Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao pronunciamento do Ministro-Chefe da Casa Civil, com críticas aos opositores do governo Lula.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários ao pronunciamento do Ministro-Chefe da Casa Civil, com críticas aos opositores do governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2004 - Página 24658
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, AUTORITARISMO, RESPOSTA, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, QUESTIONAMENTO, GOVERNADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), REUNIÃO, MUNICIPIO, PALMAS (TO), ESTADO DO TOCANTINS (TO), AUSENCIA, LIBERAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RECURSOS, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, AUSENCIA, DEMOCRACIA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, EDITORIAL, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, DENUNCIA, GOVERNADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), SUPERIORIDADE, CONCENTRAÇÃO, RENDA, ARRECADAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, REDUÇÃO, PODER, EMPOBRECIMENTO, FEDERAÇÃO.
  • DEFESA, DEMANDA, GOVERNADOR, GARANTIA, ESTABILIDADE, SITUAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Ministro-Chefe da Casa Civil, Deputado José Dirceu, não tem mesmo o chamado “desconfiômetro”. Está nos jornais de hoje a tentativa que ele fez ontem de minimizar as sérias observações dos Governadores do PSDB, que estiveram reunidos em Palmas, no Estado do Tocantins.

Os Governadores não fizeram críticas, como entendeu o Ministro, que se apressou inadequadamente em tachar as ponderações tucanas de “queixas”. Para ele, “queixas que beiram o ridículo”.

Outra inadequação: Dirceu posou para a imprensa à frente da grande bandeira nacional do Planalto. Um desrespeito aos símbolos nacionais. Os símbolos pátrios - com exceção desses inventados pelo Governo petista - pressupõem o diálogo democrático. Dirceu não é nada democrata, na medida em que procura impor uma verdade única, que é a de seu Partido, o PT. A Oposição que saia de baixo...

Pior do que o Ministro saiu-se o chefe dele. Eis aí mais palavras nada democráticas, estas do Presidente Lula: “Não haverá intriga, futrica e eleição que possa frear o desenvolvimento”. Agressões à gramática à parte, em concordância como em estilo, Lula também posou de figura imperial, outro dono da verdade. Ele não entende nada de jogo democrático e imagina que a Oposição tem que se portar como um bando de robóticos dependurados em arame de ventríloquo.

A fala de um e de outro, a do “Imperador” e a de seu fiel escudeiro, essas sim são emanações voláteis de espírito sem preparo.

Pobre do PT e de seu tosco Governo se não existisse Oposição! Os oposicionistas são uma parcela legítima da sociedade civil e, em nome de milhares de brasileiros, apontam os equívocos da equipe de plantão no Palácio do Planalto.

Vejam só que tamanho disparate na fala do Ministro Dirceu, para quem a suspensão dos repasses do salário-educação aos Estados “foi uma medida que atendeu aos interesses de todos os Municípios e não há por que modificá-la”. Fala imperial do Sr. Dirceu.

Que interesses são esses? São, no fundo, no fundo, apenas “interesses, meros interesses”? Quais são ninguém sabe. Vão para os contos da carochinha.

O que os Governadores disseram em Palmas repete o que eles ouvem às pamparras na voz dos seus coestaduanos. Por exemplo, o Governador Aécio Neves, de Minas Gerais, ponderou que faltam apenas cinco meses para o final do ano e nem sequer os convênios para os repasses dos recursos de 2004 dos Fundos Penitenciário e de Segurança foram liberados.

Que interesses há nessa prática de esconder o dinheiro nos colchões? Perguntamos eu e a Nação ao nosso autoritário e ainda Ministro José Dirceu.

Por falar em ridículo, agora devolvo essa balda ao Ministro Dirceu, indagando-lhe: ridículo não terá sido o gesto do Presidente, que, como avestruz do cerrado, não quis demitir Dirceu no episódio Waldomiro Diniz, o chamado Waldomiro dos Bingos?

O que o Governo petista ensaia faz pena, dá dó. É uma orquestração sem ritmo, sem cadência, feita de lorotas. Por isso, é bom lembrar: lorotagem, conversa fiada, piada, gabolice e bazófia não combinam com a Bandeira Nacional. Da próxima vez, que tal usar aquele dístico nazistóide do “Brasil, um país de todos”? A Ditadura Militar pelo menos usava emblemas e frases do tipo “ame-o ou deixe-o”. Respeitava-se a Bandeira. Agora, nem isso.

Sr. Presidente, peço que faça parte dos Anais da Casa o editorial de hoje do jornal O Estado de S. Paulo, que repõe a verdade dos fatos, mostra que os Governadores tucanos exerceram um direito legítimo e, mais ainda, reconhece neles razão de mérito, contraditando, portanto, o autoritarismo e o menosprezo com que foram tratados pelo Presidente Lula e pelo Ministro José Dirceu.

