Discurso durante a 150ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a morte súbita do jogador de futebol Serginho, do Clube São Caetano, ocorrida ontem. Apelo pela aprovação de projeto de lei de sua autoria a respeito do uso do desfibrilador.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Reflexão sobre a morte súbita do jogador de futebol Serginho, do Clube São Caetano, ocorrida ontem. Apelo pela aprovação de projeto de lei de sua autoria a respeito do uso do desfibrilador.
Publicação
Publicação no DSF de 29/10/2004 - Página 33355
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, MORTE, ATLETA PROFISSIONAL, FUTEBOL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • REGISTRO, VISITA, ORADOR, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), OBSERVAÇÃO, PROGRAMA, SAUDE PUBLICA, ATENDIMENTO, EMERGENCIA, CARDIOPATIA GRAVE, NECESSIDADE, PROVIDENCIA, BRASIL, UTILIZAÇÃO, EQUIPAMENTOS, REVERSÃO, SITUAÇÃO, REDUÇÃO, MORTE.
  • PROTESTO, PARALISAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, APROVAÇÃO, SENADO, OBRIGATORIEDADE, DISPONIBILIDADE, EQUIPAMENTOS, CONTROLE, CARDIOPATIA GRAVE, ESPECIFICAÇÃO, IMPORTANCIA, TREINAMENTO, TRABALHADOR, ESPORTE, EXPECTATIVA, URGENCIA, TRAMITAÇÃO.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Caro Presidente, Senador Roberto Saturnino, trago ao Plenário do Senado Federal uma reflexão sobre um fato grave ocorrido ontem. Parece tratar-se de um fato isolado, mas definitivamente não o é. Refiro-me à morte do jogador Serginho.

Ontem, o Brasil inteiro estava assistindo a uma partida de futebol e, mais uma vez, observou a queda ao solo de um jovem de vinte e poucos anos, que teve sua vida levada em poucos minutos. Serginho chegou ao hospital sem qualquer condição de reversão do quadro que o abateu e evoluiu para a morte.

Quem acompanha a vida esportiva pôde testemunhar na Comunidade Européia no ano passado, na Espanha e em Portugal, ocorrências semelhantes. Lamentavelmente, ontem à noite, tivemos mais um caso de morte súbita na prática de esportes. Um atleta de voleibol de nome Eduardo, na cidade de Recife, cotado para a seleção brasileira de voleibol, foi vítima também de uma doença que resultou em sua morte súbita.

Trago esta matéria porque ela diz respeito à responsabilidade também do Congresso brasileiro. Tive a oportunidade de, no ano de 2000, fazer uma visita a cinco Estados americanos, observar programas de saúde pública dentro dos Estados Unidos que dissessem respeito às urgências e às emergências, além de observar o que aquele país tem feito em relação aos casos de morte súbita. Fui acompanhado do Presidente da Federação Interamericana do Coração, Dr. Sérgio Timerman, do atual Ministro dos Esportes, Agnelo Queiroz, de outros parlamentares e observamos a ocorrência da intervenção da saúde pública americana no que diz respeito à morte súbita.

O que observamos foi algo muito interessante. Os Estados Unidos já têm responsabilidade definida em lei, em legislações estaduais, e garantem acesso efetivo a quem é vítima da morte súbita na maioria dos casos. Vale assinalar que são registradas mais de 450 mil mortes por ano devidas à morte súbita nos Estados Unidos, 500 mil mortes todos os anos na Europa, e o Brasil tem o registro global de 260 mil vidas que se perdem em função da morte súbita, sendo que, por doenças coronarianas, em torno de 90 mil.

