Pronunciamento de Heráclito Fortes em 18/08/2004
Discurso durante a 112ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Considerações a respeito do pronunciamento da Senadora Ideli Salvatti.
- Autor
- Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
- Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- Considerações a respeito do pronunciamento da Senadora Ideli Salvatti.
- Aparteantes
- Alvaro Dias.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/08/2004 - Página 26850
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
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- COMENTARIO, DISCURSO, LIDER, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), TENTATIVA, DEFESA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
- ANALISE, VITORIA, AGENCIA NACIONAL DO PETROLEO (ANP), QUEBRA, MONOPOLIO ESTATAL, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, AUSENCIA, DEMOCRACIA, PROPOSTA, CRIAÇÃO, AGENCIA NACIONAL, CINEMA, AUDIOVISUAL, CONSELHO, JORNALISTA, CONTRADIÇÃO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), HISTORIA, BRASIL.
- CRITICA, GOVERNO, INCOMPETENCIA, AUXILIO, CINEMA, CRITERIOS, POLITICA PARTIDARIA, LIBERAÇÃO, RECURSOS.
- CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FALTA, ETICA, DECLARAÇÃO, VISITA, PAIS ESTRANGEIRO, GABÃO.
- ANALISE, RESPONSABILIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, ATUAÇÃO, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
- CRITICA, AUSENCIA, PLENARIO, BANCADA, APOIO, GOVERNO FEDERAL.
O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, rogo a Deus que, neste instante, quando deve estar se iniciando no Haiti o jogo da nossa Seleção Brasileira, tudo corra bem. Que aquele país tenha a alegria que o seu povo deseja, sem que ali ocorra algum incidente grave, em um estádio sem nenhuma estrutura para o espetáculo que nós, brasileiros, com gesto patriótico, estamos oferecendo. Isso seria uma tristeza para todos nós.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero iniciar meu pronunciamento fazendo um elogio público e rasgado à Senadora Ideli Salvatti, esta heroína escalada para pautar a semana do Partido nas terças-feiras. Passam-lhe os assuntos mais difíceis de defesa, o osso. Daí por que a Senadora trouxe, evidentemente movida pelo subconsciente, a comparação de que canja de galinha sem pé não presta. Quero dizer à Senadora que adoro canja e detesto pé de galinha. Por questões de gosto, não acho que as duas tenham que andar sempre juntas e sinto-me muito bem com a canja sem os pés citados tantas vezes no pronunciamento por V. Exª.
Sr. Presidente, o PT é maldoso com sua Líder. Coloca-a aqui para fazer a defesa do impossível, o que ela tenta fazer de maneira esforçada e com brilho.
Senador José Sarney, Presidente desta Casa e ex-Presidente do País, o elogio que a Senadora faz hoje à Petrobras é dirigido aos governos que tentaram abrir o mercado e, no passado, tiveram dificuldades porque o Partido dela não permitia. Ninguém foi mais contra a vitória que o Brasil teve ontem, por meio da Agência Nacional de Petróleo, do que o PT. Refiro-me à quebra do monopólio estatal da exploração do petróleo do Brasil. Essa vitória, que enaltece o País, aconteceu ontem apesar do seu Partido, que hoje traz para si os frutos dessa vitória, como se deste Governo fosse, e não um esforço de várias gerações. Por justiça, isso começou no Governo Getúlio Vargas, com o refrão aqui citado: “O petróleo é nosso”. Apesar de tudo, o Brasil vence.
Fiquei muito feliz com as comparações feitas pela Senadora com relação ao Nafta, porque isso me traz à mente a luta do PT contra a Alca. O PT usou, em alguns casos, a própria Igreja, hoje tão afastada do Partido, decepcionada em razão do não cumprimento das promessas feitas ao longo de vinte anos. Combatia-se a Alca sem saber sequer o que ela era.
Aliás, Sr. Presidente, lembrei-me de uma figura fantástica que encantava o Brasil na década de 80, personificada por Jô Soares: um velho brasileiro exilado em Paris, que usava os primeiros sinais da comunicação telefônica mundial, ligava de um orelhão na Cidade Luz para seus conterrâneos brasileiros para saber das notícias, das agruras da ditadura brasileira, e dizia de lá: “Você não quer que eu volte!”
Isso tudo parece que começamos a reviver. O que vimos aqui, Sr. Presidente, é exatamente uma contradição de tudo que foi pregado ao longo desse tempo. O texto referente a essa Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual não será aprovado da maneira como está, porque, dentro do próprio Partido do Governo, há valores voltados para a cultura e para a coerência do seu passado, e estes não concordarão com esse texto.
