Discurso durante a 85ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Satisfação diante da aprovação do salário mínimo de R$ 275,00. Homenagem aos Senadores Geraldo Mesquita Júnior e Paulo Paim.

Autor
Heloísa Helena (S/PARTIDO - Sem Partido/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL.:
  • Satisfação diante da aprovação do salário mínimo de R$ 275,00. Homenagem aos Senadores Geraldo Mesquita Júnior e Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2004 - Página 18841
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, FOTOGRAFIA, NOTICIARIO, IMPRENSA, COMEMORAÇÃO, ORADOR, SENADOR, APROVAÇÃO, SENADO, MELHORIA, SALARIO MINIMO, QUESTIONAMENTO, ALTERAÇÃO, POSIÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • APREENSÃO, AUSENCIA, DESMENTIDO, GOVERNO FEDERAL, TENTATIVA, MANIPULAÇÃO, CONGRESSISTA, VOTO, SALARIO MINIMO, ELOGIO, INDEPENDENCIA, VOTAÇÃO, SENADO, ESPECIFICAÇÃO, DEMOCRACIA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, GERALDO MESQUITA JUNIOR, PAULO PAIM, SENADOR, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

A SRª HELOÍSA HELENA (Sem Partido - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, muito obrigada. Agradeço também ao Senador Teotônio Vilela Filho pela permuta, para que eu pudesse falar.

Estava aqui o Senador Mão Santa brincando comigo, dizendo para eu falar da tribuna, para ficar bem pertinho da bandeira do Brasil. Vou ficar aqui perto de S. Exª, mas sabem qual é a parte do Hino Nacional de que mais gosto?

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - É o deitado.

A SRª HELOÍSA HELENA (Sem Partido - AL) - “Um filho teu não foge à luta.” É muito linda essa parte, não é?

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - O do Piauí é mais bonito.

A SRª HELOÍSA HELENA (Sem Partido - AL) - Não, o mais bonito é o de Alagoas. Não vamos aqui brigar por hinos.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - É o primeiro que chega à luta.

A SRª HELOÍSA HELENA (Sem Partido - AL) - S. Exª está dizendo que é o primeiro que chega à luta, mas chegam à luta para associar-se aos alagoanos. Daqui a pouco o Senador Geraldo Mesquita vai falar do Acre, cuja história é muito linda também, e todos vão querer falar dos seus Estados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tive a oportunidade de folhear os jornais hoje e ver as fotos. Os Senadores Geraldo Mesquita e Paulo Paim não estão aqui porque não foram enquadrados na foto, mas, sem dúvida, estão na comemoração. Fico perguntando onde estão aqueles que sempre estiveram ao meu lado. Não é estranho que eu e os Senadores Geraldo Mesquita e Paulo Paim estejamos comemorando o aumento do salário mínimo.

Volto a repetir que R$15,00 não são nada para um Senador ou para os banqueiros que estão enchendo a pança com a ortodoxia monetária. No entanto, para uma mãe de família pobre, R$15,00 é muito dinheiro. Só sabe o que é R$1,00 no orçamento de uma família pobre quem tem sensibilidade ou quem já passou por uma situação extremamente dramática como essa.

Fiquei olhando todas as fotos e perguntando: onde estão aqueles que, historicamente, lutavam pelo aumento do salário mínimo? Onde estão aqueles que, historicamente, diziam que não poder dar o aumento do salário mínimo porque, supostamente, quebraria a Previdência era o argumento fraudulento e a cantilena enfadonha e mentirosa do Governo Fernando Henrique.

Às vezes, fico pensando: se eu estivesse como Líder do PT no Senado, há dois anos, ou como Líder da Oposição ao Governo Fernando Henrique, se eu tivesse feito críticas ao Governo Fernando Henrique por causa de bravatas, demagogia eleitoralista, por vigarice política, certamente eu me sentiria absolutamente tranqüila de mudar de lado - a propósito: as críticas que ao Governo Fernando Henrique eu fazia continuo fazendo pela sua inconseqüência política e por tudo o que ele destruiu em nosso País. Infelizmente, porém, vejo hoje o Governo Lula não apenas dando continuidade àquela política econômica, mas aprofundando o modelo neoliberal. Muitas coisas o Governo Fernando Henrique não conseguiu fazer porque tinha um obstáculo maravilhoso, conseqüente, combativo, atuando nos movimentos sociais ou na institucionalidade, mas o que era o obstáculo se transformou em ferramenta da propaganda triunfalista do neoliberalismo. Isso, sem dúvida, é muito doloroso constatar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia deixar de fazer essas considerações, já que alguns me perguntaram: “Como a senhora se sente por estar ao lado de quem está?” E eu digo que me sinto do mesmo jeito que me sentia. Agora, é evidente que estranho que o PT não esteja aqui, que o PT esteja usando os mesmos argumentos que eram combatidos como se argumentos fraudulentos fossem quando apresentados pelo Governo Fernando Henrique, estranho que hoje, de forma cínica e dissimulada, esses argumentos sejam apresentados ao povo brasileiro como se fossem a expressão da verdade absoluta.

