Pronunciamento de Pedro Simon em 11/08/2004
Discurso durante a 108ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Comentários ao anteprojeto de lei que cria o Conselho Federal de Jornalismo.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
IMPRENSA.
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- Comentários ao anteprojeto de lei que cria o Conselho Federal de Jornalismo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 12/08/2004 - Página 25717
- Assunto
- Outros > IMPRENSA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
-
- DEFESA, POSSIBILIDADE, DEMISSÃO, PRESIDENTE, BANCO DO BRASIL, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).
- SUGESTÃO, SUSPENSÃO, LEILÃO, VENDA, PETROLEO, NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
- CRITICA, ANTEPROJETO, LEGISLAÇÃO, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, CRIAÇÃO, CONSELHO FEDERAL, JORNALISMO, PREJUIZO, DEMOCRACIA, LIBERDADE DE IMPRENSA, POSSIBILIDADE, PROVOCAÇÃO, PERSEGUIÇÃO, FAVORECIMENTO, NATUREZA POLITICA.
- LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, DIVULGAÇÃO, INTERNET, CRITICA, POSSIBILIDADE, INTERVENÇÃO, CENTRAL UNICA DOS TRABALHADORES (CUT), FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS.
- LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, DIVULGAÇÃO, INTERNET, COMPARAÇÃO, PROPOSTA, FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS, ANTEPROJETO, GOVERNO FEDERAL.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, neste período de esforço concentrado, nós, que estávamos no interior, chegamos aqui com tanto assunto para falar que ficamos tontos. Ontem, eu disse, na Comissão de Assuntos Econômicos, o que penso não apenas sobre a explicação do Ministro da Fazenda sobre os Presidentes do Banco Central e do Banco do Brasil, mas também que, na minha opinião, deveriam vir com urgência a este plenário, além de serem talvez demitidos.
Há um assunto, Sr. Presidente, para o qual eu pediria providência da Mesa, porque tenho certeza de que o Plenário todo seria favorável. Refiro-me à licitação da Petrobras com relação à venda do nosso petróleo. Várias entidades estão protestando. O Governador Requião entrou com dois mandados, e várias pessoas estão pedindo ao Judiciário que suspenda esse leilão. Penso que devemos convocar com urgência a Ministra de Minas e Energia para que venha aqui depor sobre essa matéria. Enquanto isso, seria um grande gesto de V. Exª se levasse à Mesa ou reunisse os Líderes, com a urgência que o assunto merece, a sugestão para a suspensão desse leilão, que acontecerá no próximo dia 16, enquanto não tivermos uma posição mais clara com relação às denúncias gravíssimas que vêm sendo feitas e para as quais até agora não houve respostas.
Sr. Presidente, foi assinado, dias atrás, pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e encaminhado ao Congresso Nacional anteprojeto de lei que cria o Conselho Federal de Jornalismo (CRJ). Trata-se de uma iniciativa extremamente polêmica, que vem recebendo as mais duras críticas de todos os setores democráticos da sociedade brasileira. E aqui estou, nesta tribuna, para expressar a minha mágoa diante de um projeto que só terá similar na legislação dos anos mais duros do regime militar.
A minha preocupação com essa proposta antidemocrática só não é menor porque estou absolutamente certo de que o Congresso saberá o que fazer quando o assunto estiver em votação.
Esse anteprojeto nasceu de uma iniciativa da Federação Nacional dos Jornalistas. Estranho muito essa iniciativa. Não entendo por que a Federação Nacional dos Jornalistas, num momento como esse, tomou uma iniciativa dessa natureza, embora haja diferenças infinitas entre a proposta que eles enviaram ao Governo e as modificações profundas que o Governo fez no projeto inicial dessa Federação. Esse projeto teve uma tramitação rapidíssima no Executivo, uma tramitação surpreendentemente veloz. Mais impressionante foi o número de modificações sofridas na Casa Civil.
Sim, foi nas entranhas do Poder Executivo, especificamente na Casa Civil, que o projeto teve retocados alguns de seus mais importantes dispositivos, até se transformar no mostrengo que é hoje.
Quero lembrar que, quando estava maquiando o projeto, o Executivo não se lembrou de ouvir nem mesmo a Associação Brasileira de Imprensa, a gloriosa ABI, que ontem, dia 10, se pronunciou contrária à iniciativa, em reunião de seu conselho deliberativo. Além disso, em inúmeras oportunidades, o Presidente da ABI, jornalista Maurício Azedo, atacou vigorosamente o anteprojeto.
Além de criar o Conselho Federal de Jornalismo, o anteprojeto cria Conselhos Regionais de Jornalismo, que serão dotados de “personalidade jurídica de direito público”. Esses organismos paraestatais terão como objetivo “orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de jornalista”, bem como zelar “pela fiel observância dos princípios da ética e da disciplina da classe.”
