Discurso durante a 144ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento sobre a questão de desvirtuamento no Programa Bolsa Família.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Posicionamento sobre a questão de desvirtuamento no Programa Bolsa Família.
Publicação
Publicação no DSF de 21/10/2004 - Página 32545
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROVIDENCIA, PATRUS ANANIAS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, COMBATE, IRREGULARIDADE, PROGRAMA, RENDA MINIMA, FAMILIA.
  • COMENTARIO, LEITURA, ENTREVISTA, ECONOMISTA, FILIAÇÃO PARTIDARIA, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, ESTADO, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS, NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, POLITICA SOCIAL, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, COMBATE, POBREZA, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, REFORMA AGRARIA.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT-SC. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta Tribuna para novamente discutir - não as denúncias - mas o relevante papel que cabe a um programa da dimensão do Bolsa Família.

Gostaria de deixar bem claro que em relação às denúncias - que são graves, mas pontuais - nosso posicionamento é o mesmo do Ministro Patrus Ananias, que vem tomando desde já:

(1) providências cabíveis para sanar os problemas detectados e, inclusive;

(2) buscando reaver os recursos que inadvertidamente (ilegalmente, diria eu) foram pagos a pessoas que não deveriam estar recebendo. Prefiro não indicar a priori culpados em nenhuma das esferas do Poder, nem nas Prefeituras (que desempenham papel relevante na definição dos beneficiários do Programa), nem mesmo no âmbito do Governo Federal. Prefiro aguardar o trabalho já iniciado nas apurações, investigações e nas medidas concretas adotadas pelo MDS.

Ontem citei aqui o economista Márcio Pochman. Atualmente é o Secretário de Desenvolvimento e Trabalho de São Paulo, que em recente evento lembrou as palavras do educador Paulo Freire de que todo sonho sonhado por muitos se torna realidade.

Na oportunidade afirmou Pochman: "É o caso do Brasil. Devemos sonhar com uma melhor distribuição de renda". Segundo o autor, é preciso criar um compromisso da sociedade com o crescimento econômico e ao mesmo tempo com a exigência de se fazer uma reforma social e nas políticas sociais.

Não há como discordar, mas é a afirmação do próprio Márcio Pochman quanto ao “FIM DA POBREZA” que merece destaque. Afirma ele:

"São necessários dois compromissos por parte de toda a população. O primeiro compromisso político é em torno do crescimento econômico. O Brasil precisa voltar a crescer a uma taxa de 6% a 7 % ao ano, nos próximos dez anos, para combater o problema da pobreza e o desemprego. O segundo é o compromisso com um conjunto de reformas sociais: a reforma tributária (é preciso fazer com que os ricos paguem impostos); a reforma fundiária (uma reforma agrária para valer); e uma reforma social que possibilite o desenvolvimento de um estágio de bem-estar social através de espaços de públicos que atendam as necessidades da maior parte da população brasileira."

Na mesma linha, gostaria de destacar duas interessantes reflexões do economista Marcio Pochman:

Ao ser perguntado (em abril de 2004) sobre “como resolver a questão social em nosso País?” (sendo naquela oportunidade lembrado pelo entrevistador que há quem coloque que o problema social deve ser resolvido pelo mercado! E se ele não resolver, é porque o problema é insolúvel. Foi perguntado então: A questão social é um problema de mercado ou é um problema da sociedade e do Estado brasileiro?), respondeu Pochman:

