Discurso durante a 153ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca da eleição para a Prefeitura de São Paulo. Defesa da postura do Senador Eduardo Suplicy durante o período eleitoral no Estado de São Paulo.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. ELEIÇÕES.:
  • Considerações acerca da eleição para a Prefeitura de São Paulo. Defesa da postura do Senador Eduardo Suplicy durante o período eleitoral no Estado de São Paulo.
Aparteantes
Alvaro Dias, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 06/11/2004 - Página 35359
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. ELEIÇÕES.
Indexação
  • DEFESA, CONDUTA, EDUARDO SUPLICY, SENADOR, CAMPANHA ELEITORAL, MUNICIPIO, SÃO PAULO (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUSENCIA, RESPONSABILIDADE, PERDA, MARTA SUPLICY, PREFEITO, ELEIÇÃO MUNICIPAL.
  • IMPUTAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PERDA, ELEIÇÃO MUNICIPAL, ESPECIFICAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO PARA (PA).

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, funcionários, farei uma rápida consideração sobre um assunto que, infelizmente, esteve nos jornais por esses dias, referente à eleição para a Prefeitura de São Paulo.

No domingo, recebi uma graça muito grande. Sofri um grave acidente de carro, e Deus me deu uma benção, como sempre maravilhosa - cada vez mais, Senador Heráclito Fortes, estou perdendo todos os meus créditos no céu -, pois meu filho e eu ficamos muito bem. Está tudo muito bem, ninguém teve nada, mesmo com a capotagem. Eu vinha dirigindo. Foi terrível, Senador Papaléo Paes! Deus me deu uma enorme graça, pois nem eu nem meu filho tivemos absolutamente nada. No outro dia eu estava pensando assim: vai ver que Deus me deu essa experiência para dizer que me quer boazinha e que, portanto, eu não vá comemorar as derrotas do PT. E sou boazinha mesmo.

Estou falando sobre isso, Sr. Presidente, porque quero me referir a uma pessoa que para mim é muito especial e que tem sido atacada nos jornais de uma forma perversa, cruel e desrespeitosa em função da derrota do PT em São Paulo. Trata-se do nosso querido Senador Eduardo Suplicy. Independentemente da amizade, do carinho e do afeto que tenho por ele, faço esta defesa neste pronunciamento porque conheço a generosidade, em plenitude, do Senador Eduardo Suplicy.

Sei que sou uma pessoa de bom coração para todas as crianças, para todos os idosos, para deficientes e enfermos de todas as classes sociais, mas não sou uma pessoa de bom coração para banqueiros, para o capital especulativo. Estou aqui para aniquilar o capital. A minha classe é a trabalhadora. Então, não tenho imparcialidade para analisar determinados aspectos que privilegiam o capital. Estou aqui para aniquilar o capital. Não vou conseguir fazê-lo, é verdade, mas não posso dizer que eu tenha imparcialidade para analisar, porque a minha formação ideológica, a minha concepção programática, a minha visão de mundo tem lado. Então, é evidente que o que vem para privilegiar o capital eu tentarei aniquilar e combater, do mesmo jeito que alguns representantes do capital.

O Senador Eduardo Suplicy é uma pessoa completamente justa, de uma imparcialidade em relação a qualquer pessoa que às vezes até nervosismo nos causa. Quando eu era Líder do PT no Senado, Líder da Oposição ao Governo Fernando Henrique, Senador Heráclito Fortes, em muitos momentos em que solicitávamos a abertura de procedimentos investigatórios e conseguíamos documentos, inclusive sigilosos em relação a determinadas personalidades políticas que eram nossas adversárias ferozes na Casa, o Suplicy nunca foi capaz de um único gesto de parcialidade política em relação a vários Senadores, em relação ao Governo Fernando Henrique. Era incapaz de um gesto de parcialidade política. Era imparcial. Sempre queria que buscássemos outra documentação, que buscássemos ouvir a pessoa sem expô-la publicamente. Sempre foi assim. Nunca permitiu comentário algum a qualquer pessoa.