O que assusta o Brasil é que a proposta tem origem no Ministério da Cultura, e o simples fato de um partido pensar em um texto dessa natureza já espanta e estarrece a todos. Modificá-lo é um dever de todos, mas o fato de originar-se no próprio Governo é que causa, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a indignação da Nação, principalmente do setor cultural, que combateu a censura, dos jornais que tiveram seus editoriais e sua linha de ação censurados, transformando artigos em receita de bolo e em hinos de músicas brasileiras.
O que estarrece a Nação é que o texto do projeto que cria o Conselho de Jornalistas é de autoria exatamente do Palácio do Planalto e não da classe mais interessada, que é a dos próprios jornalistas. O que estarrece a Nação é a origem desses fatos, que partem exatamente de quem combateu tais idéias durante anos e anos a fio.
Sr. Presidente, se o Governo quer ajudar o cinema brasileiro, dispõe de várias formas. Temos o Canal 42, Senadora Ideli Salvatti, chamado Canal Brasil, que é dedicado ao cinema brasileiro e que está ameaçado de ser fechado por falta de ajuda. Talvez aquele dinheiro que o Banco do Brasil liberou, de forma ilegal, para patrocinar shows do Partido, para a aquisição de sua sede, pudesse ter sido colocado à disposição desse Canal, que é uma defesa avançada do cinema brasileiro. Essa teria sido uma maneira clara, transparente e justa de ajudar a nossa cultura.
Concedo um aparte a V. Exª, Senador Alvaro Dias.
O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Heráclito Fortes, V. Exª, com toda a razão, demonstra indignação em relação a essa postura do Governo, que revela indiscutivelmente uma vocação autoritária, que deploramos. Recentemente, na sua viagem pelo mar do Caribe, o Presidente Lula acusou de covardes os jornalistas que não concordam com o Conselho. Creio que essa é uma revelação de despreparo. Um presidente da República, nem de brincadeira, pode denominar de covardes jornalistas que possuem um conceito inatacável. Não me reportarei a nomes, mas alguns dos que contestam com argumentos consistentes o modelo de Conselho que deseja o Presidente Lula prestaram extraordinários serviços à redemocratização do País. Há proprietários de veículos de comunicação que resistiram bravamente à ditadura. E não há como admitir isso, nem mesmo por brincadeira. Aliás, o Presidente não é eleito para brincar. O Presidente é eleito para governar. Em alguns momentos ele brinca e não governa, desgoverna - sobretudo quando não aceita a imposição da lei, especialmente da Lei Maior, a Constituição do País, e a afronta em muitas atitudes e procedimentos. Senador Heráclito Fortes, faço o aparte apenas para destacar a importância do pronunciamento de V. Exª, neste momento histórico em que há que se denunciar, sim, essa tentativa de se estabelecer um modelo autoritário de gestão no Brasil. V. Exª faz muito bem em comparecer à tribuna com essa missão. E faço este aparte a V. Exª para registrar também a minha indignação. Lamentavelmente, a luminosidade das praias do Caribe não significaram luminosidade de idéias para o Presidente da República.
O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Agradeço a V. Exª o aparte e quero registrar, até por dever de justiça, que foi em uma conversa que tivemos há poucos minutos no plenário que V. Exª me lembrou do comportamento do PT na luta pela quebra do monopólio do petróleo no Brasil.
V. Exª citou uma questão importante: a viagem do Caribe não deve ter feito tão bem ao Presidente. Só charuto, rum... São as belezas do Caribe, que devem ser contempladas por todos os que ali vão. No entanto, há uma diferença muito grande entre a brincadeira de um Chefe de Estado em uma roda de amigos ou na sua intimidade e o que é dito de maneira pública. Vejo, neste plenário, representando o PT, um homem de perfil democrático inarredável, que é o Senador Cristovam Buarque. Tenho certeza de que S. Exª ficou rubro com a brincadeira - ou declaração séria - do Presidente, quando disse ao seu colega da Costa Rica que foi ao Gabão aprender como se governa durante 37 anos. São palavras que não cabem.
Aliás, o Senador José Sarney, quando Presidente da República, defendia a liturgia do poder. Acreditava que o Presidente da República tinha que seguir a liturgia do poder e que dela não podia se afastar. E quero dizer que todos os presidentes que cumpriram essa liturgia no Brasil se deram bem. A liturgia do poder vai além do comportamento pessoal, é o respeito aos Poderes e principalmente ao próximo. Os presidentes da República que respeitaram o Congresso Nacional e que governaram com os olhos voltados para os outros dois Poderes saíram-se bem. Os que lhe viraram as costas pagaram o preço porque, em regime democrático, Sr. Presidente José Sarney, não há Poder mais forte do que o Legislativo brasileiro. E a história demonstra isso.
