Discurso durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre artigo da jornalista Miriam Leitão intitulado "Nuvens no horizonte", publicado no jornal O Globo, a respeito do aumento das exportações brasileiras e da situação precária das estradas nacionais.

Autor
Alberto Silva (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Alberto Tavares Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR. POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA ENERGETICA.:
  • Comentários sobre artigo da jornalista Miriam Leitão intitulado "Nuvens no horizonte", publicado no jornal O Globo, a respeito do aumento das exportações brasileiras e da situação precária das estradas nacionais.
Aparteantes
Alvaro Dias, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2004 - Página 28051
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR. POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REDUÇÃO, PREÇO, PRODUTO NACIONAL, MERCADO INTERNACIONAL, PRECARIEDADE, SISTEMA DE TRANSPORTES, PREJUIZO, ECONOMIA, BRASIL.
  • REPUDIO, PRECARIEDADE, RODOVIA, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE, REGIÃO CENTRO OESTE, CRITICA, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, PRODUTOR RURAL, CONSTRUÇÃO, REDE RODOVIARIA.
  • COMPARAÇÃO, CRISE, ENERGIA ELETRICA, SITUAÇÃO, SISTEMA RODOVIARIO FEDERAL, REGISTRO, UTILIZAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, INTERVENÇÃO, DOMINIO ECONOMICO, RECUPERAÇÃO, RODOVIA, AMBITO ESTADUAL.
  • PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, CAMARA DE GESTÃO, AGILIZAÇÃO, LICITAÇÃO, RECUPERAÇÃO, SISTEMA RODOVIARIO NACIONAL.
  • REGISTRO, EXISTENCIA, RECURSOS, ARRECADAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, INTERVENÇÃO, DOMINIO ECONOMICO, CONSTRUÇÃO, RODOVIA.
  • ANALISE, FABRICAÇÃO, UTILIZAÇÃO, COMBUSTIVEL ALTERNATIVO, MATERIA-PRIMA, OLEO VEGETAL, SOJA, MAMONA, DENDE, CANA DE AÇUCAR.
  • SUGESTÃO, INCENTIVO, CRIAÇÃO, ASSOCIAÇÃO RURAL, PRODUÇÃO, COMBUSTIVEL, MAMONA, BENEFICIO, SUPERIORIDADE, RENDA, TRABALHADOR RURAL, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente. Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna, hoje, para tratar de dois assuntos, que considero fundamentais, no momento em que o Brasil desfruta de uma situação excepcional com relação ao saldo da balança comercial com o aumento de nossas exportações. No entanto, há entraves pelo meio.

Sr. Presidente, lerei trecho de um artigo da jornalista Míriam Leitão, publicado em O Globo, intitulado “Nuvens no Horizonte”, que diz:

Os preços das commodities - uma das razões do excelente desempenho da balança comercial - começam a cair fortemente no mercado internacional. A deterioração dos transportes no Brasil põe em risco o caminho pelo qual a economia brasileira está se recuperando, que é justamente o aumento do comércio internacional. Os dois problemas juntos mudam para pior o ótimo quadro econômico atual.

Senhores, “deterioração dos transportes”, a que se refere a jornalista, envolve rodovias, portos, ferrovias, enfim, os meios de transportes utilizados para o escoamento da economia até os pontos de comercialização - os portos.

O que sabemos a respeito? Tempos atrás fiz um estudo, apoiado por técnicos dos construtores de estradas e dos transportadores de carga, e chegamos à conclusão, isso já passados alguns meses - creio que teríamos de atualizá-lo, mas se o fizermos será para pior -, de que 32 mil quilômetros de estradas federais, em todos os Estados brasileiros, estão em estado precário. Umas, péssimas; outras, ruins; boas não há.

Sr. Presidente, o Governo insiste, por intermédio de seus diferentes órgãos, de um lado, na questão da parceira, em que empresários particulares assumem o compromisso, como no Sul, de repararem as estradas, mas com a cobrança de pedágio. Mas, na maior parte do País, principalmente a partir da Bahia, portanto, nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste não há quem queira investir recursos. Aliás, os produtores de soja de Mato Grosso estão construindo estradas com recursos próprios, os quais deveriam ser empregados no financiamento da safra, estão sendo desviados para a construção de estradas federais.

