Discurso durante a 143ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas aos juros altos de nossa economia, além da elevada carga tributária.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Críticas aos juros altos de nossa economia, além da elevada carga tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2004 - Página 32427
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • CONTESTAÇÃO, EXCESSO, CARGA, TRIBUTOS, BUROCRACIA, BRASIL, EFEITO, AUSENCIA, INVESTIMENTO, PAIS, IMPOSSIBILIDADE, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • COMENTARIO, PROBLEMA, CUSTO, DEMISSÃO, EMPREGADO, DIFICULDADE, ABERTURA, FECHAMENTO, EMPRESA, DEMORA, JUDICIARIO, SOLUÇÃO, DISPUTA, NATUREZA COMERCIAL.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o país emerge do pleito municipal fortalecido e legitimado para enfrentar e superar os desafios do desenvolvimento socioeconômico.

Um psicanalista dotado de consciência histórica diria que “cada época produz o seu sintoma” - e é verdade. Durante anos a fio as atenções, energias e preocupações da opinião pública e dos governantes se concentraram obsessivamente na busca de meios para exorcizar o monstro da inflação, que transformava salários em pó, paralisava uma montanha de recursos jogados na ciranda financeira, cavando um abismo gigantesco entre a minoria capaz de proteger seus ativos por meio dos mecanismos de indexação e a maioria empobrecida sem acesso aos dispositivos da correção monetária. Em memorável artigo para a revista Veja, o comentarista Joelmir Betting atribuiu a esse conflito distributivo de cartas marcadas a causa do triste título de campeão mundial de exclusão e desigualdade que ostentamos até hoje...

O fato é que, uma vez conquistada a estabilidade monetária, graças ao sucesso do plano real, que neste ano completou seu décimo aniversário, imediatamente as atenções gerais redescobriram outros problemas longamente ocultados pelo estado de intoxicação em que o descontrole dos preços mergulhara o organismo econômico brasileiro.

Cortado o torpor inflacionário, a sociedade despertou para o caos doloroso das finanças federais, estaduais e municipais - e, mais uma vez, soube colocar-se à altura do desafio exigindo de seus representantes democraticamente eleitos o encaminhamento da solução. esta, por fim viria, na forma da lei de responsabilidade fiscal, cujo projeto tive a honra de relatar em duas oportunidades: a primeira no âmbito da comissão de constituição e justiça e a segunda na de assuntos econômicos.

Nesses e em outros episódios, podemos discernir por trás das decisões do parlamento e do poder executivo, o clamor de uma sociedade democrática, cada vez mais ansiosa por avançar na senda do amadurecimento cívico, da modernização política, do desenvolvimento econômico e da justiça social.

Agora, Sr. Presidente, o Brasil acha-se novamente face a face com outro desses momentos decisivos. suas três dimensões fundamentais, conforme vem-nos alertando o douto tributarista Ives Gandra da Silva Martins, atendem pelos nomes de juros altos, carga tributária opressiva e hiperburocratização.

Peço licença aos ilustres pares para falar dos juros em uma próxima oportunidade, a fim de concentrar-me hoje no pesadelo burocrático, de vez que as aflições do nosso manicômio tributário têm sido objeto freqüente de minhas análises nesta tribuna, principalmente em conexão com o impacto esmagador da carga de impostos, contribuições e taxas sobre o orçamento cada vez mais apertado da classe média.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, minucioso relatório de pesquisa do banco mundial, recém-divulgado, desnuda a difícil posição ocupada pelo Brasil em um estudo comparativo de 145 países. Conforme o relatório do bird, pouquíssimos ambientes legais e regulatórios no mundo são tão hostis aos negócios quanto o Brasil. Mais precisamente, neste aspecto, só não somos piores que o africano Chade!...

            Vamos, rapidamente, aos fatos que infernizam a vida dos nossos empreendedores, inibem investimentos e desestimulam a criação de oportunidades de trabalho e emprego.

            Primeiro: o custo de uma demissão no Brasil é o quarto maior do planeta. Como se sabe, quanto maiores as dificuldades para demitir, também são os obstáculos à entrada no mercado de trabalho. Mesmo em momentos de retomada produtiva, como o que a indústria brasileira parece atravessar agora, o patrão pensa duas ou três vezes antes de contratar pois sabe da imensas despesas em que terá de incorrer para reduzir o quadro quando o ciclo de prosperidade se inverter. Que o digam as recentes sondagens do Dieese que evidenciam a preferência dos empresários paulistas por ampliar as horas extras dos trabalhadores existentes antes de recorrer a novas admissões. Não fosse isso, a atividade econômica já estaria exibindo níveis muito mais vistosos... (apenas em Serra Leoa, no Laos e na Guatemala, enfrentam os empresários custos maiores na hora de demitir.)

Segundo: é muito difícil e demorado abrir um negócio, por menor que seja, no Brasil. Essa maratona leva, em média, 152 dias. A situação só é pior em bolsões de atraso mundial como o Haiti, o Laos, o Congo e Moçambique. Chocante o contraste com paraísos de prosperidade como a Austrália (apenas dois dias), o Canadá e os Estados Unidos (somente um dia). Apenas já o referido e desditoso chade vence o Brasil em número de procedimentos necessários à abertura de uma empresa: aqui é preciso percorrer uma via-crucis com 17 passos burocráticos.

