Discurso durante a 100ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A questão da célula tronco. Realização, em Brasília, nesta semana, do Primeiro Encontro da Agricultura Familiar.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA AGRICOLA. HOMENAGEM.:
  • A questão da célula tronco. Realização, em Brasília, nesta semana, do Primeiro Encontro da Agricultura Familiar.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2004 - Página 23327
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA AGRICOLA. HOMENAGEM.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DEBATE, POLEMICA, UTILIZAÇÃO, VALOR TERAPEUTICO, EMBRIÃO, REGISTRO, OCORRENCIA, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), DEFESA, LIBERAÇÃO, PESQUISA CIENTIFICA, AMBITO, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, SEGURANÇA, BIOTECNOLOGIA, ESCLARECIMENTOS, ETICA, PROCEDIMENTO, LEITURA, CARTA, CIDADÃO, VITIMA, DOENÇA GRAVE, EXPECTATIVA, DESCOBERTA, TRATAMENTO.
  • SAUDAÇÃO, ENCONTRO, AGRICULTURA, ECONOMIA FAMILIAR, ANUNCIO, REALIZAÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), DEBATE, POLITICA, INCENTIVO, SETOR.
  • REGISTRO, DADOS, REPASSE, VERBA, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), PERCENTAGEM, PARTICIPAÇÃO, ECONOMIA FAMILIAR, VALOR, PRODUÇÃO, AGROPECUARIA, BRASIL, IMPORTANCIA, ABASTECIMENTO, MERCADO INTERNO, COMBATE, FOME, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, SOLICITAÇÃO, GOVERNO, CONTINUAÇÃO, AMPLIAÇÃO, APOIO, ESPECIFICAÇÃO, CONTENÇÃO, EXODO RURAL, JUVENTUDE.
  • REGISTRO, VISITA, SEM-TERRA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), MIGUEL ROSSETTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, ACOMPANHAMENTO, PROJETO, ASSENTAMENTO RURAL.
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, PABLO NERUDA, ESCRITOR, PAIS ESTRANGEIRO, CHILE.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Heráclito Fortes, que preside esta sessão.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero falar hoje sobre dois temas diferenciados: agricultura familiar e célula tronco. O último muito polêmico.

Quero hoje falar sobre um assunto polêmico e de extrema relevância. Desejo esclarecer alguns pontos sobre a célula tronco. Não dá mais, Sr. Presidente, para adiarmos essa discussão. Na Comissão de Assuntos Sociais, foram realizadas audiências públicas em que discutimos amplamente esse tema com cientistas, com Senadoras e Senadores, sob a Presidência da Senadora Lúcia Vânia. Eu participei de algumas. É uma discussão de extrema relevância, que precisa avançar no plenário, inclusive, essa questão da célula tronco vem no bojo do Projeto de Lei da Biossegurança, que proíbe a pesquisa de célula tronco. Por isso, precisamos levar esse debate e esse embate à frente. Ele precisa ficar muito claro à sociedade, porque é da mais alta relevância, eu diria.

Eu começaria perguntando: quem sabe o que é a célula tronco? É um tipo de célula que pode se diferenciar e constituir diferentes tecidos no organismo. Essa é uma capacidade especial, porque as demais células, geralmente, só podem fazer parte de um tecido específico (por exemplo, células da pele só podem constituir a pele).

Outra capacidade especial das células tronco é a auto-replicação, ou seja, elas podem gerar cópias idênticas de si mesmas.

Por causa dessas duas capacidades, as células-tronco são objeto de intensas pesquisas hoje, pois poderiam no futuro funcionar como células substitutas em tecidos lesionados ou doentes, como no caso da Doença de Alzheimer, da Doença de Parkinson e de doenças neuromusculares em geral, ou ainda no lugar de células que o organismo deixa de produzir por alguma deficiência, como no caso de diabetes.

As células-tronco funcionam como “curinga”, ou seja, teriam a função de ajudar no reparo de uma lesão. As células-tronco da medula óssea, especialmente, têm uma função importante: regenerar o sangue, porque as células sanguíneas se renovam constantemente. Ainda há outros exemplos.