Sr. Presidente, o que fizemos? Aproveitando o exemplo magnífico do apagão, o que o Governo fez? Sabendo que o Ministério de Minas e Energia, sozinho, não teria condições de resolver um problema tão grave como a questão de interligação de linhas geradoras e estabelecer um processo de racionamento, criou a Câmara de Gestão, à época em que o Chefe da Casa Civil era o Ministro Pedro Parente, o que foi muito bem concebido e realizado.

Ocorre que o problema de nossas estradas é bem pior do que o da energia. No que se refere à energia, podemos dar um jeito com a instalação de usinas termelétricas nas pontas de linha e suprir, por exemplo, a ponta de carga. Mas com as estradas, não. Principalmente se elas estão destruídas, meu caro Senador Heráclito Fortes, a exemplo do nosso Estado.

Agora o Governo dá 25% da Cide aos Estados. Muito bem! Os Estados estão tratando de ajeitar as estradas estaduais, aquelas que ligam os Municípios de interesse dos Governadores e Prefeitos. E as federais? Quem as conserta? Penso que a Cide foi criada para isso. Ora, se 25% são enviados para os Governadores e Prefeitos - suponho -, ainda sobra dinheiro.

Sr. Presidente, então, a nossa proposta é no sentido da criação de uma câmara de gestão também para as estradas brasileiras. Tenho dados importantes. Vejam V. Exªs onde se encontram os gargalos que impedem a recuperação de nossas estradas federais. O primeiro é não se poder consertar uma estrada sem a execução de um projeto. Segundo normas do antigo DNER, hoje Dnit, para se elaborar um projeto é uma novela: tem-se que haver licitação, até aí tudo bem, mas entre começar e as empresas ganhadoras da licitação mandarem os seus técnicos para o campo para furarem o asfalto para saberem onde está ruim e verificarem se a base está boa ou não, é uma longa história. Hoje existem equipamentos moderníssimos que, segundo informações colhidas em São Paulo, conseguem executar oito mil quilômetros de projeto por mês. Mas, pelo processo atual, nem em cinco anos conseguiremos fazer isso.

Então, por que não usar a câmara de gestão, que tem poderes especiais? Não que ela vá passar por cima da lei, mas certamente irá facilitar a execução dessas licitações, usando o processo moderno de fazer projetos.

Portanto, o nosso projeto se resume no seguinte: em quatro meses, teremos 32 mil quilômetros de projetos prontos. Aí o processo de licitação passa a ser mais rápido, menos burocratizado. E sabem V. Exªs qual o montante para isso? O nosso estudo revelou que em 25 mil quilômetros de estradas só precisamos trocar o asfalto que está remendado. Aquela história de tapa-buraco não funciona. Quando o asfalto envelhece, não adianta remendar aqui, porque lá adiante ele quebra. Tem que arrancá-lo. Portanto, 25 mil quilômetros têm que ser refeitos, porque as bases estão boas, e 7 mil em sua totalidade, pois base e capa devem ser recompostos.

Nesse caso, por que razão o Governo não ordena a recuperação de nossas estradas? Faço um apelo ao Ministro José Dirceu, meu amigo, para que S. Exª autorize, ainda há saldo na Cide. Ainda há a Petrobras, pois grande parte disso é asfalto. Façamos um acordo com a Petrobras. A câmara de gestão é para gerir, já que isso é uma operação de guerra. Consertar 32 mil quilômetros de estradas em 36 meses é uma operação de guerra; 11 mil quilômetros, mais ou menos por ano, mas em todos os Estados. Essa é a minha proposta, que funciona, que dá um milhão de empregos logo de saída, principalmente para um Governo que está precisando empregar tanta gente.