Como amiga dele que sou, sei a fase de dor e sofrimento por que passou após o processo de separação. Não se buscam culpados, porque nada é unilateral numa relação de amor ou numa relação que já foi de amor. Nada é unilateral. Ele nunca permitiu comentário algum, administrativo ou pessoal, sobre a Prefeita Marta Suplicy. Pelo contrário, sempre a defendeu, sempre se expôs publicamente para defendê-la não apenas pessoalmente, mas administrativamente, sempre com o senso de justiça que está na sua alma. Se achar que um ataque que faço ou que qualquer outra pessoa faz a um adversário político é injusto e significa intolerância, ele, imediatamente, defende a outra pessoa.

É por isso que me sinto na obrigação, por conhecê-lo profundamente, de fazer este pronunciamento. O PT e o Governo precisam ter a humildade de entender que, infelizmente - digo infelizmente de todo coração -, houve uma derrota do PT nessas eleições. Mais infelizmente ainda, meu nobre, caro e querido Senador Alvaro Dias, houve vitória do PSDB. Infelizmente, porque, para mim, o PSDB representa o mesmo projeto neoliberal carcomido que o PT hoje representa. Então, infelizmente, porque não havia, talvez, uma estrutura política que pudesse representar outro projeto para o País, a começar das eleições municipais.

O PT precisa aprender que o Partido é que foi punido. O Partido não foi punido apenas em São Paulo, mas nas duas administrações que sempre foram apresentadas à comunidade nacional e internacional como os dois cartões postais do chamado “modo petista de governar”. O chamado “modo petista de governar” traz elementos que considero importantes para a administração pública, e foram derrotados. Houve um sentimento anti-PT em Belém e Porto Alegre, que sempre foram apresentadas como os dois cartões postais do “modo petista de governar”. Por que houve derrota nessas duas cidades se havia determinadas medidas administrativas extremamente importantes? Punição à farsa, à demagogia e ao eleitoralismo que, infelizmente, virou o PT.

Muitos foram punidos - talvez até nem merecessem - porque todo o discurso de defesa da ética foi completamente esfacelado e aniquilado quando, em outro lugar, o PT se unia aos porcos da pocilga da corrupção do País por interesse eleitoral. Então, perdia a autoridade moral de apontar o dedo em riste para outro corrupto com quem possivelmente pudesse estar disputando.

O PT precisa entender isso e humildemente refletir a respeito. O problema de eleição não é só contabilizar e fazer cálculo do percentual de aumento. Determinadas pessoas usam partidos como partidos de aluguel. E usaram, em alguns lugares, pessoas que não têm nenhuma identidade com o que era o PT nem com o que é o PT hoje. O PT foi entregue como um partido de aluguel, e entra na tal da contabilidade medíocre e eleitoralista de dizer que aumentou.

Importa, agora, ter humildade para entender que a demagogia eleitoralista, a arrogância, a intolerância e acordos políticos dos mais delinqüentes possíveis, tudo isso acaba sendo punido eleitoralmente. Portanto, não adianta querer culpar o Senador Suplicy pela derrota de São Paulo. É absolutamente injusto fazer isso. Nem façamos isso também com o povo de São Paulo, que não merece. Há gente conservadora em todo lugar - em Alagoas, no Pará, no Paraná, em São Paulo. Agora, não dá para dizer isso de São Paulo, que, 16 anos atrás, elegeu uma guerreira, uma mulher de luta, uma nordestina, num PT isolado, sozinho, sem nada, numa belíssima demonstração de democracia. Depois, elegeu a Prefeita Marta Suplicy, que sempre defendeu temas polêmicos, importantes na minha concepção. Nem por isso, o preconceito, o conservadorismo foi de tal forma eficaz que pudesse levá-la à derrota.

Portanto, não façamos isso. É extremamente injusto fazer isso com uma pessoa que tem um bom coração, uma pessoa amável, incapaz de fazer um único gesto de perversidade ou crueldade com quem quer que seja. Muitas vezes, até brinco contra a elite paulista, porque sabemos como são alguns. Há os príncipes da elite paulista, tudo que se assemelha a fezes, sempre com muita pose. Mas, independente da pose daqueles que, mesmo se assemelhando a fezes, passeiam nos tapetes azuis do Senado como principezinhos medíocres da elite paulista, eles acabam sendo derrotados para ver se aprendem.

