Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2004 - Página 37587
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, YASSER ARAFAT, LIDER, PAIS ESTRANGEIRO, PALESTINA, ANALISE, ATUAÇÃO, ELOGIO, BUSCA, PAZ, ORIENTE MEDIO, LEITURA, OBRA LITERARIA, HOMENAGEM, AUTORIA, ORADOR, JORNALISTA, SENADO.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srs. Embaixadores cujos nomes foram citados pelo Exmº Senador Eduardo Suplicy, que teve a feliz iniciativa de propor a realização desta importante sessão especial em homenagem ao grande líder mundial Yasser Arafat; Sr. Presidente; Srªs e Srs. Senadores, subo a esta tribuna para falar de um líder que personificou os sonhos de seu povo, o sonho de um Estado palestino independente. Um líder como Arafat tem na composição de seus atos e de sua personalidade traços incomuns. Não é fácil dedicar uma vida toda ao sonho e à respeitabilidade de um povo. Exige determinação, perseverança, disciplina, e esses traços compunham - na verdade, compõem - a alma de Arafat.

Vou buscar neste discurso indagar os passos e traços da personalidade de um líder, bem como abordar os limites ilimitáveis das ações de Arafat e do povo palestino. Inovarei um pouco, findando meu discurso com um poema tecido pelo meu coração, pela linguagem subjetiva de minha alma, para esse líder que tanto fez pelo seu povo.

Emoção e razão se confundem num líder, pois muitas vezes suas ações, se balizadas pela emoção, geram erros históricos; se carecem de emoção, geram o mesmo erro. Um líder tem que compor nas suas ações os traços da emoção e da razão. Compreender o sentimento do povo é, acima de tudo, compreender a composição e as adversidades. Enfim, é compreender a totalidade dos nossos sentimentos. Arafat, um líder nato, além de possuir essas características, possuía uma macrovisão de como cativar e cultivar o espaço para o povo sonhar em suas crenças no seu espaço, realizando e idealizando suas convicções.

Nascido em 1929, com o nome de Mohammad Abdel Rauf Arafat as Qudwa al Husseini, Yasser Arafat tornou-se símbolo da luta do povo palestino para a criação de um estado no Oriente Médio. O local de nascimento de Arafat permanece um mistério. Ele afirmava que nascera em Jerusalém, mas há registros de que Arafat tenha nascido no Egito, onde estudou Engenharia. Exilado no Kuait, em 1959 fundou o Fatah, movimento nacionalista que se tornaria nos anos de 1960 o núcleo principal da Organização pela Libertação da Palestina, OLP.

Ao fim da guerra árabe-israelense de 1967, Arafat reapareceu após dois anos na clandestinidade, usando o nome de Abu Ammar, pelo qual é chamado até hoje pelos palestinos. Instalou-se na Jordânia, país com grande população palestina, comandando milícias que realizavam ataques contra Israel e atentados contra alvos israelenses ao redor do mundo. As ações deram grande destaque à causa palestina.

Em 1970, entrou em choque com o rei da Jordânia, Hussein, gerando sangrentos combates no chamado Setembro Negro. Ele e a OLP acabaram expulsos do país. Estabeleceram-se no Líbano, usado como plataforma para ataques contra o norte israelense. Israel ocupou o País em 1982, e Arafat e a OLP novamente foram expulsos para a Tunísia.

Em junho de 1994, após a assinatura dos acordos de Oslo (1993), Arafat voltou aos territórios palestinos. Ganhou com justeza o Prêmio Nobel da Paz. Em meados de 2000, fracassava a tentativa de assinatura de um acordo final de paz com Israel.

Alguns biógrafos de Arafat concordam que ele não tinha de fato uma ideologia política definitiva. Acreditavam que o líder palestino percebia o movimento como uma série de desafios táticos a serem superados, não apresentando, assim, nenhuma estratégia central. Arafat intitulava-se um revolucionário, mas estudiosos dizem que não havia um traço de transformação social em sua percepção de mundo. O líder palestino não seria um adepto da visão marxista da luta entre classes, nem da visão islâmica de uma boa política, nem mesmo de um verdadeiro nacionalismo revolucionário. Arafat tem uma visão simplista da luta palestina. Acreditaria apenas na superioridade das reivindicações de seu grupo e que deveria, então, combater os usurpadores de sua causa, posicionando-se como uma espécie de mártir.

Posso continuar a traçar um perfil de Arafat, suas ações, encontros com outros líderes, atividades em prol de seu povo. Tudo isso é muito fácil; difícil é tentar contextualizar no discurso as ações desse líder e a comunhão com a esperança de seu povo. Quando um líder é singular em seus atos, terá a respeitabilidade do mundo. É importante que ressaltemos que respeito não se impõe, se conquista. A atenção, as ações e a coerência são fatores primordiais à conquista desse respeito; não pode ser feito em vão e nem tampouco pensado à exaustão; a emoção e a razão têm que caminhar juntas.

