Discurso durante a 116ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagens ao ex-Presidente Getúlio Vargas, pelo transcurso dos 50 anos de seu falecimento.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagens ao ex-Presidente Getúlio Vargas, pelo transcurso dos 50 anos de seu falecimento.
Publicação
Publicação no DSF de 25/08/2004 - Página 27474
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CINQUENTENARIO, ANIVERSARIO DE MORTE, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, NACIONALISMO, PROTEÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, VALORIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, REALIZAÇÃO, REFORMA POLITICA, MODERNIZAÇÃO, ESTADO, ECONOMIA NACIONAL.
  • ANALISE, SUICIDIO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADIAMENTO, DITADURA, BRASIL.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, convidados ilustres que se encontram presentes neste evento histórico, tenho um discurso escrito, que nada mais é do que uma repetição, com palavras mais modestas e menos brilhantes do que aquelas pronunciadas pelos oradores que me antecederam. Portanto, desde logo, peço a V. Exª, Sr. Presidente, permissão para falar um pouco de improviso. Peço que este trabalho seja inscrito nos Anais desta Casa como uma contribuição de nosso Partido, o PSB, à comemoração dos 50 anos da morte desta figura monumental: Getúlio Vargas, Presidente da República de nosso País.

Sr. Presidente, num momento como este em que o Brasil vive uma nova era na sua economia, na sua política e na sua doutrina administrativa, falar sobre a personalidade política de Getúlio Vargas é, sem dúvida alguma, reafirmar a sua luta em favor do nacionalismo, do trabalhismo e da autoridade do Presidente da República e a sua preocupação com o social. Esse quadro aqui se revestiu de sinceridade e de uma demonstração de brasilidade dos colegas que me antecederam.

O Presidente Getúlio Vargas, como aqui já foi dito, era uma figura política contraditória, mas também um homem do povo, um homem simpático e cordial, que passava para a população essa imagem, pois, apesar de ter administrado o nosso País em um período ditatorial, editou leis que redundaram na proteção do trabalhador e na sustentabilidade de uma indústria de base, o que configurou uma nova posição do Brasil.

Apesar das contendas, das divergências, o Presidente Getúlio Vargas teve a admiração e o respeito de todas as gerações. Mesmo os adversários mais cruentos reconheciam nele a habilidade e o seu compromisso para com o desenvolvimento do nosso País.

Ao fazermos esta homenagem a um homem que teve adversários e teve companheiros que se empenharam durante toda a sua vida para elevá-lo ao poder, não podemos deixar de lembrar de Carlos Lacerda, seu maior adversário político, que teve uma passagem contraditória na política do Brasil: cometeu justiças e injustiças; iniciou lutas importantes para a nossa História. Mas, de outro lado, o seu maior adversário, Getúlio Vargas, inscreveu na História política do Brasil um comportamento que, sem dúvida alguma, ajudou o nosso País a conquistar a atual posição de destaque perante o mundo.

Naquela época, era muito mais difícil governar, já que vivíamos em um País em que não havia o voto secreto, em que a mulher não tinha o direito de votar, em que o trabalhador não tinha a proteção social da carteira do trabalho, em que não havia o Tribunal Eleitoral, em que não havia o Tribunal de Contas para fiscalizar a aplicação das verbas. Por tudo isso, foi como se colocassem nas mãos de um Presidente da República o dever e a responsabilidade de reconstruir o nosso País, abandonando a República Velha e construindo uma nova República. Getúlio cometeu os seus erros, mas, neste momento, temos que edificar o seu trabalho naquilo que foi positivo, porque o que foi negativo também já foi falado aqui.

O patrimônio que ficou do governo de Getúlio Vargas, tanto na sua primeira passagem, como quando ele foi eleito democraticamente, foram os seus atos que revelaram o seu acendrado amor para construir um Brasil independente, autônomo. E ele morreu na plenitude da sua força política. O Brasil estava mergulhando, sem dúvida alguma, na nova era democrática, mas forças poderosas estavam lutando nos bastidores da vida militar para derrubar o Presidente da República e, conseqüentemente, introduzir no Brasil a democracia. Quer dizer, se no passado ele contribuiu para a introdução da ditadura, sua morte contribuiu de modo significativo para que a ditadura fosse evitada pelo menos por dez anos seguidos. Se ele deu a sua vida para demonstrar a sua honra, para assegurar a sua dignidade, com esse ato também pôde construir no Brasil um espaço de pelo menos dez anos de regime democrático.

Sr. Presidente, dentre as pessoas presentes - há representantes das diversas confederações dos trabalhadores -, está o ex-Senador Ney Maranhão, com quem me sentei há poucos instantes, antes de vir à tribuna. Ele foi Vice-Líder do Governo Getúlio Vargas justamente naquele momento em que desaparecia o grande timoneiro das conquistas sócias.