Faço questão de esclarecer tecnicamente sobre as células-tronco, para defender a vida, ou seja, é preciso cumprir o ciclo da vida. Segundo o Dicionário Aurélio, “vida é o período compreendido do nascimento à morte de um ser vivente”.

Nada existe de antiético nessa defesa. O que existe é o objetivo claro de salvar vidas e de melhorar perspectivas dos que não têm esperança. Proibir a pesquisa de células-tronco é um erro. Por isso, defendo o tema e vou votar favoravelmente à liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias para fins terapêuticos. Que isto fique muito claro: “liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias para fins terapêuticos”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recebi em meu gabinete uma carta que muito me sensibilizou e que, com certeza, retrata fielmente o drama dos que estão dependendo de nossas decisões. Lindas palavras! Diz a carta:

Aos Srs. Senadores da República Federativa do Brasil.

Excelentíssimos,

Sou brasileiro, 60 anos, quite com a Receita Federal e Fazenda Estadual e Municipal, aposentado por estar acometido de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), a mesma doença que acomete o cientista britânico Stephen Hawking. A Esclerose Lateral Amiotrófica é uma doença do neurônio motor, incurável, evolutiva, limitante, incapacitante, humilhante. Normalmente fatal.

Meu nome é Shiroshi Wagatsuma, filho de japoneses, ex-agricultor, engenheiro formado e com mestrado pelo ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) e pós-graduado (CEAG) pela FGV (Fundação Getúlio Vargas). Até quando consegui trabalhar, fui gerente de uma grande (e ótima) empresa multinacional.

Por que estou mencionando tudo isso? Simplesmente para demonstrar aos Srs. Senadores que as doenças graves e incuráveis do tipo ELA, Alzheimer, Parkinson, Esclerose Múltipla, Esclerose Lateral Primária, Distrofia de Duschenne, diabetes, câncer, cardiopatias etc etc, só para citar algumas, NÃO ESCOLHEM etnia, cor sexo, escolaridade, nível econômico e social, profissão, religião ou renome mundial, para causar estragos. O Papa é vítima. O ex-Presidente R. Regan foi vítima. Alberto Santos Dumont foi vítima. Muhamed Ali é vítima. Os atores Paulo José, Mary Tyler Moore e M.J. Fox são vítimas. Lou Gehrig foi vítima. Stephen Hawking é vítima. Pacientes da ABRELA, da ABEM, da ABRASPP e de muitas outras associações são vítimas.

É extremamente difícil atualmente encontrar alguém que não tenha, em seu círculo de amizades, um parente, uma pessoa portadora de doença grave, incurável. Esse alguém é um abençoado por Deus. E é essa a razão do título da mensagem.

Exmºs Srs. Senadores da República Federativa do Brasil, esta mensagem tem o objetivo de apelar para a sensibilidade e consciência de V. Exªs por ocasião da votação do PL nº 2.401-A, de 2003, que ora tramita pelo Senado. Votem como representantes da ESPERANÇA DE MILHÕES DE BRASILEIROS DO BRASIL. Votem pela LIBERAÇÃO DAS PESQUISAS com células-tronco embrionárias para fins terapêuticos. O período de maturação de uma pesquisa é extremamente longo, de dez anos no mínimo. Sejam o farol-guia, a luz no final do túnel para milhões de brasileiros. Não se deixem levar por comodismos. Sejam os baluartes do amanhã! Votem com vossa consciência! Os futuros beneficiários (os acometidos por doenças incuráveis e lesionados neurológicos/medulares) agradecem, antecipadamente.

O Sr. Shiroshi encerra sua carta, dizendo:

Que Deus ilumine nossos Senadores!

Shiroshi Wagatsuma

São José dos Campos, São Paulo.

Sr. Presidente, realmente recebo muitas cartas - com certeza, V. Exª e todas as Srªs e os Srs. Senadores também as recebem. As correspondências transmitem o desespero de familiares daqueles cujos problemas seriam resolvidos com as células-tronco.