Portanto, quero salientar, Sr. Presidente, que existe a Ordem dos Advogados, que fiscaliza os advogados, mas o advogado executa, cumpre e descumpre a lei que existe. Existe, por exemplo, a associação dos médicos, que fiscaliza e pune os médicos, porque eles podem cometer atos e delitos contrários à sua profissão. No entanto, os jornalistas lidam com o fato público, com o debate de questões e, portanto, não é a pessoa dele que está em jogo. O julgamento pode ser feito com base no Código Civil, pode ser feito conforme a Lei de Imprensa, e aí é que deve ser feito, e não criar uma instituição para livremente fazer punição, sem a justiça, sem absolutamente nada.
O anteprojeto também estipula cinco penalidades - advertência, multa, censura, suspensão do registro profissional e cassação do registro - para jornalistas que, no entender dos integrantes dos CRJ, possam ter cometido “infrações disciplinares”.
Sou contra esse pretendido Conselho por inúmeros motivos. O primeiro deles é que julgo que já existem na legislação comum - criminal e civil -instrumentos para a reação de uma pessoa ou entidade que se sinta agredida por jornalista.
Acredito que o jornalista, obviamente, também está submetido a um segundo julgamento, talvez ainda mais severo do que o da Justiça comum. Refiro-me ao julgamento da opinião pública. Jornais ou jornalistas que falseiam a verdade acabam sendo abandonados pelos seus leitores.
Estou certo de que a criação de tais Conselhos Regionais de Jornalismo poderá dar ensejo a perseguições ou a favorecimentos políticos. Se um determinado jornalista não tem a simpatia dos integrantes do Conselho Regional poderá ser cassado por “praticar, no exercício da atividade profissional, ato que a lei defina como crime ou contravenção”. Inversamente, um amigo dos integrantes do CRJ jamais será penalizado, mesmo que cometa as maiores barbaridades.
O jornalismo não é uma ciência como Medicina, Engenharia ou Direito, que têm rígidas regras profissionais. As matérias-primas do jornalismo são a informação e a opinião. Como vamos fazer com a opinião? Vamos exigir que todos os jornalistas pensem da mesma forma, sob pena de serem cassados? Ou será que vamos continuar - como ocorre hoje - lendo e ouvindo várias opiniões, mesmo que conflitantes, sobre um mesmo assunto?
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer minhas as palavras de um dos mais destacados jornalistas brasileiros, Alberto Dines, que dirige o Observatório da Imprensa, importante programa de tevê e da Internet que analisa a mídia brasileira. Num artigo intitulado “Contra o denuncismo, o peleguismo”, diz Alberto Dines:
Na questão do Conselho Nacional de Jornalismo (CNJ), não é justo recriminar apenas o Governo, nem apenas a Fenaj. É imperioso incluir a CUT. A partir do momento em que a Fenaj foi entregue à facção mais radical da Central Única dos Trabalhadores, os interesses dos jornalistas e do jornalismo no Brasil ficaram sujeitos à suas ambições, idiossincrasias e dogmatismos. Raramente bem-intencionados. A CUT não brinca em serviço: a ela não basta dominar a Federação Nacional de Jornalistas, entidade sindical dos jornalistas brasileiros. À CUT interessa dominar a imprensa: impor suas regras, suas prioridades e sua “ética”. Apropriar-se do Quarto Poder.
Prossegue Alberto Dines:
Como a ABI vinha sofrendo um processo de desgaste - felizmente interrompido - os estrategistas da CUT-Fenaj conceberam uma entidade capaz de substituí-la como trincheira das liberdades da sociedade civil. Tinham muito presente o papel da ABI - junto com a OAB e a CNBB - na mobilização nacional que apressou o fim da ditadura. Por isso queriam uma organização política, supra-sindical, mais adequada ao seu projeto de poder. Por isso enfiaram no artigo 3º esta aberração antidemocrática: o exercício da atividade jornalística no território brasileiro e a denominação jornalista são privativos dos inscritos nos Conselhos Regionais de Jornalismo (CRJs).
E continua Alberto Dines:
A CUT-Fenaj quer ser a dona da profissão, dona da busca da verdade e, portanto, dona da verdade absoluta. Quem discordar deixa de ser jornalista; quem não obedecer a seus critérios, obriga-se a mudar de profissão.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda na versão do Observatório da Imprensa na Internet, podemos ler um interessante artigo do jornalista Maurício Tuffani, em que denuncia que o projeto do CFJ elaborado para Fenaj foi totalmente alterado pelo Poder Executivo, que suprimiu muitas passagens, acrescentou outras e modificou profundamente outros trechos.
