Pronunciamento de Mozarildo Cavalcanti em 19/10/2004
Discurso durante a 143ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Repúdio à reportagem publicada no site do Conselho Indigenista Missionário assinada pelo jornalista norte-americano Larry Rohter, intitulada "Esta é a nossa terra, proclamam índios brasileiros", datada do dia 18 último.
- Autor
- Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
- Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA INDIGENISTA.:
- Repúdio à reportagem publicada no site do Conselho Indigenista Missionário assinada pelo jornalista norte-americano Larry Rohter, intitulada "Esta é a nossa terra, proclamam índios brasileiros", datada do dia 18 último.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/10/2004 - Página 32375
- Assunto
- Outros > POLITICA INDIGENISTA.
- Indexação
-
- COMENTARIO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, JORNALISTA, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, PUBLICAÇÃO, INTERNET, INEXATIDÃO, DECLARAÇÃO, SITUAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), INJUSTIÇA, POLITICA INDIGENISTA, GOVERNO BRASILEIRO, PROTESTO, ORADOR, ESCLARECIMENTOS, SUSPEIÇÃO, AMEAÇA, SOBERANIA NACIONAL.
- REITERAÇÃO, REGISTRO, POLEMICA, DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), CONCLAMAÇÃO, ATENÇÃO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recentemente, o jornalista norte-americano Larry Rohter causou um mal-estar muito grande no Brasil e quase que um incidente diplomático, em razão de uma reportagem de, no mínimo, mau gosto. Não estou entrando no mérito da questão da liberdade de se escrever ou de se colocarem idéias de maneira adequada ou não.
Hoje, Sr. Presidente, no site do Conselho Indigenista Missionário, fui surpreendido por uma reportagem assinada por esse mesmo repórter, cujo título é “‘Esta terra é nossa”, proclamam índios brasileiros”, datada do dia 18, portanto ontem, que teria sido feita no Município de Uirumutã, em Roraima.
Sr. Presidente, li e reli, atentamente, a matéria de duas páginas e meia. Não se trata só do mau gosto das palavras mal colocadas, das ironias ou do interesse em prejudicar esse ou aquele, mas, realmente, de um conjunto de mentiras que me admiro de o Cimi - Conselho Missionário Indigenista - ter publicado, dando-lhe seu respaldo.
Quero apenas me apegar a algumas delas, Sr. Presidente, para realmente mostrar que são mentiras que atingem a população do Estado de Roraima, o Presidente da República, índios e não-índios. Isso só me convence, cada vez mais, de que há algo por trás dessa tão decantada questão indígena e, principalmente, da reserva Raposa/Serra do Sol, a 33ª a ser demarcada no Estado de Roraima e que se encontra sub judice no Supremo Tribunal Federal, depois de já ter recebido decisões liminares em todas as instâncias.
Quero ressaltar, para ficarem registradas, algumas dessas mentiras.
Primeiramente, o jornalista diz:
Segundo os mapas oficiais, essa região remota da Amazônia é uma reserva indígena destinada a ser o lar de meia dúzia de tribos. Teoricamente, isso a torna proibida para visitantes não convidados.
No entanto, esse não é o pensamento da maioria dos índios que moram lá, em comunidades. A Comunidade do Contão é uma verdadeira cidade, onde há escola de segundo grau, iluminação elétrica e plantação de arroz irrigado.
Há um grupo de índios, comandado pelo Conselho Indigenista Missionário, que pensa dessa maneira, isolados numa comunidade chamada Maturuca. Pelo visto, esse repórter só esteve lá.
Mas colonos brancos ignoraram os cartazes que afirmam que o grupo de aldeias é terra protegida e construíram uma pista de pouso, uma escola técnica, uma Prefeitura e lojas, tudo protegido por uma nova base militar.
O que ele não diz é que esse Município já tem mais de 12 anos de existência; que essas construções existem há décadas e que a única coisa nova, realmente, é o quartel do Exército brasileiro que, bem tardiamente, foi construído ali, pois as fronteiras com a Guiana e a Venezuela, dois países que têm litígio por terras, são regiões altamente ricas em diamantes. Estes são explorados e contrabandeados para a Guiana, então, há muito tempo deveria haver o quartel do Exército. Além disso, a Polícia Federal deveria estar permanentemente lá. É preciso que a Polícia Federal instale ali, na Raposa Serra do Sol, uma sede, para que ela possa realmente fazer uma guarda da fronteira, porque dali está saindo uma quantidade enorme de diamantes, a toda hora, porque a maior concentração está justamente na linha de fronteira com a Guiana e com a Venezuela.
