Discurso durante a 135ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância do socorro aos estados menos desenvolvidos no tocante à questão de isenções fiscais e subsídios governamentais. Necessidade da retomada de políticas de desenvolvimento regionais que, a longo prazo, provoquem a extinção de políticas de isenções e subsídios.

Autor
Rodolpho Tourinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Rodolpho Tourinho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Importância do socorro aos estados menos desenvolvidos no tocante à questão de isenções fiscais e subsídios governamentais. Necessidade da retomada de políticas de desenvolvimento regionais que, a longo prazo, provoquem a extinção de políticas de isenções e subsídios.
Aparteantes
Eduardo Azeredo, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2004 - Página 31250
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • APOIO, APROVAÇÃO, SENADO, REFORMA TRIBUTARIA, UNIFICAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), BENEFICIO, EMPREGO, RENDA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, INCENTIVO, PRODUÇÃO.
  • COMENTARIO, CRIAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL, BENEFICIO, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, COMUNIDADE, BAIXA RENDA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, APROVAÇÃO, UNIFICAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), CAMARA DOS DEPUTADOS, OBJETIVO, ERRADICAÇÃO, DISPUTA, NATUREZA FISCAL, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no final de 2003, o Senado deu uma grande demonstração de maturidade, de espírito democrático, quando aprovou, praticamente por consenso, a reforma tributária, após um longo processo de negociação que envolveu todas as forças partidárias desta Casa.

Contando com a participação efetiva do Poder Executivo Federal e Estadual, o texto aprovado no Senado representava e representa um grande avanço para o Sistema Tributário Nacional.

Entre outros pontos fundamentais que resultaram na aprovação do texto estava a unificação da legislação do ICMS e a redução da quantidade de suas alíquotas para no máximo cinco, cujos avanços deveriam entrar em vigor já no ano de 2005. Afinal, a proposta que retornou à Câmara determinava que até 31 de dezembro de 2004 seria aprovada a Lei Complementar do “novo” ICMS, editado o seu Regulamento Único e a Resolução do Senado que fixaria as suas alíquotas.

Com a unificação da legislação, além dos ganhos de racionalidade, simplificação e redução da sonegação, marcava-se uma data para acabar com a guerra fiscal.

Como parte desse grande acordo, foram assegurados os benefícios fiscais já concedidos por todos os Estados da Federação por um período determinado de tempo, definido em Lei Complementar, respeitado o limite máximo de onze anos. E não poderia ser de outra forma, até porque, ao longo dos últimos anos esse foi o único mecanismo de desenvolvimento encontrado pelos governantes das regiões mais pobres do País para incentivar a geração de emprego e renda em suas regiões. Ou para sobreviver mesmo como ente federativo.

Há muito tempo, os Estados, principalmente os menos desenvolvidos, vêm clamando por uma política nacional de desenvolvimento regional, baseada na garantia de crescentes recursos orçamentários para investimento em infra-estrutura; na reorganização do Orçamento-Geral da União de investimentos e na concessão de financiamentos com juros e prazos diferenciados e favorecidos, com a finalidade de incentivar a produção. Antagonicamente, presenciamos movimento inverso, ou seja, concentração dos tímidos investimentos federais nas regiões economicamente mais desenvolvidas. A verdade é que a atuação do Poder Executivo Federal, para redução das desigualdades entre as regiões do País, através de políticas de desenvolvimento regional, não mais existia e não mais existe. Não restando alternativa, vários Estados iniciaram um processo de concessão de incentivos fiscais como única forma de atrair investimentos para suas regiões em detrimento de outras que já gozam de infra-estrutura, mão-de-obra qualificada, mercados fornecedor e consumidor significativos.

A unificação do ICMS era e é o melhor caminho para acabar com a guerra fiscal que, se por algum tempo resultou em benefício para os Estados menos desenvolvidos, no médio e longo prazo prejudica a economia do País na medida em que pode significar, no futuro, uma total isenção dada a grandes corporações.