Terceiro: se, por aqui, abrir um negócio é dificílimo, fechá-lo, então, é praticamente impossível. Isso leva em média dez anos! Neste quesito, estamos na triste companhia de baluartes burocráticos como a índia e - mais uma vez! - o chade. Em comparação, na Irlanda, o ‘tigre celta’ cuja competitividade e produtividade transformaram-se em uma saga de sucesso dos anos 90, a coisa leva menos de seis meses.

Quarto: a proverbial lentidão do judiciário brasileiro toma, em média, 566 dias para resolver a mais comezinha disputa comercial. Em conexão com este aspecto, registre-se o fato de que recuperar dinheiro emprestado neste país do calote fantasiado de moratória soberana é uma verdadeira façanha. Espero, sinceramente, que a nova lei de falências mude radicalmente esse quadro. Afinal, hoje, quando uma empresa abre falência, seus credores recebem em média menos de um por cento do dinheiro emprestado! Apenas para mais um pequeno efeito de comparação, na gélida mas empreendedora Finlândia, 90% dos empréstimos voltam para o bolso de quem emprestou. Não é de estranhar, aliás, que no nosso Brasil tropical as taxas de juros continuem tão altas, apesar da consistência, eu diria quase calvinista, com que a equipe econômica do Ministro Antônio Palocci persegue a meta do superávit primário, o que valeu recentemente ao Brasil uma nota mais alta das agências internacionais de avaliação de riscos.

Ora, um país que precisa desesperadamente atrair investimentos estrangeiros para suprir sua insuficiente taxa de formação de poupança interna não pode adiar o imperativo radical da desburocratização, como pregava o lúcido e saudoso Hélio Beltrão. Precisa, também, ampliar sua integração competitiva ao mercado mundial. Mas vejam os nobres colegas as armadilhas e os obstáculos que nossa burocracia barroca e contra-reformista semeia no caminho de empresas pequenas ou grandes.

Colho meu último exemplo na experiência frustrante vivida recentemente pela filial brasileira da montadora francesa Citröen. Engenheiros de sua fábrica paranaense desenvolveram uma roda de liga-leve para um modelo de minivan. A filial precisava tão-somente remeter um pequeno lote de 50 unidades para obter da matriz francesa a indispensável homologação a fim de dar início à produção em série. Pena que no meio do caminho havia uma pedra, uma pedra denominada receita federal, cujos burocratas meteram na cabeça que o envio de amostras significava uma exportação, com trâmites muito mais complexos e demorados. Exportação como, se não se tratava de venda? Mas os caminhos da burocracia brasileira são insondáveis e também desastrosos.

            A demora fez com que a Citröen do Brasil perdesse a data agendada na concorridíssima pista de testes da matriz. Resultado: pelo menos até o final deste ano, a filial terá de continuar importando rodas trazidas da França...

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Revista Exame, recentemente, trouxe reportagem assinada pelo jornalista J. R. Guzzo elogiando o governo Lula por medidas tópicas de simplificação tributária em benefício das microempresas: isenção em impostos como os de renda, sobre produtos industrializados, Pis e Cofins; redução na alíquotas de INSS, FGTS, ICMS e ISS; redução das exigências burocráticas para abrir empresas e pagar impostos.

Bem que eu gostaria de ver prosperarem estas e outras iniciativas governamentais para simplificar a vida dos brasileiros que trabalham, empreendem e se sacrificam para produzir riqueza e empregos. Contudo, não posso deixar de apontar atos preocupantes que contradizem frontalmente as intenções oficiais do governo. Assim, é impossível negar que uma estrutura ministerial ineditamente pesada, com 35 pastas, gera muito mais (e não menos) burocracia, controles paralelos, exigências de papelório inútil.

Da mesma forma, a consciência nacional se angustia e revolta com o descarado aparelhamento dos quadros do funcionalismo público federal com militantes petistas, na maioria dos casos desprovidos de qualificação afora o lucrativo mérito de recolher religiosamente o dízimo sobre seus vencimentos aos cofres partidários...

            A propósito, um astuto magnata do mercado imobiliário de Brasília esfrega as mãos de puro entusiasmo com a perspectiva de derrota do pt em algumas importantes capitais no segundo turno. O empresário calcula que alguns milhares de detentores de cargos de confiança naquelas prefeituras em breve desembarcarão com armas e bagagens no Planalto Central para continuar a viver da máquina pública, desta vez federal. Os preços dos aluguéis em Brasília serão catapultados às nuvens graças aos bons e caridosos ofícios dessa mega-agência de empregos em que se transformou o partido dos trabalhadores, especialista em promover distribuição de renda em circuito fechado.

Pobre Brasil! Mais precisamente, pobre classe média que arqueja sob uma carga tributária paquidérmica para financiar essa festa sinistra!!!

            Era o que tinha a comunicar, Sr. Presidente.

            Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2004 - Página 32427