Discurso durante a 134ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da reforma política. Crítica à participação do Presidente da República nas campanhas eleitorais do Partido dos Trabalhadores, demonstrando suas expectativas de que o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva não vá participar da campanha do candidato petista em Curitiba. Distorções de dados eleitorais anunciados por institutos de pesquisa.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. ELEIÇÕES.:
  • Defesa da reforma política. Crítica à participação do Presidente da República nas campanhas eleitorais do Partido dos Trabalhadores, demonstrando suas expectativas de que o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva não vá participar da campanha do candidato petista em Curitiba. Distorções de dados eleitorais anunciados por institutos de pesquisa.
Publicação
Publicação no DSF de 05/10/2004 - Página 31180
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. ELEIÇÕES.
Indexação
  • DEFESA, URGENCIA, REFORMA POLITICA, GARANTIA, ETICA, PROCESSO ELEITORAL.
  • CRITICA, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CAMPANHA ELEITORAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO, PAIS.
  • EXPECTATIVA, AUSENCIA, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELEIÇÕES, ESTADO DO PARANA (PR).
  • DENUNCIA, IRREGULARIDADE, ATIVIDADE, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, CAMPANHA ELEITORAL, TENTATIVA, INDUÇÃO, ELEITOR, MANIPULAÇÃO, RESULTADO, PROCESSO ELEITORAL.
  • REGISTRO, CONSOLIDAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ELEIÇÃO MUNICIPAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é claro que todos nós que temos a responsabilidade de legislar devemos aprender com cada processo eleitoral. Esse que está em curso, já que teremos ainda a realização de eleições em segundo turno, deixa um ensinamento indiscutível: a reforma política é inadiável. Mas essa afirmação já se repetiu aqui inúmeras vezes. A reforma política tem sido cantada em prosa e verso há muito tempo, e não se faz no País. Temos um modelo político deploravelmente superado, retrógrado, condenado inúmeras vezes nos pleitos eleitorais pela repulsa do eleitor em participar em muitas oportunidades, pela frieza com que participa dele em outras e até pela ausência que se dá de forma absoluta por parte de um percentual significativo de eleitores que, mesmo com a obrigatoriedade do voto, recusam-se a participar.

Portanto, não há dúvida de que não temos um modelo político compatível com a realidade do nosso País e que, obviamente, depois dos escândalos de corrupção, é a razão principal da descrença que se generaliza em relação às instituições públicas, partidos políticos e políticos de forma geral. Será que aprendemos desta vez que é preciso promover a reforma política urgentemente? Ou vamos aguardar novas eleições? Afinal, as distorções sobrevivem, os vícios permanecem. Poderíamos, é claro, começar por destacar que não basta uma reforma política, um novo modelo se não mudarmos o conceito de democracia, se não mudarmos a cultura política do nosso País, se não agilizarmos, por exemplo, a Justiça Eleitoral no atendimento das demandas que ocorrem durante o processo eleitoral. Não há dúvida de que há necessidade de se conferir ao País um novo modelo político como um caminho necessário para que se busque recuperar a credibilidade, importante para a consolidação do processo democrático.

Nessas eleições, voltamos a assistir à utilização da máquina pública em determinadas Unidades da Federação, em umas de forma mais acentuadas que em outras, o abuso do poder econômico prevalecendo. No que diz respeito à participação do Partido dos Trabalhadores na campanha, a riqueza foi algo que se pôde verificar nas grandes cidades e, sobretudo, nas capitais: shows milionários, marketing caríssimo, especialmente com a presença de Duda Mendonça nas principais capitais brasileiras, ele que possui uma relação estreita com o poder público, porque é o principal beneficiário das verbas públicas de publicidade. E não há como não interpretar como uma relação de certa promiscuidade, uma vez que, representando o partido na campanha eleitoral, representa também o Governo na divulgação oficial das ações governamentais. Não há como não se estabelecer essa relação entre o que é público e o que é privado; não há como não se condenar essa promiscuidade de relação entre o que é público e o que é privado.

O que se verificou também nas ruas das principais cidades do País foi uma mudança da face do Partido dos Trabalhadores, que se apresentou sem retoques. A militância ideológica de antes foi substituída pela legião de cabos eleitorais remunerados, sem nenhum entusiasmo, representantes daquilo que chamamos de “partido caixa”, que se enriqueceu a partir do momento em que o Presidente Lula assumiu o poder no País.

A alegria e a utopia de ontem foram substituídas, portanto, pelo marketing do Duda Mendonça e pelo pragmatismo do Delúbio Soares*, que é o principal arrecadador do Partido dos Trabalhadores. O que se estabeleceu nesta campanha eleitoral foi a assertiva de que os fins justificam os meios.

Com esse desejo de se consolidar um projeto de poder no País, esquecendo-se do projeto de Nação, o Partido dos Trabalhadores esqueceu o escrúpulo em favor de se alcançar o objetivo maior.

O jornalista Clóvis Rossi disse muito bem: “As vitórias trouxeram para o PT poder e dinheiro, mas perderam junto os sonhos”.