Expresso aqui a minha saudação e o meu agradecimento à Casa. Penso que o Senado atuou de forma importante. Eu, que tantas vezes critico tanto o Senado - e critico muito mesmo, ao ponto de, às vezes, defender o unicameralismo para que o Senado deixe de existir - admito que, ultimamente, o negócio está muito diferente. Estou quase que impressionada, porque o que este Senado passou esses últimos dias...

Cito o vexatório balcão de negócios sujos, algo que não foi dito por mim, foi dito pela imprensa com detalhes de crueldade. Ninguém dizia que aquilo não era verdade, ninguém dizia que não se estavam entregando cargos, prestígio, liberação de emendas e poder, ninguém dizia que não era verdade. Era extremamente doloroso para todos nós, porque eu ficava esperando que alguém pegasse o microfone e dissesse: “É mentira, o Governo não está estabelecendo a promiscuidade, duramente condenada anteriormente, entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional”. Infelizmente ninguém dizia nada; infelizmente ninguém dizia nada.

É por isso que quero agradecer por essa postura corajosa e combativa do Senado. Não vou mais comentar - já tive oportunidade de fazê-lo nos apartes - as declarações do Ministro Aldo Rebelo. Espero realmente que a Câmara não se transforme, como disse o Senador Mão Santa, na câmara de gás contra os trabalhadores brasileiros, submetendo-se à vexatória condição de não aprovar os R$ 275,00. E espero também, pelo amor de Deus, que não saqueiem o resto do País para comprar Deputados, como tentaram fazer aqui no Senado.

Mas quero homenagear dois Senadores pela postura que adotaram na votação de ontem. Quero fazer uma homenagem ao Senador Geraldo Mesquita e ao Senador Paulo Paim. Sei que outros Senadores, inclusive do PT, do PSB e da Base de sustentação do governo fizeram um esforço e votaram contrariamente, mas quero homenagear esses Senadores porque há duas coisas que os dois representam que são muito preciosas para mim: uma delas é o sentido democrático. O Senador Geraldo Mesquita dedicou a sua vida, a sua juventude para que nós estivéssemos aqui hoje, para a conquista da democracia. S. Exª é um socialista por convicção, pena que não tenha tido a oportunidade de aqui conviver com o Senador Lauro Campos. V. Exª iria se sentir muito feliz com essa convivência, como eu também me senti extremamente feliz e sensibilizada com seu discurso. Eu sei do momento difícil que S. Exª estava vivenciando quando naquela tribuna falava: era como se eu estivesse vivenciado o meu próprio sofrimento, quando tive que ir àquela tribuna sabendo o que poderia me acontecer na época do debate da reforma da Previdência. Portanto, minha homenagem a S. Exª por ter tido a coragem de não negar as suas convicções ideológicas, a sua concepção programática, tudo o que foi acumulado ao longo de sua história e que reproduz aquilo que foi acumulado ao longo da história como concepção programática dos que ousaram condenar, combater o pensamento único. Isso, sem dúvida, é oxigênio para todos nós. Do mesmo modo, homenageio o Senador Paulo Paim.

Senador Paulo Paim, na época de minha campanha ao Senado, os nossos adversários diziam coisas do tipo: “Quem é essa negrinha que quer ser Senadora?” - estou meio amarela; sertaneja sem sol vai ficando meio amarela! Eles diziam muito: “Quem é essa negrinha que quer ser Senadora? De que família? Olha como ela se veste! Como é que ela quer ir representar Alagoas no Senado, naquela Casa tão importante?” É por isso que eu sou tão agradecida à generosidade do povo da minha querida Alagoas, que quebrou uma velha tradição, pois eu não era da varanda dos usineiros nem da cozinha dos pistoleiros, não era nascida nos berços de ouro das famílias tradicionais das Alagoas e pude, pela generosidade do povo, tocar os tapetes azuis do Congresso Nacional.

