Pronunciamento de Pedro Simon em 10/11/2004
Discurso durante a 156ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Justificativas a projeto de resolução de autoria de S.Exa. que regulamenta a criação de comissões parlamentares de inquérito pelo Senado Federal.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SENADO.:
- Justificativas a projeto de resolução de autoria de S.Exa. que regulamenta a criação de comissões parlamentares de inquérito pelo Senado Federal.
- Aparteantes
- Jefferson Peres.
- Publicação
- Publicação no DSF de 11/11/2004 - Página 35831
- Assunto
- Outros > SENADO.
- Indexação
-
- COMENTARIO, TENTATIVA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, CRIME ORGANIZADO, VINCULAÇÃO, BINGO, ATUAÇÃO, LIDER, BANCADA, GOVERNO, IMPEDIMENTO, INDICAÇÃO, MEMBROS, INGRESSO, ORADOR, JEFFERSON PERES, SENADOR, MANDADO DE SEGURANÇA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DIREITOS, MINORIA, APREENSÃO, DEMORA, TRAMITAÇÃO, PROCESSO JUDICIAL.
- ANALISE, ATUAÇÃO, EXECUTIVO, IMPEDIMENTO, FUNÇÃO FISCALIZADORA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), LEGISLATIVO, SEMELHANÇA, RESTRIÇÃO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, EXCESSO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
- COMENTARIO, PARALISAÇÃO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCO DO ESTADO DO PARANA S/A (BANESTADO), TERRAS, CONFLITO, MEMBROS, POLITICA PARTIDARIA, QUESTIONAMENTO, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL.
- REGISTRO, VOTAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROJETO DE RESOLUÇÃO, ALTERAÇÃO, REGIMENTO INTERNO, OBRIGATORIEDADE, PRESIDENTE, SENADO, INDICAÇÃO, MEMBROS, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SITUAÇÃO, OMISSÃO, LIDER.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no dia 5 de março, no início desta Legislatura, foi lido o Requerimento nº 245, do Senador Magno Malta e outros Senadores, com as assinaturas minha e do Senador Jefferson Péres, que tinha o seguinte teor:
Requeremos, em conformidade com o art. 145 do Regimento Interno, conjugado com o art. 58, § 3º, da Constituição Federal, a criação de uma comissão parlamentar de inquérito, composta de 15 membros e igual número de suplentes, com o objetivo de investigar e apurar a utilização das casas de bingo para a prática de crime de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, bem como a relação dessas casas e das empresas concessionárias de apostas com o crime organizado, com a duração de 120 dias, estimando-se em R$200.000,00 (duzentos mil reais) os recursos necessários ao desempenho de suas atividades.
O Presidente deu o despacho normal, aceitando e pedindo que os Líderes indicassem os membros da Comissão.
No dia 9 de março, após ter havido declaração pública dos Líderes do Governo, pedimos a criação da CPI. O Presidente indicou a comissão aos Líderes, para que eles indicassem os membros. Os Líderes da Bancada do Governo decidiram que não indicariam representantes e determinaram que, a partir de então, nesta Casa, só haveria comissão parlamentar de inquérito quando os Líderes da Maioria quisessem.
Inconformados, dirigimo-nos ao Presidente José Sarney, mostrando que se em cinco dias os Líderes não indicassem os nomes caberia a ele, Presidente da Casa, fazer a indicação. Ele não o fez e respondeu que não seria ele que faria, porque não passaria por cima dos Líderes. O Senador Jefferson Péres e eu ingressamos com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal, representados pelo extraordinário e ilustre Jurista Werner Becker, porque, em nosso entendimento, está se cometendo um absurdo nesta Casa. Uma decisão de Líderes está violentando a nossa Constituição, que diz: “A minoria de um terço determina a criação da CPI”. Os Líderes dizem: “Só haverá CPI quando nós quisermos”. E o Presidente do Senado não faz nada. Ingressamos com ação no Supremo Tribunal Federal porque, a nosso ver, a não indicação constrange instrumentos legais que retiram da deliberação da Presidência ou da Maioria qualquer poder de obstruir determinados fatos.