Concedo o aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Alberto Silva, V. Exª presta, nesta manhã de sexta-feira, lamentavelmente sem a presença do Governo para ouvir um discurso como esse, baseado na longa experiência que tem V. Exª de integração brasileira, não só de estradas, mas também de ferrovias, lamentavelmente, e já não é o primeiro discurso que V. Exª faz sobre esse tema. Mas, infelizmente, tenho a certeza de que a fala de V. Exª não irá ecoar nos gabinetes do poder do País. É lamentável. V. Exª, pela terceira ou quarta vez, faz um alerta para um problema tão grave no Brasil, talvez até de maior gravidade do que o do apagão.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Com certeza.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Essa questão já não é de hoje, vem dando sinais, e o Governo não toma providência concreta. É evidente que não há força humana no mundo que acabe com o famoso tapa-buraco, porque isso é exatamente a “galinha dos ovos de ouro” de quem trabalha nessa área, e V. Exª sabe muito bem disso.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - É uma pena.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Veja V. Exª , por exemplo, nas estradas do Piauí, inicia-se a operação tapa-buracos e, ao final dela, tem-se que recomeçar. Todo o ano isso se repete.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Exatamente.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - O que é lamentável. V. Exª aborda o problema dando inclusive solução. Agamenon Magalhães - e eu já disse isso várias vezes - dizia uma coisa fantástica: “O homem público tem que dormir com um alfinete na cabeceira de sua cama para, todos os dias, pela manhã, dar uma espetada em si para saber que o corpo dele dói igual ao dos outros”. O homem público tem que começar a ouvir.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Claro..

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Entristecem-me ainda mais as notícias veiculadas nos jornais de ontem e de hoje dizendo que o Ministro dos Transportes, responsável, talvez no momento, pela Pasta de maior importância no Brasil, a que cuida das estradas, num desabafo, disse que “não manda em nada e que o que acontece na ‘casa’ dele é o ultimo a saber”. É uma tristeza ouvir isso, e o Brasil parado. Eu queria que V. Exª juntasse todos os pronunciamentos que fez sobre essa questão, inclusive dando as soluções, e as publicasse. Algo intitulado “O grito das estradas”, para ver se alguém acorda para esse fato. Isso é uma brincadeira! V. Exª é um homem da base do Governo, é um homem que tem tido um comportamento de fidelidade ao Governo, mas está falando em vão, porque o Governo não toma nenhuma providência concreta. Parabenizo V. Exª pela persistência e, evidentemente, “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. Agradeço a V. Exª.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Obrigado, Senador Heráclito. V. Exª, que é um companheiro nosso, do Piauí, sabe, e tudo o que disse é verdadeiro. Temos que encarar o problema das estradas tal como ele é. Ele é tão grave quanto o da energia e precisa ser enfrentado urgentemente, porque temos safra a escoar e não temos estradas nos troncos principais que demandam os portos.

Concedo um aparte ao nobre Senador Alvaro Dias.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - O Senador Alberto Silva foi um extraordinário governador de Estado e valorizou o sistema rodoviário do Piauí. Ele construiu e conservou. O Senador Heráclito Fortes, há pouco, relatava-me esse fato.

O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti. PPS - RR) - Senador Alvaro Dias, seu microfone está desligado.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Está ligado, mas baixo.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Além das estradas, é preciso consertar aquele microfone, Senador. Mas eu dizia que V. Exª, como grande governador do Piauí que foi - o Senador Heráclito Fortes dava esse depoimento há pouco -, valorizou esse patrimônio extraordinário que é o sistema rodoviário brasileiro. Foi uma opção do nosso País o transporte rodoviário. Da mesma forma, quando governei o Paraná, o Estado investiu US$1,1 bilhão no maior programa rodoviário da história - embora também investisse em ferrovia, construindo a Ferrovia Paraná Oeste. V. Exª sabe da importância desse patrimônio. Não entendo, não posso compreender mesmo como pode o Governo tratar esse tema com tanta irresponsabilidade. Com a Cide, foram arrecadados cerca de 18 bilhões no ano passado e neste ano. Ocorre que esses recursos não foram aplicados na conservação das nossas rodovias. Se o tivessem sido, teríamos rodovias perfeitas. Não foram. Os recursos foram utilizados para pagamento de pessoal e para acúmulo de valores, a fim de se alcançar o superávit primário de 4,25%, exigência do Fundo Monetário Internacional. E um patrimônio extraordinário está sendo destruído. É uma irresponsabilidade, sim, a destruição das rodovias, porque elas custaram caro ao País. A pavimentação asfáltica é uma obra caríssima. Portanto, V. Exª - já o vi na tribuna várias vezes - dá a devida importância à conservação das nossas rodovias. Lembro-me, Senador Heráclito Fortes, de que no meu tempo de governo investíamos US$3,5 milhões/mês só na conservação de rodovias. De lá para cá, não se conservou mais rodovia no Paraná e hoje há uma destruição quase que absoluta das estradas paranaenses. Não é só o Piauí que isso acontece. É no Paraná, é no Brasil inteiro. E depois vou falar sobre o desperdício de alimentos, que tem muito a ver com o estado das nossas rodovias.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Muito agradecido, nobre Senador Alvaro Dias. Incorporo ao meu discurso as observações de V. Exª.

