Discurso durante a 96ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Cobrança da votação da "Pec Paralela". Comentários à matéria da revista IstoÉ, intitulada "O Espetáculo do crescimento mora ao lado". Comentários à proposta do Sr. Pérsio Arida, de vinculação do FGTS ao salário do trabalhador. Reflexão sobre o projeto de parcerias público-privadas.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Cobrança da votação da "Pec Paralela". Comentários à matéria da revista IstoÉ, intitulada "O Espetáculo do crescimento mora ao lado". Comentários à proposta do Sr. Pérsio Arida, de vinculação do FGTS ao salário do trabalhador. Reflexão sobre o projeto de parcerias público-privadas.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2004 - Página 20871
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COBRANÇA, VOTAÇÃO, PROPOSTA, ALTERNATIVA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ISTOE DINHEIRO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SITUAÇÃO, EFICACIA, RECUPERAÇÃO, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • QUESTIONAMENTO, PROPOSTA, INCORPORAÇÃO, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), SALARIO, TRABALHADOR, DESVINCULAÇÃO, BENEFICIO, APOSENTADO, PENSIONISTA, SALARIO MINIMO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, PROGRAMA, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, IMPEDIMENTO, PREJUIZO, ESTADO.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Serys Slhessarenko, Srªs e Srs. Senadores, sou um Senador da base do Governo, mas tenho discordado dele em alguns pontos, como no caso da reforma da Previdência.

Homenageio a V. Exª, Senadora que preside os trabalhos, pela firmeza com que defendeu, há minutos, o acordo sobre a PEC paralela. Repetindo suas palavras, “acordo é para ser cumprido”.

Senadora Heloísa Helena, os problemas do Governo de Lula, no Senado, começaram com a reforma da Previdência, que foi a gota d’água para o seu “afastamento” - prefiro utilizar este termo.

A Srª Heloísa Helena (Sem Partido - AL) - Pode utilizar “expulsão”.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - V. Exª foi expulsa, pronto.

No debate a respeito da reforma da Previdência, foi firmado o acordo da PEC paralela. Passaram-se seis ou sete meses e ela ainda não foi votada.

É difícil para nós, que ajudamos a construir esse acordo, sermos chamados, três dias antes de um possível recesso, que, no meu entendimento vai acontecer a partir de sexta-feira, para votar uma série de matérias de interesse do poder econômico e do Governo, enquanto a PEC paralela, que interessa a seis milhões de trabalhadores, permanecerá guardada em gaveta na Câmara dos Deputados.

Não há como não falar sobre isso. Não há como, na reunião que será realizada hoje, não dialogarmos com os Líderes do Governo a respeito do compromisso com a PEC paralela, na expectativa de que ele seja cumprido, como disse muito bem V. Exª, antes do recesso parlamentar. Mas também não posso fechar os olhos para a realidade.

Neste final de semana, li a revista ISTOÉ Dinheiro, e não há como não comentar o que publica a revista: “Por que a Argentina vai tão bem?”

Alguns dados, de fato, preocupam-me. Como Senador da base do Governo, pretendo refletir também a respeito das situações da Argentina e do Brasil. Não quero copiar a política econômica da Argentina, mas nós, Senadores, deveríamos, no mínimo, refletir por que aquele país vai tão bem, apesar de estar praticamente quebrado há um ano e meio, e nós, que demos continuidade à política econômica do Governo anterior, encontramo-nos ainda numa situação tão delicada.

Srª Presidente, farei a leitura de um pequeno trecho que diz: “O espetáculo do crescimento mora ao lado”.

...o Presidente da Argentina disse que pagaria a dívida de seu país com crescimento, não com mais sacrifícios. Tornou-se um pecador. Pois bem: como está a Argentina hoje? O PIB cresceu nada menos que 11% no primeiro trimestre de 2004; já havia aumentado 9% em 2003. A taxa de juros caiu de 10% para 3% ao ano - em termos reais, é negativa - e a inflação, em vez de subir, cedeu. Ficará em 5% neste ano, abaixo da brasileira. Mais: a carga de impostos, que já preocupa os empresários, está em 21% do PIB, enquanto que a brasileira resvala nos 38%. [Para mim, o mais importante.] O desemprego ainda é alto, mas caiu de 22% para 14%.

