Discurso durante a 112ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários a artigo da revista IstoÉ sobre o equívoco jornalístico que levou à cassação do ex-Deputado Ibsen Pinheiro. Preocupação com os sinais de autoritarismo demonstrados no governo Lula.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários a artigo da revista IstoÉ sobre o equívoco jornalístico que levou à cassação do ex-Deputado Ibsen Pinheiro. Preocupação com os sinais de autoritarismo demonstrados no governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2004 - Página 26856
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, INJUSTIÇA, CALUNIA, CASSAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MANDATO, IBSEN PINHEIRO, EX-DEPUTADO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), EPOCA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORÇAMENTO, REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), VINCULAÇÃO, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, GABINETE, DEPUTADO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MEMBROS, COMISSÃO PARLAMENTAR, MANIPULAÇÃO, INFORMAÇÃO, IMPRENSA, PREJUIZO, CONGRESSISTA.
  • REGISTRO, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ENQUADRAMENTO, CRIME, SOLICITAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, LEGISLATIVO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CONCESSÃO, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), PRERROGATIVA DE FUNÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, ESPECIFICAÇÃO, EPOCA, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, CONCLAMAÇÃO, PROVIDENCIA, SENADO.
  • PROTESTO, AUTORITARISMO, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), RESTRIÇÃO, ACESSO, CONGRESSO NACIONAL, DADOS, RECEITA, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente José Sarney, Srªs e Srs. Senadores, trago à tribuna hoje o massacrado. Tive a honra de conhecer Ibsen Pinheiro. Eu o tinha como um Parlamentar probo, competente e de grande futuro, tanto é que despontava já como presidenciável do PMDB. É referência parlamentar num Parlamento desacreditado pela população do País. Para mim, foi grande a surpresa quando seu nome foi incluído entre aqueles indiciados pela CPI do Orçamento. Onze anos depois, um jornalista revela com todos os detalhes o grande equívoco que deu margem à grande injustiça.

É difícil, Senador Eduardo Siqueira Campos, descrever com todas as letras o drama vivido pela injustiça proclamada, a vergonha sentida e, como diz Ibsen Pinheiro, “vergonha sente quem tem vergonha e não quem pratica atos vergonhosos”, a dor sofrida por ele próprio e pela família, porque a consciência suja não dói. Diz Ibsen Pinheiro: “O que dói é exatamente a consciência limpa”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há escândalos. Há políticos corruptos, mas, lamentavelmente, há políticos injustiçados. E o que se revela é tremenda injustiça. Muitos dos Senadores conheceram de perto Ibsen Pinheiro e certamente, como eu, muitos ficaram surpresos com a inclusão de seu nome entre aqueles indiciados pela CPI do Orçamento.

Porém, o que me traz a esta tribuna não é apenas a solidariedade. O que me traz à tribuna não é o desejo de reivindicar da Câmara dos Deputados a revisão do ato da cassação do mandato de Ibsen Pinheiro, até porque não há ressarcimento compatível com o dano causado. Não há como recuperar prejuízo, pois os prejuízos sofridos são irrecuperáveis. Houve, sim, um linchamento político, um massacre de natureza moral. Não há como ressarcir Ibsen Pinheiro dos danos causados por essa injustiça. O que me traz à tribuna é, sobretudo, outra constatação. A solidariedade, sim, embora eu saiba, com a consciência tranqüila, que ele sequer necessite dela. O que me traz a esta tribuna é a indignação de ver o Sr. Waldomiro Diniz como responsável principal por esse equívoco.

No decorrer do debate sobre a instalação da CPI Waldomiro Diniz, ouviu-se, não uma única vez, mas muitas vezes, que não havia uma ligação tão estreita assim do Ministro José Dirceu com o Sr. Waldomiro Diniz, embora se comprovasse que a residência de Deputados do PT sempre foi residência do Sr. Waldomiro Diniz, um assessor de luxo do Partido dos Trabalhadores na Oposição.

Nessa CPI do Orçamento, o Sr. Waldomiro Diniz funcionou como assessor do PT, do então Deputado José Dirceu e, segundo a revista IstoÉ, também do então Deputado Aloizio Mercadante, Líder do Governo nesta Casa. Mas os porta-vozes do Governo insistiram em afirmar que não havia maior comprometimento da relação entre o PT e Waldomiro Diniz. Mais um retrato da inverdade, mais uma constatação da dissimulação que condena o PT no Governo.

A revista IstoÉ revela textualmente:

Minutos depois, Waldomiro Diniz entrou na sucursal brasiliense de Veja, (...) exibia um sorriso triunfal e afirmou. “Pegamos Ibsen”, disse-me.