Sr. Presidente, antes de concluir esse tema, gostaria de dizer que, com o montante de R$1,6 bilhão retirado da Cide, podemos não tapar buracos, mas fazer onze mil novos quilômetros de rodovias federais por ano, distribuídos por todos os Estados. Em 36 meses, teremos trinta e dois mil novos quilômetros, que durarão 20 anos. E tapando buraco, como acabou de dizer o Senador Heráclito Fortes, não vamos a nenhum lugar. S. Exª chama isso de galinha dos ovos de ouro.

Chamo a atenção do Governo. O Ministro José Dirceu, que é o homem que toma decisões, é meu amigo, tenho por ele a maior admiração. Que S. Exª tome uma decisão, mande para cá a proposta de uma câmara de gestão, que é a maneira mais prática de se executar uma tarefa de tamanha envergadura.

E isso, para o Governo do PT, para o Governo do Presidente Lula, é algo inusitado, porque, afinal de contas, em todos os Estados, máquinas rodoviárias rolando, construindo estradas novas, geram um milhão de empregos diretos, além de outros, secundários, que acompanham um empreendimento dessa envergadura.

Mas eu gostaria, se me permite o Sr. Presidente, ainda no meu tempo, já que hoje não há muitos oradores inscritos, de me estender um pouco mais e falar sobre o famoso biodiesel.

Srs. Senadores, ontem assisti a um seminário, ouvi discursos, na Câmara dos Deputados, sobre o biodiesel. Todo mundo entende de biodiesel, todo mundo fala em biodiesel, mas a única usina de biodiesel que existe, real, pronta para funcionar, foi construída por nós - incluo-me entre as pessoas que mexeram com o biodiesel há 30 anos -, pelos técnicos da Universidade do Ceará, tendo à frente o professor Expedito Parente.

            Fizemos biodiesel há 30 anos, a pedido do Presidente Geisel. Quando me nomeou Presidente da EBTU, ele fez-me uma recomendação: “Procure um sucedâneo para o óleo diesel”. E nós trabalhamos em laboratórios deste País inteiro. Mas, antes disso, fiz uma consulta à Mercedes Benz. O superintendente da Mercedes no Brasil naquela época, acho que o Sr. Sauer, se entendia bem com a EBTU, e fiz uma proposta: “será que não podemos usar álcool em motor diesel?” E ele disse: “vou mandar fazer essa consulta à nossa matriz, na Alemanha”. Senhores, pasmem, em menos de dois meses recebi, na EBTU, um produto que diziam ser o aditivo para álcool funcionar com diesel. Na época, dever-se-ia colocar 3% desse produto aditivo para o motor diesel funcionar com álcool. Eu disse que tinha achado caro. Passados mais dois meses, a matriz européia da Mercedes Benz nos mandou um outro produto, bem mais simples e extraído da própria cana, e do qual se necessitava apenas 1,5%.

            Agora vou fazer um comparativo para os que assistem à TV Senado, que é veiculada no Brasil inteiro. Tem muita gente interessada que tem cabeça, está com papel na mão, escrevendo. Anotem esses números. Fala-se em biodiesel e todo mundo fica alegre: vamos substituir o petróleo por biodiesel, vamos plantar mamona para fazer diesel, dendê da Amazônia, etc.

            Quando eu estava na EBTU, descobrimos que para levar um litro de óleo diesel para a Amazônia gastam-se dois litros nos transportes fluviais. Fala-se que temos que misturar o biodiesel da mamona no óleo mineral na proporção de 2%. Notem a anomalia que isso representa. Por exemplo, se só vou misturar 2%, biodiesel fabricado na Amazônia com óleo de dendê ou óleo de mamona, preciso levar 98% ainda de óleo diesel. Então, fica mais ou menos a mesma coisa: são quase dois litros gastos para levar um litro.