Qual é o segredo? Segundo um grande empresário argentino “nada seria possível sem a desvalorização do peso”.

O segundo ponto ainda mais importante é a queda dos juros. Diz um outro empresário que “quem tem dinheiro na Argentina hoje investe na produção - não na especulação fácil e sem suor dos juros altos”, que também gera emprego.

Não quero fazer comparação, mas, sim, uma reflexão. Temos de refletir se o modelo usado na Argentina, dentro de sua realidade, deu tão certo, para onde estaremos caminhando? Não quero copiá-lo. Mas, quem sabe, um meio termo, que signifique diminuir taxa de juros.

“Na Argentina, investir na especulação financeira não leva a nada, leva mesmo é investir na produção”.

E mais: “Euforia: dólar estável, bolsa em alta, safra recorde e lojas cheias.”

Faço esse comentário para nossa reflexão.

Srª Presidente, há um outro assunto sobre o qual quero comentar rapidamente, ou seja, a minha preocupação acerca de matéria veiculada neste fim de semana, em que percebo estar se esboçando o tal do desbloqueio da União, conforme dizem alguns, das chamadas verbas vinculadas.

Para que a população entenda essa tal verba vinculada, à qual defendo - e vou continuar defendendo -, significa dizer que tantos por cento do orçamento, Senador Tião Viana, são destinados apenas para a Saúde, e não poderão ser deslocados para outras áreas; outros tantos por cento do orçamento são para a Educação, e também não poderão ser desviados. Então, que se tenha muito cuidado para com esse debate, senão daremos razão a diversos articulistas que dizem que não foi usado nem um quinto do dinheiro destinado à Segurança, à Saúde, à Educação e a outras áreas que têm escopo social.

Há uma outra preocupação que quero também levantar, Srª Presidente. Hoje, ouvi do Sr. Pérsio Arida a sugestão para acabar com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Quando dizem que o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço vai ser incorporado ao salário do trabalhador, esse discurso eu conheço. Quando “incorporamos” algo ao salário, ele desaparece. Hoje, mal ou bem, o Fundo de Garantia é um instrumento utilizado em situação de desemprego do trabalhador. Ou seja, o Fundo de Garantia é uma reserva para que o trabalhador possa se manter durante o período em que ele permanecer à procura de um novo emprego. E o Fundo de Garantia, corretamente, na minha avaliação - claro que prefiro a estabilidade, mas, já que ela não existe -, é usado também como instrumento de construção de casas para os trabalhadores de baixa renda. Pelo menos esse é o objetivo. Segundo Pérsio Arida, que foi do governo anterior, quero deixar bem claro que, ao mesmo tempo em que questiono, em tese, ou trago para reflexão a política econômica, também preocupa-me a proposta de Pérsio Arida ao dizer que vamos simplesmente incorporar o Fundo de Garantia ao salário do trabalhador. Ele desaparece, o salário não melhora, e nós ficamos sem Fundo e sem salário.

Eu terminaria, Srª Presidente, dizendo que a essas duas questões incorporo uma terceira: a que quer desvincular definitivamente o benefício dos aposentados e pensionistas do salário mínimo, o que também preocupa-me muito.

Como última reflexão, quero falar a respeito do PPP. Quanto a essa discussão, vamos ter que nos aprofundar, pois estou muito preocupado. Ouvi uma explanação do Senador Roberto Saturnino em que S. Exª nos demonstrava, não digo indignação, mas a sua decepção com a atual redação dada ao PPP. S. Exª dizia que no PPP está assegurado ao investimento privado tudo, e ao Estado, nada. Trata-se de uma política de parcerias em que o Estado pode perder tudo e o poder privado nada. A desculpa que se ouve de um outro setor que defende uma posição contrária à do Senador Roberto Saturnino é a de que, caso contrário, vão investir em especulação financeira. Trata-se de mais um motivo para diminuirmos a taxa de juros. Os investimentos na área privada são de risco. Se o Estado arrisca, por que o setor privado não pode arriscar? O debate do PPP, vamos ter que nos aprofundar com muita tranqüilidade, com o maior respeito aos que trouxeram a idéia ao Senado da República. Não dá para votarmos apressadamente, porque, no futuro, seremos cobrados pela população brasileira por termos feito uma legislação que vai permitir o uso indevido, inadequado, desviado do dinheiro da população. É o dinheiro da população que está em xeque no momento, pela forma como, infelizmente, o PPP veio da Câmara dos Deputados. Estou convicto de que o Senado há de discutir essa matéria com tranqüilidade. Prefiro, se não for possível votarmos nesta semana, deixarmos que se aprofunde o debate para votarmos em agosto.