Entretanto, é fundamental ressaltar a necessidade de retomada de políticas regionais voltadas para o desenvolvimento das regiões menos favorecidas do Brasil. Em função disso, criou-se o Fundo de Desenvolvimento Regional, que, apesar de possuir recursos limitados, possibilitará a realização de investimentos necessários em infra-estrutura nas localidades mais carentes, com vistas a substituir as atuais políticas de incentivo fiscal.

Outra medida em defesa da Federação brasileira aprovada nesta Casa tratava da blindagem dos fundos constitucionais, pelo menos em relação ao IPI. Ficava o Poder Executivo Federal proibido de conceder incentivos fiscais relativos a tributos não compartilhados que impactassem a base dos compartilhados e reduzissem, dessa forma, a transferência de recursos para Estados e Municípios.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as medidas citadas tinham como objetivo principal aprimorar o recolhimento de impostos no País, sem desestabilizar as contas dos demais entes da Federação. Afinal, a unificação do ICMS resultará em simplificação do sistema tributário e com isso diminuição da sonegação e incentivo à produção.

Acontece que a Câmara dos Deputados, equivocadamente, retirou da reforma tributária a necessidade de aprovação do novo ICMS até o final deste ano, postergando sua implementação sine die. Além do mais, o Governo Federal continua sucessivamente concedendo incentivos fiscais com receitas compartilhadas, que também pertencem aos Estados, como é o caso do IPI e do Imposto de Renda, contrariando o acertado nesta Casa, contrariando a blindagem dos fundos constitucionais e, portanto, enfraquecendo mais ainda a Federação. E dois dos principais avanços da reforma, tão importantes para o fortalecimento do combalido pacto federativo, se perderam.

A sinalização da Câmara é muito ruim, pois torna indefinido o futuro do ICMS, e mais ainda a implantação do IVA, que, no texto aprovado no Senado, tinha data para ocorrer: a partir de 2007, conforme sugestão apresentada àquela época pelo Senador Tasso Jereissati, de forma muito acertada.

Conseqüência de tudo isso pode ser vista em todos os jornais e noticiários do País: a guerra fiscal está de volta, e já comprometendo significativamente a economia de alguns Estados.

O ato normativo (Comunicado CAT 36) da Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo, vedando a compensação dos créditos de ICMS de produtos incentivados oriundos de determinados Estados brasileiros, conjuntamente com a reação dessas unidades da Federação em dificultar o acesso de mercadorias paulistas em seus mercados, tem gerado danos a todos os brasileiros.

Sem entrar no mérito da constitucionalidade dessa medida, é bastante compreensível que cada Secretaria de Fazenda defenda o interesse do seu Estado. Todavia, o episódio a que estamos assistindo é muito preocupante para a economia do País. O fechamento de barreiras ou a implantação de barreiras significa o acirramento de uma situação já tensionada.

Como representante de um Estado que se viu obrigado a conceder incentivos fiscais como única forma de atrair investimentos para sua economia, poderia estar aqui criticando pura e simplesmente a postura adotada pelo Estado mais rico da Federação em relação a seus irmãos mais pobres. Mas não é esse o meu objetivo.

Afinal, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Estado de São Paulo tem deixado claro o porquê dos seus atos. Em entrevistas em vários jornais, seu Secretário da Fazenda tem dito que ao conceder o crédito de 12% às mercadorias que não pagaram esse valor na origem, pois gozam de incentivos fiscais, estaria o Estado paulista arcando com incentivo concedido por outrem. De certa forma, a afirmação é verdadeira, mas não podemos esquecer que o Estado de origem concedeu o incentivo fiscal utilizando-se da parcela do imposto que lhe cabe e para que pudesse, como foi dito, na ausência de uma política de desenvolvimento regional nacional, gerar emprego e renda.