Em artigo publicado no jornal Zero Hora, de 8 de março de 2004, o ex-Senador e ex-Ministro Paulo Brossard diz o seguinte:
Criada a CPI, que não pode ser obstada por força da Constituição, que assegura a um terço da Câmara ou do Senado o poder de criá-la, seria ela mumificada pela ausência deliberada dos representantes da Minoria. Isto ocorrendo, a CPI não funcionaria, embora formalmente criada. (...) A hipótese, e falo em hipótese, seria letal para as instituições; o expediente teria o efeito de derrogar, prática e efetivamente, a cláusula constitucional que confere à Oposição ou à Minoria a prerrogativa de realizar determinadas investigações na esfera governamental.
Como, na prática, a não indicação de integrantes de uma CPI pela maioria traduzir-se-ia na frustração de um direito constitucionalmente assegurado à minoria, há que haver remédio para isso”.
Entramos com um mandado. Deliberadamente não pedimos liminar, porque julgávamos que, nesse caso, o que está em jogo não é essa CPI. O que está em jogo aqui é a tese, o princípio jurídico, sobre se, no Congresso Nacional, Câmara e Senado, a minoria pode ou não criar uma CPI, ou se o artigo da Constituição foi rasgado e agora quem decide são os Líderes da maioria e não a Constituição. Por isso, não nos interessava apenas essa CPI. Interessava-nos a tese.
No Supremo, o ilustre e brilhante Ministro Celso de Mello, Relator do processo, pediu informações a esta Casa. O Presidente Sarney respondeu com um parecer do jurista Saulo Ramos, seu amigo, afirmando que não se entendia como autoridade coatora - entendimento que, aliás, foi também de Cláudio Fonteles, Procurador-Geral.
Com base nisso, o Senador Arthur Virgílio acionou a Justiça Federal em Brasília para apontar os Líderes como responsáveis. A Desembargadora Federal julgou que não pode decidir a questão antes que o Supremo o faça.
Em 27 de maio, o Relator colocou o processo em pauta para julgamento. Ele não foi julgado. Em 17 de junho o mesmo relator retirou-o da pauta. Em 02 de julho, o Relator resolveu notificar os Líderes governistas. Nós, impetrantes, pedimos que fossem notificados todos os Líderes partidários que não indicaram membros.
Os Líderes João Capiberibe (PSB) e Ideli Salvatti (PT) responderam no dia 17 de setembro, e o Líder Duciomar Costa (PTB) respondeu no dia 22 do mesmo mês. Os Líderes Renan Calheiros (PMDB), Mozarildo Cavalcanti (PPS) e Magno Malta (PL) não responderam.
Em 27 de setembro, o Relator pede outra audiência à Procuradoria Geral, que reitera, em 25 de outubro, seu posicionamento de que os Líderes são de fato a autoridade coatora.
Em suma, a Justiça Federal não decide antes do Supremo, e o Supremo não decide não sei por quê. Com isso tudo entendo que nós, a sociedade como um todo, também podemos ser vitimados pela lesão a outro uso de legítimo instrumento jurídico que é o mandado de segurança, que também termina praticamente nada decidindo, embora sua característica principal devesse ser a sumariedade, a ligeireza em sua apreciação.
Entramos no dia 05 de março. Até agora, nada.
Com tudo isso acontecendo, ou melhor, não acontecendo, aprovamos hoje na Comissão de Constituição e Justiça um texto - já que o Presidente José Sarney não quis aceitar e utilizar a semelhança do Regimento Comum do Congresso, nem do Regimento da Câmara dos Deputados, segundo os quais cabe ao Presidente indicar membros para as comissões, se os Líderes não o fizerem -, que deliberaremos neste Plenário, definindo exatamente que, se os Líderes não indicarem membros para as comissões, caberá ao Presidente do Senado Federal fazer as indicações. Espero que isso aconteça.
Agradeço ao nobre Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, Senador Edison Lobão, bravo companheiro, que foi de uma fidalguia imensa ao permitir que a matéria fosse votada hoje naquela comissão, estando agora pronta para ser votada pelo Plenário.
