Discurso durante a 110ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Saudações ao Ministro da Cultura pelo Programa Fome de Livro. O problema do lixo e da poluição no mundo.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Saudações ao Ministro da Cultura pelo Programa Fome de Livro. O problema do lixo e da poluição no mundo.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/2004 - Página 26357
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, MINISTERIO DA CULTURA (MINC), CRIAÇÃO, PROGRAMA, AMBITO NACIONAL, FOME, LIVRO, OBJETIVO, INCENTIVO, LEITURA, JUVENTUDE.
  • COMENTARIO, RISCOS, EXCESSO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, CONSUMO, SOCIEDADE, AUMENTO, QUANTIDADE, LIXO, POLUIÇÃO, MUNDO.
  • APREENSÃO, AUSENCIA, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, NECESSIDADE, CAMPANHA, ESCLARECIMENTOS, UTILIZAÇÃO, RACIONALIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, OBJETIVO, PREVENÇÃO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, FUTURO.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer uma referência muito especial ao Senador Tião Viana. Logicamente, neste momento, vimos no Senador Tião Viana um entusiasmo muito grande, justificável pelo tema que trouxe para comunicar a este Plenário.

Sempre digo que o Senador Tião Viana, como médico, tem uma sensibilidade muito mais aguçada do que o ser humano normal, de outra profissão. Quando o médico exerce a atividade política, ele não perde essa sensibilidade, mas, ao contrário, reforça-a ainda mais, visto que, quando exercemos nossa atividade política com responsabilidade, passamos a nos preocupar muito mais com a questão social.

O tema abordado envolve a questão social, e, por isso, quero parabenizar V. Exª e dizer que, realmente, o número de livrarias no nosso País é deficitário. V. Exª informa que existem cerca de 1,5 mil livrarias no País, concentradas, na sua maioria esmagadora, nos grandes centros - Rio, São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte -, ficando para os outros Estados uma quase falta de opção, exatamente pela falta de incentivo. E é esse incentivo que o Governo, parabenizado neste momento, começou a buscar de forma sistematizada.

Parabéns a V. Exª! Ficamos agradecidos pela iniciativa brilhante do Governo Federal.

Sr. Presidente, como morador da região amazônica e preocupado com a realidade atual e principalmente com o futuro daquela região, inspirei-me para fazer o pronunciamento de hoje. Em diversos discursos que fiz nesta Casa, estive muito preocupado com a questão do meio ambiente, da devastação da nossa natureza, da destinação adequada do lixo, e é sobre esse tema que trato neste momento.

Sr. Presidente, o ser humano, durante muito tempo, com a noção de que os bens encontrados na natureza seriam infinitos, podendo, sempre que necessário, ser encontrados em outros locais, explorou de forma irracional os recursos que poderiam lhe trazer alguma espécie de conforto ou acúmulo de patrimônio.

Quem despertou a Humanidade desse sonho paradisíaco foi o economista religioso inglês Thomas Robert Malthus, que, há cerca de 200 anos, publicou o Ensaio sobre o Princípio da População, no qual afirmava que a produção de alimentos só cresce em progressão aritmética, ao passo que a população tende a aumentar em progressão geométrica, sendo contida de forma natural por catástrofes ou pestes ou pelo próprio homem, com suas guerras.

Agora, estamos observando, por um lado, um grande decréscimo nas taxas de natalidade, principalmente nos países mais desenvolvidos, mas temos, por outro lado, o aumento na média de expectativa de vida, o que nos obriga a uma maior atenção com a utilização dos recursos fornecidos pela natureza.

No século XX, principalmente na sua segunda metade, ocorreu um grande movimento em busca da conscientização dos habitantes do planeta para a necessidade de preservação do ambiente em que vivem.

Mas existe no ser humano uma capacidade inexplicável de basear o seu bem-estar no consumismo e no desperdício dos recursos naturais, principalmente entre os habitantes das sociedades mais opulentas. O físico teórico Luigi Sertorio, em seu livro História da Abundância, lançado recentemente na Itália, “explica as origens, as causas e os limites da busca excessiva pelo bem-estar que caracteriza a atual civilização”, de acordo com o que encontramos em matéria da revista Planeta, em sua edição de julho de 2004.

Segundo o cientista, a sociedade do consumo e da produtividade acredita que bem-estar significa muita comida no estômago e que a felicidade é conquistada com o acúmulo de dinheiro e de bens materiais. Em contraste com as populações pobres e subnutridas, as sociedades ricas estão se tornando gordas, anormalmente obesas e enfrentam, além disso, outros problemas que não atingem as primeiras.

Estatísticas recentes mostram que cerca de um terço da população norte-americana está acima do peso normal, e uma parcela considerável já apresenta obesidade patológica. Segundo especialistas, esse problema já superou o tabagismo. Por sua vez, do outro lado do Atlântico, nos países ricos da Europa, a alimentação costuma ser de melhor qualidade, mas as clínicas para distúrbios psicológicos e os centros de desintoxicação de alcoólatras e usuários de drogas aumentam substancialmente suas clientelas. Esses fatos só fazem comprovar que a boa vida, a abundância e o bem-estar excessivo também podem levar à doença e à morte.

Podemos dizer que, nesse sentido, já tivemos um alerta na época do Renascimento, um divisor de águas na cultura ocidental. Trata-se do célebre personagem de Rabelais em sua novela Horríveis e Espantosos Feitos e Proezas do Mui Célebre Pantagruel, que levou à nossa cultura um adjetivo de forte significação: quem ainda não terá ouvido a expressão “festa pantagruélica”? Pois esse personagem acreditava que bem-estar era sinônimo de barriga cheia. Por isso, deveria comer até a barriga estourar.