Infelizmente, o nosso País não adota uma regra clara de intervenção em saúde pública no que diz respeito à morte súbita. Ontem, o jovem atleta Serginho foi vitimado pela morte súbita. Nada mais é, para quem não acompanha na linguagem médica este assunto, do que uma dissociação entre a transmissão elétrica que o coração leva para uma atividade mecânica. Ou seja, o coração funciona por um estímulo elétrico, que se transforma numa ordem mecânica, e ele começa a funcionar. Quando há uma dissociação entre a transmissão elétrica e a atividade mecânica cardíaca, temos fenômenos de arritmia, a chamada fibrilação ventricular, um evento que leva à morte, sem qualquer alternativa de salvação, a não ser pelo recurso do tratamento do desfibrilador. Os Estados Unidos e a Europa têm, em política de saúde pública, um aparelho chamado AED, o desfibrilador external automático, ou seja, um pequeno aparelho que se coloca ao lado do paciente. Põem-se as placas de transmissão e até crianças de 7 anos podem utilizá-lo, fazendo a reversão do quadro. Com esses recursos, poderíamos salvar no mundo, todos os anos, 50 mil pessoas vítimas da morte súbita.

Infelizmente, o Congresso brasileiro não deu a devida atenção a essa matéria, que ainda está parada na Câmara dos Deputados desde o dia 18 de agosto e não temos o andamento dela. O Senado Federal discutiu nas Comissões, por um ano e meio, o projeto de lei que apresentei, aprovou-o por unanimidade, em votação terminativa, na Comissão de Assuntos Sociais, mas, lamentavelmente, na Câmara dos Deputados, a matéria não conseguiu angariar a devida solidariedade e sensibilidade por parte dos nobres Deputados.

Espero que esse episódio de ontem seja um motivador para que a Câmara dos Deputados adote a tramitação da matéria como prioridade e se assegure a proteção do cidadão brasileiro vítima da morte súbita.

É a primeira causa de morte no nosso País e, infelizmente, não temos uma política determinada de governo, porque não há uma legislação vigente que imponha a devida obrigação de uma conduta.

Infelizmente, ontem, no estádio de futebol onde ocorreu o evento, tínhamos disponível o aparelho, mas ele não conseguiu ser usado por pessoas que estavam ao lado. Fizeram manobras superadas de ressuscitação cardiopulmonar, o paciente chegou com mais de 5 minutos de parada no hospital e foi impossível para a equipe médica de plantão conseguir reverter o quadro e assegurar-lhe a vida. Então, a chance que tinha foi jogada à margem e as críticas se avolumam dentro de toda a rede de comunicação em tempo real - a Internet - por parte de especialistas, condenando a ausência de um recurso básico de vida que pudesse ser tomado.

Existem cursos formais na Sociedade de Cardiologia do Brasil como o BLS, suporte vital básico, o ACLS, que é o suporte vital avançado do coração, recursos que poderiam estar perfeitamente dentro da rotina dos treinadores dos estádios de futebol e das equipes que trabalham com medicina esportiva, mas nós não temos essa prática assegurada. É uma pena que tenhamos tido mais uma vítima da morte súbita, sem o recurso efetivo que poderia ter sido implantado.

Então, em nome da Sociedade Brasileira de Cardiologia, normas legais  que já foram adotadas, como no Estado do Paraná, onde já se adota a obrigação do desvibrilador externo automático, e do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, que já adota o treinamento de funcionários para o que possam fazer. Nos Estados Unidos, em alguns Estados, a legislação é tão rigorosa que, se num determinado prédio residencial, uma pessoa for vítima de um enfarte - vítima da morte súbita - e não for usado o desvibrilador externo automático, o único recurso de tratamento que se tem para esse fenômeno clínico, o sindico do prédio será responsabilizado penalmente.

Então, lamento profundamente que o Brasil não tenha ainda despertado como deveria para esta matéria. O Senado Federal já fez a sua parte. Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4.050. Espero que a Comissão de Seguridade Social e os nobres Deputados entendam a importância de um gesto solidário de tramitação rápida, para que possamos dar a devida resposta à sociedade brasileira e esses fenômenos não continuem a ocorrer. É fato que é uma manifestação rara em jovens e atletas entre 17 e 31 anos de idade, mas ela ocorre no dia-a-dia, nos edifícios, nas ruas, nos shoppings centers, nas rodoviárias, nas ferroviárias; no entanto, infelizmente, a atenção em saúde pública tem sido muito escassa em nosso País com relação a uma matéria tão relevante.

O meu apelo fica para que possamos entender a importância de tal assunto, aprová-lo com a devida urgência na Câmara dos Deputados.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/10/2004 - Página 33355