Discurso durante a 95ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Impossibilidade de S.Exa. comparecer às homenagens por ocasião do falecimento do ex-governador Leonel Brizola, destacando a trajetória pública desse grande brasileiro.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. HOMENAGEM.:
  • Impossibilidade de S.Exa. comparecer às homenagens por ocasião do falecimento do ex-governador Leonel Brizola, destacando a trajetória pública desse grande brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2004 - Página 20560
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. HOMENAGEM.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, IMPOSSIBILIDADE, COMPARECIMENTO, ORADOR, HOMENAGEM POSTUMA, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, MISSÃO, EXTERIOR.
  • HOMENAGEM POSTUMA, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), ELOGIO, LIDERANÇA, VIDA PUBLICA, SIMBOLO, LUTA, DEFESA, IDEOLOGIA, NACIONALISMO, REALIZAÇÃO, DEMOCRACIA, JUSTIÇA SOCIAL.
  • LEITURA, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DISCURSO, AUTORIA, LEONEL BRIZOLA, EPOCA, GESTÃO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), DEFESA, RESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ANTERIORIDADE, GOLPE DE ESTADO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Luiz Otávio, Srªs e Srs. Senadores, eu não estava presente no Brasil na semana passada, porque fui convidado para participar de um simpósio no Centro de Estudos Brasileiros na Universidade de Oxford e também para participar, na Assembléia Nacional Francesa, de um simpósio sobre a dotação universal ou a renda básica de cidadania, que está sendo objeto de recomendação por inúmeros Parlamentares, economistas e cientistas sociais, inclusive pelo membro da Academia Francesa de Letras Maurice Druon.

Por estar realizando essa missão no exterior, não pude comparecer às homenagens prestadas ao Governador Leonel Brizola, Presidente Nacional do Partido Democrático Trabalhista. Eu não poderia deixar de expressar meu sentimento de pesar a toda sua família, bem como aos companheiros do PDT, ao Líder Jefferson Péres e a todos os membros do PDT no Senado Federal.

Eu gostaria de transmitir o quanto, para mim, desde jovem, o Presidente Nacional do PDT, Leonel Brizola, constituiu-se numa das lideranças de maior importância na história do Brasil e um símbolo de luta por suas convicções de defesa do nacionalismo e da realização da justiça e da democracia.

Sempre uma pessoa de extraordinária coragem, ele sabia se utilizar de sua arma principal, a sua palavra, a sua voz, para, em inúmeros momentos da nossa história, dizer aquilo que era tão necessário que fosse dito em nome do povo brasileiro, do povo gaúcho, do povo do Rio de Janeiro. Certamente, Leonel Brizola deixa marca muito importante para todos nós.

Fui testemunha de inúmeros diálogos do então Presidente Nacional do PDT, Leonel Brizola, com o então Presidente Nacional do PT e hoje Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Foi em minha própria casa, em São Paulo, que eu e a Marta, hoje Prefeita de São Paulo, tivemos a honra de receber para uma reunião e para um almoço Leonel Brizola e Lula. Os dois tiveram alguns de seus primeiros diálogos em minha própria casa. Isso ocorreu mais de uma vez. O Presidente do PDT, Leonel Brizola, então voltando de longo tempo do exílio, disse ao Presidente Nacional do PT, Lula, à época, o quanto era importante unir as forças em defesa da democracia, em defesa das eleições diretas. Aquele diálogo contribuiu muito para que ambos estivessem juntos em inúmeras campanhas, como a das Diretas Já, em 1984, e, posteriormente, em 1992, a campanha pela Ética na Política.

Em 1989, ambos foram candidatos à Presidência da República. Foi quando Lula chegou ao segundo turno, e Leonel Brizola resolveu dar-lhe todo o apoio. Em 1998, Leonel Brizola resolveu abraçar a campanha de Lula, e, como seu companheiro de chapa, candidatou-se a Vice-Presidente da República. Nas eleições de 2002, novamente, Leonel Brizola e o seu Partido resolveram apoiar a candidatura de Lula.

Sim, é bem verdade que, nesse ano e meio, Leonel Brizola inúmeras vezes teceu críticas à condução do Governo por parte de Lula. Muitas vezes publicou artigos, deu entrevistas e fez pronunciamentos com críticas severas ao Presidente Lula e ao seu Governo, em virtude daquilo que ele, Brizola, considerava importante. Isso, inclusive, explica a razão de uma hostilidade por ocasião da presença do Presidente Lula ao funeral de Leonel Brizola, quando parte dos seus companheiros resolveram manifestar seu sentimento.

Quando Leonel Brizola tecia essas avaliações críticas ao Presidente Lula e ao seu Governo, tenho certeza de que ele assim agia no melhor sentido de defender o interesse público. Estava Leonel Brizola dizendo aquilo que considerava importante para a defesa da nacionalidade, da educação, da cultura brasileira, de uma política que pudesse ser sinônimo de soberania para o Brasil. Portanto, presto a minha homenagem a um companheiro de batalha pela democracia e pela defesa do interesse nacional, que foi Leonel Brizola.

Entre os pronunciamentos que marcaram época na história brasileira, está justamente aquele do dia 28 de agosto de 1961, quando o então Governador Leonel Brizola, pela Rádio Guaíba, diretamente da sede do Governo, o Palácio Piratini, em Porto Alegre, fez um pronunciamento de extraordinária importância para a história do Brasil, porque naquele dia muitos estavam preparando um golpe militar, um golpe de Estado. Não fosse pela ação de Leonel Brizola naquele dia, o golpe militar teria ocorrido pelo menos três anos antes.