E mais: o próprio acordo feito no Senado, refletido na aprovação da reforma tributária, reconhecia os incentivos concedidos fora da regra do Confaz ao fixar um prazo de validade e estabelecer data para o fim da guerra fiscal. Primeiro com a unificação e depois com o IVA, Imposto de Valor Agregado, a ser cobrado no destino.

É preciso reconhecer que o Estado de São Paulo não está agindo dentro do espírito do acordo da reforma tributária ao não conceder crédito às mercadorias incentivadas em outros Estados. Essa posição poderá inviabilizar todos os avanços conseguidos no Estado.

Por outro lado, é preciso também reconhecer que São Paulo tem razão em não conceder crédito a incentivos que não podem ser aceitos nem pelo bom senso nem pela racionalidade e nem pela responsabilidade que os governantes estaduais têm em relação à Federação, crédito para incentivos que não geram emprego e representam, simplesmente, um passeio virtual de nota fiscal. Por isso, não pode e não deve ser aceito.

Com a demora da aprovação da reforma, esses incentivos tomam corpo e podem prosperar. Na verdade, por mais dura que seja minha afirmação, o que se está praticando nesse tipo de incentivo é a cobrança de uma comissão pelo Estado que o concede, dividindo os 12% da alíquota interestadual com o contribuinte. Normalmente, 1% para o Estado e 11% para o contribuinte. São Paulo, nesse ponto, tem razão. Precisamos evitar que essa modalidade de ação prospere.

Por outro lado, não é admissível que tal tratamento seja estendido aos incentivos fiscais de natureza estruturante e que já haviam sido aprovados aqui nesta Casa. Chamo de estruturantes aqueles incentivos que promovem a desconcentração espacial do emprego e da renda; que estimulam a geração de empregos; que complementam as cadeias produtivas locais; que observam a vocação regional ou local; que propiciam o desenvolvimento dos processos produtivos, gerenciais e de tecnologia; aqueles que minimizam impactos ambientais e contemplam princípios de responsabilidade social. Esses precisam e devem ser respeitados.

A última reunião do Confaz - o Conselho Nacional de Política Fazendária, composto por todos os Secretários Estaduais de Fazenda do País -, ocorrida em Aracajú, deu mostra de como os interesses de cada Estado estão impossibilitando qualquer acordo em torno do ICMS.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluo este pronunciamento, alertando a Casa para o retrocesso que estamos presenciando em virtude da paralisação total da reforma tributária na Câmara dos Deputados.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA) - Ouço V. Exª, Senador Eduardo Azeredo.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Nobre Senador Rodolpho Tourinho, acompanhei o esforço de V. Exª, no fim do ano passado, em relação à reforma tributária e quero compartilhar da sua preocupação. Há 15 dias, estive com o Ministro Antônio Palocci e pude conversar sobre as dificuldades que os Estados brasileiros têm enfrentado. O Ministro dizia da sua crença de que, com a conclusão da reforma tributária, os Estados terão uma melhoria na sua arrecadação. Entretanto, a questão está paralisada na Câmara, e a reforma tributária não chega a seu fim. Portanto, é importante o pronunciamento de V. Exª no sentido de que o Governo tome as providências necessárias para que essa reforma seja definitivamente aprovada e para que não haja essa disputa entre os Estados, que começa a chegar a pontos perigosos.

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA) - Agradeço muito o aparte, nobre Senador Eduardo Azeredo. Estamos saindo de uma guerra para uma guerrilha fiscal, nas fronteiras perigosas às quais me referi, na medida em que o grande prejudicado é o contribuinte, o consumidor.

O retorno da guerra fiscal - e também dessa guerrilha - é o principal sintoma das dificuldades dos Deputados em retomar a apreciação da emenda constitucional. Como eu disse antes, a defesa dos interesses de seus Estados pelos Secretários de Fazenda é natural e legítima, mas o acirramento que está acontecendo é muito preocupante para o País como um todo e não contribui para o desenvolvimento sustentado da economia.

