67, a 77 seria aceita pelo Governo e levada a efeito na Câmara dos Deputados. É lamentável, Sr. Presidente, que isso não tenha acontecido. O político tem como patrimônio a palavra, tem como balizador de sua conduta o compromisso assumido, não apenas em praça pública, porque a praça pública é a praça do povo, como também num ambiente como este do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, onde a palavra empenhada vale tanto quanto a dita em praça pública, porque descendemos da vontade do povo.

A nova legislação falimentar, em que é necessário conceber a falência não mais como uma “liquidação de empresas”, mas de continuidade da atividade econômica. O exemplo da recente falência da Parmalat do Brasil, ocasionando danos às cooperativas de leite, aos trabalhadores da indústria de laticínios e a diversas outras empresas de fornecimento de embalagens e transporte, deixa patente a necessidade de se buscar salvaguardar o setor produtivo e punir os maus gestores.

Outra reforma, a do Judiciário, a fim de se possibilitar que esse Poder possa cumprir de modo eficaz a maior das atividades públicas, que é a distribuição da justiça e apaziguamento dos conflitos sociais.

O projeto de Parceria Público-Privada, o qual poderá trazer novos investimentos privados para o Brasil, desde que aprovado com as alterações substanciais que propusemos na Comissão de Assuntos Econômicos, mediante as discussões que ali serão travadas, com a presença de representantes dos Ministérios da Fazenda, do Planejamento e do próprio BNDES, quando poderemos clarear os objetivos primaciais desse projeto da PPA, Parceria Público-Privada, que será, sem dúvida alguma, mais uma saída para a intensificação dos investimentos, retomada do crescimento no Brasil e a geração de emprego e renda.

Temos, ainda, projetos que tratam do meio ambiente e de proteção daquela área que, durante os mais de 500 anos de Brasil, foi a que mais sofreu ataques - a preservação da vegetação nativa do bioma da mata atlântica; e, por fim, a nova Lei de Biossegurança.

Portanto, ao lado desses temas, o Congresso deveria iniciar os debates sobre a reforma trabalhista. Evidentemente, não creio que, isoladamente, a reforma trabalhista vá conseguir a reversão do quadro de desemprego que assola o País devido à política econômica implantada pelo governo anterior, que deixou o Presidente Lula refém. Ao lado da reforma trabalhista, está a necessidade do crescimento econômico, cujos dados, opinião dos especialistas e o mercado indicam que de modo tímido já está ocorrendo neste ano. Assim, é importante o novo pacto sobre a relação de trabalho!

Todavia, Srªs e Srs. Senadores, é necessário o cuidado com a denominada “Flexibilização do Direito do Trabalho, até mesmo porque essa flexibilização tornou-se pensamento hegemônico e instrumento único de solução da questão do desemprego. Ocorre que, de acordo com instituições multilaterais insuspeitas, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), as reformas trabalhistas, sem atingir os efeitos esperados, resultaram na precarização do emprego e maior desproteção social. Dessa forma, não há como afirmar que o rigor dos mecanismos institucionais de proteção do emprego possam comprometer a geração de emprego (OIT, 2000; OCDE, 1999). Aliás, não houve rebaixamento das taxas de desemprego. Apenas constatou-se o crescimento da precarização das condições e relações de trabalho, notada pela elevação da participação do emprego parcial no total da ocupação. Em geral, o emprego parcial encontra-se sem proteção trabalhista.

É bem verdade, Sr. Presidente, que desde 1990 o Brasil tem insistido na realização da reforma trabalhista. Todavia, sem apresentar uma ampla reforma, o País realizou, ao seu jeito, uma reformulação trabalhista que aponta para a ampliação da flexibilização salarial, contratual, do tempo de trabalho, da organização do trabalho e da demissão. Apesar da elevada flexibilidade que as relações de trabalho já apresentavam, assistiu-se ao seu aprofundamento desde 1990.

A situação extremamente desfavorável ao conjunto dos trabalhadores não adveio tão somente da reforma trabalhista realizada, mas também esteve associada ao flagelo do contexto econômico de baixa expansão da produção e liberação comercial. Esse mesmo contexto social e econômico, pontuado pela reforma trabalhista em meio à crescente heterogeneidade da estrutura ocupacional, tem levado a maiores limitações na ação coletiva do conjunto dos trabalhadores, especialmente nas negociações coletivas de trabalho e na fragilização do sindicalismo.

Apresento um quadro, Sr. Presidente, que nos foi fornecido pelo IBGE, que mostra a relação entre o total de trabalhadores ocupados e a população com 10 anos e mais, o desemprego aberto, em milhões, o total de contribuintes da seguridade social também.

A taxa de ocupação do País, Sr. Presidente, antes dessa reforma a que me referi, feita no Governo de Fernando Henrique Cardoso, era de 55,0. Depois da reforma, 55,1.

Total de desemprego antes da reforma: 1,9; depois da reforma trabalhista: 7,6.

