Pronunciamento de Paulo Paim em 24/08/2004
Discurso durante a 116ª Sessão Especial, no Senado Federal
Homenagens ao ex-Presidente Getúlio Vargas, pelo transcurso dos 50 anos de seu falecimento.
- Autor
- Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
- Nome completo: Paulo Renato Paim
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Homenagens ao ex-Presidente Getúlio Vargas, pelo transcurso dos 50 anos de seu falecimento.
- Publicação
- Publicação no DSF de 25/08/2004 - Página 37437
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
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- HOMENAGEM, CINQUENTENARIO, ANIVERSARIO DE MORTE, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, EX-DEPUTADO, EX SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), ELOGIO, ATUAÇÃO, CHEFE DE ESTADO, RENOVAÇÃO, CENTRALIZAÇÃO, REPUBLICA, VALORIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, JUSTIÇA ELEITORAL, AMPLIAÇÃO, VOTO, MULHER, REFORÇO, ORGANIZAÇÃO, TRABALHADOR, INDUSTRIALIZAÇÃO, CRIAÇÃO, COMPANHIA SIDERURGICA NACIONAL, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), COMPANHIA NACIONAL DE ALCALIS, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO (BNDE), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S/A (ELETROBRAS), UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), UNIVERSIDADE DO BRASIL, PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA (PUC).
- ELOGIO, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, INICIO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, CRIAÇÃO, MINISTERIO DO TRABALHO INDUSTRIA E COMERCIO, JUSTIÇA DO TRABALHO, PREVIDENCIA SOCIAL, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).
O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador José Sarney, Srªs e Srs. Senadores e demais convidados desta sessão especial, cumprimento os representantes das confederações de trabalhadores que se encontram no plenário neste momento e o Presidente da Confederação dos Aposentados e Pensionistas, companheiro João Lima.
Cito os nomes que o Cerimonial nos enviou até o momento. Cumprimento João Vicente Goulart, Presidente do Instituto João Goulart; Moacir Roberto Tesch, Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade; Ubiraci Dantas de Oliveira, Vice-Presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil; Marco Antônio Campanela, responsável, em Brasília, pela Central Geral do Trabalhadores do Brasil. Registrarei em seguida os demais companheiros, cujos nomes a assessoria está me passando.
Sr. Presidente, Senador José Sarney, senhoras e senhores, “trabalhadores do Brasil” - marca dos pronunciamentos do Presidente Getúlio Vargas -, o Senado da República homenageia, no dia hoje, a memória de um dos seus mais ilustres membros, Getúlio Vargas, o líder popular que o povo brasileiro jamais esquecerá.
Getúlio Vargas foi duas vezes deputado estadual por meu Estado, o Rio Grande do Sul, deputado federal, líder da bancada gaúcha na Câmara dos Deputados, ministro da Fazenda, governador do Rio Grande do Sul, chefe vitorioso da Revolução de 1930, deputado federal por sete Estados, senador da República por outros dois. Getúlio Vargas foi, sem sombra de dúvida, o principal presidente de toda a história republicana.
A República Velha, contra a qual Vargas se insurgiu e que derrubou, era a república do atraso, em que as questões sociais eram tratadas como caso de polícia.
Podemos dizer hoje aos trabalhadores do Brasil que a República fundada por Vargas traçou logo novos horizontes. A economia saiu do campo para se industrializar, movida por braços de trabalhadores que, pela primeira vez na história, ganharam a proteção do Estado.
Até 1930, o poder do Presidente da República era limitado pelos governadores dos Estados, que desafiavam impunemente o chefe da Nação ao sabor dos seus interesses.
Vargas entendeu que, para fazer as mudanças que o País reclamava, era preciso inverter essa equação. Por meio de um movimento de centralização, transferiu o poder dos Estados para o Governo Federal, o qual passou a assumir papel crescente na sociedade e na economia.
Com o Executivo forte, a intervenção do Estado voltou-se então para promover o desenvolvimento tecnológico e industrial e fortalecer a organização dos trabalhadores.
As oligarquias rurais começaram a ceder espaço no cenário público. Em seu lugar entraram os trabalhadores organizados em seus sindicatos, uma crescente classe média, os empresários da indústria, e os servidores públicos avançaram com a nova visão do Estado.
Além de moderno, era um Estado austero. Nunca precisou de uma Lei de Responsabilidade Fiscal, pois não havia irresponsabilidade nos gastos públicos. Getúlio controlava até as despesas do cafezinho.
O Brasil industrializado de hoje só existe graças ao gênio político de Vargas. Ele tanto soube jogar com os interesses de grupos políticos internos como soube manter uma política externa pendular.