Sr. Presidente, falei de contradições do PT, entre o PT que pregava e o PT que governa, no exato dia em que os aposentados estão desesperados, à espera de uma decisão judicial sobre o que lhe era prometido ao longo dos anos, que era a não contribuição dos aposentados. Estão tendo que aguardar na Justiça o que lhes está sendo negado, mas que lhes foi prometido durante muitos anos.
Esse e outros fatos é que fazem com que a decepção tome conta dos brasileiros, embora, paralelamente a isso, se veja um avanço na economia, não como produto de um Governo que assumiu recentemente, mas como resultado do trabalho de vários governos que investiram na infra-estrutura, na agricultura, na renovação do nosso parque industrial. Agora, como na questão do petróleo, o atual Governo começa a colher os seus primeiros frutos. E é bom que isso aconteça. A democracia nos proporciona não o espetáculo de crescimento, como se quis dizer, mas o espetáculo de uma realidade deste velho gigante antes adormecido e que começa a despertar, depois do sacrifício de várias gerações.
Pagamos um preço alto, demos uma quota de sacrifício, é verdade, nos últimos oito anos, para que pudéssemos, a partir de agora e nos próximos anos, nos anos futuros, colher esses frutos.
Razão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por que me solidarizo com a Senadora Ideli Salvatti. Muito ocupada, muitas tarefas pelos Ministérios, S. Exª não pôde ficar aqui, pacientemente, para ouvir o pronunciamento do seu colega. Governo é isso! Quem tem que estar no plenário é a Oposição. Ou então governista rejeitado, não é, Senador Cristovam? Os que estão no poder estão atrás da caneta, estão nos Ministérios, às vésperas das eleições com mais motivo ainda. Nós, não. Nós, da Oposição, e os rejeitados temos que amargar, de consciência tranqüila, com a certeza do dever cumprido, a solidão que o Governo nos impõe.
Parabéns, Senador Cristovam Buarque! V. Exª é voz isolada desse Governo no plenário. Imagine V. Exª se a Oposição de hoje fosse a Oposição irresponsável de ontem, que acusava sem provas, que atacava, que agredia - o Brasil assistindo, impassível, como estamos vendo aqui, sabendo que esta palavra repercute para o orador positiva ou negativamente Brasil afora, as galerias repletas de pessoas de idade.
Como pega mal ver o Governo não ter quem o defenda na tribuna! Onde estão os governistas? O que há, na realidade, é um sistema de rodízio. Não é obrigatório todos estarem aqui no mesmo dia, mas isso existe. E estão todos nos Ministérios, para liberar estradas, escolas. O Brasil inteiro sabe que o Governo hoje só atende aos que lhe dizem amém. Os governos anteriores faziam a mesma coisa? Sim, mas a Oposição combatia e prometeu mudanças. Que mudança que nada! Isso não existe!
Sr. Presidente José Sarney, acho que no Brasil há uma ideologia mais forte do que a da esquerda, a da direita e a do centro: a da caneta. Se você quer ver a verdadeira personalidade do cidadão, é só dar a ele a caneta cheia. Aí você vê nomeação sem concurso, vê a crueldade de negarem direitos aos trabalhadores, você vê obra sem licitação, você vê tudo igual ao que era antes. Não muda nada! Este é o Brasil!
Agora, querer nos convencer de que o projeto da Lei do Audiovisual é democrático é pensar que somos idiotas e loucos. Graças a Deus este é um País de pessoas atentas. E, felizmente, o “vazódromo” do Governo funcionou a tempo, porque esse texto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vazou ninguém sabe como, e, por meio da Internet, ficamos estarrecidos com as intenções de setores da cultura do Governo na calada da noite.
Mas quero, por dever de justiça, afirmar aqui que o Ministro da Cultura Gilberto Gil talvez fosse o menos informado do que acontecia ali, porque, pelo seu perfil e pela sua formação, tenho certeza de que jamais aceitaria aquilo.
Sr. Presidente, imagine que, por um milagre, o Henfil voltasse e visse os dias que perdeu acreditando nos que pregavam justiça e liberdade; e visse, exatamente na classe a que ele pertencia, a da atividade cultural, que foi a sua razão de ser, esse projeto de fazer inveja àqueles que, na ditadura passada, na época da guerra, prendiam e deportavam. Imagine se alguns que entraram nessa luta e nela acreditaram voltassem à Terra para ver quantas noites perdidas, quanto tempo perdido durante vinte anos acreditando que, quando a estrela subisse ao céu, ela traria bondade, fartura, progresso e não a frustração que toma conta de todos nós brasileiros.
Muito obrigado, Sr. Presidente.