Seguridade social antes da reforma: 30,6; depois da reforma: 31,0.

Isso significa, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que a reforma veiculada no governo passado, em vez de contribuir para a flexibilização do emprego, ou seja, melhorar o índice do emprego, piorou, fazendo com que a ocupação dos trabalhadores nas fábricas, no comércio, em todos os setores produtivos da economia diminuísse.

Concedo o aparte ao nobre Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Antonio Carlos Valadares, cumprimento V. Exª por fazer um pronunciamento claro, transparente, que aponta caminhos para a distribuição de renda, para a questão do emprego, a fim de enfrentarmos aqui um bom debate, no momento adequado, sobre a relação entre capital e trabalho, mas não nos moldes do passado. Mesmo porque em todos os países do mundo - podemos citar França, Itália, Alemanha, Espanha, Japão, Argentina - em que esse tipo de reforma foi feita, o número de trabalhadores desempregados aumentou.

V. Exª traz esse tema, nesta tarde em que esta Casa, o Senado da República, assumindo toda a sua responsabilidade, fará um grande debate sobre o mundo do trabalho, porque o salário mínimo é referência para qualquer política salarial no País, pois influencia, de forma direta, os pisos nos Estados, conforme lei; repercute sobre o piso de todas as categorias e sobre os cargos e salários das empresas. Quando falamos que o debate do salário mínimo interessa a mais de 100 milhões de brasileiros, é com esta ótica, a da relação capital e trabalho. V. Exª faz sua introdução a esse grande debate no dia de hoje, falando exatamente sobre emprego e renda. Sei que V. Exª deixará muito claro à Casa, no momento adequado, na discussão, no encaminhamento, a sua posição - que não sou eu que definirei - sobre o salário mínimo. Esse debate é importante e deve enriquecer a tarde de hoje. Tenho certeza absoluta de que o verdadeiro choque de emprego e renda passará por uma discussão, conforme V. Exª traz ao Plenário, e pela deliberação do salário mínimo. O Senado apontará: o social tem que estar em primeiro lugar. Parabéns a V. Exª.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Senador Paulo Paim, eu gostaria de incluir no meu discurso as palavras generosas e sábias de V. Exª. Ninguém melhor do que V. Exª para falar das relações de trabalho, porque essa tem sido, ao longo de sua vida, a sua grande meta, o seu grande projeto, que certamente redundou nos melhores benefícios para o trabalhador brasileiro. E, no Senado Federal, tem sido assim: V. Exª tem apontado soluções, caminhos. Lamentavelmente, a conjuntura econômica não tem sido favorável para que todos os projetos apontados por V. Exª sejam aprovados, mas tenho certeza de que suas posições têm influenciado, volto a dizer, o posicionamento de muitos Senadores nesta Casa. Agradeço a Exª.

Então, Sr. Presidente, não parece haver dúvidas de que a reforma trabalhista realizada no Brasil, promovida pelo Governo passado, resultou não apenas em frustração quanto às expectativas iniciais, mas na piora sensível do comportamento do mercado de trabalho.

Em termos gerais, a taxa de ocupação permaneceu praticamente inalterada, quando se comparam os períodos anterior e posterior à realização da reforma trabalhista. Da mesma forma, não houve alteração na quantidade de contribuintes da Previdência Social - antes da reforma, eram 30,6 milhões e, depois, 31 milhões -, não obstante a elevação na quantidade de inativos. Por outro lado, constatou-se a forte expansão na quantidade de trabalhadores desempregados.

Pode-se concluir que o impacto da reforma realizada no Brasil não foi capaz de reverter a evolução negativa do mercado de trabalho, tampouco favorecer o desenvolvimento das relações de trabalho. Com a flexibilização do mercado de trabalho, o emprego não aumentou proporcionalmente ao total da população, somente o desemprego e a precarização da mão-de-obra.

Assim, é chegada a hora da reforma trabalhista, de um novo pacto sobre a relação capital e trabalho. O momento é único, e o Brasil necessita disso, pois estamos contando com um operário, um sindicalista que transformou o sindicato em instrumento de reivindicação por melhores condições de trabalho e também de participação popular. O Governo Lula é fruto de uma ampla esperança da sociedade brasileira, seja do setor produtivo, seja dos trabalhadores. Por outro lado, o Congresso Nacional tem todas as condições para, como conciliador de vários setores da sociedade, promover um urgente debate sobre a reforma trabalhista, motivo pelo qual peço que tanto a Oposição como o Governo se sensibilizem e ampliem a pauta do Congresso, pois o debate sobre o salário mínimo poderia iniciar-se pela criação de diversos outros mecanismos de proteção do trabalhador.

O salário mínimo é instrumento de geração de emprego e renda neste País. O debate do salário mínimo está posto nesta Casa, e, em outra oportunidade, a reforma trabalhista virá à tona como um instrumento de valorização do trabalhador e do setor produtivo do nosso País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/2004 - Página 18672