Discurso durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a venda de medicamentos pela internet.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com a venda de medicamentos pela internet.
Publicação
Publicação no DSF de 07/07/2004 - Página 21182
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, REGULAMENTAÇÃO, CONTROLE, UTILIZAÇÃO, INTERNET, VENDA, MEDICAMENTOS.
  • REGISTRO, ADVERTENCIA, PRESIDENTE, CONSELHO FEDERAL, FARMACIA, VENDA, MEDICAMENTOS, INTERNET, PROVOCAÇÃO, PREJUIZO, SAUDE, POPULAÇÃO, NECESSIDADE, FARMACEUTICO, ORIENTAÇÃO, PACIENTE.
  • COMENTARIO, MANUAL, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), DESTINAÇÃO, CONSUMIDOR, PRODUTO FARMACEUTICO, PREVENÇÃO, COMPRA E VENDA, INTERNET.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, PUBLICIDADE, MEDICAMENTOS, ADVERTENCIA, PERIGO, EXCESSO, PROPAGANDA, VENDA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, AMEAÇA, INTEGRIDADE, SAUDE, POPULAÇÃO.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Internet, sem dúvida, vem propiciando uma série de benefícios para os usuários da informática no mundo inteiro, podendo-se destacar, entre suas vantagens, a rapidez e a facilidade de comunicação no plano pessoal, empresarial ou institucional. Merece destaque, igualmente, a democratização do acesso à informação, praticamente universalizada com a expansão dessa notável rede.

Entretanto, o uso indiscriminado, em alguns casos até doloso dessa rede, tem provocado graves problemas à comunidade nela interligada. Na condição de legislador e de médico, tenho me preocupado, de forma particular, com uma prática que vem se disseminando entre nós, que é a venda de medicamentos pela Internet. Por ser uma atividade ainda recente, mas que se torna a cada dia mais popular, esse tipo de comércio ainda carece de legislação mais adequada e de um controle mais eficaz. A rigor, entendo que a publicidade de medicamentos nos meios de comunicação de massa, bem assim sua comercialização via Internet, devem ser coibidas o quanto antes, por incentivarem a automedicação.

Já há algum tempo, Srªs e Srs. Senadores, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária vem estudando uma forma de normatizar a venda remota de medicamentos, pois a lei que regula o comércio de medicamentos é muito antiga. A matéria é regulada basicamente pela Lei nº 6.630, de 23 de setembro de 1976, quando a Internet era muito limitada e seu uso restrito aos meios militares e a alguns círculos acadêmicos. A normatização desse tipo de operação, de acordo com a Anvisa, poderá impedir uma série de abusos que vêm ocorrendo, como a comercialização de medicamentos sem registro ou com data de validade vencida, por exemplo, ou ainda contribuir para evitar a propaganda enganosa, que já é objeto da Resolução RDC 102, de 2000.

Em fins do ano passado, durante audiência pública promovida pela Anvisa para definir as medidas a serem tomadas na regulamentação desse segmento, o Conselho Federal de Farmácia (CFF) advertiu quanto ao risco de permitir que medicamentos sejam vendidos via Internet.

Na ocasião, o Presidente do Conselho, Jaldo de Souza Santos, foi categórico ao afirmar que a venda remota de produtos farmacêuticos “é temerária e põe em risco a saúde da população”. A revista Pharmacia Brasileira, reportando a audiência, destacou a posição do Presidente do CFF, para quem a simples ausência física do farmacêutico e do paciente no ato da dispensação gera preocupações. Souza Santos lembrou que para medicar o profissional precisa, entre outras ações, fazer a “anamnese” do paciente e prestar as orientações sobre o produto que o paciente vai utilizar. Para isso, deve levar em conta as possibilidades de reações adversas e as interações dos medicamentos com a alimentação e com outros medicamentos. Além disso, deve registrar em ficha as informações levantadas e fazer o acompanhamento do paciente enquanto ele estiver utilizando os medicamentos prescritos.

“Quem garante - pergunta Souza Santos - que, num terminal interligado à rede não esteja um hipocondríaco, um menor de idade, um dependente químico que precise ser mais investigado pelo farmacêutico? E quem garante, também, que na outra ponta, ao computador, esteja mesmo o farmacêutico habilitado a fazer essa dispensação via Internet?”

