Discurso durante a 145ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Lançamento, pelo Ministério da Saúde, de carta destinada ao combate da hanseníase. Comentários aos riscos do aumento dos casos de tuberculose, enfermidade declarada pela OMS como reemergente.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Lançamento, pelo Ministério da Saúde, de carta destinada ao combate da hanseníase. Comentários aos riscos do aumento dos casos de tuberculose, enfermidade declarada pela OMS como reemergente.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2004 - Página 32708
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), MELHORIA, ATENDIMENTO, HANSENIANO, DIVULGAÇÃO, DOCUMENTO, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, NECESSIDADE, PREVENÇÃO, ERRADICAÇÃO, DOENÇA GRAVE, BRASIL.
  • REGISTRO, ANUNCIO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), ESTADO DE EMERGENCIA, TUBERCULOSE, APRESENTAÇÃO, DADOS, CONTAMINAÇÃO, POPULAÇÃO, MUNDO, ATUAÇÃO, VIRUS, CORPO HUMANO, COMENTARIO, POSSIBILIDADE, REALIZAÇÃO, TRATAMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
  • APOIO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, RECURSOS, INVESTIMENTO, PROGRAMA, CONTROLE, TUBERCULOSE.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje pela manhã, às 10 horas, estive em uma solenidade no Ministério da Saúde quando foram lançadas cartas para a eliminação da hanseníase. São documentos elaborados por técnicos do Ministério da Saúde e assinados pelo Ministro. S. Exª entregou pessoalmente aos vinte e sete secretários estaduais de saúde do Brasil uma carta com recomendações para que consigam melhorar o atendimento aos portadores da hanseníase. O objetivo principal é controlar a doença e praticamente eliminá-la nos próximos anos.

Hoje, no Brasil, há uma média de quatro casos de hanseníase para cada dez mil habitantes em alguns dos Estados, enquanto em outros a média é de 15 casos para cada dez mil habitantes. Essa carta será um instrumento para ajudar na gestão do recursos e das técnicas de combate à hanseníase.

O tema que vou abordar hoje também se refere a uma doença, o perigo da tuberculose, doença que durante certo tempo desapareceu, depois voltou a grassar na humanidade.

A tuberculose é uma das enfermidades mais conhecidas do mundo. Ela não é contudo uma doença do passado, como todos pensam. Bem ao contrário, a tuberculose encontra-se em estado de emergência decretado pela Organização Mundial da Saúde, a OMS, como enfermidade reemergente desde 1993.

Nada menos que um terço da população mundial está infectada pelo mycobacterium tuberculosis, enquanto cerca de dois terços apresenta a doença. Infectada significa que a pessoa teve contato com a micróbio da doença, então de cada três pessoas uma teve contato com o micróbio, mas não é portadora da doença. Por ano - isso que é triste -, ocorrem oito milhões e meio de casos no mundo e morrem três milhões de pessoas, em sua maioria em países em desenvolvimento, sendo a tuberculose responsável por 25% das mortes evitáveis em jovens. Além disso a tuberculose é a principal causa de morte entre os portadores de HIV positivo, sendo responsável por um terço das mortes por aids no mundo.

Anualmente, notificam-se no Brasil perto de cem mil casos de tuberculose, sendo 85 mil desses, novos casos. Morrem, no País, cerca de seis mil pacientes por ano. Calcula-se que, do total da população, 35 a 45 milhões de pessoas estejam infectadas pelo micróbio da tuberculose.

Os principais fatores que contribuem para a manutenção e para o agravamento do problema são a persistência da pobreza em nossa sociedade e a ocorrência de aids nos grandes centros urbanos. A maioria dos casos de tuberculose no Brasil ocorrem em pacientes do sexo masculino e em idade reprodutiva, prejudicando ainda mais as condições de vida das famílias carentes, maiores vítimas da moléstia. A realidade é que a pobreza gera tuberculose, que, por sua vez, gera mais pobreza em um perverso círculo vicioso.

Sr. Presidente Luiz Otávio, a tuberculose é transmitida por bactérias que se propagam pela vias respiratórias. A doença se manifesta com maior freqüência nas áreas subdesenvolvidas, pois está relacionada às condições de vida da população. O crescimento populacional na periferia das grandes cidades contribui para o aumento do número de casos de tuberculose no País. Observa-se grande concentração da ocorrência da tuberculose em todas as grandes metrópoles brasileiras. Outro fator agravante da situação em todo o mundo é a associação de tuberculose e aids. No Brasil, 8% dos pacientes com tuberculose também têm aids.

Causada pelo bacilo de Koch, a tuberculose é transmitida quando um doente espirra ou tosse perto de outra pessoa, em contato íntimo e prolongado. Qualquer pessoa pode ser contagiada pela tuberculose: basta estar com o sistema imunológico deficiente ao entrar em contato com o bacilo. A bactéria fica no ar, depois de expelida pela tosse ou espirro de um doente.

