Discurso durante a 104ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao perdão, pelo governo brasileiro, da dívida do Gabão. Lamenta o tratamento dispensado por alguns governistas às denúncias da Oposição.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Críticas ao perdão, pelo governo brasileiro, da dívida do Gabão. Lamenta o tratamento dispensado por alguns governistas às denúncias da Oposição.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2004 - Página 25014
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, PROTESTO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), PERDÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DIVIDA, PAIS ESTRANGEIRO, GABÃO.
  • CRITICA, AUTORITARISMO, GOVERNO FEDERAL, IMPUTAÇÃO, BANCADA, OPOSIÇÃO, AUSENCIA, ACEITAÇÃO, CRESCIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, TENTATIVA, OBSTACULO, ESTABILIDADE, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), BANCO DO BRASIL.
  • INFORMAÇÃO, INTERESSE, BANCADA, OPOSIÇÃO, ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, AUTORIDADE, RESPONSAVEL, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, CONTRIBUIÇÃO, MELHORIA, ECONOMIA NACIONAL, GARANTIA, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA, GOVERNO.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o autoritarismo é uma manifestação degenerativa da autoridade, segundo Norberto Bobbio. Nas lições desse pensador italiano, onde há o autoritarismo a Oposição é reduzida à sua expressão mínima, aniquilada, substancialmente esvaziada.

Compareço a esta tribuna no dia de hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para deplorar essa manifestação de autoritarismo que eclode de quando em vez na postura do Presidente Lula.

Retornando de sua viagem à África, onde desfilou em Rolls-Royce conversível ao lado do ditador do Gabão, o Presidente volta suas armas contra a Oposição política do Brasil. Seriam os fluidos do Gabão que fizeram com que Sua Excelência demonstrasse essa recaída autoritária? É deplorável ver imagens do Presidente Lula, do PT, que proclamou a democracia como razão maior da existência partidária, desfilar ao lado de um ditador que há 37 anos submete um povo pobre a um autoritarismo implacável, incapaz de respeitar a cidadania.

A OAB protesta contra o fato de o Presidente da República ter perdoado a dívida de US$36 milhões do Gabão. A OAB afirma que não está na Constituição essa prerrogativa de o Presidente sair pelo mundo perdoando dúvidas. Aliás, Senador Mozarildo Cavalcanti, perdoar para quê? Eles não pagam mesmo! Jamais pagaram, pagariam ou teriam condições de pagá-la. O Presidente Lula visita um país de cerca de 160 mil habitantes, com uma população que vive na miserabilidade absoluta, e afirma que vai a esse país celebrar acordo comercial. Isso é o que espanta. Além disso, Sua Excelência homenageia o ditador que é o maior proprietário de imóveis em Paris e celebra um convênio para a plantação de mandioca!

Não queremos, de forma alguma, ridicularizar a imagem do Presidente da República. Ao contrário, queremos preservá-la como forma de preservar a nacionalidade. Mas o Presidente Lula não tem o direito de agredir a Oposição simplesmente porque pairam dúvidas sobre o comportamento dos presidentes do Banco Central e do Banco do Brasil. Inconformado com as críticas a esse tipo de comportamento, tanto de um quanto de outro, o Presidente Lula manifesta a sua postura autoritária.

É bom frisar que a crítica ao perdão da dívida do Gabão não foi da Oposição, mas da Ordem dos Advogados do Brasil. A denúncia contra os presidentes do Banco Central e do Banco do Brasil partiu de revistas veiculadas no final de semana. Mas o Presidente revolta-se contra a Oposição.

Em episódios passados, o caráter autoritário do Governo esteve sempre latente, mas agora se manifesta abertamente, em função talvez do entusiasmo do Presidente da República com a retomada do crescimento econômico, embora não na dimensão em que todos gostaríamos.

Recentemente, o mundo condenou a postura do Governo brasileiro com o correspondente Larry Rother, do jornal The New York Times. A decisão do Presidente de expulsar o jornalista, repetindo um gesto do General Médici, que bania jornalistas estrangeiros do País, foi apoiada pelos seus principais auxiliares e alcançou repercussão internacional deplorável. Todos nós sabemos da conseqüência desse gesto, que obrigou o Presidente da República, em seguida, a recuar de sua decisão.

Agora, de forma orquestrada, o Presidente da República, o Ministro José Dirceu e o Ministro Aldo Rabelo afirmam que a Oposição não se conforma com o crescimento econômico e, por isso, ataca o Governo. Tentam caracterizar a Oposição como uma legião a serviço de interesses subalternos, integrada por homens desinformados e atrasados.

Volto a Norberto Bobbio, que nos ensina que o adjetivo autoritário e o substantivo autoritarismo, que dele deriva, empregam-se em contextos específicos. Ao iniciarmos nossas palavras de hoje, já dissemos que o autoritarismo é essa manifestação degenerativa da autoridade que aniquila a Oposição, que esvazia a Oposição. Este é o desejo explícito do Presidente da República: tornar a Oposição subalterna, aniquilada, amesquinhada, esvaziada de forma absoluta. Os Ministros José Dirceu e Aldo Rebelo, no retorno de suas férias em Cuba e na China, respectivamente, direcionam as suas críticas à Oposição, tentando fazer coro com o Presidente Lula.