Aproveito este instante para dizer ao ex-Senador Ney Maranhão que ele conta com a admiração desta Casa. Sua figura pontificou, naquela época, no PTB, como uma das lideranças máximas do Governo Getúlio Vargas, em pleno regime democrático.

Sr. Presidente, com estas palavras singelas, deixo patenteada minha admiração a esse gaúcho de São Borja que marcou a sua passagem pela política do Brasil como um grande estadista.

Temos, no Brasil, estadistas que deixaram a sua história, a exemplo - para sermos mais rápidos, citaremos os mais recentes - de Juscelino Kubitscheck, de João Goulart e o atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que hoje desponta não apenas na América Latina mas em todo o mundo como uma das figuras que mais engrandecem a diplomacia brasileira. Um operário, que veio de baixo, veio do nada e se consagra hoje como um grande estadista, segurando a nossa economia, segurando a inflação, dando tranqüilidade ao investidor externo e dando paz e harmonia aos segmentos sociais e econômicos do nosso País.

Por essa razão, Sr. Presidente, homenageio, em nome do PSB, o ex-Presidente Getúlio Vargas, mesmo sabendo que milhares e milhares de homenagens estão sendo feitas a ele neste dia e serão feitas para todo o sempre, porque a sua figura é um patrimônio nacional.

Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR ANTONIO CARLOS VALADARES.

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O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito já se falou neste Plenário, e por este Brasil afora, sobre Getúlio Vargas. Poderia aqui fazer um discurso de sua vida pessoal, dizendo que ele foi um estadista gaúcho. Foi Presidente da República que mais tempo permaneceu no cargo, pois governou o País de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954.

Que ingressou na política em 1909 como deputado estadual pelo Partido Republicano Rio-Grandense (PRR). De 1922 a 1926 cumpre o mandato de deputado federal. Foi Ministro da Fazenda do governo Washington Luís, deixa o cargo em 1928, ao ser eleito para governar seu estado. É o comandante da Revolução de 1930, que derruba Washington Luís.

Eu poderia aqui enumerar inúmeros dados sobre a Presidência Getúlio Vargas, tais como: que em 1937 fecha o Congresso, prescreve todos os partidos, outorga uma Constituição, instala o Estado Novo e governa com poderes ditatoriais. Nesse período, adota forte centralização política e atuação do Estado. Na área trabalhista cria a Justiça do Trabalho (1939), o Ministério da Justiça e o salário mínimo (1940), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, 1943), a carteira profissional, a semana de 48 horas de trabalho e as férias remuneradas. Na área estatal, cria a Hidrelétrica do Vale do São Francisco (1945) e entidades como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (1938). É derrubado pelos militares em 1945. Volta à Presidência em 1950, eleito pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que ajudou a fundar. No último mandato, cria a Petrobras. O envolvimento do chefe de sua guarda pessoal no atentado contra o jornalista Carlos Lacerda leva as Forças Armadas a exigir sua renúncia no último ano do mandato. Suicida-se em meio à crise política, com um tiro no peito, na madrugada de 24 de agosto de 1954, dentro do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, e deixa uma carta testamento.

Podemos lembrar da Presidência de Getúlio Vargas que entre 1930 e 1945 o país passa por um surto de desenvolvimento industrial. Na década de 30 o crescimento da indústria é de 125% ao ano, em média, enquanto a agricultura cresce a uma taxa de 20%. Durante a Segunda Guerra o crescimento industrial cai para 5,4% ao ano, mas o setor consegue avançar pela superutilização dos equipamentos já instalados. Nesse período, o Brasil chega a exportar tecidos para a América Latina, África do Sul e Estados Unidos. A expansão industrial continua no pós-guerra e, em meados da década de 50, a indústria supera a agricultura na composição do Produto Nacional Bruto.

O governo getulista tem papel fundamental na expansão do parque industrial do país. Ele institui tarifas protecionistas, dá incentivos fiscais às indústrias, amplia o sistema de crédito, controla os preços e estabelece uma política de contenção salarial. O Estado também faz investimentos diretos na ampliação dos setores de energia, transportes e na indústria de base, como a siderúrgica - áreas que não interessam aos capitalistas nacionais porque têm um retorno lento e exigem grandes capitais. Em 1941, com dinheiro público e financiamento do Eximbank norte-americano, Vargas monta a Companhia Siderúrgica Nacional, que só começa a operar em 1946 com a inauguração da usina de Volta Redonda. Em 1942 cria a Companhia Vale do Rio Doce para explorar minério de ferro. No mesmo ano baixa um plano de saneamento econômico, desvaloriza a moeda e substitui o mil-réis pelo cruzeiro.