Sr. Presidente e Srs. Senadores, entre as distorções ocorridas durante esta campanha eleitoral, poderíamos destacar a presença da máquina pública. Isso se verificou em várias Capitais, em várias cidades importantes do País. Mas lastimável é a presença do próprio Presidente da República na campanha eleitoral. Certamente os Srs.Senadores e os telespectadores da TV Senado se lembram de que 48 horas antes do início do horário eleitoral na tevê, em 17 de agosto, o Presidente Lula ocupou rádio e televisão em cadeia nacional para exaltar o bom momento do País e ajudar o PT. Foi como se o Presidente quisesse pautar os programas gratuitos dos candidatos na televisão e no rádio, programas que começariam 48 horas após a fala presidencial. Na comemoração do Dia da Pátria, o Presidente utilizou o expediente para associar ufanismo à sigla petista de forma subliminar.

Depois disso, o Presidente Lula participou da campanha em São Paulo, na inauguração de uma obra pública, pedindo votos para a Prefeita Marta Suplicy, numa afronta inusitada à legislação vigente no País, inusitada porque partiu do Presidente da República - não é inusitada no sentido genérico, mas é inusitada a origem da afronta. Não tenho notícia de que outro Presidente da República tenha cometido esse deslize em qualquer momento da nossa História política. Lula disse taxativamente: Se as pessoas querem continuar tendo progresso nas políticas sociais não há outro jeito senão, no dia 03 de outubro, votar em Marta Suplicy para continuar administrando São Paulo.

Foi essa a recomendação de Lula. Depois pediu desculpas. Evidentemente, não basta pedir desculpas.

Faço referência a São Paulo, porque se anuncia no Paraná que Presidente Lula participará da campanha do candidato petista em Curitiba. O candidato Beto Richa, do PSDB, foi vitorioso no primeiro turno com quatro pontos percentuais à frente do candidato do PT. Já se anuncia a presença do Presidente Lula. Senador Papaléo Paes, eu não acredito que o Presidente Lula vá participar da campanha eleitoral. Afinal, o Presidente não foi eleito para participar de disputas municipais. Deve colocar-se acima disso. Em relação ao Paraná, mais do que a presença física de Sua Excelência, nós esperamos a presença de seu Governo. Não sentimos a presença do Governo do Presidente Lula. Não sei se sua presença física será comemorada sem que a presença das ações governamentais que produzam efeitos benéficos em favor do Estado. Cito um exemplo: apenas 5% dos recursos consignados no orçamento da União foram repassados ao Paraná. Mas 5% de recursos não são suficientes! Imagine se o povo do Paraná oferecesse ao candidato do Presidente Lula apenas 5% dos seus votos, na contrapartida daquilo que o Governo ofereceu ao Estado na forma de benefícios financeiros.

O nosso Estado, que é importante no cenário nacional, não pode se submeter à humilhação de ser considerado pelo Presidente da República como uma unidade federativa de segunda classe. Embora o Presidente tivesse aumentado excessivamente o número de Ministérios, o Paraná não é contemplado sequer com um cargo de primeiro escalão no Governo da República. Nunca na nossa História nosso Estado deixou de estar presente no Ministério do Governo Federal. Esta é a primeira vez. E quero repetir, porque considero um abandono. Considero que se tenha voltado as costas para o nosso Estado. E concluo dizendo que acho que seja um desrespeito do Presidente da República para com o Paraná.

No Paraná não há ninguém em condições de ocupar uma função de primeiro escalão no Governo da República? Entre os aliados do Presidente da República no meu Estado não existe um sequer que tenha competência, que tenha qualificação, para ocupar um cargo representativo no Poder Executivo Federal?

Eu não acredito que o Presidente Lula vá participar das eleições no Paraná. Preferimos evitar esse constrangimento para o Presidente. Gostaria que Sua Excelência fosse ao Paraná depois das eleições, para anunciar que vai retribuir um pouco daquilo que o Estado oferece à Nação como participação no desenvolvimento econômico do País. Eu gostaria que o Presidente da República visitasse uma entidade de assistência social. Vou sugerir que visite o Pequeno Cotolengo, onde certamente vai sensibilizar-se e vai sofrer com o drama que vivem aquelas pequenas criaturas humanas desvalidas, que sobrevivem de forma vegetativa. Muitas delas estampam na face pequenina angústia e desespero. Olham como se estivessem apelando por socorro e salvação.

Sugiro que o Presidente visite o Pequeno Cotolengo, porque consignei no Orçamento da União, Senador José Jorge, várias emendas, desde que conheci aquela instituição, porque me compadeci da situação em que se encontram aquelas pessoas. Confesso que fui às lágrimas de emoção por sentir o drama que vivem aqueles pequeninos seres humanos. Na minha primeira emenda parlamentar depois que visitei a referida instituição, consignei no Orçamento R$ 400 mil. Entretanto, o Governo do Presidente Lula não liberou até hoje nem um centavo. Todos os anos nesses dois anos, eu consignei no Orçamento emenda parlamentar para a instituição.

É apenas um exemplo. Não é o único. Eu poderia citar muitos outros, mas espero que o Presidente da República faça essa visita após o segundo turno destas eleições.