A tuberculose é mais comum em jovens e em adultos, embora as crianças tenham mais facilidade de contrair a doença. A principal medida para controlar a tuberculose é o diagnóstico precoce, para o imediato tratamento adequado. Todas as pessoas que apresentam tosse com catarro há mais de três semanas, acompanhada ou não de outros sintomas, como febre e emagrecimento, devem procurar uma unidade do Sistema Único de Saúde (SUS), para realizar o exame do escarro. Qualquer unidade do SUS é capaz de fazer o diagnóstico e oferecer o tratamento da doença.

A partir da década de 50, com a descoberta do tratamento eficaz contra a tuberculose, permitiu-se aos pacientes retornar ao convívio social. O tratamento, que antes era de um ano ou mais, hoje dura apenas seis meses.

Os postos ligados à rede do SUS oferecem gratuitamente os remédios usados no combate à doença. O Brasil adota a estratégia de controle da tuberculose recomendada internacionalmente e denominada DOTS, Directly Observed Treatment Short Course, isto é, Tratamento de Curta Duração sob Observação Direta. Por meio do DOTS, os doentes recebem, além da medicação completa - composta pela combinação de três quimioterápicos -, acompanhamento pelos profissionais nos postos, centros de saúde ou hospitais, ou das equipes de saúde da família.

A medicação deve ser tomada durante seis meses, sem interrupção. Enquanto o paciente não inicia o tratamento, ele pode transmitir a doença por meio da fala, espirro ou tosse. O Ministério da Saúde estima que um paciente pulmonar bacilífero, se não tratado, pode infectar, em um ano, de dez a quinze pessoas. Uma vez iniciado o tratamento, o paciente normalmente pára de transmitir a doença, no máximo, em quinze dias, ou seja, em quem for diagnosticada a tuberculose tem de evitar contato com pessoas doentes ou fracas, no máximo, em 15 dias. Depois, ela pode conviver normalmente com qualquer pessoa.

Como a via aérea é a principal via de transmissão da tuberculose, aumentar a ventilação do ambiente, cobrir a boca e o nariz, quando ocorrer tosse ou espirro, ajudam a reduzir a transmissão da doença. Nos dois primeiros dias de tratamento, o paciente já sente melhoras. Exatamente por isso, muitos acham que foram curados e abandonam o uso da medicação. O abandono do tratamento pode levar o paciente a adquirir a tuberculose multirresistente, que é a forma mais difícil de tratar. No Brasil, ainda são registrados poucos casos dessa forma mais grave da tuberculose. No total, são 1.300, sendo que 90% desses 1.300 decorrentes do abandono do tratamento.

Com efeito, no caso da tuberculose, como em todas as doenças, seguir o tratamento à risca, sem interrupções, até o seu final, tem importância vital. Se o paciente deixa de tomar os remédios antes de estar completamente curado, o bacilo, o micróbio, torna-se resistente a eles. Nesse caso, tornam-se necessárias drogas mais potentes e mais caras. Mas, mesmo com o seu uso, as chances de cura reduzem drasticamente. Se ele seguir à risca, direto, normalmente o primeiro tratamento, ele tem 100% de chances de ficar curado. Se ele interromper e começar com o segundo esquema de tratamento, cai para 20% a sua chance de ficar curado.

Sr. Presidente Luiz Otávio, Sr. Senador Pedro Simon, o Brasil foi um dos países participantes no mês de março passado, do II Fórum Mundial do Programa Stop TB - movimento global para acelerar ações sociais e políticas para o controle da tuberculose no mundo. O encontro foi realizado em Nova Délhi, na Índia, país onde a tuberculose representa um flagelo de maior proporção do que em qualquer outro. O Exmº Sr. Ministro da Saúde, Humberto Costa, esteve presente no fórum, representando o Brasil.

Além do Brasil, outros 21 países participaram da reunião. Juntas, essas nações concentram 80% dos casos de tuberculose do planeta. As principais metas do Programa Stop TB, até 2005, são: descobrir 70% dos casos estimados de tuberculose e curar 85% deles; até 2010, reduzir em 50% as mortes e a prevalência da doença. Reduzir em 50%, até 2010, significa que deixarão de morrer 1,5milhão de pessoas por ano, a partir do momento em que se conseguir atingir o objetivo. Até 2050, reduzir a incidência da doença para um caso ou menos por milhão de habitantes no mundo.