A expansão das atividades industriais não diminui a dependência da economia brasileira em relação ao exterior. A maior produção de bens de consumo exige mais importações de bens de capital, matérias-primas e combustíveis. Mantém-se o desequilíbrio do balanço de pagamentos. As emissões de moeda e os empréstimos externos são freqüentes. O resultado é uma inflação constante durante todo o governo Vargas. Ademais, a política de valorização do café é mantida durante toda a Era Vargas.

O governo Vargas atendeu a várias reivindicações operárias. Em 1932 a jornada de trabalho passa a ser oficialmente de oito horas e o trabalho da mulher e do menor é regulamentado. É estabelecido o princípio de salário igual para trabalho igual e as mulheres ganham o direito à licença-maternidade de dois meses. A lei de férias, criada em 1926, é regulamentada em 1933, mas apenas algumas categorias de trabalhadores urbanos gozam de tal direito. Ainda em 1933, a previdência social começa a ser organizada sob o controle do Estado e são criados os institutos de aposentadorias e pensões (IAPs). Eles praticamente eliminam as antigas entidades assistenciais dos trabalhadores e colaboram para aumentar a força do Estado com os imensos recursos recolhidos dos assalariados e das empresas.

Em 1940 é instituído o salário mínimo com o objetivo de reduzir a pauperização dos trabalhadores urbanos e ampliar o mercado para as indústrias de bens de consumo leve. Em 10 de novembro de 1943 entra em vigor a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que reúne todas as resoluções tomadas desde 1930 na área trabalhista, sempre apresentadas como uma "doação" do Estado e do próprio Getúlio.

Srªs e Srs. Senadores, já se falou que o governo passado (que hoje é oposição) esteve longe da política getulista, de intervenção estatal e de defesa dos trabalhadores. Na verdade foram administrações onde se venderam as empresas brasileiras e foram flexibilizados os direitos trabalhistas.

No que toca as privatizações dos últimos anos, Srªs e Srs. Senadores, na verdade se criaram novos cartéis, o que explica que as tarifas telefônicas tenham sido aumentadas algumas centenas de vezes acima da taxa de inflação e que, ainda agora, pagamos proporcionalmente mais caro, do que povos de renda cinco vezes superior à nossa, pelos mesmos serviços de utilidade pública. O Estado continua a determinar grande parte das regras de funcionamento desses serviços, assim como deixamos para o Estado quase 50% do custo do custo desses serviços, sob a forma de impostos, taxas especiais e outras contribuições.

Nos anos do governo passado, a possibilidade de exterminar a herança varguista era grande. Tudo começou com a o jogo de braço entre o governo e a greve dos petroleiros em 1995. O governo ganhou a disputa e iniciou uma das maiores empreitadas contra os direitos trabalhistas previstos na CLT. Flexibilizou, remendou, desfigurou a CLT para adaptá-la aos novos tempos da acumulação global do capital.

O trabalhismo e o nacionalismo estavam quase liquidados. Mas o Brasil precisava de um novo estadista, com visão diferenciada de inclusão social e não de uma mera “proteção” dos pobres, dos trabalhadores, do salário mínimo, dos direitos sociais e da sociedade do  apetite do capital estrangeiro. A resposta está na eleição de Lula.

A eleição de Lula é a defesa de uma inclusão social de grande parcela da população. Tarefa nada fácil, diante da realidade mundial posta - de guerras, de grandes disputas comerciais, de proteção dos países desenvolvidos aos produtores agrícolas e outras indústrias; e o pior, de grande dependência econômica do Brasil ao capital externo, daí o aumento absurdo da dívida externa brasileira que o governo passado patrocinou.

De fato, o governo Lula tem uma grande tarefa a executar. Sou da base de sustentação do governo e por isso constato que desde que assumimos o poder temos sido acusados - algumas vezes injustamente outras nem tanto -, oscilado entre a conservação e a mudança, de maneira que lembra o pêndulo de Vargas.

Todavia, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores e outras autoridades e convidados, as mudanças estão sendo feitas, no ritmo possível, de uma sociedade com diversos interesses, muitas vezes antagônicos. Essas mudanças que, por um lado aproximam o povo do Estado e da justiça social, através de políticas de participação nas gestões públicas, por outro lado, provocam uma imediata e forte repulsa da elite, acostumada a ter as benesses do Estado brasileiro somente para si.

Assim como no período do Presidente Getúlio Vargas as críticas positivas e negativas somente podem ser pensadas tempos depois, pela história, pelas conseqüências dos atos ali praticados, as mudanças que hoje serão feitas, serão colhidos no futuro.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/08/2004 - Página 27474