Por que, no dia da sua morte, estava difícil sepultá-lo? Porque ninguém quer deixar que se enterre a personificação de um sonho. Os liderados sentem-se acéfalos quando respeitam e admiram seu líder e ele morre. O liderado fica sem ação e, singular no seu caminho de liderado, fica perdido na conjunção de sua razão com a emoção.

Falemos um pouco, agora, do que é ser palestino.

O uso do termo “palestino” guarda uma diversidade de percursos e conflitos sociais que agiram no sentido de dar substancialidade a uma identidade para grupos sociais que vivem em outros estados nacionais, inclusive em Israel. Redefinições territoriais e de cidadania demonstram a complexidade da autodeterminação do palestino. Para tanto, é necessário retomar a história recente dos conflitos entre nações, redefinições territoriais e embates diplomáticos que colocaram a Palestina no mapa geopolítico no nosso século. A compreensão dos diferentes itinerários permite reconhecer a centralidade do nacionalismo palestino nas atualizações da identidade palestina ainda no contexto de origem, antes e depois de 1948. As redefinições de fronteiras entre estados nacionais e cidadania fornecem o melhor entendimento sobre a identidade palestina e a multiplicidade de itinerários de imigração que incidem nos depoimentos dos imigrantes palestinos que vivem como irmãos no Brasil.

Como se pode ver, um líder de um povo com essa complexidade tinha que ter verve e diversificação em suas ações, bem como crença em si mesmo. Os outros dificilmente nos imputam a crença que temos nas nossas ações. Precisamos acreditar que essas têm base e nunca vão se distanciar de nossas crenças. É muito difícil, no mundo atual, não nos distanciarmos de nossas crenças.

O mundo político é um mundo de composições, e, às vezes, para que essa composição ocorra, nos vemos tolhidos quanto a nossas idéias e ideais. Não, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Embaixadores, isso faz o político menor, o líder comum; o líder singular não se distancia de suas convicções, traçando, a cada minuto, estratégias e conquistando a legitimidade sempre.

Discorreria sobre Arafat horas a fio, comentando seus encontros com outros líderes mundiais, sua vida desde o seu nascimento aos dias de hoje, como Pedro Simon, Eduardo Suplicy e Maguito Vilela o fizeram, quando me antecederam. Mas prefiro ser singular e terminar lendo um poema que fiz com o Sr. Anand Rao, jornalista que trabalha no Senado, sobre as convicções de um líder e as singularidades de suas ações, chamado “Brilho Singular do Olhar”:

É o brilho do olhar

Que norteia nossas ações.

Se este for singular,

Seremos versos e prosas

Como liras e canções.

Se comum,

Seremos passageiros da agonia,

Um olhar rarefeito de intenções.

 

O Olhar e o ver

São díspares.

Quem olha percebe o íntimo

A infinita razão de viver.

Quem vê

Nem o olhar percebe

E se vê tolhido no sentir

E no perceber.

O Líder

É a conjugação do olhar e ver.

O ver é apenas um sentido.

O olhar é o sentimento infinito,

Se conjuga um outro olhar

O olhar de um povo

No brilho do seu olhar.

Um líder

É mago,

E como tal não vê

Sente,

Olha.

É fato, cheiro e sangue de sua terra

Ímã a quem o venera,

Ímpar a quem desespera,

Alento acima de tudo.

Não consegue permanecer solitário

E solidário sempre está com todos.

Um líder é a solidariedade,

Um líder não se limita à idade

Extrapola o tempo ao ter

Em suas ações o dever.

 

Por fim,

Não há fim

Quando um líder se vai.

Há sim o início,

O estar e o ser

De sempre se renascer.

Um líder

É a alma de um povo,

E os liderados,

Na palma das mãos,

Enaltecem essa liderança.

Um líder

Vive!

Pois a vida é eterna a todos

Mas ao líder

É eterna e fraterna

Na verdade, é...

Terna.

 

Pedi ao nosso querido Embaixador Musa Amer Odeh que me desse, em árabe, algo para eu falar do fundo da alma, na certeza de que Arafat se encontra junto a Alá, olhando e protegendo o povo da Palestina, para que consiga a efetivação do Estado Palestino. Não sei se conseguirei pronunciar a contento, mas espero que os senhores me entendam: Inna ruh Arafat tahra Ashaab al falastini li istimrar fikrihi wa nidalihi.

Espero que realmente tenha expressado, em árabe, os meus sentimentos.

Shukram a todos os Srs. Embaixadores.

Muito obrigado aos meus colegas Senadores e Senadoras.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2004 - Página 37587