Vargas avalizou o financiamento para a construção da Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN, que foi a primeira grande e moderna indústria brasileira. Dela saiu o aço para os primeiros fogões e geladeiras fabricados no Brasil. Foi a CSN que permitiu ao País ter hoje uma das mais importantes indústrias automobilísticas do mundo.
Juntamente com a usina de Volta Redonda, foi criada a Companhia Vale do Rio Doce, para abastecê-la do minério de ferro necessário à produção do nosso aço. Depois vieram a Companhia Nacional de Álcalis, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico, atual BNDES, a Petrobrás e a Eletrobrás, consolidando a vocação industrial da economia brasileira.
Essas realizações no campo econômico já seriam mais do que suficientes para fazer de Getúlio Vargas o mais importante líder da nossa história. Mas, para Vargas, de nada adiantava o Brasil crescer sem distribuir entre os trabalhadores os frutos desse crescimento - teoria que defendemos até hoje. Só crescer não basta, é preciso também distribuir a riqueza.
A sua maior realização - Vargas governou sob o império de três diferentes Constituições, implantou o voto secreto, o voto feminino e criou a Justiça Eleitoral -, sem dúvida alguma, foi colocar em prática uma nova política social para o País.
Srªs. e Srs. Senadores, Srs. convidados, trabalhadores do Brasil, quando Vargas chegou ao poder, metade da nossa força de trabalho tinha menos de 18 anos de idade e o trabalho infantil era explorado nos quatro cantos do País.
Com um salário médio de somente 4 mil réis podia-se comprar uma cesta básica com meio quilo de arroz, de açúcar, de café, de macarrão e de banha. As fábricas eram mal iluminadas, não tinham ventilação nem instalações sanitárias, e os patrões descontavam das mulheres operárias até mesmo o tempo gasto para amamentar seus filhos.
Vargas mudou tudo isso. Combateu as jornadas que ultrapassavam 14 horas diárias. Não havia a carteira assinada. Não havia o direito trabalhista ou a assistência previdenciária. Nada disso existia e a polícia é que era chamada quando os trabalhadores se rebelavam contra essa situação.
Enfim, tudo estava por fazer. Era preciso dar educação, saúde, condições de trabalho, salário e cobertura previdenciária aos nossos trabalhadores.
Vargas criou o Ministério do Trabalho e em pouco tempo as relações trabalhistas passam a sofrer profundas transformações positivas.
Com Getúlio o Brasil conheceu a Justiça do Trabalho e a Previdência Social, os sindicatos de patrões e empregados - aqui muito bem aqui representados por aqueles que já citei e, particularmente pelo Sr. Moacir. Com Getúlio Vargas não avançamos somente na área sindical: tivemos a nossa CLT, o salário mínimo, as férias anuais, o descanso semanal remunerado e a carteira de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, trabalhadores do Brasil - repito o bordão de Vargas aqui -, quero dar um destaque especial para o salário mínimo. Implantado por Vargas em 1940, sem sombra de dúvida, o salário mínimo continua sendo, até hoje, o melhor distribuidor de renda do País. Por isso tenho insistido tanto para que o Brasil tenha um salário mínimo decente - o atual salário mínimo, infelizmente, ainda tem um valor indecente.
Vargas estabeleceu o primeiro sistema de cotas no Brasil ao fixar um limite para que as empresas tivessem, entre os seus empregados, trabalhadores estrangeiros, dessa forma garantindo aos operários brasileiros, sobretudo aos negros, as vagas que se abriam na indústria.
Faço um aparte na história e venho ao presente. Aprovar, como estou propondo, o Estatuto da Igualdade Racial significa dar continuidade à obra de Vargas. O estatuto que está pronto para ser votado aqui no Congresso Nacional é a verdadeira carta de alforria dos negros brasileiros.
Paralelamente, Vargas cuidava da saúde e da educação, o maior e mais importante fator de mobilidade social.
O direito à educação e a destinação constitucional de recursos orçamentários para o ensino público são obras de Vargas.
Com recursos orçamentários se garantem, na Era Vargas, o ensino elementar de qualidade, a educação física, a ampliação das escolas secundárias e a criação das escolas normais, formadoras de professores e professoras.
O crescimento econômico do País exigia trabalhadores capacitados, e Getúlio negociou com os empresários a criação do Senai e do Senac, destinados a formar mão-de-obra para a indústria e para o comércio.
Nascia, assim, o ensino técnico profissionalizante, formando a elite operária e as primeiras lideranças sindicais.
Inúmeros Ministros, Parlamentares de hoje, eu próprio e, principalmente, o Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva passaram, em sua base de formação, pelo Senai.
Também são dessa época as primeiras universidades brasileiras dignas desse nome. Foi Vargas quem criou a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade de Porto Alegre (1934), a Universidade do Brasil (1937) e a Pontifícia Universidade Católica (1940).