Já conhecemos o despreparo do Governo do PT para gerir a máquina administrativa, mas surpreendemo-nos, cada vez mais, com a falta de aptidão para conviver com o cotidiano de uma democracia. É evidente que a Oposição não se pode calar, não se pode tornar indiferente à declaração feita pelo Ministro do Desenvolvimento Econômico e Social, Patrus Ananias, de que o Governo não tem prazo para erradicar a fome no País.

São demonstrações que reforçam a tese de que houve um estelionato eleitoral com a eleição do Presidente Lula, porque não foi esse discurso do Ministro Ananias que o Presidente Lula pronunciou na campanha eleitoral ao referir-se ao programa Fome Zero.

Não podemos abdicar do compromisso oposicionista com o País. Não podemos aceitar o clima de autoritarismo nem essa discriminação com a Oposição. Desta tribuna, já se denunciou a diferença entre o que recebem as cidades administradas por partidos aliados ao Presidente Lula e o que recebem as cidades governadas pela Oposição. Os Municípios considerados “amigos” receberam R$1,4 por habitante, enquanto os Municípios adversários receberam R$0,33.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente da República tenta atribuir à Oposição a criação de uma agenda negativa para o País. Fala em futricas, intrigas, o que revela que Sua Excelência não tem razão. E os Ministros seguem o Presidente. O Ministro José Dirceu, por exemplo, agora critica os Governadores do PSDB. Os Governadores afirmaram que seus Estados estão sendo discriminados pelo Governo na distribuição de verbas. E o Ministro José Dirceu disse que os Governadores beiraram o ridículo, qualificando as acusações contra os presidentes do Banco Central e do Banco do Brasil como infundadas, beirando o denuncismo. Aliás, na escola do denuncismo, o PT já foi laureado inúmeras vezes. É estranho ouvir do Ministro José Dirceu, que presidiu o PT durante muito tempo, essa acusação de denuncismo. Essa tentativa de imputar à Oposição um inconformismo com o suposto crescimento da economia - daí as denúncias envolvendo os presidentes do Banco Central e do Banco do Brasil - é uma aberração da parte do Governo.

            É claro que, oposicionistas ou não, devemos aplaudir o crescimento econômico quando este se manifesta. Essa é uma missão do Governo e objetivo da Oposição. O crescimento econômico é um compromisso insubstituível de todos os que exercem função pública no País. No entanto, não podemos ignorar fatos que devemos denunciar em nome de um discreto crescimento da economia, que não pode ser de forma absoluta imputado à política governamental. Há quem diga até que a nossa economia depende muito mais de Alan Greenspan do que do Ministro Palocci. Nós não podemos ignorar que há uma forte dose de verdade nesta afirmativa.

A base do crescimento nacional está centrada no aumento crescente das exportações e no magnífico desempenho do agronegócio no Brasil, conjugados à elevação dos preços das commodities agrícolas no mercado internacional. O crescimento da economia mundial tem compensado o efeito contracionista da política fiscal e da política monetária adotadas pelo Governo Lula.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aplaudimos os discretos índices de crescimento da nossa economia. Aplaudimos até mesmo o Governo, mas não podemos de forma alguma ignorar que o Governo tem procurado usufruir os benefícios desse crescimento econômico, que devemos creditar sobretudo ao agronegócio brasileiro, a essa capacidade de exportar do setor produtivo nacional, recuperada sobretudo em função do extraordinário desempenho da economia mundial nos últimos meses. Sem dúvida, esse cenário favorável da economia internacional, com a elevação dos preços das commodities agrícolas sobretudo, é que têm proporcionado ao Brasil sucesso na sua política de exportação. Mas isso não pode de forma alguma significar atestado de boa conduta ao Governo quando ele erra. Não pode o Presidente da República imaginar que, em nome de um discreto crescimento econômico, a Oposição feche os olhos para eventuais escândalos que possam explodir no seio do Governo Federal.

O que quer a Oposição não é o prejulgamento, não é a condenação sumária. A Oposição quer esclarecimentos, porque as denúncias dizem respeito a autoridades responsáveis pela política econômica do Brasil, ao lado do Ministro Palocci e do Ministro Mantega, que podem de forma decisiva influir no desempenho da economia do País. É evidente que o Presidente do Banco Central tem enorme responsabilidade relativamente às medidas de natureza econômica adotadas pelo Governo. E estar sob suspeição coloca o País evidentemente numa situação de risco iminente. Daí a necessidade de se esclarecer para que a credibilidade não seja arranhada. Credibilidade é um produto indispensável na prateleira governamental. Não há como um projeto de governo, muito menos um projeto econômico de governo, alcançar sucesso sem credibilidade. E as denúncias contra o Presidente do Banco Central e o Presidente do Banco do Brasil, sem sombra de dúvida, arranham a credibilidade do Governo.

A Oposição cumpre o seu dever ao denunciar e ao exigir explicações.

O Presidente da República revela uma vocação autoritária ao não se conformar com essa postura oposicionista.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2004 - Página 25014