Não é melhor estudarmos - já que o Brasil não gasta dinheiro em pesquisas - aquela descoberta da Mercedes Benz e usar um aditivo no álcool e, lá na Amazônia, produzir álcool, porque lá se pode produzir tudo? Existem as oleaginosas, não há dúvida, mas sugiro que as oleaginosas da Amazônia, como o dendê, fabriquem o biodiesel para exportar. Que lá na Alemanha, na Itália ou na França, onde já usam o biodiesel há muito tempo, eles usem o nosso biodiesel de dendê ou de mamona como eles quiserem - eles podem misturar e até não misturar. Aqui estão falando em 2%. Senhores, não é esse o rumo.

Uma outra informação importantíssima: se queremos fazer o biodiesel substituir o diesel, vamos fazer o biodiesel de óleo de soja, que está sobrando no Paraná. Além do enorme volume da produção brasileira, se esmagarmos a soja no Brasil, teremos o farelo, que paga o grão, dá lucro, e ainda sobram 20%, que podem ser transformados em biodiesel. V. Exªs sabem a diferença entre o biodiesel de soja e o de mamona? Não é preciso misturá-lo com o óleo mineral, bastando produzi-lo e colocá-lo no motor.

Estou dizendo isso porque há uma usina na Universidade do Ceará - estamos aguardando que o Presidente a inaugure dentro de algum tempo -, onde já testamos um motor de 100kVA. Funcionou muito bem por horas e horas com biodiesel de mamona, sem misturar com o óleo mineral.

Quanto à parte rural, notei que os que estão trabalhando com isso estão cometendo um equívoco ao destacar o lado social do biodiesel. Querem plantar mamona para transformá-la em biodiesel e garantir renda familiar. Fala-se em agricultura familiar. Temos uma experiência vivida de cinco anos usando a mamona para aumentar a renda do lavrador. Sabem quais são os números, senhores? Tomem nota. Não precisamos mais do que três hectares: plantam-se feijão e mamona no primeiro, mamona e feijão no segundo e algodão no terceiro, para variar, obtendo-se uma renda extraordinária, superior a 250 arrobas por hectare. No cerrado, chega-se a 280 arrobas por hectare.

Vamos raciocinar: se quero que o lavrador tenha renda, ele não poderá plantar mamona para vender para as fábricas de biodiesel, que, segundo tenho ouvido falar, não podem pagar mais que R$0,35 por quilo de mamona, pois são necessários 2,2 quilos de mamona para produzir um litro de óleo de mamona. Nesse caso, se pagarem apenas R$0,35 por quilo da mamona, o lavrador, que só obtém uma tonelada por hectare, receberá R$350,00 por tonelada, o que não considero renda.

Nossa proposta é outra. Queremos juntar os lavradores e vamos fazer isso no Estado do Piauí. Anotem bem: seriam três hectares para cada lavrador, reunidos cinco mil lavradores em 20 Municípios, em associação por cotas.

O Pronaf entrega o dinheiro ao lavrador, sejam R$500,00 ou R$1 mil. Como o lavrador não tem instrução suficiente, ao chegar a casa pergunta à mulher o que está faltando. Ela responde que está faltando tudo, que os meninos estão sem sapato, sem roupa. E o lavrador gasta parte do dinheiro recebido e, depois, não consegue pagá-lo. Perguntei ao superintendente do Banco do Nordeste o que ocorre quando o lavrador não consegue pagar, e ele me respondeu que, no ano seguinte, o lavrador não recebe mais, sendo o recurso dado para outro. Essa seguramente não é a solução.

Nossa proposta é que se organizem esses lavradores em associações por cotas, e o próprio Pronaf depositaria os recursos em uma conta bancária. Vamos raciocinar com base nos números? De R$500,00 do Pronaf, o Governo dá R$200,00 para cinco mil lavradores; isto é, o lavrador só tem de pagar R$300,00. Somando e multiplicando esses valores, o capital será de R$1 milhão para uma sociedade de cinco mil lavradores. Com R$1 milhão, construo uma usina, colocando lá dentro uma esmagadora de mamona ou de qualquer outra oleaginosa, menos soja, que exige solvente. Vejamos qual é a renda desse lavrador. Ele tem uma máquina que custa R$250 mil, o galpão custa R$200 mil, somando R$450 mil, quase R$500 mil, mas ele tem R$1 milhão.