Em Mato Grosso, há vários casos. Um deles está em Alto Taquari. Trata-se de um casal que está numa luta permanente em Cuiabá, na Capital do meu Estado de Mato Grosso. Estiveram presentes na audiência pública, na Comissão de Assuntos Sociais, aqui em Brasília, e nos sensibilizaram muito. O pai, na primeira vez que falou conosco, pedindo-nos que imaginássemos o drama de suas duas menininhas - uma de dois anos e outra de cinco - relatou que, todos os dias, elas olham para o pai e para a mãe e dizem: Papai, Mamãe, abram um buraquinho nas nossas costas e ponham pilha para andarmos como as nossas bonecas! As duas menininhas não conseguem andar. A célula-tronco resolveria isso de imediato.

Realmente, ninguém aqui está querendo defender a clonagem. Nada disso! Defendemos a célula-tronco embrionária para fins terapêuticos. Temos que deixar isso muito claro.

Ficamos bastante emocionados, comovidos, quando, há poucos dias, recebemos carta de algumas Representações de Igrejas Evangélicas, solicitando a aprovação da pesquisa com célula-tronco.

Realmente, causa-nos bastante emoção que pessoas que poderiam ter restrições vejam a necessidade da aprovação pelo Plenário do Senado da pesquisa da célula-tronco. Essa conquista poderá resolver o problema de muitas pessoas que, como muito bem diz o Aurélio, têm que completar o ciclo da vida. Nada mais do que isso: apenas completar o ciclo da vida. Acredito que avançaremos na utilização da técnica da célula-tronco, que vem no bojo da pesquisa do Projeto de Biossegurança. É uma grande responsabilidade que está em nossas mãos.

Sr. Presidente, outro tema de que preciso tratar hoje, rapidamente, é a agricultura familiar.

Quero saudar desta tribuna o Primeiro Encontro Nacional da Agricultura Familiar, que acontecerá em Brasília, na próxima sexta-feira, dia 16.

É o primeiro grande debate sobre o tema depois de o “Grito da Terra” - manifestação que reuniu cerca de 5 mil líderes, trabalhadores e trabalhadoras rurais, ligados à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Agricultura (Contag).

Desta vez, as discussões serão coordenadas pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar - FETRAF, que espera reunir cerca de três mil agricultores e agricultoras no pavilhão da ExpoBrasília, no Parque da Cidade.

São trabalhadores e trabalhadoras, pequenos proprietários rurais que vêm lá de Mato Grosso, do Rio Grande do Sul, do Nordeste, do seu Piauí, dos quatro cantos deste rico País e que chegam a Brasília com a disposição de negociar políticas que alavanquem, de fato, os números e os resultados da agricultura familiar em nosso País.

É bom constatar que essa mobilização ocorre dentro de uma conjuntura em que os trabalhadores da agricultura familiar contam com um Governo que se identifica com os seus interesses e que tem demonstrado que está trabalhando para garantir primazia para os reclamos da agricultura familiar.

Exemplo disso é, sem dúvida alguma, o aumento no repasse de verbas para o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que foi elevado este ano para R$7 bilhões.

E ouvi, da boca do Presidente Lula, no Palácio do Planalto, que, se o Pronaf precisar de um pouco mais de R$7 bilhões, Sua Excelência fará um esforço gigantesco, porque acredita que esse recurso realmente é fundamental para o desenvolvimento da agricultura em nosso País.

Dados do Ministério da Agricultura demonstram que o setor agroindustrial ainda recebe cerca de R$10 bilhões a mais que os agricultores familiares. A expectativa de todos aqueles trabalhadores que tiram da agricultura familiar o seu sustento, e com seu trabalho dedicado nesse importante setor da economia ajudam a construir um Brasil mais solidário, é de que possamos, até o final do Governo Lula, fazer com que essa diferença entre o que se investe na agroindústria e o que se investe na Agricultura Familiar possa diminuir.

Os avanços estabelecidos pelo Governo Lula têm sido expressivos no que se refere à política agrícola, mas há muito ainda o que se avançar para que atinjamos um patamar efetivamente satisfatório para aqueles setores até então desconsiderados pelo planejamento governamental.