Sr. Presidente, a sociedade atual apenas muda o enfoque desse estranho personagem, transferindo sua gula para a avidez que apresenta em relação ao inumerável universo de objetos criados para satisfazer uma minoria, deixando à margem grandes contingentes de seres humanos. 

E o problema maior dessa “festança” é o lixo produzido, que pode acabar tornando inabitável a nossa própria casa, isto é, o planeta Terra.

O cientista Luigi Sertorio afirma, em seu livro, que a espécie humana é energívora, e essa é a moeda para pagar nossa condição de abundância e de desperdício. Segundo ele, desde os primórdios, o homo sapiens, por sua debilidade e fragilidade, viu-se obrigado a “emprestar” do planeta a energia de que não dispunha. Desde a descoberta do fogo, utilizava-se das florestas para se aquecer, cozinhar, afastar alguns predadores e prolongar a luz do dia. Não demorou para o fogo passar a ser utilizado na cerâmica e na metalurgia. É fácil inferirmos o aumento desmesurado do consumo de energia, devido à evolução tecnológica, até os dias atuais.

A energia emprestada do planeta, se fosse utilizada de forma parcimoniosa, poderia mostrar-se renovável, mas não foi o que testemunhamos na história da humanidade.

A invenção dos motores térmicos, com a conseqüente utilização de combustíveis fósseis em quantidades sempre maiores, iniciou uma nova etapa tecnológica.

E o século XX assistiu à disputa pela hegemonia política e pela supremacia econômica, mas a busca acirrada e contínua de novas invenções levou a um descuido em relação ao meio ambiente, fazendo com que se acendesse a luz amarela de alerta, avisando que a saúde do planeta corria perigo e que, se esse curso fosse mantido, o fim estaria cada vez mais próximo.

No entanto, vemos a nação mais poderosa do mundo ignorar olimpicamente o esforço geral de reduzir a emissão de poluentes, ela, que responde com exclusividade pela emissão de cerca de 25%, ou um quarto, do total de emissões que poluem a atmosfera.

Segundo Luigi Sertorio, “como o desenvolvimento da tecnologia passou a determinar o desenvolvimento da economia, o impulso tecnológico produziu instrumentos potentes o bastante para modificar o ecossistema num sentido prejudicial ao homem”. O autor comenta ainda que os combustíveis fósseis - como o carvão, o petróleo e o gás natural - são recursos finitos e que seu consumo desenfreado altera profundamente o ambiente terrestre, não apenas com as emissões de gases, que produzem o efeito estufa, mas também com uma grande produção de escórias que poluem o ambiente terrestre e aquático. Some-se a isso o esforço desmesurado por abrir novos mercados, depois que o bem-estar do cidadão passou a ser medido pelos economistas pelo tamanho do Produto Interno Bruto (PIB). Parece que a ciência, a economia e a ética não se comunicam nesta era de abundância tecnológica. Estamos vivendo a ética do consumo. O bem-estar se tornou sinônimo de aumento de consumo.

Segundo o autor, é necessário chegar a uma política geral de equilíbrio, em que o gasto de energia seja mínimo e a entropia - ou seja, a desordem do sistema - aumente dentro de limites controláveis. Isso significa atingir um estado de alta eficiência, do qual a maior mestra é a própria natureza. Só assim será possível que continuemos a gozar dos confortos aos quais nos habituamos.

Com a postura que assumimos, Senador Edison Lobão, que neste momento preside esta sessão, estamos exatamente corroborando a ética do consumo, desperdiçando grande parte daquilo que adquirimos não para viver melhor, mas para servir aos interesses de forças econômicas que não levam em conta a condição humana.

Sr. Presidente, é incrível que não nos demos conta também de que a natureza nos oferece de mão beijada fontes de recursos, como o sol. A energia que nos é dada por essa estrela é muito maior do que tudo o que podemos produzir consumindo recursos não-renováveis, como as jazidas subterrâneas de petróleo. E tem a vantagem de ser gratuita!

Quero chamar a atenção dos Srs. Senadores para o fato de que pesa sobre os nossos ombros, como homens públicos, a responsabilidade por legar àqueles que nos sucederão um mundo que seja habitável com um mínimo de qualidade, pois assim o recebemos. Estamos conseguindo nos livrar de parte considerável desse ônus com a elaboração de normas de proteção e preservação do meio ambiente. E ainda podemos ter muita esperança no porvir.

Temos um território imenso, o que viabiliza a produção e o consumo de recursos renováveis, como o álcool e o biodiesel. Temos muitos desempregados que, na falta de qualificação, podem ser estimulados a participarem de cooperativas dedicadas à reciclagem de materiais, como papel, plástico, vidro e metal.

Porém, de suprema importância, Sr. Presidente, é a conscientização de nossos compatriotas para os males do desperdício. O uso racional dos bens a que temos acesso pode servir para minorar as necessidades de outros. Se o que vale é produzir cada vez mais para o aumento do PIB, como é da essência do capitalismo e da visão econômica atual, o uso racional das riquezas só tende a permitir que mais pessoas possam delas usufruir. Se conseguirmos tocar a consciência do ser humano, conseguiremos tornar este mundo melhor e mais justo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/2004 - Página 26357