Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2004 - Página 37590
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, YASSER ARAFAT, LIDER, PAIS ESTRANGEIRO, PALESTINA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, LUTA, NACIONALISMO, INDEPENDENCIA, BUSCA, PAZ, ORIENTE MEDIO.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Agradeço, Sr. Presidente.

Cumprimento as Srªs e os Srs. Senadores, os Srs. Embaixadores, os Prefeitos do meu Estado, que nos prestigiam nesta sessão.

Se discurso tivesse título, este meu discurso teria um único título: “Morre o símbolo de um sonho que não pode morrer”. É dessa forma que vejo a morte de Yasser Arafat; a morte da pessoa, a morte física, mas o fortalecimento de um povo pelo exemplo de vida, de luta que ele foi ao longo de toda a sua vida; o fortalecimento do sonho e do desejo inalienável de todos os povos de ter o seu território, de ter reconhecido o direito a se constituir como Nação, como Estado.

Não vou querer falar tão bem quanto o Senador Romeu Tuma, pois S. Exª é ligado à comunidade árabe por ascendência. Mas Yasser Arafat, também conhecido por Abu Ammar, seu nome de guerra, personificava, mais que ninguém, não apenas o sonho do povo palestino, mas também de todos os povos que brigam, lutam, morrem em defesa do seu território, do direito de se constituirem como Estado.

Muitas frases foram ditas sobre o homem político palestino: cidadão do mundo, defensor do direito de todos os povos. Numa das homenagens póstumas, o Secretário Geral da ONU, Kofi Annan, se reportou a essa personalidade tão emblemática, tão forte, dizendo: “Por quase quatro décadas, Arafat expressou e simbolizou em sua pessoa as aspirações nacionais do povo palestino”.

Kofi Annan também afirmou: “O presidente Arafat foi um desses poucos líderes que podem ser imediatamente reconhecidos por qualquer pessoa em todo o mundo”. Isto porque o que ele reivindicava, aquilo por que lutava, por que empenhou a vida toda, se comprometeu e explicitou, através da sua luta cotidiana, é, como eu já disse, algo fundamental.

Não se pode imaginar povo algum sem território, sem reconhecimento ao seu Estado. Apesar de ter despertado, ao longo da sua vida, amor e ódio, até na sua morte, pela forma como foi tratado o desejo que tinha de ser enterrado na sua Jerusalém, esse amor e ódio que perpassaram toda a sua vida não apagaram e não tiraram, em nenhum momento, a sua razão e o seu inquestionável papel de liderança e importância em todo o mundo.

Tenho aqui um discurso longo, mas vou abreviá-lo, e peço a V. Exª, Sr. Presidente, que mande publicá-lo na íntegra, para permitir que outros Parlamentares também usem da palavra nesta sessão, proposta por vários Senadores, mas cuja iniciativa se deve ao Senador Eduardo Suplicy, tão sensível e até respondendo pela tarefa de, ao longo de dois anos, presidir a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

O enterro de Yasser Arafat provocou comoção, chamou a atenção de toda a comunidade internacional, de todos aqueles que consideram o respeito à soberania e à autonomia dos povos um dos direitos inalienáveis e uma das tarefas básicas de todos aqueles que defendem esses princípios como direito primordial, sem o qual não é possível haver respeito entre os homens neste planeta tantas vezes conturbado. Por isso, nos associamos à comunidade palestina, à comunidade árabe e aos homens e mulheres que entendem, que defendem, que têm o compromisso de lutar até o último minuto para fazer valer o respeito e a garantia da territorialidade a todos os povos neste planeta. Planeta tão grande que não é possível que um povo fique refugiado, aprisionado como nos últimos três anos de Yasser Arafat. Que nós possamos ter nesta solenidade a explicitação deste compromisso, da luta do povo brasileiro juntamente com o povo palestino para que o objetivo de Yasser Arafat não seja em nenhum momento esquecido, nem fique embaixo da terra, enterrado. Que fique em cima da terra, fazendo valer a todos que acreditam que sem o direito à territorialidade não há respeito efetivo entre os povos e as nações.