Eu chamaria a atenção dos meus prezados Senadores para algo que considero muito importante. Primeiro, não é de hoje que o Poder Executivo quer boicotar a criação de CPIs. O Sr. Fernando Henrique Cardoso fez o mesmo em relação ao nosso pedido de CPI com relação a empreiteiras no Orçamento, pois obrigou Parlamentares a retirarem suas assinaturas, de tal maneira que nem o percentual necessário conseguimos. Agora acontece isso. Não se cria CPI. O Presidente do Senado não permite criar.
A par de não se permitir a criação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito, verificamos o que está acontecendo com as CPIs já instaladas. Aqui no Senado, acompanhamos a CPI do Banestado e a CPI das Terras, e verificamos que há um tumulto, algo que nunca tinha acontecido, uma rebelião, uma inconformidade, uma luta interna entre Presidente e Relator, entre membros do PSDB e do PT, com acusações de que um grupo estaria formando um dossiê com outro grupo, e outro grupo contra esse grupo.
Na verdade, o trabalho dessas duas comissões está parado. Nesses 20 anos, eu nunca tinha visto ocorrer algo assim. Pede-se para os Presidentes do Senado e da Câmara interferirem para encontrar uma solução, e a solução não existe. E estamos vivendo o vexame, a humilhação de duas CPIs só serem manchete negativa, com acusações recíprocas de que um ou outro estariam fornecendo dados à imprensa ou agindo nesse sentido.
Primeiro, não se deixa criar CPI, engaveta-se seu pedido de instalação. Segundo, duas CPIs das mais importantes, das mais significativas, envolvendo fortunas, dezenas de pessoas, cai na desmoralização, cai no ridículo, fazendo com que o Senado e a Câmara dos Deputados fiquem em uma posição humilhante perante a opinião pública.
Em terceiro lugar, ao mesmo tempo em que isso acontece, a Polícia Federal e a Procuradoria, agindo muito bem, estão trabalhando, correndo, movimentando-se, colocando na cadeia Prefeito, Senador, seja quem for, dando uma demonstração de alta competência, como nunca tinha ocorrido.
Interessante notar que, há muitos e muitos anos, isso não ocorria. O Procurador-Geral apenas engavetava - aliás, tinha o título de “engavetador-mor”. Já o atual ocupante do cargo é atuante. Inclusive, acredito que S. Exª deve ganhar a brilhante decisão de que o Presidente do Banco Central não tem direito a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal, ou seja, é um caso comum. A Polícia Federal agindo excepcionalmente bem e o Congresso Nacional se humilhando, abrindo mão dos seus direitos, deixando de agir naquilo que era, talvez, ultimamente, a missão mais importante do Congresso Nacional, que era fiscalizar, que era cobrar, que era investigar, que era fazer como fez: tirar um Presidente da República corrupto, tirar Parlamentares corruptos, buscar a verdade.
Fico a me perguntar: não há um esquema no sentido de esvaziar a CPI? Não há um esquema maquiavélico - não sei quantas pessoas nele estão envolvidas - no sentido de esvaziar de vez a CPI? Vamos esquecer essa CPI. Aliás, muitos aqui, até Parlamentares, diziam, quando entrávamos com pedido de CPI, que estávamos querendo transformar o Congresso Nacional em um delegacia de polícia. O Congresso Nacional não é delegacia de polícia! Quem tem que cuidar de CPI é a delegacia de polícia.
Não sei... O que sei é que, no mundo inteiro, nos Parlamentos democráticos, a CPI é uma instituição de grande significado e de grande peso. No Brasil, durante muito tempo, a CPI foi o grande instrumento que a sociedade brasileira tinha para descobrir a verdade onde, infelizmente, a Justiça, lerda e tardia, não chegava aos mais ilustres e aos mais poderosos.
Esta Casa já vê diminuído em muito seu poder de legislar. As medidas provisórias estão aí. Já são dezoito atravancando a pauta da Câmara dos Deputados; são medidas provisórias as mais genéricas, as mais desnecessárias, que, se fossem analisadas pela Comissão de Constituição e Justiça, o Plenário deveria rejeitar de plano, pois não são urgentes e significativas. São medidas provisórias que invadem e arrombam a nossa competência. No entanto, o Governo atual, cujo Presidente é do Partido que era um dos grandes líderes do debate, do protesto e da revolta pelo fato de o Presidente da República Fernando Henrique encher esta Casa de medidas provisórias, está ganhando de longe do ex-presidente Fernando Henrique. As medidas provisórias estão aí...