Quero saudar V. Exª, que honra a tradição de luta e de libertação do povo negro. Eu tive oportunidade, na abertura do congresso do nosso partido, Partido do Socialismo e Liberdade, de recordar algo para ilustrar uma resposta àqueles muitos que ousaram pensar que, com a nossa expulsão ou com a negação das concepções programáticas acumuladas ao longo da história da esquerda socialista democrática, seria possível aniquilar, liqüidar as bandeiras históricas da classe trabalhadora e a concepção programática acumulada pela esquerda socialista e democrática. E eu lembrava do mais belo dos sonhos, que é o sonho da liberdade, sonho que nem o fogo, nem o açoite, nem os castigos impostos aos negros - crucificados ou amarrados em ganchos tomados nas suas costelas -, foram capazes de impedir.

Sabe V. Exª, como sabemos todos nós, a primeira vez que um negro fugia, cortavam-lhe o tendão de Aquiles; a segunda vez que ele tentava ousar fugir novamente, cortavam-lhe a perna inteira; e se eles ousassem não denunciar aqueles fugitivos, eram absolutamente retalhados. E mesmo assim, Srªs e Srs. Senadores, não conseguiram conter o sonho e a luta da liberdade.

É por isso que tenho que ter muito orgulho da posição de V. Exª e muito orgulho do sangue dos negros e das negras, Dandara, Zumbi dos Palmares, que corre nas minhas veias.

E era uma coisa bela, eu estava mostrando ao Senador Geraldo Mesquita, nesse instante, dois parágrafos lindos de Eduardo Galeano, quando ele falava das negras que fugiam dos fogos tenazes, dos açoites, da pancadaria e da perseguição. Sabem o que elas levavam? Sabem o que elas roubavam? Pepitas de ouro? Não. Jóias importantes? Pratarias das casas grandes? Não. Elas simplesmente escondiam nas suas cabeleiras o que para elas era mais belo, que eram as pepitas de semente de milho, semente de abóbora, semente de feijão, e quando elas entravam no que era o maior aliado dos negros, a floresta impenetrável, elas tiravam as sementes do cabelo e fecundavam a terra livre. Isso, sem dúvida, é uma coisa belíssima e maravilhosa.

É por isso que não poderia deixar de saudar V. Exª, Senador Paulo Paim, e V. Exª, Senador Geraldo Mesquita, pois imagino o significado dos gestos de V. Exªs, porque passei por eles também, mas nada melhor do que a consciência tranqüila. E sabemos exatamente quando nos ameaçam: “E o futuro político? E os coeficientes eleitorais e as vitórias eleitorais?” Isso não tem importância nenhuma. É zero. Tenho certeza de que o que mais vai me dar alegria é voltar para a minha sala de aula na Universidade Federal de Alagoas. E sabem como serei recebida? Serei recebida com flores, carinho, abraços e bolo de chocolate pelas nossas queridas e queridos companheiros da Universidade.

Essas coisas contam muito para nós. Contam muito mais do que a ameaça e a negociata. Isso conta para quem tem aquilo que D. Pedro Casaldáliga dizia - talvez ninguém, nem os mais importantes intelectuais, referências para a esquerda, para o mundo da política, tenha conseguido expressar, de forma mais singela e preciosa, o que D. Pedro Casaldáliga disse sobre ética na política: “Ética na política é vergonha na cara e amor no coração”.

É por isso que fiz questão de saudar, em nome do SOL - Socialismo e Liberdade, o nosso Partido, a postura do Senado, uma postura corajosa e combativa, que espero seja seguida pela Câmara Federal. Espero que a Câmara dos Deputados não haja sob pressão do Palácio do Planalto. Volto a repetir: votamos de consciência tranqüila. Alguns ainda têm a ousadia de dizer que defender R$15,00 a mais para uma mãe de família pobre é demagogia e irresponsabilidade. Certamente quem assim diz nunca teve uma única lágrima caindo da sua face diante da menininha que vende o corpo por um prato de comida, diante do jovem que é tragado pela marginalidade como último refúgio. Certamente nunca viram nas suas próprias casas o que R$1,00 pode efetivamente fazer.

Portanto, parabéns ao Senado. Espero que a Câmara dos Deputados tenha não apenas a independência, que é obrigatória pela Constituição, mas a sensibilidade necessária para viabilizar essa conquista que o povo brasileiro teve aqui no Senado da República.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2004 - Página 18841