Diz Maurício Tuffani:
Ao trabalhar sobre o texto encaminhado pela Fenaj, o Poder Executivo fez muito mais do que exercer seu papel técnico-legislativo e de corrigir vários erros gramaticais e alguns problemas de lógica da proposta sindicalista. Aproveitou para dar uma ‘canetada’, abrindo espaço para que, sendo aprovado pelo Legislativo, o projeto de lei faça com que o novo órgão tenha atribuições que podem se estender até mesmo às atividades dos veículos de comunicação. A tabela comparativa dos dois textos - o que foi encaminhado pela Fenaj ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e o produto engendrado a partir dele - deixa evidente a intenção do Governo de extrapolar a pretendida regulamentação profissional. A proposta da entidade foi enviada ao Ministério do Trabalho e Emprego em 10 de dezembro de 2002, nos últimos dias do Governo Fernando Henrique Cardoso.
Continua Tuffani:
Entre as atribuições previstas em seu art. 1.º para o CFJ, está a de ‘disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de jornalista’. No anteprojeto elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, esse trecho teve o acréscimo de algumas palavras e ficou sendo ‘disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de jornalista e da atividade de jornalismo’. Não há como acreditar na hipótese de que essa alteração tenha sido fruto de um mero descuido ou de uma simples ênfase nos aspectos da profissão de jornalista. A ‘canetada’ é corroborada por duas outras modificações. O texto da Fenaj previa entre as competências do CFJ a de ‘resolver os casos omissos nesta lei e demais normas pertinentes ao CFJ e ao exercício da profissão de jornalista’ (art. 2.º, XIV). No anteprojeto de lei, esse dispositivo também teve o acréscimo ‘e da atividade de jornalismo’. A mudança feita pela equipe do Ministro Ricardo Berzoini não só reforça a alteração no art. 1.º, como também dá ao CFJ - e aos conselhos estaduais a serem criados - plenos poderes nos casos não previstos em lei para toda a atividade jornalística.
E diz ainda Maurício Tuffani:
Por mais que se tente manter uma saudável dúvida sobre aquilo que os estudiosos das leis chamam de intenção do legislador, o trabalho do MTE parece não ter sido pautado pela menor preocupação em deixar evidente as suas razões de Estado. A terceira “canetada” fecha o círculo da organicidade do dispositivo enxertando nos dois primeiros artigos. Ela está também no artigo 3º, que trata da competência dos Conselhos Estaduais de Jornalismo (CRJs). Ao preencher os vácuos da proposta da Fenaj no que se refere às atribuições e competências dos CRJs, a equipe do TEM acrescentou o inciso IV: “Exercer a fiscalização do exercício da profissão de jornalista e da atividade de jornalismo”. Não há nenhuma explicação para essas alterações na “Exposição de Motivos” do anteprojeto, datada de 28 de maio deste ano e assinada pelo ministro Berzoini.
Sr. Presidente, encerro aqui este pronunciamento. Estou aqui preocupado com o que vem ocorrendo nos últimos dias. Temos agora esse Conselho Federal de Jornalismo. São muitas também as críticas contra a criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual. Sem falar nos fantásticos escândalos na área dos bancos oficiais. Assim, conto com a vigilância dos Srs. Senadores. A liberdade de imprensa foi uma das grandes conquistas da Carta de 1988. Temos de mantê-la a qualquer custo.
Passo também à análise da Mesa, e pediria, se fosse possível, a distribuição aos Srs. Senadores, a comparação feita, Sr. Presidente, entre o texto enviado pelo Sindicado dos Jornalistas e o proposto pela Casa Civil com as profundas modificações que transformaram um projeto muito ruim num monstrengo, que é o que temos aqui.
Agradeço a tolerância, Sr. Presidente, e volto a pedir a V. Exª que, junto com o Presidente José Sarney, faça chegar ao Presidente da República pedido de suspensão dos leilões de áreas da Petrobras a empresas estrangeiras. Será um longo debate e uma longa discussão. Até estranho porque, quando vinha para cá - e se for o caso vou distribuir - lia os discursos que o atual Presidente da Petrobras fez aqui no Senado quando o Governo Fernando Henrique fez licitações dessa natureza. Eram protestos, discursos de revolta por aquilo que estava acontecendo. Seria muito importante que a Mesa, já que terminamos o trabalho amanhã e sexta-feira ocorrerá o leilão, pedisse ao Presidente da República que suspendesse o leilão, porque não perdemos nada até uma segunda discussão.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR PEDRO SIMON EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
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Matéria referida:
“Como era e como ficou a proposta de criação do CFJ”.