Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Voto de pesar pelo falecimento do ex-governador Leonel de Moura Brizola.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Voto de pesar pelo falecimento do ex-governador Leonel de Moura Brizola.
Publicação
Publicação no DSF de 23/06/2004 - Página 19044
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), ELOGIO, VIDA PUBLICA, LIDERANÇA, ATIVIDADE POLITICA.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador José Sarney, Srªs e Srs. Senadores, sem sombra de dúvida, hoje, o Brasil parou, do mais simples grotão às capitais. No Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados parou para homenagear o seu Deputado Federal mais ilustre; o Senado Federal parou. O Poder Executivo parou. O Poder Judiciário parou. O País parou.

Com a morte do Governador Leonel Brizola, ocorrida na noite de ontem, no Rio de Janeiro, o Brasil perde um dos maiores políticos da nossa geração.

Não há como fugir a um paralelo entre Getúlio Vargas e Leonel Brizola. Da República Velha até sua morte, em 1954, o Brasil girou em torno de Vargas. De lá para cá, coube a Brizola ser a referência dos interesses nacionais.

Tenho a impressão, Sr. Presidente, de que, quando Getúlio partiu, deixou que Brizola continuasse a sua obra.

Como Getúlio, Brizola entendia e interpretava como ninguém a visão do trabalhador brasileiro. Soube mobilizar as classes trabalhadoras inúmeras vezes, ao arrepio das elites. Com a Cadeia da Legalidade, resistiu ao golpe que seria dado em 1961. Nesse momento histórico, lembro que ele contou com os militares da Aeronáutica, que estavam resistindo na minha cidade, Canoas, no Rio Grande do Sul. Contou também com o Exército. Brizola apareceu na sacada do Piratini, abanou ao povo, de metralhadora em punho, em nome da liberdade e da democracia.

Eu poderia lembrar, Sr. Presidente, que Getúlio criou o salário mínimo, mas foi Brizola que, mesmo na sua morte, protestou, exigindo um salário mínimo melhor. Brizola deixa para morrer exatamente no dia em que a Câmara poderia aprovar um salário mínimo menor que o aprovado pelo Senado da República. E Brizola, mesmo morrendo, protestou dizendo: “Quero um salário melhor para o meu povo, para os trabalhadores”.

Sr. Presidente, Brizola teve extrema dificuldade para estudar. Por isso, fez da educação um dos eixos, um dos nortes da sua vida. Não vou falar dos Cieps e de outras tantas iniciativas. Foi na faculdade que Brizola achou sua vocação para a política.

Eu mesmo sofri a influência positiva do comandante-em-chefe Leonel Brizola. Em 1954, quando Getúlio morreu, meu pai, que faleceu há 30 anos, desceu as escadas, pegou-me pela mão - essa é minha única lembrança da infância, com quatro anos - e disse: “Assassinaram o nosso líder. Assassinaram Getúlio Vargas”.

Dez anos depois, em 1964, ocorreu um fato que me faz lembrar outra vez do meu velho. Havia na sala uma enorme foto de Brizola. Ele retirou a foto e disse: “Este é um grande homem, mas não posso falar nele”. E escondeu debaixo do colchão a foto de Brizola, dizendo: “Vai ficar aqui, mas não te preocupes. Mira-te nele, porque ele um dia voltará”. E Brizola voltou.

Desse dia em diante, na galeria dos homens da minha vida do Rio Grande do Sul, jamais me esquecerei de Getúlio Vargas, João Goulart, Alberto Pasqualini e Luiz Carlos Prestes. Também não vou deixar de lembrar dos lanceiros negros da Revolução dos Farrapos.

João Goulart só não perdeu a possibilidade de ser Presidente da República porque o Governador da época resistiu até o último momento.

Estou acelerando, Sr. Presidente, mas quero lembrar um outro passo: foi Leonel Brizola quem permitiu que chegasse ao Senado da República o primeiro negro...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - ... pela iniciativa e pela forma de ver a política, porque interferiu positivamente para que o grande Abdias Nascimento fosse suplente de Darcy Ribeiro. Tivemos aqui, então, o primeiro Senador negro, chamado Abdias Nascimento.

Para a nossa infelicidade, Leonel Brizola não chegou à Presidência da República. Tentou por duas vezes, mas, a exemplo de Rui Barbosa, não conseguiu; preferiu ficar com as suas convicções e a sua coerência.

Quem acompanhou Leonel de Moura Brizola de perto deve ter ouvido aquela frase dele: “Basta-me um microfone para derrotar os adversários”. Essa frase mostra o quanto ele acreditava nas suas idéias. Esse microfone lhe foi retirado, ou pelo menos limitado, nas ocasiões em que fez a grande disputa da sua vida.

Estive com Brizola na caminhada das Diretas. Brizola voltou à minha vida agora, nos últimos dois anos. Conversamos muito sobre a reforma da previdência e sobre o salário mínimo. Brizola esteve em meu gabinete, registrando a sua solidariedade. Recordo-me da sua última frase: “Temos de conversar muito. Este País, companheiro Paim, tem tudo para dar certo”.

Sr. Presidente, concluo dizendo que uma das boas experiências da minha vida foi, ainda como sindicalista, ter ido à Nicarágua como integrante de uma comissão especial. Naquele país, conversei muito com Thomas Borges, a quem perguntei qual era o momento mais bonito ou mais triste da revolução sandinista. Ele me responde que foi a época em que estava no cárcere, sob a tortura do ditador Somoza, quando um dos seus gorilas entrou e disse: “Acabou a revolução sandinista. O seu principal líder, Carlos Fonseca, morreu”. E Thomas Borges respondeu: “Te enganas. Carlos Fonseca não morreu. Ele estará sempre vivo, entre nós, pelas suas idéias”.

Sr. Presidente, por que faço essa comparação? Porque o ex-Governador do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro, Deputado Federal Leonel Brizola não morreu. A exemplo de Carlos Fonseca, suas idéias e sua coerência estarão sempre junto a nós, na nossa alma, no nosso coração e na nossa mente.

Leonel de Moura Brizola, presente! Deputado Estadual, Prefeito, Deputado Federal, Governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro.

Viva Brizola, eternamente presente!

Termino dizendo, Sr. Presidente, que essa história há de ser contada em verso e prosa, à beira das fogueiras, do lado dos rios, nas universidades, e os livros contarão a caminhada desse homem a gerações e gerações.

Viva Brizola, eternamente presente.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/06/2004 - Página 19044