Com base nos documentos fornecidos, a revista Veja divulgou ter sido Ibsen Pinheiro responsável por transações que envolviam um milhão de dólares. A própria revista constatou depois que se tratava de apenas mil dólares e não um milhão de dólares. Mas o Sr. Waldomiro Diniz forjara documentos. Apresentara documentos, levando um jornalista a incidir num equívoco que custou, lamentavelmente, a trajetória política de um brilhante líder do Rio Grande do Sul, o Sr. Deputado Ibsen Pinheiro.

E o Sr. Waldomiro Diniz mereceu da parte do atual Governo proteção no momento da denúncia. Evitou-se, agredindo a Constituição, desrespeitando o direto da Minoria no Congresso Nacional, a instalação da CPI sobre Waldomiro Diniz, que certamente revelaria todas as mazelas por ele acumuladas antes e depois da posse do Presidente Lula na Presidência da República.

Aqui está o jornal de hoje:

CPI pede prisão de Waldomiro Diniz.

            (...) O relatório da CPI da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro enquadra Waldomiro em oito crimes diferentes e solicita ao Ministério Público Estadual que o ex-assessor da Casa Civil seja investigado em três outros casos, nas supostas doações de campanha em 2002, em possíveis irregularidades na compra de uma casa por R$290 mil e com relação à alegada contribuição de R$8 mil que recebia da Fundação Parque de Alta Tecnologia de Petrópolis em complementação ao seu salário na Presidência da Loterj.

É esse cidadão, esse assessor de luxo do PT o principal responsável pelo equívoco deplorável cometido por um jornalista, que, como decorrência, proporcionou um equívoco coletivo da Câmara dos Deputados que levou à cassação, agora, segundo se revela injustamente, o Sr. Ibsen Pinheiro. De nada valeram os argumentos dos advogados do então Deputado.

Não teve importância alguma também a auditoria realizada pela Trevisan e Associados para esquadrinhar todos os ingressos e todas as saídas das contas bancárias de Ibsen Pinheiro, comprovando a lisura de seus procedimentos. Isso não importou. O que importou, na verdade, foi a documentação forjada por Valdomiro Diniz utilizada para a cassação de um Deputado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez, há comprovação de que a CPI Valdomiro Diniz certamente revelaria fatos inquestionavelmente graves e comprometedores da ação do atual Governo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nosso objetivo nesta tribuna é também destacar o desapreço do Presidente Lula à lei, especialmente à Lei Maior, a Constituição. Desapreço esse proclamado, mais uma vez, na edição de uma medida provisória, dessa feita, não só pela afronta à Constituição, mas também pelo objetivo da providência adotada.

Quer o Presidente, por meio de medida provisória, conferir status de Ministro ao Presidente do Banco Central. Há afronta à Constituição, porque não existe relevância e urgência nessa medida, pressupostos básicos indispensáveis para que se autorize o Presidente da República a editar medidas provisórias.

Essa afronta à Constituição se repete, é rotina: o Presidente da República revela seu desapreço à lei. É preciso constatar sempre: a lei deve governar os governantes. Quando a lei não governa, os governantes desgovernam; quando a Constituição é afrontada pelo Presidente da República, a conseqüência imediata é o desgoverno do País.

O Presidente da República adota a medida provisória, afirmando a importância de se conferir ao Presidente do Banco Central status de Ministro, como se isso pudesse consistir em sentença judicial de absolvição por eventuais ilícitos praticados - evidentemente, essa é a razão dessa providência urgente do Presidente Lula, diante das denúncias, das acusações assacadas ao Presidente do Banco Central. E, embora na Oposição, não o estamos julgando, condenando-o de forma precipitada. Julga-o e o condena antecipadamente o Presidente da República, ao tentar protegê-lo, conferindo-lhe status de Ministro, a fim de fugir à Justiça comum, como se, julgado por ela, estivesse a correr o risco da condenação. Portanto, Senador Demóstenes Torres, quem o julga e o condena antecipadamente é o Presidente da República, ao editar a medida provisória.

O Senado Federal tem enorme responsabilidade na defesa da Constituição Federal e, no caso específico do Presidente do Banco Central, em exigir prestação de contas. Cabe, sim, ao Senado Federal convocar o Presidente do Banco Central a prestar contas de atos e atitudes, já que foi esta Casa a responsável por sua nomeação. Coube ao Presidente a escolha, mas ao Senado Federal a convalidação dela e, portanto, a consagração da nomeação do Presidente do Banco Central.

