Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao editorial publicado no jornal O Globo, de 29 de agosto último, da articulista Miriam Leitão, intitulado "É bom lembrar".

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários ao editorial publicado no jornal O Globo, de 29 de agosto último, da articulista Miriam Leitão, intitulado "É bom lembrar".
Publicação
Publicação no DSF de 03/09/2004 - Página 29013
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), EXERCICIO, PODER, GOVERNO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, ANTERIORIDADE, IDEOLOGIA, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBSTACULO, INVESTIGAÇÃO, ATUALIDADE.
  • CONTRADIÇÃO, MANUTENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MODELO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, EDITORIAL, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CONTRADIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna neste momento para tratar novamente da incongruência entre o PT da oposição e o do governo. Refiro-me, nesta oportunidade, ao "denuncismo” e à política econômica.

            Neste contexto, seria saudável, até para contribuir com o processo de amadurecimento, que os atuais ocupantes do governo reexaminassem os discursos proferidos em passado recente. Assim, perceberiam que o “denuncismo”, por exemplo, é de autoria notória do então sindicalista Lula, que, em 1998/1999, afirmava que o dinheiro da privatização da Telebrás seria usado para fazer caixa dois para a campanha da reeleição de Fernando Henrique. Dizia que havia uma "quadrilha" no governo. Em relação a estas denúncias deve-se registrar que nenhuma delas se comprovou. Mas, agora, quando a imprensa mostra casos de suposto tráfico de influência, como no caso Waldomiro e outras ocorrências no seu âmbito interno, o governo afirma que há uma onda de denuncismo. Em verdade, o denuncismo, que deve ser visto como imputações infundadas, ocorria quando o sindicalista Lula acusava o governo. Atualmente, as denúncias, ao contrário, estão sendo comprovadas.

Sobre a política econômica a incompatibilidade entre o discurso de ontem e o de hoje é ainda mais evidente. O PT afirmava que a proposta econômica de Fernando Henrique era inexeqüível. Intimaram o presidente Fernando Henrique a deixar o cargo, a não ser que adimplisse às seguintes condições: “romper com o FMI, decretar moratória da dívida interna, confiscar R$7 bilhões dos bancos, mudar a política cambial e suspender o envio de dólares ao exterior.” Bem, no poder, o PT manteve o modelo econômico e agora colhe frutos que não são seus.

Para que conste dos Anais do Senado da República, requeiro, por fim, Sr. Presidente, que a matéria em anexo, passe a integrar este pronunciamento, por ter embasado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO AZEREDO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

O Globo, 29/08/04, pág. 38

Panorama Econômico

Miriam Leitão

É bom lembrar

O líder máximo da oposição discursa diante de manifestantes reunidos em frente ao Congresso: "O presidente não tem grandeza, é arrogante e prepotente." Mais adiante, ele se refere ao governo como "o presidente e sua corja". Para ser mais preciso, denuncia: há uma "quadrilha" no governo. Ele e todos os integrantes da oposição gritam a palavra de ordem intimando o presidente a deixar o cargo.

Era agosto de 99 e o presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, comandava as manifestações pelo "Fora FHC". Denúncias - até hoje não comprovadas - vinham sendo repetidas desde o ano anterior contra o então presidente. Numa delas, em 98, Lula disse que o dinheiro da privatização da Telebrás seria usado para fazer caixa dois para a campanha da reeleição. Fernando Henrique decidiu, então, processar Lula e ele reagiu dizendo que o presidente era "arrogante" por querer processá-lo.

Numa palestra na Universidade de Oxford, Lula se colocava como opção política para 2000, certo de que haveria interrupção do mandato dado ao então presidente:

- O presidente Fernando Henrique hoje não tem autoridade moral para fazer nada pelo país. Ele é mero chefe de serviço da crise e refém do capital especulativo - disse Lula.

O atual presidente e seus assessores fariam bem ao país se lessem o que disseram, como se comportaram e o que propuseram nos anos anteriores a chegar ao poder. Aprenderiam sobre quem iniciou o "denuncismo" ou as declarações que fustigavam a auto-estima do povo brasileiro.