O Presidente da República, em reunião com empresários, chama a atenção, entre rindo e brincando, para o fato de que ele tem se encontrado, este ano, mais com empresários do que com trabalhadores, dizendo que são ossos do ofício. Creio que não. No caso do Presidente da República, acredito que não seja ossos do ofício falar mais com empresários do que com trabalhadores. Se ele olhasse o problema da fome, o problema da miséria, o problema da injustiça social e o problema da moradia, estaria falando mais com os trabalhadores do que com os empresários. Mas, na verdade, ele está se sentindo bem, se vê a alegria dos empresários... Não me lembro de ter visto, nem no tempo do Fernando Henrique, como nessas últimas reuniões, os empresários aplaudindo, com tanta alegria, com tanta felicidade, o Presidente Lula falando... E os empresários ficam boquiabertos, achando uma maravilha. Aliás, com toda sinceridade, lá no Rio Grande, todo empresário que fala comigo sempre diz a mesma coisa: “Mas que surpresa esse Lula, hein? Como é bom! Que coisa boa é esse Lula”! E até começo a pensar: mas se ele está falando assim é porque não deve ser tão bom. Porque conheço o empresário e sei o que ele pensa.
Mas, na verdade, na verdade, o Congresso está sendo esvaziado. Não legislamos mais. E agora estão querendo esvaziar a CPI.
Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, votamos um item muito importante hoje. O Regimento do Senado terá um item que vai dizer que, se os Líderes não indicarem os membros para uma comissão, em cinco dias, o Presidente do Senado terá de indicá-los. O Presidente Sarney não poderá mais invocar a omissão do Regimento do Senado. Na minha opinião, não precisava. Como faziam os Presidentes anteriores, o Presidente Sarney poderia ter usado o Regimento Comum do Congresso ou o Regimento da Câmara. Agora, terá de usar o Regimento do Senado. Isso será feito. A comissão será instalada.
No entanto, o que me apavora é que sinto no ar um cheiro de tentativa de esvaziamento do Congresso Nacional, sinto no ar um cheiro de se tentar retirar do Congresso aquela capacidade que ele tinha de buscar a verdade, por parte daquele PT espetacular, que era estilingue, a quebrar vidraças, debater, analisar, abrir o jogo, buscar, cobrar. Hoje, vemos exatamente o contrário: um sentimento de apatia. Uma hora querendo determinar que os Promotores não podem mais abrir investigação; outra hora - graças a Deus foi arquivado - querendo criar um Conselho para orientar a ação dos jornalistas. São movimentos negativos na luta pela liberdade.
Venho aqui agradecer ao ilustre jurista Werner Becker e à sua esposa pelo trabalho que vêm fazendo na defesa do mandado. Agradeço à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e ao Senador Jefferson, que foi o Relator, por aprovar hoje pela manhã a emenda que permitirá que isso aconteça. Só não sei se essa caminhada, essa campanha que se faz para desmoralizar a CPI - o que estou vendo, repito, na CPI do Banestado e na CPI da Terra -, irá adiante e teremos condições de responder a ela.
O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Pedro Simon, permite-me V. Exª um aparte?
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não, nobre Senador. Mais uma vez, agradeço a V. Exª a gentileza do seu parecer.
O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - De nada, nobre Senador Pedro Simon, pois são tão grandes as nossas afinidades, que difícil é estarmos em lados opostos. Relatei seu projeto com muita satisfação, até porque eu e V. Exª ingressamos no Supremo Tribunal Federal contra aquela medida arbitrária tomada pelos Líderes da Casa, que impediu aquela CPI. Como nosso propósito não é casuístico, não é aquela CPI, mas uma questão de princípio, do respeito aos direitos da minoria, será muito bom que este Plenário do Senado aprove essa Resolução de sua autoria, porque assim nos anteciparíamos à decisão do Supremo Tribunal Federal. Mais uma vez, parabéns a V. Exª! Tive muita honra de relatar seu projeto.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu é que agradeço o esforço de V. Exª e acho que poderemos reconsiderar essa questão, Sr. Presidente.
Muito obrigado.