Mais à frente, ele diz:
O confronto constitui o primeiro grande teste da política indígena do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, observado de perto por defensores dos índios dentro e fora do Brasil. Até agora, segundo esses defensores, Lula preferiu cortejar os adversários dos índios em vez de cumprir antigas promessas feitas aos grupos tribais e aplicar as leis já aprovadas.”
Isso é uma injustiça para com o Presidente Lula que, num espaço de menos de dois anos, proporcionalmente, já demarcou mais reservas indígenas do que os outros Presidentes. No meu Estado, Sua Excelência demarcou mais seis novas reservas indígenas, num total de 36. Então, é uma mentira, um desrespeito para com o Presidente da República.
Criar uma reserva indígena no, Brasil, é um procedimento complexo, que pode facilmente se estender por uma década ou mais.
No caso da Raposa/Serra do Sol, uma demarcação formal do território a ser destinado aos índios foi feita em 98. Quando Lula assumiu o cargo, em 1º de janeiro de 2003, um decreto certificando formalmente o registro da reserva, o último passo ao longo do processo, estava sobre sua mesa faltando apenas a assinatura.
Isso é verdade. O decreto estava sobre a mesa do Presidente Fernando Henrique Cardoso faltando apenas assiná-lo. Todavia, Sua Excelência não o assinou, porque tinha informações precisas - e não informações mentirosas - de que aquela reserva devesse ser demarcada em conformidade com o pretendido pela portaria da Funai. Até porque todo o processo - ficou provado agora na Justiça Federal - que deu origem a essa portaria foi fraudado, inclusive até com falsificação de assinaturas. Por isso, agora, o Procurador da República se apressou em argüir que se trata de um conflito federativo com o intuito de trazer a matéria para o Supremo Tribunal Federal, já que um juiz de Roraima nomeou peritos e constatou, entre outras fraudes, a falsificação de assinaturas e a nomeação de motoristas como peritos, como técnicos agrícolas e como especialistas em terras. Enfim, na verdade, uma série de fraudes ficaram comprovadas ao longo desse processo. Portanto, muito acertadamente o Presidente Lula não o assinou. Mandou o Ministro da Justiça ir a Roraima e ouvir todo mundo e, ao final disso tudo, nomeou um grupo de trabalho para fazer um diagnóstico correto, justo, que atenda a todas as partes.
Srªs e Srs. Senadores, a maioria dos índios não quer essa demarcação que o Cimi insiste em impor à Funai. Portanto, houve essa decisão judicial simultaneamente. Complexo não é demarcar terras indígenas; pelo contrário. No Brasil, há um verdadeiro festival de demarcação de terras indígenas. Para 0,2% da população brasileira, composta por índios, já existem demarcados 12% do território brasileiro. Então, não é complexo coisa alguma! Complexo foi o que fizeram, nos Estados Unidos, com os índios de lá. Complexo é como realmente são tratadas as questões das comunidades indígenas nos Estados Unidos. Aquilo sim é complexo. Nós, no Brasil, não temos nada de complexo; pelo contrário. É até uma leviandade o que se faz com a demarcação de terras indígenas: um órgão de terceiro escalão como a Funai faz um laudo antropológico - como no caso da Raposa/Serra do Sol - fictício e fraudado; o Ministro assina a portaria; e o Presidente da República apenas a homologar sem sequer o Congresso Nacional, especificamente o Senado, que representa a Federação, ser ouvido! Este não é um processo complexo. É um processo leviano. Complexa mesmo é a mente desse repórter.
Mais à frente, Sr. Presidente, para atingir a classe política de Roraima, ele diz:
“Infelizmente a reserva está sendo usada como moeda de barganha para interesses locais e nacionais.” (...)
“Os verdadeiros motivos do atraso são políticos, e não jurídicos. Em vez de emitir imediatamente a aprovação como podia ter feito facilmente, o Governo está negociando o apoio da bancada de Roraima no Congresso, e os índios acabam sendo usados.”
(...)
(...) continua buscando o apoio dos três Senadores de Roraima, que são contrários à reserva.
Ora, Sr. Presidente, os Parlamentares de Roraima têm consciência de que é necessária a demarcação das terras indígenas. Tanto é que 57% do meu Estado já foram demarcados como terras indígenas. Não há nenhum Estado no Brasil que tenha essa proporção de terras indígenas demarcadas, e vejam que a população indígena do Estado é de apenas 8% da população geral do Estado. No entanto, ele, depois de - digamos assim - agredir o Presidente Lula e a Bancada do Estado, vai mais longe.