Por outro lado, Senador Garibaldi Alves Filho, espero, estou ansioso, para que no debate que está acontecendo agora sobre a LDO seja aceita a minha proposta, de muito equilíbrio - e sei que com o princípio V. Exª concorda -, para que o salário mínimo tenha assegurado pelo menos o dobro do PIB com aumento real, já no ano que vem, além da inflação. Pelo menos isso.

Claro que pela nossa proposta - e sei que V. Exª está refletindo sobre o assunto - tem a proposta de V. Exª. Mas é importante que entrando o que for do PIB deve-se fazer uma redação que não esteja engessada, porque aí, sim, serei contra; a redação tem que dizer que será no mínimo o crescimento em dobro do PIB, para ficar de acordo com a minha redação. Se a economia resistir, e é o que defendo, poderemos no ano que vem ultrapassar a barreira dos US$100.00, já que neste ano não foi possível. Em nenhuma hipótese o salário mínimo seria corrigido como aumento real o correspondente ao dobro do PIB: se o PIB crescer 4 o salário mínimo terá, pelo menos, de forma antecipada, por decisão desta Casa no ano que vem, um reajuste igual à inflação mais o dobro. Ou seja, o PIB cresceu 4, o aumento real será de 8, sem esquecer os nossos 22 milhões de aposentados e pensionistas.

Como havia me comprometido com a Mesa em acelerar a minha fala, encerro-a.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR PAULO PAIM EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Artigo da ISTOÉ Dinheiro: O Espetáculo mora ao lado”.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

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O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com o objetivo declarado de reduzir gastos nas áreas de educação, saúde e transportes, cujos orçamentos são determinados pela Constituição, um estudo elaborado pela equipe econômica do Governo está propondo a desvinculação de receitas no Orçamento da União para investir em infra-estrutura os recursos daquelas áreas.

Não se trata, em princípio, de inovação alguma. O atual Governo não é o primeiro a investir contra a vinculação de verbas do orçamento, saída que os constituintes encontraram para evitar exatamente que setores tão necessitados da atenção ficassem à mercê da vontade política desse ou daquele governo.

Por isso mesmo essas receitas são consideradas sagradas. Elas têm sua origem ainda no tempo em que não havia controle social sobre o orçamento, levando setores mais organizados da sociedade a buscar a garantia de recursos para aquelas áreas, com a criação das vinculações.

Graças ao princípio da vinculação, a Constituição estabelece que uma parcela mínima de 18% da receita de impostos tem de ser gasta com educação pública.

Outro dispositivo constitucional obriga o Governo federal a gastar em saúde o equivalente às despesas efetuadas em 1995, acrescidas a cada ano da variação nominal do Produto Interno Bruto - PIB.

Isso também ocorre com a Cide - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, como é chamado o imposto sobre combustível. Toda a sua receita deve ser vinculada a gastos na área de transportes.

Se a vinculação de receitas orçamentárias reduz a margem de financiamento de outros programas do Governo, a questão é outra.

Que se busquem novas formas de financiamento, mas sem retirar o dinheiro destinado a educar nossos filhos, curar nossos doentes e tapar os buracos das nossas estradas.

A determinação do Governo em promover a desvinculação de receita é tamanha que a proposta faz parte do que já foi batizado na área econômica de "terceira agenda de reformas", voltada dessa vez para atacar os gastos.

E a coisa vem orquestrada. Não faltaram nos jornais do fim de semana entrevistas com os chamados “especialistas” em contas públicas sempre prontos para avalizar propostas como essa ou qualquer outra que tenha por objetivo desvio de recursos das áreas sociais para outros setores.