Já fui derrotada numa eleição e tentei aprender com isso, mesmo sabendo quem eu estava enfrentando. Derrota serve para estas coisas também: aprender, e não tentar atribuir culpa a quem de fato não a tem; muito pelo contrário, sempre teve altivez, brilhantismo e dignidade para defender, inclusive, a Prefeitura de São Paulo e a Prefeita.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Primeiro, ouço o Senador Heráclito Fortes e, em seguida, V. Exª, Senador Alvaro Dias.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senadora Heloísa Helena, em primeiro lugar, registro minha alegria, que, quero crer, seja de todo o Senado, pela sua volta hoje sem problemas mais graves após o acidente que sofreu. Quando tomei conhecimento do acidente, estava em Teresina para o processo eleitoral. Confesso que as primeiras notícias é de que tinha sido um acidente muito grave e que seu estado de saúde merecia cuidados especiais. Evidentemente, preocupou não só a mim mas a todos que tomaram conhecimento da notícia. Daí a minha alegria em vê-la aqui com mais força do que antes. Com relação ao Senador Eduardo Suplicy, entendo que essa de fazê-lo bode expiatório de uma derrota não vai colar. O Brasil todo, e São Paulo principalmente, conhece o Senador Suplicy. Tive a felicidade de chegar à Câmara, no meu primeiro mandato, juntamente com S. Exª. Nossa convivência, embora distante, por causa de diferenças partidárias, pessoalmente é muito afetuosa, e concordo com V. Exª: o Senador Eduardo Suplicy é uma pessoa de caráter inoxidável. Não há quem consiga maculá-lo. É um homem que só diz o que acredita e que insiste nas teses em que acredita. É um homem puro, coisa rara de se ver no mundo de hoje. Desse modo, penso que São Paulo todo é testemunha da atuação do Senador Eduardo Suplicy e sabe que esse processo que está sofrendo agora já vinha sendo preparado há algum tempo. Não é novidade. Por fim, quero parabenizá-la pela análise rápida que fez das vitórias do PT. Aliás, algo que será necessário avaliar aqui, Senadora, é a questão da qualidade e da quantidade. V. Exª foi de um PT que, para aceitar novos militantes, algumas vezes exigia até DNA. Procurava conhecer o passado e o perfil da pessoa. Agora, vou dar só um exemplo do que foi a vitória do PT em termos numéricos. No Estado do Piauí, o PT, que tinha uma prefeitura, agora fez sete; das sete, apenas um eleito, o Prefeito de São João do Arraial, é um petista militante. Todos os outros fizeram do PT uma sigla de aluguel; foram filiados nos últimos instantes. São pessoas excelentes, mas que jamais seriam aceitas como candidatos pelo PT em outras circunstâncias - pessoas oriundas do PFL e de vários partidos. De forma que a análise que V. Exª faz é perfeita. Essa justificativa de vitória do PT parece-se muito com a que o Palácio do Planalto apresentou em 1974 para justificar as 16 derrotas que abalaram o País. Foram para a televisão mostrar que a Arena havia ganhado. É verdade que ganhou no Nordeste. Senadora, minha única preocupação é que, naquela época, depois de muita meditação, o Palácio criou a figura do senador biônico. Com esse viés autoritário de que o PT hoje é possuído, tenho medo de que o laboratório esteja programando algum atentado contra nós todos. Tentativas já houve com relação à imprensa e à cultura, mas deixo essa questão para meditação do Brasil. Muito obrigado.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Agradeço a V. Exª.