Tão importantes foram as palavras de Leonel Brizola naquele dia que eu vou ler aqui, Sr. Presidente, alguns trechos do seu pronunciamento para recordarmos e para que permaneçam nos Anais do Senado Federal em 2004. Quero observar que estas palavras foram pronunciadas em 28 de agosto de 1961 por Leonel Brizola:

Peço a vossa atenção para as comunicações que vou fazer. Muita atenção. Atenção, povo de Porto Alegre! Atenção Rio Grande do Sul! Atenção Brasil! Atenção meus patrícios, democratas e independentes, atenção para as minhas palavras!

Em primeiro lugar, nenhuma escola deve funcionar em Porto Alegre. Fechem todas as escolas. Se alguma estiver aberta, fechem e mandem as crianças para junto de seus pais. Tudo em ordem. Tudo em calma. Tudo com serenidade e frieza. Mas mandem as crianças para casa. Quanto ao trabalho, é uma iniciativa que cada um deve tomar, de acordo com o que julgar conveniente.

Quanto às repartições públicas estaduais, nada há de anormal. Os serviços públicos terão o seu início normal, e os funcionários devem comparecer como habitualmente, muito embora o Estado tolerará qualquer falta que, porventura, se verificar no dia de hoje.

Tenho os fatos mais graves a revelar

Hoje, nesta minha alocução, tenho os fatos mais graves a revelar. O Palácio Piratini, meus patrícios, está aqui transformado em uma cidadela, que há de ser heróica, uma cidadela da liberdade, dos direitos humanos, uma cidadela da civilização, da ordem jurídica, uma cidadela contra a violência, contra o absolutismo, contra os atos dos senhores, dos prepotentes. No Palácio Piratini, além da minha família e de alguns servidores civis e militares do meu gabinete, há um número bastante apreciável, mas apenas daqueles que nós julgamos indispensáveis ao funcionamento dos serviços da sede do Governo. Mas todos os que aqui se encontram estão de livre e espontânea vontade, como também grande número de amigos que aqui passou a noite conosco e retirou-se, hoje, por nossa imposição.

Aqui se encontram os contingentes que julgamentos necessários. Da gloriosa Brigada Militar o Regimento Bento Gonçalves e outras forças. Reunimos aqui o armamento de que dispúnhamos. Não é muito, mas também não é pouco para aqui ficarmos preocupados frente aos acontecimentos. Queria que os meus patrícios do Rio Grande e toda a população de Porto Alegre, todos os meus conterrâneos do Brasil, todos os soldados da minha terra querida pudessem ver com seus olhos o espetáculo que se oferece.

Aqui nos encontramos e falamos por esta estação de rádio, que fora requisitada para o serviço de comunicação, a fim de manter a população informada e, com isso, auxiliar a paz e a manutenção da ordem. Falamos aqui do serviço de imprensa. Estamos rodeados por jornalistas, que teimam, também, em não se retirar, pedindo armas e elementos necessários para que cada um tenha oportunidade de ser também um voluntário, em defesa da legalidade.

“Não nos submeteremos a nenhum golpe”

Esta é a situação! Fatos os mais sérios quero levar ao conhecimento de meus patrícios de todo o País, da América Latina e de todo o mundo. Primeiro: ao me sentar aqui, vindo diretamente da residência, onde me encontrava com minha família, acabava de receber a comunicação de que o ilustre General Machado Lopes, soldado do qual tenho a melhor impressão, me solicitou audiência para um entendimento. Já transmiti, aqui mesmo, antes de iniciar minha palestra, que logo a seguir receberei. S.Exª, com muito prazer, porque a discussão e o exame dos problemas é o meio que os homens civilizados utilizam para solucionar os problemas e as crises. Mas pode ser que essa palestra não signifique uma simples visita de amigo.

Que essa palestra não seja uma aliança entre o poder militar e o poder civil, para a defesa da ordem constitucional, do direito e da paz como se impõe neste momento, como defesa do povo, dos que trabalham e dos que produzem, dos estudantes e dos professores, dos juízes e dos agricultores, da família.

Todos, até as nossas crianças desejam que o poder militar e o poder civil se identifiquem nesta hora para vivermos na legalidade. Pode significar, também, uma comunicação ao Governo do Estado da sua deposição. Quero vos dizer que será possível que eu não tenha oportunidade de vos falar mais, que eu nem deste serviço possa me dirigir mais, comunicando esclarecimentos à população. Porque é natural que, se ocorrer a eventualidade do ultimato, ocorrerão, também, conseqüências muito sérias.

E por aí seguiu falando Leonel Brizola num pronunciamento de extraordinária coragem.

Sr. Presidente, solicito que esse pronunciamento de Leonel Brizola seja transcrito na íntegra.

Quero, com isso, ressaltar que o Governador Leonel Brizola, naquele dia, estava defendendo o respeito à Constituição do Brasil. Todo o ocorrido naquele período, de 31 de março de 1964 até 1985, ou até 1989, quando finalmente houve eleições livres e diretas para a Presidência da República. Portanto, houve mais de um quarto de século de regime de exceção. Tudo aquilo que ocorreu nos leva a afirmar que é importantíssimo aprendermos com as lições da História e que nunca mais permitamos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que sejam rasgadas aquelas normas constitucionais, aqueles preceitos que correspondem aos anseios de democracia, de liberdade e de respeito àqueles que tenham sido eleitos pela vontade do povo brasileiro.

Portanto, essa é a minha homenagem aos companheiros e à família de Leonel Brizola e ao PDT. Sempre mantive com Brizola um relacionamento de fraternidade e de respeito. Tenho convicção de que esse relacionamento entre o PT e o PDT terá longa vida.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Discurso de um Rebelde.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2004 - Página 20560