Tenho a oportunidade de conviver em Santa Catarina com a comunidade árabe e de forma muito especial com a comunidade palestina; e ao longo de toda a minha vida parlamentar não houve nenhum ano, durante os meus dois mandatos na Assembléia Legislativa, que não tivéssemos trazido ao plenário da Assembléia a antiga e tão urgente reivindicação do povo palestino: a constituição do seu Estado. Por isso me associo muito sinceramente a todas as manifestações feitas aqui. Sintam-se confortados com a solidariedade do povo brasileiro, que tenho certeza é unânime e está aqui hoje tão bem presente nesta sessão.

Muito obrigada, Sr. Presidente e a todos que nos assistem e participam desta sessão.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO PRONUNCIADO PELA SENADORA IDELI SALVATTI

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A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se nossos pronunciamentos tivessem títulos, o desse que aqui venho fazer nesse momento devesse chamar-se

“Morre o símbolo de um sonho que não pode morrer”.

Morre Yasser Arafat. Morre Abu Ammar, seu nome de guerra, mas não morre o sonho de um Estado Palestino.

Muitas frases ditas sobre o homem político Palestino, nascido em 24 de agosto de 1929, numa família de notáveis de Al-Qods (Jerusalém), os Husseini, resumem aquele que hoje prestamos esta homenagem póstuma:

"Por quase quatro décadas, Arafat expressou e simbolizou em sua pessoa as aspirações nacionais do povo palestino", disse o Secretário Geral da ONU, Kofi Annan.

Que também afirmou:

"O presidente Arafat foi um desses poucos líderes que podem ser imediatamente reconhecidos por qualquer pessoa em todo o mundo".

O líder palestino despertou amor e ódio em vida, e amor e ódio transpareceram nos comentários sobre sua morte. Mas sua importância é inegável!

Com um breve histórico pretendo demonstrar a importância de Yasser Arafat:

Ele participou dos combates na Palestina em 1948, depois se refugiou em Gaza antes de seguir para o Cairo onde estudou engenharia civil. Foi presidente da União dos Estudantes Palestinos de 1952 a 1956, participou em seguida da guerra de 1956, com a patente de sub-tenente no exército egípcio. Várias vezes foi preso por suas atividades políticas no Egito, em 1959 se instala no Kwait onde funda o Fatah, juntamente com Salah Khalaf (Abu Iyad), Khalil al-Wazir (Abu Jihad), Mahammud Abbas (Abu Mazen) e Farouk Kadumi (Abu Loutof). Por causa do grande número de Palestinos, em boa situação econômica vivendo nos Emirados, e da grande liberdade que se beneficiam, o Fatah se torna rapidamente a primeira organização política Palestina.

Depois da derrota Árabe de 1967, e da integração dentro da O.L.P. (Organização para a Libertação da Palestina), renovada pelo movimento dos Fedayins que tinham se formados fora dela, Arafat se torna presidente do Comitê Executivo designado para o Conselho Nacional Palestino (C.N.P.), em fevereiro de 1969 e é eleito presidente da Organização. Em 1973, ele é designado Comandante-em-Chefe de todas forças combatentes Palestinas. Em 1974 ele vem diante da Assembléia Geral das Nações com um ramo de oliveira e uma arma. A simbólica justaposição da Paz e da Resistência que definiu a vida política da Arafat.

Em 1983, em plena guerra do Líbano, ele é forçado a deixar Beirute, cercada pelo exército israelense, e vai para Tunísia, onde são instalado o Quartel-Genaral da O.L.P.

Em 15 novembro de 1988, ele proclama a independência da Palestina, onde dota uma moção onde todas as Resoluções das Nações Unidas são reconhecidas e pede negociações diretas com “Israel”. Ele é eleito pelo Conselho Nacional Palestino (C.N.P.) presidente do Estado da Palestina em abril de 1989.

Em 1993 ele assina a Declaração de Princípios na Casa Branca, entre a O.L.P. e “Israel”, e em 1994, após longos anos de exílio ele retorna para a Palestina, onde é eleito Presidente da Autoridade Palestina (A.P.) com 87,1% dos votos, na primeira eleição geral, sob controle de observadores internacionais, nos territórios Palestinos em janeiro de 1996.