Esperamos que esta Casa, sem excluir, é claro, as providências já adotadas pelo PFL e pelo PSDB na área do Poder Judiciário, faça valer sua prerrogativa de guardião da Constituição Federal, impedindo que mais essa agressão à Lei Maior do País seja conflagrada pelo Presidente da República, com o aval do Senado Federal.

Mas quero, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, referir-me também ao veto do Presidente da República a alguns artigos da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Talvez eu esteja equivocado, mas a impressão que ficou é que houvera um acordo entre Lideranças do Governo e da Oposição, para que essa lei pudesse ser aprovada no Congresso Nacional. Se houve o acordo, esse foi rompido, desrespeitado, ignorado pelo Presidente Lula.

O Presidente Lula vetou artigos fundamentais. Com o veto ao art. 100 da LDO, por exemplo, quer impedir o acesso irrestrito do Congresso Nacional às consultas aos sistemas que controlam a receita e os orçamentos públicos. E eis sua justificativa:

Os dados sigilosos poderiam comprometer a segurança do Estado, e a divulgação das informações podem perturbar, desnecessariamente, o ambiente político e econômico do País, sem nenhuma vantagem aparente para aqueles que farão o acompanhamento da execução orçamentária.

Isso é risível. É lamentável ter que rir de uma atitude do Presidente da República, principalmente pela pobreza da argumentação.

“Transparência zero”, esse deve ser o slogan do atual Governo. Nem mesmo o Congresso Nacional pode ter acesso às informações precisas da execução orçamentária.

Trata-se de um Governo incapaz de executar o Orçamento, que demonstra uma incompetência inédita em matéria de execução orçamentária. Ele não quer mesmo que o Congresso Nacional acompanhe a sua execução, e esta é a razão para tal: a sua incompetência.

O Congresso Nacional é responsável pela elaboração do Orçamento? É responsável por sua aprovação? Que Congresso é este que não pode investigar a aplicação dos recursos públicos? Que Congresso é este que não pode acompanhar sequer se o Poder Executivo respeita o Orçamento elaborado, votado e aprovado? Quer o Presidente Lula amesquinhar o Congresso? Quer reduzi-lo a uma Casa homologatória, sem força de investigar, propor e legislar?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sem sombra de dúvida, essa atitude do Presidente da República acompanha as demais de cunho autoritário. Não importa que a Liderança do PT venha a esta tribuna, para falar em “canja de galinha” e fazer chacota com a expressão “autoritarismo”, tão em voga nos documentos e nos programas elaborados e discutidos pelo PT ao longo de mais de 20 anos.

O autoritarismo, agora, mudou de lado, e o PT perdeu o gosto pelo exercício da expressão. Não deseja ouvir, porque certamente não sabe como responder quando ouve. É um Governo que quer, sim, manipular a imprensa; calar a livre manifestação do pensamento cultural brasileiro; amordaçar os Procuradores; silenciar os servidores públicos; amesquinhar o Congresso Nacional. É um Governo que tem um projeto de poder, na esteira de uma estratégia autoritária que é visível a olhos nus, no Brasil em que vivemos hoje.

O veto do Presidente não foi apenas esse. O Presidente veta também os controles do Sistema de Acompanhamento Gerencial dos Contratos, do art. 19. E o Poder Executivo justificou que não teria estrutura para dar cumprimento: é preciso rir de novo. Mas é justo que, diante das dificuldades do povo brasileiro, o Senador venha à tribuna para rir dos argumentos utilizados pelo Presidente da República? Se o Governo não tem estrutura para acompanhar o gerenciamento dos contratos, que estrutura tem para administrar, executar programas, enfim, realizar investimentos produtivos que embalem o crescimento econômico do País? A única estrutura que tem o Governo é a do marketing? Se desligarmos a televisão, acaba o Governo então? Creio que é preciso perguntar se o Governo é absolutamente virtual, porque estrutura não há para detalhes que considero elementares para um governo que quer ser transparente, que quer aplicar corretamente os recursos públicos e que quer corresponder às expectativas do País.

O outro veto do Presidente que eu poderia ainda destacar diz respeito à aplicação dos recursos da Cide. Esse fica para uma outra oportunidade porque, em respeito ao tempo e ao pronunciamento do Senador Leonel Pavan, que falará a seguir, devo concluir, afirmando que é preciso, sim, olhar com muita atenção para o Palácio do Planalto para ver o que pulsa no coração deste Governo.

A mim, o Governo não engana mais. Há o pulsar de sentimentos autoritários, com a força de quem deseja manter-se no poder, algemando a sociedade, impondo a sua vontade e dirigindo a Nação na busca do seu destino de forma impositiva e autoritária. Não concordo com isso e certamente os brasileiros não concordam.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2004 - Página 26856