Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Justificativas a Projeto de Lei de sua autoria que altera a Lei 9.717, de 27 de novembro de 1998.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Justificativas a Projeto de Lei de sua autoria que altera a Lei 9.717, de 27 de novembro de 1998.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/2004 - Página 33370
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DISPOSIÇÃO, ORGANIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO, REGIME, PREVIDENCIA SOCIAL, SERVIDOR, MUNICIPIOS, ESTADOS, OBJETIVO, RECUPERAÇÃO, AUTONOMIA, AUSENCIA, INTERFERENCIA, UNIÃO FEDERAL.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, e meados de agosto próximo passado, fui procurado por representantes de prefeitos, servidores e secretários municipais que solicitaram as minhas gestões no sentido de buscar junto ao meu companheiro de partido, Ministro Amir Lando, da Previdência e Assistência Social, uma solução capaz de viabilizar a continuidade do recebimento das transferências voluntárias para os Municípios inadimplentes com as obrigações previdenciárias de servidores.

Destacava-se nesse contexto o Município de Campina Grande, um entre centenas de pequenos e médios municípios brasileiros que têm sofrido com a interpretação equivocada do art. 9º da Lei nº 9.717, de 1998, que dispõe sobre as regras gerais para organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Naquele momento, urgia resolver-se o impasse que impossibilitava esses Municípios de receber as transferências voluntárias, numa absurda e flagrante ação atentatória contra o princípio federativo.

Isso porque a interpretação dos referidos dispositivos da Lei não poderia, em nenhum momento, servir à idéia coercitiva de fazer sujeitar os municípios ao monitoramento e sanção da União, exceto por uma inaceitável visão financista ou fiscalista do Estado.

Daí o sucesso das liminares que despontaram na Justiça aos borbotões. Campina Grande era apenas e tão somente a ponta do iceberg. Os Municípios mais penalizados continuam a ser os menores e mais pobres, que não contam com procuradorias estruturadas capazes de defendê-los e a suas populações, que deixam de contar com serviços públicos em função da suspensão dos recursos providos pelas transferências.

Procurei o Ministro para tentar uma solução que, à oportunidade, só poderia ser paliativa, minorava a situação dramática dos Municípios, pela via temporária da excepcionalização da aplicação da Lei, mas não resolvia definitivamente o problema.

Entretanto, entendia claramente que o assunto merecia uma abordagem mais completa e definitiva, o que só seria possível mediante a correção da legislação em vigor, de modo a retirar do campo da interpretação a sua aplicabilidade.

Assim é que apresento na tarde de hoje um projeto de lei com o objetivo de sanar as imperfeições que deram origem a um equivocado monitoramento da União sobre os Municípios, ferindo de morte a autonomia que lhes é assegurada constitucionalmente.

Mediante a Lei nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, o legislador ordinário federal, com fulcro no art. 24, XII, da Constituição Federal, houve por bem estabelecer regras gerais para a organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal e dá outras providências.

Tais normas são importantes, na medida em que visam a garantir um mínimo de organização aos regimes previdenciários dos servidores públicos das três esferas de Governo e, por conseqüência, a sua sustentabilidade, em benefício dos próprios servidores.

Não obstante os aspectos positivos do referido diploma normativo, entendemos que ele está a merecer algumas correções, em pontos nos quais, a nosso ver, o legislador federal extrapolou o âmbito de sua competência constitucional de estabelecer regras gerais, ferindo, assim, o princípio federativo.

Nessa linha, o inciso I do art. 9º da citada Lei, ao prever competir à União, por intermédio do Ministério da Previdência e Assistência Social, a orientação, a supervisão e o acompanhamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos e dos militares da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, engendrou uma forma de tutela do Poder Executivo Federal sobre os entes federados que não encontra amparo na Carta Magna.

Com efeito, a competência da União de fixar normas gerais em matéria previdenciária não tem a dimensão de submeter Estados e Municípios a ingerências administrativas do Ministério da Previdência e Assistência Social.