E solidária como sou com o esforço desenvolvido por todos os que sustentam a agricultura familiar em nosso País, devo ressaltar que este I Encontro da Agricultura Familiar ocorrerá em Brasília, nesta semana, sob a expectativa de que haja mudanças profundas na política de crédito agrícola, além de uma revisão no conjunto de projetos destinados à aquisição de produtos da agricultura familiar.

É importante destacar, por exemplo, que a erradicação da fome no Brasil - um objetivo que tem estimulado e orientado tanto a atuação do Presidente Lula - só será possível com o desenvolvimento efetivo da agricultura familiar.

Observem, Srªs e Srs. Senadores, que a agricultura familiar é responsável por quase 40% do valor bruto da produção agropecuária brasileira.

As manchetes da mídia costumam destacar os números das grandes safras, da explosão da produção de soja, esquecendo-se, muitas vezes, de dar o devido destaque ao fato de que mais da metade da produção de mandioca, de feijão e das carnes consumidas no País saem de propriedades familiares, que, em muitos casos, têm-se viabilizado contra toda sorte de dificuldades.

Basta pensar nas verduras, nas hortaliças, nas frutas que alegram as nossas mesas, para perceber a importância vital do trabalho desses agricultores.

O Brasil tem conquistado muitas divisas e um belo saldo comercial com os privilégios que têm sido concedidos à cultura da soja, produto importante para o equilíbrio das transações comerciais do País.

Nós, de Mato Grosso, orgulhamo-nos muito do sucesso que nossos produtores têm alcançado com suas lavouras de soja. Só que, como Nação, precisamos fazer muito mais em nossas áreas agrícolas do que simplesmente plantar um ou dois produtos. E esse é um desafio que deve estimular a criatividade de tantos quantos vêem no agronegócio um importante instrumento para o desenvolvimento harmônico de nosso País. É preciso encontrar caminhos que ampliem o alcance de nossa produção agrícola, visando, primordialmente, a resolução de nossas carências sociais.

É preciso fortalecer a luta contra a fome e pela soberania alimentar brasileira. É preciso dimensionar nossa agricultura dentro de uma perspectiva de sustentabilidade, aproveitando-se intensamente as riquezas naturais de regiões como a Amazônia e o cerrado, mas sem comprometer o equilíbrio ambiental. Pelo contrário, a garantia de sustentabilidade deve ser usada como um trunfo a nosso favor, como se vê no caso da China, que rechaça o incremento da produção de transgênicos em nosso País.

Por tudo isso se faz necessário que a agricultura familiar seja mais apoiada - eu diria intensamente apoiada -, para que possamos reverter muitos dos números cruéis que marcam as estatísticas deste País.

Atualmente, uma das grandes preocupações das lideranças desse importante setor de nossa economia é com a migração de jovens do campo para a cidade, em busca de educação e emprego. É preciso garantir que esses jovens sintam que têm perspectivas de vida digna no campo para que, em muitos casos, não caminhem para a degradação de suas vidas nas periferias e na marginalização dos grandes centros urbanos.

Vejam todos que o I Encontro Nacional da Agricultura Familiar, que ocorre esta semana em Brasília, tem muitos temas a debater, de larga abrangência e forte impacto sobre a vida de todos nós, e por isso merece todo o nosso apoio e incentivo.

Os senhores que estarão presentes nesse grande encontro, agricultores que propagam a agricultura familiar, contem sempre com esta Senadora.

Ao encerrar, Sr. Presidente, gostaria de dizer que amanhã o Ministro da Reforma Agrária, Miguel Rossetto, estará em Mato Grosso, em nosso assentamento do Movimento dos Sem-Terra, o 14 de Agosto, localizado no Município de Campo Verde. S. Exª estará também no Município de Dom Aquino. É importantíssimo o comparecimento do nosso Ministro a esses locais, pelos projetos que lá estão sendo desenvolvidos.

Infelizmente, o tempo que nos resta não nos permite falar um pouco sobre o centenário de Pablo Neruda, outro tema da mais alta relevância, mas peço a V. Exª, Sr. Presidente, que fique registrada a nossa homenagem ao escritor chileno, que deixarei por escrito.

Muito obrigada.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SENADORA SERYS SLHESSARENKO EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Celebração a Pablo Neruda” - O Globo


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2004 - Página 23327