Após o fracasso das negociações de Camp David sobre o “status definitivo”em julho de 2000, Arafat foi acusado de “não responder positivamente as proposições israelenses”. Estas últimas, apresentadas pelo primeiro ministro Barak e pelo ministro do interior Shlomo Ben Ammi, foram fontes de desacordos pois não tratava claramente do status de Al-Qods (Jerusalém) e das colônias na área de 1967 (West Bank e Gaza). Enfim, o Estado Palestino seria composto de “bantustões” na Cisjordania e Gaza, isolados do mundo exterior.

Depois do início da segunda Intifada (Intifada de Al-Aqsa), o futuro de Yasser Arafat se tornou incerto. Abertamente criticado por tropas, que ele parecia não poder mais controlar, seu poder foi ameaçado pela estratégia israelense totalmente concentrada na destruição da infra-estrutura e líderes Palestinos da Resistência.

Ele foi então aprisionado no seu quartel-general (Muqata), desde dezembro de 2001, sitiado por diversas vezes pelo exército israelense em 2002. O governo sionista tenta convencer a comunidade internacional de boicotá-lo, mas o apelo é rejeitado pelo conjunto dos países Árabes e europeus.

Em fevereiro de 2003, sob intensa pressão internacional, notadamente os Estados unidos e União Européia, o líder Palestino é obrigado a aceitar a criação do posto de primeiro ministro e assim dividir seu poder. O Conselho Legislativo Palestino (C.L.P.) aprova a criação deste novo posto por esmagadora maioria, mostrando assim seu desejo de reformar a A.P.. Este arranjo permite Arafat de conservar o controle da segurança e da política exterior, enquanto o primeiro ministro é encarregado do interior e da formação do governo.

A escolha de Mahammud Abbas (Abu Mazen) para este cargo, primeiro ministro, é apoiada pelo “quarteto” (Estados Unidos, Rússia, União Européia e pela O.N.U.), que esperavam que ele fosse capaz de reformar a A.P. reduzindo os poderes de Arafat, e retomar as “negociações de Paz”. Mas por causa do conflito pelo poder ele renuncia a seu posto em 07 de setembro de 2003, e é substituído por Ahmad Qorei (Abu Ala’), que continua em desavença com Arafat na escolha do posto do ministro do Interior.

Após a demissão de Abu Mazen, “Israel” ameaçou Arafat de expulsão e até mesmo de morte, provocando manifestações através dos Territórios Ocupados e da comunidade internacional. Recentemente, Arafat foi novamente ameaçado de morte, medida criminosa que “Israel” já aplicou contra os líderes espirituais do Hamas, Sheikh Ahmad Yassin, e seu sucessor, o médico pediatra Dr. Abdel Aziz Al-Rantissi.

Com a tentativa de marginalizar Arafat, “Israel” obteve o efeito contrário, e ele ganhou apoio da população.

Em novembro de 2004, Arafat voou de sua Muqata (quartel-general) em Ram Allah - Palestina para França, onde em um hospital militar Percy de Clamart, no subúrbio de Paris recebeu tratamento para sua grave e misteriosa doença. Diferentes informações afirmaram, em 03 de novembro de 2004, que Arafat estava em coma ou era apoiado por aparelhos para sobreviver, outros declararam que a situação era estável e reversível.

No dia 11 de novembro de 2004 , as fontes oficiais médicas do Hospital de Percy, declararam que Yasser Arafat faleceu as 04:30 desta manhã em Paris.

O funeral na mesquita Fayçal no Cairo, e em seguida levado para ser enterrado em Ram Allah, na sua Muqata (quartel-general) nos Territórios Palestinos Ocupados, onde passou os últimos três anos de sua vida como ‘prisioneiro’.

Seu desejo de ser enterrado em Al Qods (Jerusalém), a eterna capital da Palestina, foi negado em flagrante desprezo aos Direitos inalienáveis do Povo Palestino, tanto na vida quanto na morte.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2004 - Página 37590