O Presidente Lula, volto a dizer, concordância gramatical à parte, fala em frear, fala em intriga, futrica e fuxico, enfim. E disso Sua Excelência entende, porque jamais vi uma aglomeração tão chegada à intriga, ao fuxico e à futrica quanto o Partido do qual é Presidente de Honra - o Ministro Palocci sendo atacado pelas costas pelo Ministro José Dirceu; o Ministro fulano conspirando para derrubar o Ministro Guido Mantega; o beltrano de tal, que não gosta do fulano, plantando notícia na imprensa; dossiês aparecem, e todos sabem que, no fundo, fazem parte do velho acervo de fabricação de dossiês que tem marcado, ao longo de sua existência, a vida desse Partido. Se o Presidente diz que os Governadores estão fazendo intriga, vou alertar, Senadora Heloisa Helena, com toda humildade, os meus companheiros governadores tucanos. Direi para terem cuidado, pois pode ser que, no mérito, tenham razão, mas que pode ser que estejam fazendo intriga, Auém que entende muito disso, que é do ramo, que pertence a um partido que é do ramo, está dizendo que eles estão entrando no ramo como neófitos, amadores, vestibulandos. Alertaria a cada um dos governadores tucanos: “Cuidado, porque um PhD em intrigas diz que vocês estão fazendo intriga”.

             O que interessa mesmo não é a intriga, ou a concordância gramatical; o que interessa é os governadores tucanos terem, e eles têm, razão de mérito no que reivindicaram e exigiram do Governo Federal.

Não se trata de queixa, de lamúria, até por que quem tem altivez não se lamuria. Quem tem altivez, quem tem razão reivindica, exige, protesta e contesta, não faz queixas. Repito que não se trata de intrigas do tipo daquelas com que o Presidente está acostumado a conviver. Nem sei como Sua Excelência agüenta!

Quero que me apontem dois ou três membros desse Governo que, francamente, gostem um do outro, que tenham efetivo compromisso de afeto e solidariedade política um com o outro. O Governo perde-se, inclusive, nessas entrelinhas das notas plantadas, dos dossiês. Quando alguém pensa que tem que ter mais poder que o outro e que o poder do outro lhe ofende e lhe fecha os caminhos, faz-se um jogo que quase que dispensa a nossa ação de Oposição. A rigor, tem vezes que me sinto desempregado em potencial, porque não há necessidade, muitas vezes, de se fazer oposição a um Governo que erra tanto e tem uma oposição interna tão dura, e não me refiro à Oposição, que, ideologicamente, contesta o Governo, e contesta abertamente, mas à oposição dentro do próprio PT. Não me refiro à oposição aberta, e sim à da intriga, à das notinhas plantadas, à da fofoca. O que diz o Presidente Lula? Diz que é a oposição da intriga, da futrica. E a da eleição? Eu jamais vi Governo tão eleitoreiro. Ele sabe que está engodando a respeito dos resultados econômicos, mas precisa melhorar a sua perspectiva na eleição, ainda que depois sobrevenha uma brutal desilusão, porque o Presidente Lula já deveria ter maturidade suficiente para saber que não é nada demais a economia crescer três ou quatro por cento no ano. O que é preciso é fazer com que o País cresça algo semelhante no ano seguinte, e não com que cresça muito em um ano e nada no outro, dando, no final, essa média infeliz, insuficiente, de dois ponto alguma coisa por cento ao longo dos últimos vinte anos, com o Brasil agravando todos os seus problemas e não marcando o encontro com o seu grande destino.

O Presidente Lula não há de imaginar que o Brasil cresceu em média 2,2% ao ano nos últimos vinte anos porque cresceu 2,2% ao ano todos os anos. Deve saber que o País cresceu 5% num ano, no outro não cresceu nada, no outro cresceu menos 0,5%, no outro cresceu dois ponto alguma coisa, dando uma média de 2,2%, como a média de Fernando Henrique, que foi de 2,4% ao ano. O Presidente Lula tem que dizer para as pessoas, com sinceridade, com honestidade, e honestidade intelectual, que não deve faltar a ninguém - honestidade deve ser redonda, não deve ter aresta alguma -, que a média dele é de 1,75% na média do biênio, pois, se crescer 3,7% este ano, menos 0,2%, significa 3,5%, resultando, portanto, em 1,75% na média do biênio, o que é menos do que o Brasil tem crescido, e tem crescido mediocremente, ao longo das últimas duas décadas.

Quem fala em eleição de maneira enferma é o Presidente Lula. Quem gosta de fuxico são os companheiros do Presidente Lula, um contra o outro até, quem gosta de intriga é o Partido do Presidente Lula e quem gosta de futrica me parece que é essa mesma gente que vive plantando nota um contra o outro. Não se pode dizer isso da Oposição, que vem de peito aberto exercitar aquilo que é um direito seu, que é, mais do que seu direito, seu dever: fiscalizar o Governo que venceu as eleições para que o Brasil não permita que o Governo cometa todos os desatinos que, se o deixarmos solto, ele cometerá, até pelo despreparo que vem marcando os passos do Presidente e dos seus principais auxiliares.