“O verdadeiro problema de Lula [e aí já é o problema político; antes era a complexidade] são os militares, que por causa de grandes cortes orçamentários foram privados de aumentos salariais e novos equipamentos.” “Mas as Forças Armadas também têm a preocupação de segurança nacional que ele pode atender mais facilmente. Eles temem a balcanização da Amazônia, a criação de um Estado separado ou uma ‘área liberada’ sob controle estrangeiro”.
Líderes indígenas comparam essa retórica nacionalista com a realidade do que eles descrevem como um florescente mercado negro de gasolina da Venezuela, onde o combustível custa US$0,05 o litro, menos que um décimo de seu preço no Brasil.
Sr. Presidente, veja que aí está também o contrabando; além da questão do descaminho dos nossos minerais, está o contrabando de gasolina, que campeia livremente não só nessa área da Raposa/Serra do Sol não. Ele não fala a verdade, porque a verdade é que o grande contrabando se dá na reserva São Marcos, que faz fronteira exatamente com o Município de Pacaraima.
Sr. Presidente, peço a transcrição deste artigo, na íntegra, para que fique registrado nos Anais do Senado Federal, porque é importante vermos como o nosso País, no caso, o Presidente da República, os Parlamentares e toda a população do Estado são agredidos por um repórter que parece já ter demonstrado ter raiva do Brasil. Na verdade, quer desmoralizar o País. Mas o Brasil não precisa de conselho de nenhuma nação, muito menos dos Estados Unidos, para tratar da questão indígena. Temos tratado a nossa questão indígena com muita superioridade em relação ao que fizeram os Estados Unidos.
Sr. Presidente, quero, inclusive, mostrar o mapa do meu Estado. Aqui se vê claramente, nas áreas amarelas, as reservas indígenas; a parte que ainda está pontilhada é a pretendida Raposa/Serra do Sol, que fica na fronteira da Guiana com a Venezuela. Sobra para o Estado, Sr. Presidente, apenas 12% de sua área territorial. O que queremos não é que não se demarque a Raposa/Serra do Sol; queremos que, de 1 milhão e 700 mil hectares que se pretende demarcar de forma contínua para tirar todos de lá, contra a vontade dos próprios índios, sejam retirados apenas 320 mil hectares, preservando o Município do Uiramutan, portanto, a sua sede, as vilas, a área produtiva de cultivo de arroz, como os índios também querem. Com isso, ainda resta 1 milhão e 400 mil hectares de reserva indígena. Poucas reservas indígenas no Brasil têm esse tamanho. Maiores do que essa, são poucas. Lá, no meu Estado, temos uma maior, a reserva Ianomâmi, que, inclusive, atinge os Estados de Roraima e do Amazonas, do Senador Gilberto Mestrinho.
Em boa hora o Senado realmente criou a Comissão Temporária Externa, que está cuidando da questão das terras indígenas.
É preciso, portanto, que nós, no Senado, assumamos, de maneira muito clara, o controle dessa questão, porque é, sim, uma questão de segurança nacional; é uma questão, sim, de soberania nacional; e é uma questão, sim, de defesa do nosso patrimônio, aí incluídos a biodiversidade, os minérios e todo tipo de coisa.
Na verdade, sabemos que eles não estão preocupados com os índios não! Eles estão preocupados com o que existe nessas terras que eles pretendem demarcar como terras indígenas. É o caso dos índios Ianomâmi: são 9 milhões de hectares demarcados para 5 mil índios, que continuam morrendo, vítimas de várias enfermidades, inclusive de uma enfermidade que, lá, é endêmica: a oncocercose. No entanto, o Governo brasileiro credenciou uma ONG, que recebe uma fortuna, cerca de R$8 milhões por ano, para fazer-de-conta que assiste aquela comunidade, além de maquiar números. Na verdade, o que se viu com essas ONGs na área da saúde foi desvio de muitos recursos públicos.
Peço que seja publicado esse artigo como parte do meu pronunciamento e deixo registrada a minha indignação pela forma como um repórter, que ainda é credenciado no Brasil, vive a falar mal do Brasil, a mentir sobre o Brasil e, pior ainda mais, um órgão como o Cimi dar guarida a tantas mentiras que, com certeza, só fazem prejudicar a nossa imagem.
Temos que ter a coragem de denunciar esse tipo de manobra, pois, no fundo no fundo - e ele mesmo diz que há temor -, temos, sim, o temor de que a Amazônia seja balcanizada, que a Amazônia seja internacionalizada e que a Amazônia, amanhã, seja pretexto para intervenções, senão militares, intervenções de outra ordem. Isso não está distante não! Temos a Colômbia, vizinha da nossa Amazônia, que está, hoje, já completamente dominada pelos Estados Unidos, que nunca mais sairão de lá.
Muito obrigado.
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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
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Matéria referida:
- Esta terra é nossa.