É fundamental que a Câmara conclua a votação da reforma e faça retornar ao texto uma data-limite para a unificação do ICMS, pois, caso contrário, a situação do Sistema Tributário Nacional tende a piorar para os Estados.

Entendo também que o Governo Federal tem parte da responsabilidade pela não-conclusão dessa reforma, na medida em que não responde à indagação dos Estados sobre o valor do Fundo de Desenvolvimento Regional, sempre considerado fundamental para os Estados, porque vem substituir o não-poder de conceder incentivos fiscais. Inicialmente, esse Fundo de Desenvolvimento Regional, em torno de dois bilhões, estava acertado em cerca de 2% do IPI do Imposto de Renda, mas o Governo propôs a mudança do percentual para 45% do que vinha sendo compensado na base de calculo do IPI, referente a créditos do PIS/Cofins. Na verdade, o Governo não responde qual é o valor. Ainda hoje, farei um requerimento, solicitando da Receita Federal e do Ministério da Fazenda informações sobre qual é esse valor. É absolutamente necessário que haja não só a fórmula de cálculo, mas o valor exato - que a Receita Federal ficou de informar -, para que o sistema tenha prosseguimento.

Repito que o Governo Federal também tem uma enorme responsabilidade neste momento, por não se empenhar em responder à pergunta dos Secretários de Fazenda estaduais sobre o valor desse Fundo de Desenvolvimento Regional.

Por fim, cumpre registrar que não é hora de briga entre as unidades federadas, que se encontram em situação de penúria fiscal. Estamos diante de sucessivos recordes de arrecadação federal, que podem elevar o superávit primário para 5%, tamanha a folga nas receitas da União, e, por outro lado, estamos presenciando um conflito entre Estados no País, o que resultará em perda para todos.

O momento é de concentrarmo-nos em obter uma solução para o impasse e em concluir, o quanto antes, a reforma tributária.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador?

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA) - Pois não, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - O assunto que V. Exª está abordando é sério. Sei que não agrada a ninguém dividir o que tem, mas, lamentavelmente, Estados e Municípios precisam ter oxigenação. Verificamos o problema principalmente em nossa região e em boa parte da Bahia, que tem o maior semi-árido do Nordeste. Sei que a situação dessas Prefeituras do semi-árido não deve ser diferente da situação das nossas da Paraíba. Mesmo as grandes estão com dificuldade; nos Estados, nem se fala. Solidarizo-me com V. Exª. Esse é um assunto desagradável para o Governo Federal, mas é imprescindível que se busque o equilíbrio e se achem soluções que não sejam para matar o Governo Federal. Não é isso que queremos. Mas que não se deixe também soçobrarem Prefeituras e Estados. Estou em total acordo com V. Exª em que essa folga não está havendo nos impostos que a União divide com Estados e Municípios, mas principalmente nas taxas. Devemos encontrar, com prudência, uma situação de equilíbrio. Parabéns!

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA) - Agradeço o aparte, Senador Ney Suassuna, em que V. Exª abordou a questão das Prefeituras do semi-árido, das Prefeituras pobres deste País.

Verificamos que todo esse pacote do Governo Federal, chamado de “pacote de bondades”, está sendo feito com base no descumprimento de um acordo aprovado no Senado, à custa do FPE e do Fundo de Participação dos Municípios, à custa dessas pequenas Prefeituras que vivem numa situação de penúria fiscal.

Realmente, agradeço muito a participação de V. Exª no sentido de trazer a figura dessas Prefeituras espalhadas pelo Brasil inteiro, sobretudo em nosso Nordeste.

Eu dizia que o momento é de buscar uma solução para o impasse e de concluir, o mais rápido possível, a reforma tributária. Afinal, não é o momento de transformar uma guerra simbólica, de tarifas, em uma guerra real ou em uma guerrilha fiscal, de fechamento de divisas ou fronteiras estaduais e de bloqueio de caminhões com mercadorias, prejudicando-se, sobretudo, a população mais carente do País, os consumidores, a sociedade de forma geral.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2004 - Página 31250