- O Brasil virou um país de trambiqueiros - disse Marco Aurélio Garcia nesse mesmo evento na Universidade de Oxford.

Em maio de 99, quando surgiram as fitas do BNDES, o agora presidente Lula dizia o seguinte: "Todo dia tem uma pessoa ligada ao presidente envolvida em uma falcatrua."

- O presidente perdeu efetivamente o sentido de responsabilidade. Parece-me que ele não tem nenhum controle. Não sei se emocionalmente está apto a continuar no cargo - afirmou Lula.

O então presidente executivo do PT, José Dirceu, pedia a abertura de um processo de impeachment de Fernando Henrique:

- Ele não tem condições éticas, não tem credibilidade, nem legitimidade.

O "Fora FHC" nasceu do cálculo equivocado do PT de que a queda da popularidade de Fernando Henrique, após a desvalorização cambial, levaria o país a derrubá-lo. Naquele momento, eles elevaram o tom das críticas, fizeram todo o tipo de denúncias, usaram fiéis aliados dentro do Ministério Público, divulgaram investigações inconclusas. Hoje, no poder, diante de críticas bem mais amenas, o governo quer controlar os jornalistas, censurar a televisão, constranger funcionários públicos e tentou até cercear o acesso dos parlamentares às informações fiscais.

Ao falar na televisão no programa partidário em 99, Lula disse que estava entrando com um pedido de apuração contra FH por crime de responsabilidade. Mais adiante elevou o tom:

- Faltam ao presidente autoridade, comando, coordenação política e coragem. Está ficando visível para a sociedade a falta de iniciativa de Fernando Henrique. Ele não tem coragem de brigar com ninguém - fustigou Lula.

O exercício de olhar para trás pode ser muito saudável ao PT para completar o processo de amadurecimento que o partido já iniciou ao chegar ao poder. Lembrando o que disseram, verificariam que a proposta econômica que faziam naquela época era inexequível:

- Fernando Henrique deve compreender que seu modelo econômico faliu. É preciso centralizar o câmbio e reduzir a taxa de juros - sugeriu Lula.

João Pedro Stédile, no mesmo palanque, condicionou a permanência do presidente no poder a cinco medidas: romper com o FMI, decretar moratória da dívida interna, confiscar R$ 7 bilhões dos bancos, mudar a política cambial e suspender o envio de dólares ao exterior.

Assim que começou o segundo mandato - e diante da crise que se seguiu à desvalorização -, o então presidente Fernando Henrique procurou o PT, pediu um encontro com Lula no Palácio e ligou algumas vezes para ele. José Dirceu, no entanto, explicou como via aquelas tentativas de entendimento:

- O presidente está fazendo mise-en-scène e isso é um desrespeito. Nossa posição agora é tolerância zero com o governo.

Marcelo Deda, integrante da ala moderada do PT, concordou a certa altura que não era possível entendimento com o governo, já que ele estava fazendo algo inaceitável: mantendo o acordo com o FMI.

Lula foi bem mais direto ao protestar em Brasília:

- Ou Fernando Henrique cria vergonha e muda a política econômica ou vamos tomar conta da cidade.

O ministro da Fazenda Pedro Malan criticou a campanha "Fora FHC" e chamou a oposição de "os sem-rumo". Deda respondeu:

- Se somos os sem-rumo, Malan é o sem-pátria. Basta ver sua política econômica de subserviência à banca internacional.

Quando o presidente reclamou da campanha, José Dirceu disse o seguinte:

- Avise ao presidente que não adianta dar chilique. Tudo o que a gente está fazendo está previsto na Constituição. Ele tem que ler a Constituição e as pesquisas. O grito no Brasil é de que ou Fernando Henrique muda de modelo econômico ou o Brasil vai mudar o governo - disse o hoje chefe da Casa Civil.

O PT chegou ao poder, manteve a política econômica e demonstra ter esquecido o que dizia e como se comportava na oposição. Seria bom se lembrasse. E aprendesse. Bons modos políticos são importantes numa democracia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/09/2004 - Página 29013