Eu acredito que o papel do Estado é fundamental. É óbvio que o país precisa voltar a crescer, precisa de um modelo econômico que ofereça como possibilidade a recuperação das atividades econômicas. O Brasil é um país em construção, não é um país completo, é um país que tem ainda que ampliar, por exemplo, toda a sua infra-estrutura material, desde rodovias, o sistema viário de uma maneira geral, tem problemas sérios em termos habitacionais, então é um país que precisa ser completado, nesse sentido. Mas, ao mesmo tempo, não há como deixarmos de passar pelas chamadas reformas. O Brasil ainda não fez, por exemplo, a reforma agrária. Precisaríamos fazer a reforma agrária, a meu modo de ver, precisaríamos uma mudança na estrutura tributária que onerasse fundamentalmente os mais ricos e, ao mesmo tempo, precisaríamos reconstruir, diria assim, a estrutura fundamental do Estado de Bem Estar Social. Temos uma péssima distribuição de renda e, lamentavelmente, os recursos que estão sendo transferidos para o Estado, na forma de tributos, não são orientados fundamentalmente para as atividades sociais. Temos uma dívida pública que absorve uma parcela importante dos recursos públicos. Então, estou convencido de que precisamos combinar esforços, de um lado, que ajude a construir um projeto de desenvolvimento econômico para o país, qual é o caminho do Brasil para as próximas duas, três décadas e, ao mesmo tempo, precisamos fazer reformas internas que viabilizem uma mudança na repartição da renda e, ao mesmo tempo, uma possibilidade de ter recursos direcionados fundamentalmente para um melhor gasto social.”

Uma outra questão feita ao economista Pochman permitiu que ele desenvolvesse uma interessante linha de raciocínio, citando inclusive o exemplo de SP:

PERGUNTA: “Mas aí surge a discussão do FMI de que um maior gasto social tende a provocar menor responsabilidade fiscal. Como resolver esta equação?”

MP - Eu não entendo que as dificuldades que temos, hoje, no plano fiscal decorram justamente da ausência de gasto social adequado ou mesmo de um gasto social muito elevado. A meu modo de ver, a área social, inclusive, está contribuindo muito para a geração do chamado superávit primário, uma vez que, por exemplo, existe um desvio de recursos do orçamento da seguridade social para financiamento de outras atividades do setor público, inclusive, o pagamento do serviço da dívida pública. Pelo contrário, a meu modo de ver, o Brasil precisa ampliar o gasto social...

E aqui, Sr. Presidente, eu me permito completar o economista Marcio Pochman, pois vejo que o Bolsa Família é um passo fundamental de nosso Governo nessa direção e não podemos deixar que ‘desvios’ nesse firme propósito venham a ocorrer. Todos que sabem da importância da área social dever estar juntos no firme propósito de defesa de programas de distribuição de renda num país como o nosso!

E continua Pochman na sua resposta:

“...precisamos de um choque redistributivo, com redistribuição de renda, porque isso ajudaria a animar a atividade econômica, ao mesmo tempo em que evitaria a desagregação social que é, um pouco, os sinais que estamos vendo nas grandes cidades. A experiência aqui do município de São Paulo mostra o papel importante das políticas públicas voltadas para uma melhor redistribuição da renda. Os resultados são bastante interessantes no que diz respeito à (1) elevação do nível de atividade econômica, da (2) geração de empregos com carteira assinada, inclusive, a (3) melhora do desempenho escolar das crianças pertencentes às famílias pobres e é ainda bastante importante chamar a atenção para o fato de que (4) programas, como os que têm sido aplicados em São Paulo, por exemplo, têm (5) possibilitado reduzir a taxa de homicídio nas regiões onde o crime é bastante expressivo.”

Pois é isso, Sr. Presidente. Não podemos fazer sobre os programas sociais um olhar reducionista de se são altos ou baixos os gastos sociais. É imperioso que os tratemos como “investimentos no nosso povo”.

E é preciso dizer: o Programa Bolsa Família é uma iniciativa que ainda tem muito por fazer a este País, e não deve ser analisada sob o prisma dos ‘espertinhos’, dos ‘apadrinhados’, dos ‘irresponsáveis’, que existem, mas que não são a maioria dos beneficiários e reais merecedores do programa.

Esse subconjunto é uma minoria que não é um bom exemplo e que não impedirá o êxito de nossa política social. A maioria, os realmente mais necessitados, permanece como o segmento mais importante e elemento central de nossa ação!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/10/2004 - Página 32545