Muito obrigado.

Era o que tinha a dizer.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“A raiz do ‘enfraquecimento da Federação’”.

A raiz do 'enfraquecimento da Federação'

Menos por serem do PSDB e mais por serem governadores, os oito governadores do PSDB, cujos Estados reúnem pouco menos da metade da população brasileira e produzem pouco mais da metade da riqueza nacional, acabam de alertar o País para a verdadeira escalada de espoliação fiscal a que a União, sob o governo Lula, passou a submeter os entes federados subnacionais, Estados e municípios. Reunidos na segunda-feira em Palmas, no Tocantins, Aécio Neves (Minas), Geraldo Alckmin (São Paulo), Ivo Cassol (Rondônia), Lúcio Alcântara (Ceará), Marconi Perillo (Goiás), Simão Jatene (Pará), Cássio Cunha Lima (Paraíba), além do anfitrião Marcelo Miranda, explicaram circunstanciadamente em um documento, a Carta do PSDB, por que acusam o Planalto do "crescente enfraquecimento da Federação".

Para surpresa de ninguém, os líderes governistas no Congresso desdenharam da denúncia, debitando-a ao ano eleitoral. O senador Aloizio Mercadante disse que a nota dos governadores "não é uma análise sóbria e equilibrada da relação com os Estados". Na realidade, ela não é outra coisa. Se o PSDB dependesse desse documento para acirrar os ânimos do eleitorado contra o PT nas campanhas municipais, o fracasso seria total, tamanha a serenidade do texto e o tratamento objetivo da maioria dos problemas ali arrolados.

Essencialmente, o que os governadores expõem, em termos técnicos, é "a mais perversa concentração de renda na mão da União em toda a história republicana", como Aécio Neves disse em entrevista. Brasília se apropria de algo como 72% de todos os impostos pagos no País.

A concentração da renda tributária decerto não surgiu neste governo, mas nele adquiriu uma dimensão alarmante. Pois, além de aumentar impostos cuja arrecadação inteira fica na esfera federal, o PT no poder, afirmam os governadores, reduziu as transferências constitucionais, demora a cumprir compromissos assumidos por ele próprio, descumpre contratos firmados no governo anterior e adota, para a liberação de parte dos recursos federais, "critérios que vêm privilegiando aliados políticos em detrimento das reais necessidades apontadas pelos Estados e municípios". Políticos moderados como o paulista Alckmin ou que mantêm relações quase de camaradagem com o presidente Lula, como o mineiro Aécio, não subscreveriam essa acusação se ela não tivesse fundamento.

Uma das queixas recorrentes não só desses, mas de todos os governadores - e também dos prefeitos -, diz respeito ao mais importante instrumento singular criado na administração Fernando Henrique para promover a educação básica no País, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Como se sabe, trata-se de uma cesta de recursos que vincula os investimentos no setor, notadamente para aumentar os salários do professorado, ao total de alunos matriculados nas redes públicas estaduais e municipais. O governo Lula, provando que fala mais do que faz pela educação de massa, se recusa a rever o valor que lhe compete pagar por aluno. Hoje em dia da ordem de R$ 500, está defasado em relação ao previsto na lei que criou o Fundef.

A dezena de demandas dos governadores nada tem de extravagante, ainda que uma ou outra delas seja passível de reparo. O essencial é que, vistas em conjunto, descortinam um panorama sombrio que a nenhum ator político relevante é dado ignorar. O panorama é o de um processo de marcha batida para a centralização, no âmbito da União, dos recursos institucionais de poder do setor público nacional. Recentralização, a rigor, seria o termo correto, pois - como se comentou ontem neste espaço, a partir de artigos do ex-presidente Fernando Henrique e do governador baiano Paulo Souto publicados no Estado de domingo - o governo Lula está revivendo o padrão autoritário de estruturação da República Federativa do Brasil imposto pelo regime militar e reformado pela Constituição de 1988.

Não há de ter sido por falta de assunto que os governadores julgaram necessário externar a sua "grande apreensão" com o projeto que regulamenta os consórcios públicos e o anteprojeto da nova Política Nacional de Saneamento Ambiental - tratados naqueles artigos. O anteprojeto é um caso particular da tendência concentradora que a proposta dos consórcios encarna à perfeição. Eis por que as reivindicações tópicas dos governadores não surgem em um vácuo. Exprimem, antes, um problema que as transcende: o vezo ditatorial das práticas e intenções do governo diante do chamado pacto federativo. Por isso o projeto de poder do PT ameaça a Federação brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2004 - Página 24658