Não imagino o Presidente da República visitando um Estado esquecido por ele como o Paraná, abandonado por ele como o Paraná, desrespeitado por ele como o Paraná. Respeitar o Paraná não é transformar Itaipu num comitê eleitoral, usando a binacional, uma empresa eminentemente técnica, para atender aos quadros partidários que lhe dão sustentação política. Isso não basta para o Paraná. O Paraná exige e merece mais do que isso do Presidente da República. Imagino que esse anúncio não tenha sido autorizado pelo Presidente da República, espero que ele não pretenda participar do pleito municipal em Curitiba. Certamente, ele haverá, ainda em tempo, de corresponder às expectativas que gerou no nosso Estado, com a votação esmagadora que obteve no primeiro e no segundo turno das eleições presidenciais.

Espero que no segundo turno não se dê o mesmo derrame de dinheiro. Não há como imaginar que seja dinheiro privado! Transformaram Curitiba num palco para apresentação de celebridades artísticas nacionais: Zezé de Camargo e Luciano, Vanessa Camargo e outros mais.

Esperamos que esse tipo de espetáculo não aconteça agora no segundo turno porque isso afronta a inteligência das pessoas.

Não há como se apresentar ao Tribunal Regional Eleitoral um valor correspondente aos gastos que se pretende utilizar na campanha eleitoral e depois transformá-la num festival artístico incomum, como se faz atualmente. A utilização da máquina estadual já ocorre de forma aberta, com os ocupantes dos cargos de confiança nas ruas a ostentar as bandeiras do candidato situacionista. Isso tudo é o que se verifica.

Portanto, estamos aqui para aprender com esse processo eleitoral em curso e voltamos a defender a reforma política. Entretanto, é preciso reformar mentalidades, reciclar conceitos e mudar posturas, a fim de que uma postura responsável no processo eleitoral signifique esperança de mudança de comportamento também na gestão pública deste País, recuperando credibilidade junto à sociedade brasileira.

Não terei tempo suficiente para abordar uma outra questão, que foi um espetáculo deprimente nesta campanha eleitoral: tivemos 121 institutos de pesquisa em atividade na campanha eleitoral, institutos fantasmas, desmoralizados e suspeitos, tentando induzir o eleitor, tentando modificar resultados, enfim, tentando distorcer o processo eleitoral. E não faremos nada?

Vou citar apenas um exemplo no Paraná. O candidato Beto Richa*, do nosso Partido, denunciou um instituto - como isso corre em segredo de justiça, vou evitar citar o nome do instituto - que o procurou para vender pesquisa. As provas são fartas e documentais, como fitas de vídeo, fotografias, fitas cassete, mostrando que um representante desse instituto ofereceu aos coordenadores da campanha um produto engenhoso: a realização de pesquisas com excelentes resultados para o candidato, incluindo a publicação em revista de circulação nacional. Senador Papaléo, o candidato poderia escolher as alternativas do pacote, que incluía o “kit ouro”, ao custo de R$1 milhão, e previa a realização e a publicação de quatro pesquisas; o “kit prata”, três pesquisas, ao preço de R$500 mil, e o “kit bronze”, que incluía duas pesquisas, ao custo de R$300 mil. Onde chegamos, Srs. Senadores?!

É claro que precisamos tomar alguma providência. Aliás, diz bem Francisco Toledo, que é dono da Toledo & Associados*, um instituto de quase 30 anos de atividade, o seguinte: “Em 26 de atividade, nunca vi tamanha desfaçatez com pesquisas numa eleição. Além das fraudes, há o surgimento de institutos fantasmas e outras enganações.”

Portanto, cabe ao Congresso Nacional debater esse tema. O que podemos fazer? Legislar estabelecendo um prazo limite para a publicação das pesquisas ou permitir que se publiquem pesquisas até na véspera da eleição, como se faz hoje, instituindo penalidades para os abusos cometidos, como, por exemplo, indenização por perdas e danos se eventualmente determinado candidato se julgar prejudicado pela divulgação de números facciosos na véspera da eleição, números que induzem inevitavelmente o eleitor a mudar de posição.

Talvez convocar os institutos de pesquisa à responsabilidade, acabando com essa impunidade que lamentavelmente estimula a corrupção, com a utilização dos mencionados institutos para se ganhar muito dinheiro e fraudar o processo eleitoral de maneira perversa.

Para concluir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de dizer que dessa eleição emergem, consolidam-se como os dois partidos nacionais o PSDB e o PT. Das 72 cidades com mais de 200mil eleitores o PT ganhou a eleição em 7, e o PSDB, em 6. Portanto, uma bipolarização nos grandes centros dos dois partidos. Se o PT se consolida como o Partido situacionista - é evidente que somente poderia ser dessa forma -, como a alternativa de continuidade em 2006, o PSDB se valoriza como a alternativa mais importante de mudança para o País nas eleições de 2006.

Esperamos que as eleições de 2006 possam ser deflagradas num outro cenário, com maior respeito à legislação e com um modelo político compatível com a realidade do nosso País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/10/2004 - Página 31180