Ouço o Senador Alvaro Dias.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) -Senadora Heloísa Helena, como a baraúna do Nordeste, que verga, mas não quebra, V. Exª também não se abate com os contratempos. Neste aparte, quero solidarizar-me com o Senador Eduardo Suplicy e dizer publicamente da admiração que devoto a S. Exª, pelo seu comportamento, pela sua elegância e postura ética e, sobretudo, pela presença sempre civilizada nos confrontos com seus opositores. S. Exª nunca perdeu o chamado fair-play. O Senador Suplicy é de uma elegância imbatível no que respeita ao relacionamento com seus aliados e adversários. Tenho procurado cumprir meu dever fazendo uma oposição dura ao Governo Lula, e S. Exª tem dado uma demonstração de apreço mesmo àqueles a quem se opõe, porque o Senador militou na oposição durante muito tempo e sabe qual é a missão do opositor. Relativamente à questão de São Paulo, também é bom reconhecer méritos dos que vencem e não somente procurar os defeitos de quem foi derrotado. Há um conjunto de fatores que determinam a vitória e a derrota. Há circunstâncias que influenciam de um lado e de outro. Evidentemente, a vitória tem muitos pais; a derrota é órfã. É por isso que o Senador Suplicy foi responsabilizado agora de forma irresponsável, indigna e perversa. Ninguém tem autoridade de responsabilizá-lo por uma derrota quando, na verdade, ele contribuía para a vitória, pois só tinha a oferecer na direção da vitória. O Senador Suplicy é um cabo eleitoral que qualquer candidato deseja ter em qualquer lugar deste País exatamente por sua história. S. Exª não necessita dessa solidariedade, mas apenas compartilho da posição de V. Exª, nesta hora, relativamente ao episódio de São Paulo. E, como integrante do PSDB, devo dizer que a vitória de Serra em São Paulo se deu também e sobretudo em função dos seus méritos pessoais, da sua qualidade, da sua competência e da sua integridade moral. Certamente, está qualificado para ser um grande Prefeito da cidade de São Paulo. A Prefeita Marta Suplicy tem méritos. e obviamente não podemos creditar a vitória de Serra apenas aos defeitos da Prefeita de São Paulo que alguém poderia apontar. Além da competência, da qualificação e da história de Serra, há um governo, em São Paulo, que também somou e participou efetivamente nessa vitória: o governo de Geraldo Alckmin, com um desempenho extraordinário à frente do maior Estado do nosso País. Portanto, expresso aqui a nossa solidariedade ao Senador Eduardo Suplicy.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Agradeço a V. Exª pelo aparte, Senador Alvaro Dias. Sr. Presidente, como bem disse o Senador Alvaro Dias, o Senador Eduardo Suplicy não precisa de solidariedade, mas, nós que o conhecemos, sabemos o quanto ele é um homem bom, generoso e incapaz de qualquer gesto de perversidade contra qualquer pessoa. Portanto, que o PT assuma os seus erros e aprenda com essas derrotas, até porque o que ficou muito claro, especialmente nas administrações que representavam o chamado modo petista de governar, é que a derrota se deu exatamente porque o PT, que traiu a concepção da Esquerda Socialista, quis tanto parecer com o PSDB, que traiu a concepção da Social Democracia Européia, que esse mimetismo acabou fazendo ressuscitar os velhos neoliberais do PSDB, o que, na minha concepção, é muito ruim. Embora respeite o resultado das urnas, para mim, para a concepção programática, para as minhas convicções ideológicas, enfim, para a concepção que tenho para o futuro do País, isso é muito ruim. Mas infelizmente há os grandes responsáveis pelo ressurgimento político daqueles estavam tentando desmontar o projeto iniciado, e hoje o que vemos são tucanos com o broche de estrelinha.

Fica realmente muito difícil entender, na busca do aprimoramento da democracia representativa brasileira, o que é o quê no processo eleitoral. E nos outros centros, em alguns outros centros - evidentemente ninguém pode falar, mas vi em Belém e no Rio Grande do Sul - vi que o sentimento anti-PT era muito grande, e isso é importante que seja analisado. Do outro lado, não havia forças políticas gigantescas, mas apoio de banqueiros havia de todos os lados. Então fica realmente muito difícil. Espero, portanto, que o PT humildemente reconheça e reflita a respeito, o que, aliás, acho difícil pelas colocações e pelas análises que têm sido feitas de derrotas importantes. Infelizmente, o que se apresenta não é a humildade para reconhecer erros. Continua o mesmo fanatismo, a fanfarra a tocar como se nada tivesse acontecido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/11/2004 - Página 35359