Discurso durante a 94ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a recente viagem do presidente Lula à China.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários sobre a recente viagem do presidente Lula à China.
Publicação
Publicação no DSF de 01/07/2004 - Página 20335
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, INCOMPETENCIA, FALTA, COORDENAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DIVULGAÇÃO, ACORDO, VENDA, URANIO, USINA NUCLEAR, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, DESCONHECIMENTO, PROIBIÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna neste momento para fazer um breve comentário sobre a recente viagem do presidente Lula à China, considerada por ele como a mais importante de sua gestão.

O editorial do jornal O Estado de S. Paulo do último dia 28 de maio, intitulado “A trapalhada que não podia faltar” confirma como o desempenho do Governo Lula é marcado pela descoordenação, falta de conhecimento e excesso de vanglória. Com o atrapalhado episódio sobre a divulgação do acordo de cooperação nuclear entre Brasília e Pequim, o presidente Lula e seus ministros mais uma vez deixaram no exterior a marca da incompetência do atual governo.

Para que conste dos Anais do Senado, requeiro, Sr. Presidente, que o texto em anexo seja considerado como parte integrante deste pronunciamento.

Era o que tinha a dizer.

 

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(DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO)

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e & 2º, do Regimento Interno)

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Matéria referida:

O Estado de S. Paulo, 28/05/2004

Editorial

            A trapalhada que não podia faltar

            Mesmo quando as coisas parecem correr bem para o governo - o que tem sido antes a exceção do que a regra -, o governo se encarrega de fazê-las correr mal. Não foi diferente na viagem do Presidente Lula à China, para ele a mais importante de sua gestão. A visita caminhava para ser um robusto êxito diplomático, sem tropeços, justificando, se não as ambiciosas expectativas do Planalto em relação aos seus efeitos de longo prazo, decerto o tratamento que lhe deram os principais órgãos de imprensa dos Estados Unidos e da Europa. Mas eis que o costumeiro padrão de desempenho do Governo Lula - feito de descoordenação, falta de conhecimento e excesso de vanglória - tornou a emergir. E deixou, na cena internacional, a marca de uma situação constrangedora para o Brasil, proporcional ao barulho em torno do que se revelaria, no máximo, um factóide. Está se falando, é claro, do inexistente acordo de cooperação nuclear entre Brasília e Pequim, pelo qual, basicamente, o País venderia óxido de urânio (o chamado yellow-cake) destinado a alimentar, depois de beneficiado, as usinas chinesas e, em troca, ajudaria a grande potência nuclear a construir 11 usinas. Na terça-feira, em discurso presumivelmente revisado em um ou mais de um Ministério, o presidente afirmou que "a exploração conjunta de minas de urânio" constitui uma área promissora de parceria sino-brasileira. Na mesma linha e com muito mais pormenores, se manifestou o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, ao relatar aos jornalistas brasileiros as suas conversações com interlocutores chineses da área. A rigor, o presidente da República não tem a obrigação de saber - embora seria auspicioso que soubesse - que o Brasil não vende urânio, por se tratar de material sensível, nem pode explorar o minério com outros países, no território, por impedimento constitucional. Enquanto, por motivos óbvios, se propagavam as notícias da suposta cooperação nuclear, o ministro Campos, que certamente foi o "inventor" do acordo inexistente, recebeu ordem para divulgar uma nota dando o dito por não dito. Mais tarde, numa entrevista, Lula demonstrou o seu desconforto com a trapalhada. A uma pergunta do Estado, disse, enredado nas palavras: "Esse assunto, você, na nota, se ler ela direitinho, vai saber qual é a posição do Brasil, o que nós esperamos disso. Portanto, qualquer dúvida, você conversa com o ministro, que ele poderá te dar outra vez a nota." O estrago estava feito. Um funcionário americano, ouvido por nosso correspondente Paulo Sotero, observou que o episódio "reforça a percepção de falta de seriedade que persegue o Brasil". E um diplomata norte-americano fulminou: "Não temos por hábito comentar coisas que não aconteceram." Para mal dos nossos pecados, é o que também se poderia dizer da "aliança" que o presidente Lula imagina que tenha cimentado com a China no plano econômico e estratégico global. "Muita gente no mundo está torcendo para que essa aliança não dê certo", afirmou, em um improviso. No sentido que lhe deu Lula, nada sugere que essa aliança aconteceu. A China - e isso deveria servir de lição ao governo brasileiro - sabe perfeitamente quais são os seus interesses e não confunde estreitamento de relações econômicas bilaterais com eventuais parcerias estratégicas na esfera multilateral. O governo chinês quer, sim, mais negócios com o Brasil - e o presidente terá do que se orgulhar se a sua viagem, como tudo indica, contribuir para isso. Mas, como tudo indica também, Lula se engana ao supor que a China esteja inclinada a formar, com o Brasil, um eixo que privilegiaria as chamadas relações econômicas Sul-Sul e do qual participariam a Índia, a África - e a Rússia. As convicções do presidente parecem nutrir-se das próprias palavras com que as exprime, o que não diminui a distância entre elas e os fatos. E estes, até onde se percebe, são inequívocos ao apontar que a prioridade da China continua a ser a de integrar plenamente o Norte, e a da Rússia, a de voltar a integrá-lo. Conflitos comerciais não mudam essa realidade nem conduzem a rupturas. Por sinal, os mesmos jornais de ontem que trouxeram a esperançosa fala de Lula trouxeram o plano do presidente Vladimir Putin de dobrar até 2008 o tamanho da economia russa, o que fará com que ela se volte ainda mais para os países desenvolvidos. Falta ao Governo, em suma, competência (na administração) e realismo (na visão de mundo). Não é pouco.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/07/2004 - Página 20335