Mas aqui no Senado essa iniciativa terá a nossa oposição. Não podemos confundir com gastos os necessários e indispensáveis investimentos em educação, saúde e recuperação da nossa malha viária, que tanto sacrifício exigiu do País.

O argumento de que a desvinculação das receitas se faz necessária para aumentar a capacidade de investimento do Governo não nos convence.

Nossa dívida social, principalmente com a população mais pobre, por si só justifica a manutenção das vinculações constitucionais para esses setores.

A área econômica argumenta que as mudanças podem ser feitas sem que representem um corte nas verbas para essas áreas.

Trocando em miúdos, o Ministério da Fazenda conta com um aumento da arrecadação de impostos em conseqüência do anunciado crescimento que a economia deve experimentar este ano.

As novas regras valeriam apenas para o dinheiro novo que entraria com o crescimento. Como se, apesar das vinculações constitucionais, tivesse sobrando dinheiro para a educação, para a saúde e para o conserto das nossas estradas.

Por isso, desde já declaro minha oposição a essa proposta. E estou certo de que também não encontrará apoio dos demais Srs. Senadores e das Srªs. Senadoras.

Se a desvinculação for aprovada, ocorrerá com os setores da saúde, da educação e dos transportes o mesmo que vem acontecendo com o setor de Seguridade Social, que nos últimos anos sofreu o desvio de R$40 bilhões dos seus recursos para outros órgãos e rubricas do Orçamento Fiscal.

Esse desvio de recursos é que tem contribuído para o chamado déficit da Previdência Social.

Outro assunto que me traz a esta tribuna é a proposta do economista Pérsio Arida de transferir o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS - para o salário do trabalhador.

A proposta do ex-presidente do Banco Central foi apresentada durante entrevista que concedeu ao jornal O Globo, em sua edição de ontem, em meio aos comentários que teceu sobre o décimo aniversário do Plano Real, do qual é um dos criadores.

Ela significa na prática acabar com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, instrumento que serviu para compensar o instituto da estabilidade dos trabalhadores com mais de dez anos de serviço, extinto pelo regime militar.

Ela surge no momento em que nos laboratórios do Governo se prepara uma reforma sindical e trabalhista que pelo que se conhece tende também a suprimir direitos trabalhistas como já se tentou anteriormente.

Ele argumenta que mecanismos de poupança compulsória, como o FGTS, não têm mais funcionalidade hoje uma vez que o trabalhador perde porque o rendimento da aplicação é inferior ao ganho de mercado e os recursos a serem aplicados são sujeitos à ingerência política por serem manejados por bancos governamentais.

Isso se corrige exigindo-se mais responsabilidade dos administradores do FGTS, cobrando-lhes mais zelo com o patrimônio do trabalhador, abrindo-se novas oportunidades de aplicação dos recursos do Fundo de Garantia, como no caso das ações da Petrobrás e da Vale do Rio Doce, que proporcionaram ganhos acima da média nas contas do FGTS.

O crescimento dos fundos de previdência privada como substituto da poupança compulsória, não me parece um exemplo feliz apresentado pelo ex-presidente do Banco Central.

Além das condições fiscais para que as pessoas aderissem aos planos privados, como destacou o economista, esse mercado cresceu muito em cima da campanha orquestrada de descrédito da Previdência Social pública.

Também não acredito que a eliminação do FGTS possa contribuir para a redução da informalidade, como sugere Pérsio Arida.

Os cerca de oito milhões de postos de trabalho destruídos pelo Plano Real só voltarão com a retomada do crescimento, que pressupõe a redução da taxa de juros absurda que até hoje é utilizada para sustentar a estabilidade da economia apregoada por aquele plano econômico.

Concordo com o Sr. Pérsio Arida apenas quando ele defende a redução de tributos sobre a folha de salários como media que pode estimular a geração de empregos. Nesse sentido, temos aqui defendido a transferência da contribuição patronal da folha de salários para o faturamento das empresas.

Emergencialmente, o desemprego só será reduzido com a redução da jornada de trabalho, a eliminação das horas extras ou a abertura imediata de frentes de trabalho para a construção de habitações populares, obras de saneamento e recuperação das rodovias.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2004 - Página 20871