Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

O horário de verão no Brasil.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • O horário de verão no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/2004 - Página 35200
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, HORARIO DE VERÃO, CAPACIDADE, ECONOMIA, ENERGIA, ANALISE, AUMENTO, CONSUMO.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos anos o governo brasileiro tem adotado o horário de verão e justifica tal medida por causa da questão energética brasileira. Segundo ERNANI SARTORI, cientista político, assim como não se justifica que um país tão rico como o Brasil (que tem exagerado dinheiro para certas coisas e escasso dinheiro para outras) tenha um povo tão miserável, da mesma forma não se justifica que um país tão rico em recursos energéticos (potência energética!) importe energia elétrica e instale termoelétricas, estas poluentes do ar e dos rios do Brasil. No contexto energético brasileiro também se encaixa o horário de verão, o qual possui inconsistências quanto à sua real capacidade de economizar energia.

            Enquanto que o horário de verão se torna agradável no final da tarde ao nos proporcionar alguns minutos a mais de claridade e lazer, no inicio do dia ele obriga muita gente a acordar muito cedo e no escuro para ir ao trabalho e à escola. Situação ainda pior devido às condições de segurança deste País. Imaginem agora com os apagões das ruas!

A idéia básica do horário de verão é a de aproveitar o maior comprimento do dia claro durante o verão com o fim de utilizar a iluminação natural e assim economizar energia elétrica. Esta idéia surgiu durante a primeira guerra com o objetivo de poupar o escasso óleo e outros combustíveis fósseis que formavam e ainda formam a base de produção de energia de muitos países desenvolvidos. No Brasil, 95% da energia gerada é de origem hidrelétrica. Bem, quanto à água, sabe-se que no Brasil não há falta de água, aqui só tem problemas de distribuição de água, como parte da regra nacional de problemas de distribuição de bens... Veja-se que uma das conversas sobre as privatizações era a de tornar o Estado mínimo, mas só o que se vê é o Estado aumentar violentamente a quantidade e o valor dos impostos sobre o povo e reduzir os benefícios ao mesmo. Isto só causa distribuição de males ao povo...

O maior comprimento do dia claro, porém, não é suficiente para justificar a adoção do horário de verão, pois este horário temporário também está relacionado a fatores que dependem do grau de desenvolvimento e organização do país. Quando observamos o seu funcionamento e a sua aplicação para o Brasil com mais cuidado verificamos que toda a sua idéia básica pode ficar comprometida e, em vez de economizar energia pode resultar em aumento de consumo, como veremos a seguir.

O comprimento do dia claro no verão não é igual em todos os lugares e depende da latitude do local. Enquanto em Porto Alegre o dia no verão chega a ter até 4 horas a mais do que no inverno, em Fortaleza esta diferença é de apenas 24 minutos. Ou seja, para as baixas latitudes, em vez de horário de verão, poderia instituir-se o horário de inverno, que daria no mesmo. Porém, mesmo para Porto Alegre, que é a capital brasileira que possui a mais alta latitude, ainda há o que considerar. Vamos, então, analisar o que acontece no inicio e no fim do dia naquela cidade no que se refere aos ganhos e perdas de energia com o horário normal e com o horário de verão.

Em Porto Alegre, em 30/10 (próximo do início do horário de verão), o dia começa às 05:31, quando o sol já se põe acima do horizonte. A maioria das empresas e escolas começa sua atividade às 07:00 ou 07:30. Para poderem chegar no horário das suas atividades as pessoas necessitam acordar em torno de uma a duas horas antes da hora prevista. Vamos admitir, então, que em média as pessoas se despertam uma hora e meia antes do trabalho ou escola. Uma hora e meia mais cedo das 07:00 corresponde às 05:30. Assim, no horário normal e naqueles dias, as pessoas acordam quando o dia já está claro e, daí, não precisam acender as luzes. No horário de verão, porém, o que era 05:31 passou a ser 06:31 mas o horário de início das atividades continuou o mesmo (07:00) e as pessoas continuam tendo que se acordar às 05:30 (que corresponde às 04:30 do horário normal). Ou seja, das 05:30 às 06:31, a população do Rio Grande do Sul, em vez de economizar é obrigada a desperdiçar em média uma hora (!) de energia elétrica devido ao horário de verão, além das pessoas terem de se sacrificar para se acostumarem a levantar uma hora antes do horário que o corpo sempre esteve acostumado. No dia 31/01 (próximo do fim do horário de verão), em Porto Alegre, o dia começa às 05:52, que no horário de verão corresponde às 06:52. Neste caso, ao se acordarem às 05:30 (04:30 no horário normal) as pessoas precisam gastar uma hora e 22 minutos a mais de energia elétrica antes do dia estar suficientemente claro! No horário normal este gasto seria de apenas 22 minutos. Em Porto Alegre, que é a capital brasileira mais favorável para o horário de verão, apenas acontece a troca de uma hora da tarde por uma hora da manhã, ou seja, o que se pode ganhar de tarde perde-se exatamente de manhã.

Vamos agora nos deter na parte da tarde, no final do expediente, pois durante o dia nada muda, uma vez que o número de horas de trabalho no horário de verão é o mesmo do horário normal. A maior parte das empresas encerra seu expediente às 18:00. Então, 18:00 no horário de verão corresponde às 17:00 do horário normal e assim sobra mais tempo de claridade após o expediente. Com isso, em muitas cidades, o comércio permanece aberto além do expediente normal para aproveitar o maior número de pessoas nas ruas e daí gasta mais energia. Adicionalmente, não é de se esperar que a propalada economia de energia venha das indústrias - que no horário de verão teriam uma hora a mais para não acenderem as luzes - pois elas normalmente mantêm as luzes acesas mesmo durante o dia. Projetos adequados dos prédios aproveitando eficientemente a luz externa evitariam a necessidade delas de acender as lâmpadas durante o dia.

A população que vai pra casa logo depois do trabalho, quando chega em sua residência liga o chuveiro, as luzes e os eletrodomésticos do mesmo modo que faz no horário normal, não provindo daí nenhuma economia de energia. Vamos ver o caso de São Paulo. Certamente, a maioria daquela população demora em média (ou no mínimo) uma hora e 30 minutos pra chegar em casa depois do trabalho. Em 30/10, em São Paulo o dia começa a escurecer às 19:20 no horário de verão, o que significa que já é noite quando as pessoas chegam em casa e, daí, precisam acender logo as luzes. Na vigência do horário de verão, o dia começa em São Paulo entre às 06:20 e às 06:45 (hora de verão), de modo que se as pessoas se acordam às 05:00 precisam gastar uma hora e meia de energia antes do dia clarear, uma hora a mais do que seria no horário normal!

As considerações para as outras cidades brasileiras são semelhantes às feitas acima, porém, quanto mais para o norte menor é o potencial de economia de energia devido ao horário de verão. É certo que à noite no horário de verão as pessoas permanecem acordadas menos tempo e assim gastam menos energia, mas tal ganho não se compara às perdas que o volume da população é obrigado a ter de manhã no novo horário. Em resumo, os gastos de energia na parte da manhã no Brasil com o horário de verão são maiores do que uma débil economia de energia que é possível obter na parte da tarde com o horário de verão. De manhã só é possível economizar energia quando as pessoas se despertam após o nascer do sol, caso contrário é puro desperdício. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/2004 - Página 35200