Srªs e Srs. Senadores, Srs. Convidados, Trabalhadores do Brasil, o legado de Vargas não cabe em um pronunciamento de alguns minutos. Mas hoje já se sabe que o suicídio do Presidente abortou articulações militares golpistas em curso, as mesmas que uma década depois levariam à deposição do Presidente João Goulart.
O povo viu no seu sacrifício o gesto maior de Vargas para salvar as conquistas da Nação e dos trabalhadores, saiu às ruas atacando tudo aquilo que representasse oposição ao seu líder, e sua reação assustou os golpistas.
Além do nacionalismo econômico, o principal alvo daquelas articulações era a política social de Vargas. Pouco antes de morrer, o Presidente duplicara o valor do salário mínimo, desvalorizado no período em que esteve fora do poder.
Já se atentava na época contra a legislação sindical e trabalhista. Passados mais de 60 anos da vigência da CLT, o diploma legal que garante a cidadania e a dignidade do trabalhador brasileiro, infelizmente não falta, ainda hoje, quem queira revogá-la e os artigos sociais que estão na nossa Constituição. E o tentam com o mais cínico dos argumentos, de que, flexibilizando a legislação trabalhista, a economia vai gerar mais empregos. Nada mais falso.
Os números divulgados na semana passada pelo próprio Governo, dando conta da contratação de mais de 1,236 milhão de novos empregos desde janeiro, provam que o caminho é o crescimento econômico sustentável. Não se deve mexer na CLT ou acabar com o nosso movimento sindical. Não é atentando contra os direitos dos trabalhadores e contra os seus rendimentos que seremos uma Nação forte.
Um País que desgraçadamente ainda tem trabalhadores explorados, como aqueles que, ainda hoje, estão sob o regime de escravidão, não se pode dar ao luxo de revogar direitos trabalhistas.
É bom lembrar que, com a atual legislação sindical, os trabalhadores chegaram ao poder neste País, elegendo Vereadores, Prefeitos, Deputados Estaduais e Federais, Governadores, Senadores, este que vos fala e, principalmente, o ex-sindicalista e hoje Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Parece-me que o sistema que nos foi deixado por Getúlio não é tão ruim como alguns apregoam; caso contrário, não estaríamos, neste momento, nesta tribuna.
Nesta manhã em que lembramos os 50 anos da morte de Getúlio, para que ninguém diga que só falei de flores, lembro que Vargas, como todo grande homem, tinha virtudes, mas também tinha defeitos.
Vargas era polêmico, pois todo grande líder é polêmico.
Sr. Presidente, Trabalhadores do Brasil, não poderia encerrar este meu pronunciamento sobre Getúlio Vargas sem uma referência específica ao trabalhismo e aos seus mais ilustres herdeiros. Refiro-me aqui a Alberto Pasqualini, a João Goulart, cujo filho está no plenário neste momento, e também a Leonel Brizola.
Com base na organização dos trabalhadores urbanos em seus sindicatos, o trabalhismo nasceu para manter e ampliar a legislação trabalhista inspirada em Vargas, para estender os benefícios dessa legislação aos trabalhadores rurais e da cidade, fazer a reforma agrária, sustentar o direito à greve e também a conciliação entre as classes sociais.
Este era o Brasil sonhado por Vargas: da democracia social, da valorização do trabalho e, principalmente, do trabalhador. Um Estado do Bem Estar Social tropical, como ele dizia, que Getúlio implantou e que começou a ser demolido após sua morte, apesar dos esforços de Jango, de Pasqualini e de Brizola.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Convidados e Trabalhadores do Brasil, a obra feita por Getúlio teve um bom alicerce e, por isso, resiste, a despeito daqueles que insistem em não reconhecê-la. Getúlio Vargas, João Goulart, Leonel Brizola e Alberto Pasqualini são daqueles homens que nunca morrem, pois seus ideais estarão sempre vivos entre nós.
Por isso termino dizendo:
Pasqualini presente,
Brizola presente,
Jango presente,
Presidente Getúlio Dornelles Vargas presente,
Vivam os trabalhadores do Brasil! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Concedo a palavra ao Senador Hélio Costa, autor do requerimento.
O SR. PAULO PAIM - Sr. Presidente, enquanto o Senador Hélio Costa, autor do requerimento, não chega à tribuna, permita-me fazer uma solicitação. O Senador Pedro Simon, que está hospitalizado, pediu-me que remetesse à Mesa - o que faço, neste momento, justificando sua ausência - requerimento, com a devida publicação, para que Getúlio Vargas seja incluído entre os grandes vultos que honraram a história do Senado.
Obrigado, Sr. Presidente.