O Presidente do Conselho Federal de Farmácia lembrou, durante a audiência pública promovida pela Anvisa, que a Organização Mundial de Saúde - OMS - já advertira as autoridades sanitárias para os riscos existentes na venda remota de medicamentos, numa clara demonstração da gravidade desse assunto. Além disso, ele chamou a atenção para o fato de que os setores de vigilância sanitária nos Estados e Municípios já não conseguem fiscalizar adequadamente as farmácias tradicionais, o que faz supor uma dificuldade ainda maior para fiscalizar também as farmácias virtuais.

Finalmente, o dirigente do Conselho Federal de Farmácia aponta uma contradição, caso as vendas pela Internet sejam efetivamente liberadas. Isso, porque a Anvisa propôs alterar a Lei nº 5.591, de 1973, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos e insumos farmacêuticos, exatamente para torná-lo mais rigoroso e, assim, conferir maior segurança ao uso de medicamentos. Nessas condições, a permissão para vendas diretamente ao usuário, à distância, não se justifica.

E uma vez que o Presidente do CFF citou a Organização Mundial de Saúde, Sr. Presidente, gostaria de lembrar que aquela instituição publicou, há algum tempo, um pequeno manual de orientação aos consumidores de produtos farmacêuticos, alertando-os para os riscos de comprá-los via Internet.

No capítulo IV do citado guia, a OMS informa que existem várias razões pelas quais a compra de medicamentos pela Internet pode trazer danos à saúde ou representar perda de tempo e de dinheiro. Entre as dez razões ali enumeradas, cita: muitos desses produtos não têm sua segurança e eficácia comprovadas; as instruções para uso do medicamento podem ser inadequadas ou pouco claras; o processo de produção, a embalagem, o transporte e a estocagem podem comprometer a qualidade; o fabricante pode estar driblando as leis de proteção ao consumidor; os produtos vendidos sem licença ou autorização das autoridades sanitárias, por não atenderem aos padrões requeridos, podem ser inócuos e, mais ainda, trazer prejuízos à saúde do paciente; em muitos países, o consumidor desses produtos farmacêuticos, caso seja lesado, pode ter dificuldades em ser ressarcido; o paciente pode gastar mais tempo e dinheiro no tratamento com esses produtos do que gastaria com a medicação prescrita por um profissional da saúde; como a legislação sanitária varia de um país para outro, os componentes das fórmulas de alguns desses produtos podem ser proibidos sem que o consumidor tenha conhecimento; produtos com nomes idênticos, mas de países diferentes, podem também ter uma formulação diversa daquela que o consumidor pretenda utilizar; e, finalmente, o consumidor corre o risco de que as informações eventualmente repassadas via Internet não sejam mantidas em sigilo.

Gostaria de registrar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que essas advertências da Organização Mundial da Saúde, tanto quanto as alegações do Conselho Federal de Farmácia, reforçam minha atitude crítica em relação às vendas de medicamentos pela Internet. Ao apresentar a esta Casa, em agosto do ano passado, o PLS nº 308 - que, entre outras providências, regula a publicidade dos medicamentos -, já estava absolutamente convicto dos perigos que representam para o consumidor a propaganda enganosa, nos meios de comunicação de massa, e a venda remota de medicamentos. Por isso, na justificação, fiz questão de ressaltar que os medicamentos não são mercadorias comuns, de livre circulação no mercado, sujeitas tão-somente à oscilação da demanda e da oferta. A saúde e a integridade das pessoas são bens cuja proteção é assegurada por nossa Carta Magna, não podendo, portanto, estar sujeitas aos interesses de ordem comercial.

Estando em consonância com autoridades sanitárias da maior expressão, em nosso País e no plano internacional, quero encarecer aos nobres Colegas o decisivo apoio nessa resistência à venda de medicamentos pela Internet. Estou certo de que, agindo assim, estaremos evitando o agravamento das condições de saúde orgânica, física e mental de milhões de brasileiros que hoje recorrem à automedicação e a fórmulas exóticas, as quais tanto têm de milagrosas quanto de enganosas, muitas vezes gastando esses cidadãos inutilmente seus parcos recursos.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/07/2004 - Página 21182