No entanto, há uma novidade de que já falei aqui e que vou repetir. A grande vantagem de plantar mamona para a renda do lavrador é esta: com sua pequena usina, ele tira 1,5 tonelada por hectare de mamona; em dois hectares, ele tira três toneladas, transformando-se 50% em óleo. Com sua usina, ele esmaga a mamona e obtém 1,5 mil litros de óleo. Sabem quanto custa o óleo de mamona no mercado, senhores? De R$2,00 a R$2,50. Sendo assim, com 1,5 mil litros, o lavrador tira R$3 mil nos dois hectares de mamona. E o algodão dá mais uns R$3 mil. Mas a grande vantagem de plantar mamona - e aí vai a novidade - está em que, em um hectare, a árvore da mamona, depois de produzir a soja, dá sete toneladas de madeira, de celulose. Já testamos isso no terreno da Embrapa, onde fizemos uma espécie de laboratório.

Ora, senhores, sete toneladas por hectare são 14 toneladas nos dois hectares que ele tem. Sabem o que fazemos desse pó? Acrescentamos uma bactéria - existe tecnologia para isso - e, a R$50,00 por hectare, teremos adubo orgânico, o que o Brasil não tem. O Brasil aplica 100% de fertilizante NPK, que torna a terra, em algum tempo, quase improdutiva, em razão da lixiviação da terra. Mas, tendo adubo à disposição, será diferente. E quanto custa o adubo orgânico? O lavrador só precisa de R$50,00 por hectare. Ele gastará R$100,00 e terá 14 toneladas de adubo orgânico nos dois hectares. A tonelada do adubo custa R$300,00; com 14 toneladas, ele terá mais R$4,2 mil. Somando-se aqueles R$3 mil e os R$2 mil anteriores, ele terá R$10 mil. São quase R$12 mil em três hectares! E não é necessário desapropriar ou comprar terra; basta arrendar. No Piauí, quem tem menos tem 10 mil hectares. Eles estão loucos para arrendar terra. Podem arrendar por R$100,00 o hectare. Quem vai ganhar R$10 mil por ano, pode tirar R$100,00 por hectare. O lavrador faz isso.

No entanto, não pode fazer isso sozinho e desamparado. É preciso organizá-lo numa associação. Já existe o modelo, e esperamos, ainda neste ano, fazer uma associação como essa na Capital do Piauí, na zona rural da Capital. Muitas pessoas nos arredores de Teresina vieram do campo e estão morrendo de fome. Vamos propor três mil hectares e colocar mil famílias em redor de Teresina ganhando uma média de R$800,00 a R$1 mil por mês. Essa é uma proposta que deixo à consideração dos nossos companheiros do Senado.

Entendo que o Senado pode e deve contribuir, além de aprovar leis. A constituição de uma comissão de agricultura do Senado poderia sensibilizar o Governo, pois aqueles assentamentos que vi não resolvem nada. No meu Estado, é uma balbúrdia: vários órgãos tratam da mesma coisa, e não há resultado. Em um dos assentamentos que visitei, eles estão morrendo de fome, porque não há uma política certa, gastando-se uma fortuna por mês. Vamos organizar os lavradores de todo o País, do semi-árido, por exemplo. Isso deve ser feito não em cooperativas, pois deve haver uma em cada Município, não sendo possível fazer uma filial. A entidade juridicamente correta seria uma associação por cotas, administrada por uma diretoria contratada. Não se pode deixar uma administração de um capital de R$1 milhão, por exemplo, nas mãos dos próprios lavradores. No estatuto dessa associação, deve conter uma cláusula estabelecendo que ela é administrada por uma diretoria contratada; isto é, vamos procurar pessoas, aposentados do Banco Central e do Banco do Brasil, formando uma diretoria séria, honesta, capaz de administrar esse dinheiro e de garantir a construção da usina, o aproveitamento dos insumos, a comercialização, o que é fundamental, transferindo, afinal, para o lavrador uma renda, para que ele se sinta um cidadão visto pelo Poder Público, que age e resolve o seu problema.

Essa era a mensagem que eu queria deixar hoje, esperando poder voltar a esse tema. Mais uma vez, agradeço aos meus dois companheiros que me apartearam e ao Sr. Presidente pela tolerância.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2004 - Página 28051