E, se eventualmente alguma das normas gerais insertas na lei é descumprida, tal situação deve ser corrigida pela via judicial, e não por mecanismos de supervisão e acompanhamento realizados por órgãos do Poder Executivo Federal.

O sistema federativo brasileiro não tolera a criação de instrumentos de intervenção do ente central sobre as autonomias que não estejam expressamente previstos na Constituição Federal, seja qual for a roupagem que adotem.

Ademais, a teor dos arts. 75 e 31 da Lei Maior e pela própria simetria que deve existir com o modelo da União, compete aos Poderes Legislativos Estadual e Municipal, auxiliados pelas Cortes de Contas, exercer a fiscalização e o controle externo da Administração Pública dos Estados e dos Municípios.

De resto, não se encontram entre as competências previstas constitucionalmente como privativas da União as de orientar, supervisionar e acompanhar os regimes próprios de previdência dos servidores públicos estaduais e municipais, mas, sim, as de fiscalizar apenas as operações de previdência privada (art. 21, VIII, da Constituição Federal).

Se não cabe à União fiscalizar ou exercer qualquer tutela sobre os regimes próprios de previdência dos servidores estaduais e municipais, igualmente descabidas são as previsões do art. 7º da Lei, que punem Estados, Distrito Federal e Municípios que desatenderem a qualquer dos preceitos nela estabelecidos com: a suspensão das transferências voluntárias de recursos pela União; o impedimento de celebrar acordos, contratos convênios ou ajustes, bem como de receber empréstimos, financiamentos, avais e subvenções em geral de órgãos ou entidades da Administração direta e indireta da União; a suspensão de empréstimos e financiamentos por instituições financeiras federais; e a suspensão do pagamento dos valores devidos pelo Regime Geral da Previdência Social em razão da Lei nº 9.796, de 1999.

As punições são, a olhos vistos, irrazoáveis, eis que desproporcionais as rigorosas penas, na medida em que o descumprimento de qualquer das regras estabelecidas na lei lhes dá ensejo, até mesmo o flagrantemente inconstitucional preceito do parágrafo único do art. 9º, segundo o qual Estados, Distrito Federal e Municípios devem prestar informações ao Ministério da Previdência e Assistência Social sobre o regime próprio de previdência de seus servidores e sobre os fundos previdenciários que criarem. No presente projeto, também propomos a revogação do aludido parágrafo único.

A inconstitucionalidade se revela ainda mais gritante no inciso IV do art. 9º da lei, que prevê como punição a suspensão do pagamento dos valores devidos pelo Regime Geral da Previdência Social a título de compensação financeira pela contagem recíproca de tempo de contribuição.

Ora, é a própria Constituição que determina seja feita tal compensação, em seu art. 201, § 9º, e nem poderia ser de outra forma, já que a retenção de tais recursos representaria enriquecimento sem causa do ente federal.

Se este recebeu recursos de contribuições previdenciárias de alguém que mais tarde tem benefícios previdenciários custeados por Estado ou Município, o aproveitamento do tempo de serviço como segurado do INSS para fins de aposentadoria como servidor estadual ou municipal deve necessariamente se fazer acompanhar da compensação financeira referida.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as questões que levantamos não são puramente acadêmicas. Têm sérios efeitos práticos. É sabido que muitos Municípios têm sido penalizados com a aplicação dos dispositivos cuja revogação preconizamos, o que causa grande prejuízo para as populações locais, pela suspensão do fluxo de recursos que seriam lhes seriam destinados.

Não por outro motivo liminares têm sido concedidas pelo Poder Judiciário para impedir tais práticas lesivas aos cofres municipais.

Sem embargo, boa parte dos Municípios menores sequer contam com procuradorias organizadas, para, insurgindo-se contra a situação descrita, defender seus interesses junto ao Poder Judiciário. Este é mais um motivo a recomendar a revogação, o quanto antes, dos artigos da Lei nº 9.717, de 1998, aos quais nos referimos.

São essas, em suma, as razões que me animaram a apresentar esse projeto de lei e a defender a sua importância da tribuna desta Casa, ao mesmo tempo em que rogo o apoio de V. Exªs para a sua urgente aprovação.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/2004 - Página 33370