Além da observação direta do paciente, implica que ele receba medicação e tenha todo o tratamento, observado pelo serviço de saúde, estratégia que tem apresentado bons resultados pelo mundo afora. Cura de pacientes, salva vidas, reduz a transmissão e previne o aparecimento e a disseminação da tuberculose resistente à múltiplas drogas. No Brasil, a estratégica de tratamento seguido de acompanhamento é desenvolvida da seguinte forma - falo para que as pessoas que tiverem tuberculose e estiverem ouvindo fiquem atentas para verificarem se está sendo seguida a seguinte regra: na primeira fase do tratamento, com duração de dois meses, faz-se o mínimo de três observações semanais. Na segunda fase, com quatro meses de duração, faz-se uma observação semanal, ou seja, a equipe de saúde, médico, enfermeira do posto, todos têm de ter contato com o paciente nessa freqüência.

O Brasil, apesar de adotar as normas internacionais de controle da tuberculose, permanece incluído no grupo de 22 países com maior número absoluto de casos da doença. Atualmente, ele está na 21a posição.

Segundo o médico Christopher Dye, coordenador e um dos autores do relatório da Organização Mundial de Saúde sobre a tuberculose no mundo, o desempenho do Brasil no combate à moléstia é fraco, em comparação com o de outros países. Na opinião do Dr. Dye, o Brasil, devido à falta de investimentos, tem resultados piores do que países mais pobres, como Índia, Indonésia, Paquistão e até Bangladesh. Em suas palavras:

Esses países têm muito menos recursos para implementar programas de controle de tuberculose que o Brasil, ou seja, o Brasil tem um desempenho relativamente fraco. O Brasil (...) tem os recursos para fazer o controle eficiente da tuberculose e, mesmo assim, ainda não vimos lá o progresso que vimos em outros países, como os da Ásia.

Confrontado com essa manifestação, o Ministro da Saúde, Humberto Costa, concordou com a avaliação da agência da ONU. “O Brasil, por sua estrutura de saúde pública, poderia ter indicadores bem melhores do que tem hoje”, disse o Ministro, que anunciou um pacote de mudanças para reverter esse quadro, acrescentando que as falhas do Brasil se concentram na área se concentram principalmente no diagnóstico da doença e no tratamento não-continuado. Ambas as questões estão destacadas pelo relatório da Organização Mundial de Saúde, que salienta, ainda, que a abrangência da estratégia DOTS - tratamento de curta duração com acompanhamento - sobre a população vem caindo nos dois últimos anos examinados. Em 2001, a estratégia DOTS atingia 32% da população. Em 2002, o índice caiu para 25%, mais uma má notícia para o sistema de saúde brasileiro, segundo o Dr. Dye. Disse o técnico da OMS:

“A porcentagem que recomendamos é 100%. É isso que o Brasil deveria estar tentando atingir. O fato de a porcentagem estar em queda indica uma negligência no que diz respeito à introdução da estratégia DOTS no País.”

Para o Ministro Humberto Costa, essa suposta negligência deve ser atribuída à resistência do Governo anterior em descentralizar os programas de combate à tuberculose. Na sua avaliação, o Brasil falhou nos Governos anteriores por ter um programa de saúde da família que não fazia diagnósticos nem tratamento de tuberculose. Os pacientes tinham de se deslocar para os centros especializados, muitas vezes longe de suas residências.

Concordo plenamente com o Sr. Ministro, porque isso ocorria no meu Estado.

Para tentar reverter esse quadro negativo, o Ministro da Saúde anunciou, em março passado, um pacote de medidas, afirmando sua certeza de que, no próximo relatório da OMS sobre tuberculose, o Brasil estará em situação bem mais confortável e milhares de pessoas que hoje não têm tratamento terão e obterão cura.

Entre as medidas anunciadas pelo Governo Federal, está a injeção de R$117 milhões a mais por ano na área, além da criação de forças-tarefa para intervir nas coordenações estaduais dos programas de combate à doença.

É auspicioso registrar que, pela primeira vez, a luta contra a tuberculose está entre as 16 ações prioritárias do Ministério da Saúde. A meta do Governo é curar 50.500 tuberculosos até 2005. Para isso, o Ministério pretende reestruturar o seu Programa de Controle da Tuberculose (PCT). A qualificação das equipes que atendem os doentes é uma das ações previstas. Outra iniciativa será o reforço das atividades de diagnóstico, com repasse de equipamentos aos laboratórios das unidades de saúde pública do País.

Sr. Presidente Luiz Otávio, Srªs e Srs. Senadores, como reconhece o próprio Ministério da Saúde, o Brasil, com a estrutura de saúde pública que possui, poderia apresentar indicadores bem melhores do que aqueles exibidos hoje no combate à tuberculose.

Saudamos, enfaticamente, portanto, a disposição de Sua Excelência de reforçar significativamente os recursos destinados ao controle dessa enfermidade tão grave. Esperamos que se fortaleça a disposição dos diversos níveis de governo e do conjunto da sociedade de erradicar, definitivamente, esse mal que ainda aflige tantos brasileiros.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2004 - Página 32708